Acórdão nº 955/13.5TABRG.1.S1   de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelMANUEL AUGUSTO DE MATOS
Data da Resolução02 de Março de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - RELATÓRIO 1.

Após audiência destinada à elaboração de cúmulo jurídico das penas parcelares aplicadas neste e noutros processos que se indicarão, o Tribunal Colectivo da Comarca de Braga – Instância Central – 1.ª Secção Criminal – J4 – condenou o arguido AA em duas penas únicas, de cumprimento sucessivo: - A primeira de 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de prisão, resultante do cúmulo abrangendo as penas de prisão que lhe foram aplicadas nos processos n.

os 1932/11.6PHMTS e 84/12.9PJPRT.

- A segunda de 1 (um) ano e 10 (dez) meses de prisão, resultante do cúmulo abrangendo as penas de prisão que lhe foram aplicadas no processo n.º 1704/11.8PHMTS e a dos presentes autos.

  1. Inconformado com a decisão, o Ministério Público interpôs o presente recurso, rematando a sua motivação com as conclusões que se transcrevem[1]: «CONCLUSÕES 1 – Por acórdão de cúmulo jurídico de penas de 6 de Outubro de 2015 proferido nos presentes autos, AA foi condenado em duas penas únicas de cumprimento sucessivo, a primeira de 6 anos e 8 meses de prisão resultante do cúmulo abrangendo as penas de prisão que lhe foram aplicadas nos processos n.ºs 1932/11.6PHMTS e 84/12.9PJPRT e a segunda de 1 ano e 10 meses de prisão resultante do cúmulo abrangendo as penas de prisão que lhe foram aplicadas no processo n.º 1704/11.8PHMTS e a dos presentes autos (955/13.5TABRG) 2 - O nosso dissídio para com o decidido nos autos, com todo o alto respeito que nos merece a posição ali vertida, apenas se reporta a matéria de direito e, dentro desta, relativamente às concretas penas parcelares (condenações) que foram consideradas para integrar os ciclos (cúmulos) de penas únicas consideradas e que necessariamente têm reflexo nas penas únicas fixadas em cada um dos ciclos considerados.

    3 – Na nossa perspectiva o disposto nos artigos 77.º, n.º1 e 78.º do Código Penal determina que aquele primeiro cúmulo tenha que integrar necessariamente a pena aplicada no processo n.º 1704/11.8PHMTS, ficando aquele segundo cúmulo jurídico de penas restringido àquelas penas parcelares e única que foram aplicadas nos presentes autos (955/13.5TABRG).

    4 – Com efeito, tendo presente que há concurso de penas quando o mesmo agente tiver cometido vários crimes antes do trânsito em julgado da condenação por qualquer deles e que o pressuposto essencial para a efectuação do cúmulo jurídico de duas penas parcelares é a prática de diversas infracções pelo mesmo condenado antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles e há sucessão de penas quando o mesmo agente tiver cometido vários crimes depois do trânsito em julgado, havendo lugar nestes a uma acumulação material de penas, tendo o agente que cumprir sucessivamente as penas relativas a cada um dos crimes cometidos, a ideia que está na base desta solução assenta na existência de uma diferença substancial entre os casos em que o agente, apesar de já te recebido uma solene advertência, por via de uma condenação transitada em julgado, prossegue na sua actividade delituosa (situação que determina uma sucessão de penas) e os casos em que o agente comete diversos crimes antes de ser condenado por qualquer deles (situação de concurso de penas).

    5 – Ou seja, a data que estabelece o limite até ao qual será possível realizar o cúmulo das penas aplicadas por cada um dos crimes é a correspondente ao trânsito em julgado da primeira condenação por um deles, pelo que deste modo, apenas os crimes que forem cometidos até a essa primeira data estarão em concurso e será possível realizar o cúmulo das penas aplicadas aos mesmos e onde todos os crimes que forem praticados posteriormente àquela data não poderão integrar o concurso, pois que em relação a estes, haverá uma sucessão de penas, pelo que a pena a aplicar aos mesmos será autónoma e não poderá ser englobada no cúmulo.

    6 – Havendo quem entenda que quando o agente comete um outro crime depois do trânsito em julgado da primeira condenação por um dos delitos em concurso, mas antes do trânsito em julgado da condenação por um dos crimes em concurso praticado antes do trânsito da primeira condenação, tal crime entra no cúmulo – designada teoria do cúmulo por arrastamento – o certo é que a jurisprudência maioritária do STJ é no sentido de que o designado cúmulo por arrastamento não deve ser admitido.

    7 – Na verdade, tem vindo a ser considerado que o denominado «cúmulo por arrastamento» é de rejeitar não só porque contraria os pressupostos substantivos do artigo 77.º, n.º 1, do Código Penal, como ignora a relevância de uma condenação transitada em julgado como solene advertência ao arguido, quando, relativamente aos crimes que se pretende abranger nesse cúmulo, uns são anteriores e outros posteriores a essa condenação; 8 – Nestes termos “não se verifica o concurso de infrações quando a condenação por um dos crimes transitou antes de se ter praticado outro crime” pelo que “Só podem entrar para o cúmulo crimes cujas penas não tenham transitado, representando o trânsito em julgado de uma condenação penal o limite temporal intransponível no âmbito do concurso de crimes, excluindo-se do âmbito da pena única os crimes praticados posteriormente; o trânsito em julgado de uma dada condenação obsta a que se fixe uma pena unitária que englobe as infracções cometidas até essa data e cumule as praticadas depois desse trânsito”. (Cf. P.P. Albuquerque, in "Comentário do CP",pág. 288).

    ” 9 – Também sabemos que “Segundo certa jurisprudência do STJ, porém, em situações destas, é possível efectuar outras combinações de penas, de modo a obter-se a pena conjunta mais favorável ao arguido (…)” sendo a “teoria que subjaz a uma tal solução é a seguinte: (…) numa situação em que se tem de formular mais do que uma pena única para o mesmo arguido, a cumprir sucessivamente, e em que há penas parcelares que tanto podem ser englobadas num dos concursos de penas como no outro, a escolha faz-se de modo a agrupar as penas mais elevadas que sejam cumuláveis entre si. Na verdade, essa será a situação mais favorável para o arguido (…)Isto é: na formação da pena única, quanto maior é o somatório das penas parcelares, maior é o factor de compressão que incide sobre as penas que se vão somar à mais elevada, pois, se assim não fosse, muito facilmente se atingiria a pena máxima em casos em que a mesma não se justifica perante a gravidade dos factos.” cfr. . O Cúmulo Jurídico Na Doutrina e na Jurisprudência do STJ1 António Artur Rodrigues da Costa Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça In STJ.pt (Documentação, Estudos Jurídicos, Direito e Processo Penal http://www.stj.pt/documentacao/estudos/penal e publicado também na revista Julgar (n.º21) 10 - Contudo, como enfatiza o ilustre autor no mesmo texto: “Há dois reparos que nos merece este tipo de raciocínio: em primeiro lugar, o fundamento que lhe está na base e que consiste em considerar que a operação de cúmulo jurídico é essencialmente uma operação matemática, em cujo cálculo entram factores como o designado factor de compressão de penas, tanto maior quanto mais elevado for o somatório das penas a considerar; em segundo lugar, a postergação do critério legal (art. 77.º, n.º 1 do CP), que manda aplicar uma única pena a todos os crimes que tenham sido cometidos antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles, ou seja, a regra de que o trânsito em julgado de uma condenação é um limite temporal intransponível, no âmbito do concurso de crimes, à determinação de uma pena única, excluindo desta os crimes cometidos depois (mas devendo incluir, necessariamente todos os crimes cometidos antes). Por último, esta forma de proceder pode redundar no já censurado cúmulo por arrastamento, na medida em que sejam incluídas, em qualquer das operações de cúmulo, penas relativas a crimes cometidos posteriormente à primeira condenação transitada em julgado que deva ser considerada para o efeito”.

    11 – Na nossa perspectiva e naquilo que constitui o substrato doutrinário e jurisprudencial acima exposto, será de considerar que a primeira decisão transitada será assim o elemento aglutinador de todos os crimes que estejam em relação de concurso, englobando as respectivas penas em cúmulo, demarcando as fronteiras do círculo de condenações objecto de unificação, sendo que a partir daquela data, em função dessa condenação transitada deixam de valer discursos desculpabilizantes das condutas posteriores, pois que tendo sido julgado e sido condenado em pena de prisão por decisão passada em julgado, não pode invocar ignorância acerca do funcionamento da justiça penal, e porque lhe foi dirigida uma solene advertência, teria de agir em termos conformes com o direito, “cortando” com as anteriores condutas.

    12 - Pelo que assim visto, a partir desta barreira (inultrapassável) afastada fica a unificação, podendo os subsequentes crimes integrar outros cúmulos, formando-se outras penas conjuntas autónomas, de execução sucessiva.

    13 – Nestes termos e perante os factos dados como provados na decisão cumulatória, a condenação aplicada nos autos de onde foi extraído o presente traslado (processo n.º 955/13.5TABRG) – tribunal da última condenação e processo onde foi realizado o cúmulo jurídico ora em causa – foi a última, decidida pela sentença de 3 de Fevereiro de 2015, sendo igualmente a derradeira a transitar em julgado, em 16 de Março de 2015, de uma série de quatro condenações sofridas pelo condenado em tantos outros processos.

    14 – Apura-se ainda que a decisão mais antiga transitada em julgado foi aquela a que se refere o facto provado 1.1 (T1.1.), e a data do trânsito é de 29 de Junho de 2012 (processo n.º 1932/11.6PHMTS – 1.1) e antes dessa data, o arguido praticou os crimes pelos quais foi condenado no processo n.º 1704/11.8PHMTS (factos de 6 de Novembro de 2011), os crimes pelos quais veio a ser condenado no processo n.º 84/12.9PJPRT (factos desde inícios de Novembro de 2011 a 25 de Janeiro de 2012) e naturalmente aquele relativo ao processo da...

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