Acórdão nº 33/13.7TTBRG.P1.G1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Março de 2016
Magistrado Responsável | ANA LUÍSA GERALDES |
Data da Resolução | 17 de Março de 2016 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 1. AA Intentou a presente acção declarativa de condenação com processo comum, contra: BB, S.A.
Pedindo a condenação da R. a pagar-lhe: a) a quantia de € 58.212,73, respeitante a retribuições em atraso, férias, subsídios de férias e de Natal não pagos; e b) indemnização pela resolução do contrato de trabalho da iniciativa do trabalhador e com invocação de justa causa, tudo com juros de mora legais.
Alegou, para tanto, que resolveu com justa causa o contrato de trabalho no dia 4 de Dezembro de 2012, porquanto a R. deixou de pagar o vencimento ao Autor, tendo ficado a dever a este a totalidade das retribuições dos meses de Setembro, Outubro e Novembro (€ 1.431,17x 3); € 85,00 referente ao mês de Agosto, subsídio de Natal de 2011 (€ 1.431,17), tudo no total de € 5.809,65.
A estes valores acrescem os demais montantes peticionados a título de proporcionais de férias, subsídios de férias e outros, que perfazem o total do pedido.
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A R contestou impugnando a justa causa de resolução do contrato invocada pelo A, bem como os restantes créditos reclamados.
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Tendo sido marcada a audiência de discussão e julgamento, veio a R. requerer a suspensão da instância, ao abrigo do n.º 1 do artigo 17.º-E do CIRE, alegando estar em curso no Tribunal Judicial de Vila Verde, sob o n.º 754/13.4TBVVD, um Processo Especial de Revitalização da Empresa, tendo nele sido proferido despacho a nomear Administrador Judicial Provisório, conforme anúncio publicado no CITIUS, em 5 de Julho de 2013 – cf. fls. 102.
Requerimento que foi deferido, tendo o Tribunal de 1ª instância determinado a suspensão da instância, ao abrigo da citada norma – cf. fls. 111.
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Posteriormente, no âmbito do supra mencionado processo de reestruturação (PER), foi homologado por sentença de 20/01/2014, o plano de revitalização, no qual foi reconhecido o crédito peticionado pelo A. nos presentes autos (cf. fls. 149).
Por isso, e em face desse circunstancialismo, foi proferido nos presentes autos, pelo Tribunal de primeira instância, a seguinte decisão: “Decorre do plano de revitalização aprovado e judicialmente homologado, que existirá um "deferimento na estrutura do passivo" (cf. fls. 17 e 19), tendo sido estipulado ainda diferentes períodos de carência, ora de 24 meses, ora de 18 meses, ora de 12 meses (este quanto a juros) (cf. fls. 20), tendo ficado consagrado a fls. 34 do PR ser tal período inicial de carência de pagamento de capital “(…)determinante para a prossecução dos objectivos e cumprimento das obrigações decorrentes do próprio plano (liquidação das dívidas ao pessoal(…)”.
Nada estipulado foi em tal PR quanto à previsão da continuação de quaisquer acções de cobrança de dívidas contra a aqui R, pelo que, ao abrigo do disposto no art.º17.º-E, n.º 1, parte final, do CIRE, se determina a extinção da presente instância, por impossibilidade superveniente da lide” 5.
Inconformada, veio a R. apelar para o Tribunal da Relação de Guimarães, que se pronunciou da seguinte forma: “Prescreve o art. 17.º-E n.º 1 do CIRE, que a decisão a que se refere a alínea c) do n.º 3 do art. 17.º-C obsta à instauração de quaisquer acções para cobrança de dívidas contra o devedor e, durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, suspende, quanto ao devedor, as acções em curso com idêntica finalidade, extinguindo-se aquelas logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação, salvo quando este preveja a sua continuação.
A norma jurídica acabada de mencionar emprega a expressão "obsta à instauração de quaisquer acções para cobrança de dívidas... ficam suspensas durante a fase negocial... extinguindo-se aquelas logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação". (…) Os termos abrangentes empregues pelo legislador, os princípios inspiradores do plano especial de revitalização - e do CIRE - baseiam-se na celeridade e na autocomposição, com vista a obter em tempo útil uma solução que viabilize a empresa, que a revitalize e a impeça de morrer. O prolongar de acções declarativas de condenação, mais demoradas, não se compadece minimamente com a agilidade prescrita pelo legislador para o processo especial de revitalização, a menos que os próprios credores acordem em que determinada acção prossiga. Este processo visa evitar que o devedor caia na insolvência. Daí a grande dinâmica que o legislador lhe impõe. Visa evitar que a empresa entre em incumprimento. O prolongamento no tempo de acções declarativas com manifesto e incerto efeito económico na empresa a recuperar constituem um obstáculo à finalidade do processo especial de revitalização. (…) No plano de recuperação não se prevê a continuação da acção.
Assim, (…) entendemos que, ao estar certificado no processo que foi homologado o plano de revitalização da apelante, o tribunal recorrido decidiu bem ao julgar a extinção da instância, nos termos do art. 17º-E n.º 1 do CIRE” – cf. 261, do II Vol.
Pelo que, com tais fundamentos, julgou improcedente a apelação, confirmando, por unanimidade, a decisão recorrida.
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Irresignada, veio a R. interpor recurso de revista excepcional para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo formulado as seguintes conclusões, que aqui se sintetizam: “ - (…) O douto Acórdão proferida pelo Tribunal (…) determinou a extinção da presente instância, por inutilidade superveniente da lide, mantendo a sentença proferida pelo Tribunal da 1.ª Instância.
(…) Está a douta decisão em contradição quanto à mesma matéria com outras decisões proferidas por Tribunais Superiores.
- (…) Fica a Devedora, aqui Recorrente prejudicada pelo pagamento de um crédito litigioso e que não foi discutido, nem apreciado judicialmente, quer pelo Tribunal no âmbito do qual decorreu o PER, quer pelo Tribunal do Trabalho, sendo este o competente para apreciação deste matéria.
- (…) Caso a sentença não seja revogada, ficará a aqui Recorrente prejudicada, pois será obrigada a assumir e a liquidar um valor de crédito reclamado pelo Recorrido que não são devidos, só porque formalmente, no âmbito do PER, em sede de reclamação de créditos foi considerado o valor reclamado pelo Credor, aqui Recorrido, vendo assim o Recorrente prejudicado o acesso à justiça, sendo colocado em causa o Princípio do Acesso ao Direito e à Tutela Jurisdicional Efectiva.
- (…) A questão jurídica fulcral a apreciar e decidir neste recurso prende-se com a definição exacta do conceito de acções para cobrança de dívidas e mais concretamente saber se nesse mesmo conceito se incluem as acções declarativas de condenação, como a presente.
- (…) Está em causa a contradição existente, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, entre o Acórdão aqui recorrido e o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 11.07.2013 - Processo n.º 1190/12.5TTLSB.L 1-4 (Relator Leopoldo Soares) Cf. Acórdão-fundamento de acordo com o disposto no artigo 721.°-A, n.º 2, alínea c), do C.P.C. - que considerou para efeitos do disposto no artigo 17°- E, n.º1 do C.I.R.E., as acções declarativas não consubstanciam acções para cobrança de dívidas contra o Devedor, ao passo que o Acórdão-recorrido, versando também sobre a aplicação do disposto no artigo 17.º-E. n.º 1 do C.I.R.E. considerou, sumariamente, que a acção declarativa instaurada pelo aqui Recorrido contra a ora aqui Recorrente deverá ser extinta, atendendo à homologação do plano de recuperação no âmbito do PER, existindo assim oposição entre os dois Acórdãos.
- Da mesma forma que o Acórdão recorrido se encontra igualmente em contradição com o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa de 23.04.2015 no âmbito do Processo n.º 172724/12.6YIPRT.L1 - que veio definir com exactidão o conceito de “acções para cobrança de dívidas/acções com identifica finalidade” no contexto dos efeitos previstos nos termos do disposto no art. 17.°-E, n.º 1, do C.I.R.E. e que veio concluir no sentido da expressão apenas se circunscrever às acções de natureza executiva para pagamento de quantia certa, com exclusão das acções declarativas de condenação, ao passo que o Acórdão-recorrido, versando sobre a mesma matéria e sobre os créditos da mesma natureza, considerou que a presente acção (declarativa) ficará abrangida pelos efeitos da homologação do plano de recuperação e consequentemente, por efeito automático, a mesma acção será extinta.
- (…) Importa assim saber, se a acção declarativa deverá ser extinta ou prosseguir os seus termos perante a homologação do plano de recuperação.
- O Acórdão recorrido merece censura, na medida em que não fez uma correta interpretação, nem uma aplicação do direito, pelo que deverá ser integralmente substituído, por uma decisão que ordene a prossecução dos termos da acção declarativa com vista ao reconhecimento do crédito que foi instaurada pelo aqui Recorrido com vista ao reconhecimento dos seus créditos laborais.
- (…) Numa acção declarativa a dívida ainda não foi declarada.
- (…) À data em que a acção declarativa é intentada o que existe é apenas um crédito potencial e não um crédito declarado (firmado), considerando que, destina-se a proporcionar ao Autor um título executivo que depois possa executar em sede própria, ou seja, numa acção executiva, esta sim - indubitavelmente - para cobrança de uma dívida ...
- A existência e decurso de uma acção declarativa de condenação, como é o caso, em nada prejudica as negociações referidas na lei, entenda-se no âmbito do PER.
- A acção declarativa de condenação, efectivamente, não é uma acção de cobrança de uma divida. (…) Não existe ainda o reconhecimento de um crédito, apenas essa potencialidade.
- Encontrando-se, assim, o Acórdão-recorrido em plena contradição com o Acórdão e que é aqui Acórdão-fundamento, pois acerca da mesma matéria têm os dois Acórdãos posições distintas.
- (…) Apenas as acções executivas para pagamento de quantia certa podem ser consideradas como verdadeiras acções para cobrança de dívida para os efeitos do artigo 17.°-E, n.º 1, do C.IRE.
- As acções...
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