Acórdão nº 294/12.9TBPTB.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelSALAZAR CASANOVA
Data da Resolução17 de Março de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.

AA e BB intentaram no dia 24-9-2012 ação com processo comum sob a forma ordinária contra CC e DD, EE e FF pedindo a condenação dos RR na restituição da quantia de 68.622,97€, sendo 37.409,84€ de capital e 31.213,13€ de juros vencidos, à taxa legal, bem como os juros vincendos até efetivo pagamento.

  1. Os AA outorgaram escritura de compra e venda de metade indivisa de prédio urbano no dia 15-7-1997 pelo preço de 7.500.000$00.

  2. Nessa escritura declararam ter recebido o preço, mas tal declaração não corresponde à verdade porque nada receberam.

  3. Considerando as relações familiares entre AA e rés, sobrinhas dos AA, o pagamento foi sendo adiado até ao presente.

  4. Os réus contestaram considerando ser falso que o preço de venda do imóvel fosse de 7.500.000$00, pois o preço real de venda corresponde à soma de ambas as dívidas transmitidas pelos AA para as Rés CC e EE, ou seja, 8.800.000$00, não tendo, por isso, nada a pagar.

  5. Na mencionada escritura de 15-7-1997 intervieram também GG e HH, progenitores das RR CC e EE; intervieram também representantes da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo do ... que consentiram na transmissão para as rés da dívida no montante de 4.300.000$00 que é a parte dos AA na dívida contraída pelos AA e pelos progenitores das rés junto da Caixa de Crédito quando da aquisição por eles do imóvel por escritura de 15-7-1993; imóvel de que os AA agora alienaram metade indivisa às sobrinhas; a outra metade continua a pertencer aos pais delas. 7.

    Os restantes 4.500.000$00, isto segundo a contestação, foram transmitidos, mediante acordo, pelos AA para as referidas rés, transmissão consentida pelos credores que são os anteriores proprietários do imóvel a quem os AA e os pais das sobrinhas adquiriram o imóvel em compropriedade.

  6. Este montante de 4.500.000$00, segundo a contestação, corresponde ao valor em dívida das rés para com as anteriores proprietárias do imóvel que, pela quantia de 25.000.000$00 - valor real, pois o declarado na escritura de 15-7-1993 junta aos autos foi de 15.000.00$00 -, foi vendido, como se disse, aos pais das rés e aos tios, estes últimos agora autores.

  7. Os compradores, assim sendo, pagaram 1.000.000$00 de sinal e 15.000.000$00, valor do preço declarado na escritura respeitante ao imóvel sobre o qual foi contraído mútuo hipotecário.

  8. Dos 9.000.000$00 em dívida (25.000.000$00-16.000.000$00), a parte dos autores, tios das rés, era de 4.500.000$00.

  9. Foi este valor que também foi acordado ser assumido pelas rés, assim se obtendo o total de 8.800.000$00.

  10. Os réus juntaram aos autos a escritura de compra e venda de 15-7-1993 onde constam como vendedores II e JJ e como compradores AA e BB, estes os autores da presente ação, tios das rés, e GG e HH, pais das rés. Dessa escritura consta a compra e venda no dia 15-7-1993 do imóvel pela já mencionada quantia de 15.000.000$00 tendo sido mutuada essa quantia com garantia real sobre o imóvel.

  11. Organizada base instrutória, procedeu-se a julgamento tendo sido ouvidas sobre a matéria de facto controvertida as testemunhas arroladas pelas partes.

  12. O Tribunal respondeu à base instrutória da forma constante da sentença dando como não provados os factos arrolados pelos RR que incidiam sobre a matéria que constituía a sua contestação e dando como provado o facto 1 infra: que os RR não procederam à entrega aos AA do valor correspondente ao preço de venda do imóvel declarado na escritura no montante de 7.500.000$00.

  13. Os RR não põem em causa que não pagaram esta quantia de 7.500.000$00 - "em lado algum […] alegaram terem algum dia entregue aos apelados a quantia correspondente ao preço declarado na escritura de compra e venda do imóvel e que aqueles declararam ter recebido na mesma escritura" - o que é exato, porque consideram que o preço de venda no montante de 8.800.000$00 estava liquidado por força da assunção de dívida dos AA para com a instituição de crédito mutuante (4.300.000$00, valor que consta da escritura) e também para com os vendedores do imóvel (4.500.000$00).

  14. Os RR, na apelação, consideram que a prova produzida não permitia dar-se por provado que não procederam à entrega da aludida quantia e mais alegaram que os AA, na petição inicial, se limitaram a alegar que não corresponde à verdade a declaração constante da escritura de que receberam o preço, nenhum outro facto tendo sido aduzido nessa peça, nem posteriormente, de cuja demonstração resultasse a prova de que na formação da vontade conducente à emissão da declaração houvesse qualquer erro ou vício, cumprindo-lhes o ónus da prova de que, declarando ter recebido o pagamento, erraram ou foram vítimas de vício da vontade.

  15. O acórdão recorrido, que confirmou a sentença condenatória, salienta que foram os próprios réus que assumiram que nada pagaram no ato da escritura, não pugnando para que se considere provada a matéria alegada que constava da base instrutória; mais considera que o conteúdo das declarações, ou a veracidade das mesmas, não faz prova plena uma vez que o notário não percecionou tais factos.

  16. A revista excecional interposta pelos réus com fundamento em contradição na jurisprudência foi admitida. Os acórdãos em confronto são os Ac. do STJ de 15-4-2015 (P.28247/10.4T2SNT-A-L1.S1 - rel. Pires da Rosa -) onde se considera que a declaração por parte do vendedor de que já recebeu o preço admite a prova da sua não correspondência à verdade, cumprindo ao vendedor o ónus da prova desse facto que pode ser feita por qualquer forma maxime a prova testemunhal e o Ac. do STJ de 6-12-2011 (rel. Gregório da Silva Jesus) onde se considera que tal declaração constitui confissão extrajudicial de tal sorte que a força probatória plena pode ser afastada por duas vias, ou por via da alegação da falsidade do título que integra a declaração confessória ou por via da impugnação da confissão extrajudicial mediante a prova da falta ou vícios de vontade que inquinam tal declaração, cumprindo o ónus da prova do não recebimento do preço à vendedora que declarou em escritura ter recebido o preço.

  17. A revista excecional foi admitida nestes termos: "no acórdão recorrido entendeu-se que a declaração feita em escritura pública faz prova plena quanto à sua realidade, mas não quanto ao declarado. Assim, este é já da livre apreciação do tribunal. Já no acórdão fundamento, junto aos autos, depois de se consignar, em princípio, o mesmo entendimento, refere-se que, consistindo o declarado no reconhecimento pelo comprador de que já recebeu o preço, estamos perante uma confissão que faz prova plena, a qual só pode ser impugnada alegando a falsidade do documento de que consta, ou algum vício de vontade na declaração. Perante isto é de concluir pela oposição de julgados" 20.

    Os apelantes concluem a minuta de recurso de revista nestes termos: 1.ª- O presente recurso vem interposto do douto acórdão proferido nos referenciados autos, que confirmou os termos da douta sentença proferida em 1ª instância, julgando procedente a ação...

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