Acórdão nº 587/09.2GBSSB-A.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelISABEL SÃO MARCOS
Data da Resolução17 de Março de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

* I. Relatório 1.

No âmbito do Processo Comum n.º 587/09.2GBSSB-A, da actual Comarca de Setúbal, Sesimbra – Instância Local – Secção de Competência Genérica – J2, com intervenção do tribunal singular, o arguido AA com os demais sinais dos autos, foi julgado e condenado, por sentença de 16.02.2011, transitada em julgado em 18.03.2011, pela prática de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152.º, número 1, alínea b), e número 2, do Código Penal, na pena de 2 anos e 2 meses de prisão, cuja execução foi suspensa, pelo período de 2 anos e 2 meses, sob a condição de, no prazo de 2 anos, pagar à assistente e demandante a indemnização fixada no montante de € 1.250,00. 2.

Por decisão judicial de 09.04.2015, transitada em julgado em 20.05.2015, foi revogada a suspensão da execução da referida pena de 2 anos e 2 meses de prisão aplicada ao arguido AA.

  1. Invocando como fundamento o previsto na alínea d) do número 1 do artigo 449.º do Código de Processo Penal, vem, ora, o arguido AA interpor o presente recurso extraordinário de revisão da aludida decisão revogatória de 09.04.2015, transitada em julgado em 20.05.2015.

    São as seguintes as conclusões que o requerente entendeu extrair da motivação que apresentou: «A. Por sentença proferida a 16.02.2011, transitada em julgado a 18.03.2011 foi o Arguido condenado nos presentes autos pela prática de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152.2, n.2 1, alínea b) e 2, do Código Penal, na pena de 2 anos e 2 meses de prisão, suspensa na sua execução por idêntico período, sujeita ao dever de pagar à Assistente e Demandante a indemnização de € 1.250,00 fixada, no prazo de 2 anos.

    1. O Arguido não logrou pagar à Demandante a indemnização a que havia sido condenado no prazo concedido para o efeito e que era o da suspensão da execução da pena de prisão e, pelo Douto Despacho de 17/06/2013, foi prorrogado o o período da suspensão de execução da pena foi prorrogado o período da suspensão de execução da pena até 23/04/2014.

    2. No seguimento da notificação de 4 de Setembro de 2013, o Arguido informou os autos a 9.Set. 2013 da sua situação de desemprego, da sua situação de insolvente e da necessidade de pagamento de pensão ao seu filho menor no montante de 162 euros, acrescida de outras despesas.

    3. Notificado nos termos e para os efeitos do artigo 495.º do Código de Processo Penal, foi promovida a prorrogação do período de suspensão de execução da pena, determinada até 18.6.2014.

    4. Não obstante tais dificuldades, o Arguido alcançou efectuar um pagamento de 150 euros à Demandante em Abril de 2014, e a 11 de Março de 2015 foi novamente ouvido ao abrigo do disposto no Artigo 495.º do CPP, onde informou sobre a precariedade da sua situação pessoal e profissional.

    5. O Ministério Público promoveu a revogação da suspensão da execução da pena de prisão, reconhecendo embora a situação económica difícil do Arguido, e, por despacho de 9.04.2015, a fls. 360, a Mma. Juiza “a quo" veio revogar a suspensão de execução da pena, ordenando o cumprimento da pena de prisão.

    6. A 22 de Abril de 2015, foi comunicado ao processo o pagamento à Demandante da totalidade da quantia indemnizatória, tendo, em consequência, O MP promovido que a pena de prisão aplicada ao Arguido fosse declarada extinta pelo cumprimento, nos termos do disposto no artigo 475.º do CPP, e que fosse dado sem efeito o douto despacho a fls. 360-362, pelo qual a Mma. Juíza lia quo" decidiu revogar a suspensão de execução da pena de prisão.

    7. Pelo despacho a fls. 391, veio a Meritíssima Juíza "a quo" considerar esgotado o poder jurisdicional do tribunal de primeira instância, mantendo o despacho de fls. 360-362.

      I. Pretende-se a sindicância por este Venerando Tribunal da justeza da manutenção na ordem jurídica portuguesa do Douto Despacho de fls. 360-362, que ordena o cumprimento da pena de prisão pelo Arguido, atenta a ocorrência de um facto/meio de prova superveniente - o pagamento, pela entidade empregadora do Arguido, da indemnização a que este foi - e a sua conjugação com os factos invocados pelo tribunal "a quo" para revogar a suspensão da execução da pena constantes do Douto Despacho de 9.4.2015 (fls. 360-362), bem como do despacho que considerou esgotado o poder jurisdicional do tribunal (fls. 391).

    8. Ora, a revisão de sentença transitada em julgado é admissível quando, nos termos da alínea d) do n.º 1 do Artigo 439.º, se descubram novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação, sendo à sentença é equiparado despacho que revoga a suspensão da execução da pena de prisão.

    9. Primeiramente, cumpre referir que foi o próprio MP quem, depois do pagamento pelo Arguido da indemnização devida à Demandante, promoveu fosse dado sem efeito o douto despacho a fls. 360-362, pelo qual a Mma. Juíza "a quo” decidiu revogar a suspensão da execução da pena de prisão que, como se disse, mereceu o despacho a fls. 392.

      L. Da promoção e do douto despacho que sobre a mesma recaiu foi o Arguido notificado a 27 de Setembro de 2015.

    10. De regresso à questão decidenda, pergunta-se se será justo, à face do direito penal português, que o Arguido cumpra pena de prisão, depois do verificado cumprimento da condição de suspensão, apesar de fora do prazo concedido, e qual a relevância que o facto - pagamento por entidade empregadora do Arguido - assume enquanto facto novo relevante, na conjugação com os que foram apreciados no processo para efeitos do disposto no artigo 439.º/1/ alínea d) do CPP.

    11. Analisemos, pois, primeiramente, o despacho de 9.4.2015, a fls. 360 dos autos.

    12. Realizado o enquadramento de alguns elementos em apreço nos autos, que ali se consideraram com relevância para a decisão de revogação da suspensão de execução da pena, esclarece o despacho ora posto em crise que, por referência ao artigo 56.º do CP, a decisão de revogação ocorrerá obrigatoriamente sempre que o condenado "cometer crime pelo qual venha a ser condenado, e revelar que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas" (sublinhado e negrito da Mma. Juíza "a quo").

    13. Ora, tratando-se de requisitos cumulativos, desconhece-se por que motivo foi invocado este preceito pelo despacho "a quo", dado que o Arguido não praticou novo crime e, por isso, sequer revelou minimamente que as finalidades que estiveram na base da suspensão não puderam ser alcançadas o que, tratando-se de requisitos típicos cumulativos tornam imperceptível esta parte do dispositivo.

      Não obstante, Q. Prossegue o despacho ora posto em crise com a afirmação de que será ao tribunal que compete escolher qual das diversas medidas constantes dos artigos 55.º e 56.º melhor se adequa ao condenado.

    14. Ora, se, como atrás indicado, não se vislumbra em que é que o n.º 1 do Artigo 56.º do C.P, na parte tangente ao cometimento de novo crime - alínea b), seja aqui operante, refere o douto despacho que, independentemente da solução judicial adoptada pelo tribunal "a quo" (ou pelo artigo 55.º ou pelo artigo 56.2 do CP), relevante é que o incumprimento das condições de suspensão tenha ocorrido com culpa.

    15. É sobre este aspecto que se impetra a este Venerando Supremo Tribunal de Justiça que se pronuncie sobre se a circunstância de o Arguido, mesmo depois da ameaça de prisão, ter liquidado o "remanescente" da indemnização a que fora condenado, através da sua entidade empregadora, se afigurar demonstrativo de não o ter feito em momento anterior por absoluta impossibilidade financeira, logo, sem culpa.

    16. E diga-se remanescente porque, à data daquele despacho, já o Arguido tinha entregue, na medida das suas possibilidades, cento e cinquenta euros à Demandante, sendo que a medida das suas possibilidades não pode deixar de relacionar-se com o facto comunicado ao processo de se encontrar insolvente, desde 2011 e com uma empregabilidade precária.

    17. No aludido despacho de 9.4.2015, ora posto em crise, a fls. 361, admite-se que o Arguido, a 18.9.2013, comunicou ao processo ter sido declarado insolvente, que apenas prestou funções na empresa "Zircorn" durante um mês, tendo regressado à situação de desemprego até 15 de Julho de 2013, altura em que retomou a actividade laboral na empresa "Talenter", auferindo 642 euros mensais, sendo que as despesas mensais orçavam em 592 euros.

      V. Ainda assim, o Arguido beneficiou de prorrogação do prazo, até 18.6.2014, depois de ouvido no processo - artigo 595.º do CPP.

    18. Sendo certo que, após notificação para o efeito, o Arguido nada disse ao processo a propósito do pagamento da indemnização, concluiu o tribunal pelo total desrespeito do condenado pela sentença proferida, sendo aqui que se supõe resida a fundamentação utilizada pelo Tribunal "a quo" para efeitos de aferição da culpabilidade da conduta do Arguido.

      X. É sobre esta conclusão que se roga a V. Exas. seja formulado juízo sobre a virtualidade de o pagamento que sobreveio posteriormente ao despacho poder afastar a caracterização da actuação do Arguido como culposa, nos termos a que a ela se refere o despacho ora posto em crise.

    19. Salvo o devido respeito pelo tribunal “a quo", esta conclusão, quase presunção, de culpa do Arguido, deve ser reformulada à luz deste novo facto.

      Na realidade, Z. Ainda que a situação de insolvência do Arguido, as suas despesas relatadas nos autos, nomeadamente com o seu filho menor, bem como a sua empregabilidade precária não fossem susceptíveis de, em abstracto, formular um juízo favorável ao Arguido em sede de culpa - em relação ao não pagamento da condição de suspensão, entendimento que não se acompanha - o facto de, perante a ameaça de prisão iminente ter sido a sua entidade patronal a assegurar o pagamento da indemnização à Demandante, torna absolutamente claros os motivos que presidiram à não realização da prestação devido no prazo concedido para o efeito, os quais se reconduzem à situação de precariedade em que o Arguido se...

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