Acórdão nº 32/13.9JACBR.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelJOÃO SILVA MIGUEL
Data da Resolução17 de Março de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam em conferência na 3.ª Secção criminal do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1. Nos autos de processo comum, com intervenção do tribunal coletivo, com a referência 32/13.9JACBR da Instância Central – Secção Criminal –J1, da comarca de Coimbra, AA (doravante AA) e BB (doravante BB), recorrem do acórdão proferido em 14 de abril de 2015 (fls 561-586), que os condenou nas penas únicas de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de prisão e 6 (seis) anos de prisão, respetivamente, pela prática em coautoria de um crime de roubo agravado, p. e p. p. 210.º, n.

os 1 e 2, alínea a), e 204.º, n.º 2, alínea f), e um crime de sequestro agravado, p. e p. p. artigo 158.º, n.

os 1 e 2, alínea b), todos do Código Penal (CP) e ao arguido Marcelo Carvalho ainda pela autoria de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro.

2. Inconformados com a decisão, dela interpuseram recurso, o primeiro diretamente para este Supremo Tribunal de Justiça (fls 606-611), e o último para o Tribunal da Relação de Coimbra (fls 593-598 e 600-605), cada um formulando, nas respetivas motivações, as seguintes conclusões[1]: 2a. AA: «1. O recorrente foi condenado, pela prática de um crime de roubo agravado e sequestro agravado na pena única de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de prisão.

2. À data da prática dos factos o arguido tinha 19 anos, pelo que o douto tribunal devia ter aplicado o Regime Jurídico dos Jovens Delinquentes, constante do Decreto-Lei n.º 401/82 de 23 de Setembro.

3. A norma do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 401/82 configura um fundamento autónomo de atenuação especial fundado diretamente na idade, e que tem como pressuposto o juízo que deve ser formulado sobre a existência de razões sérias para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção social do jovem condenado; juízo esse que reverte essencialmente às condições pessoais e de carácter do jovem condenado - condições de vida, familiares, educação, inserção, de prognose sobre o desempenho da personalidade, mais do que à gravidade das consequências do facto.

4. O tribunal afastou-se da ponderação da personalidade de cada arguido, da sua conduta anterior e posterior aos factos, das condições pessoais que cada um tem à data da decisão, para se bastar com uma apreciação generalista de ambos os arguidos ─ e não de cada arguido como impõe a lei ─ abordando apenas os aspetos relativos à prática do crime.

S. A atenuação especial não pode ser recusada com fundamento exclusivo em razões preventivas ou de culpa.

6. O recorrente à data da prática dos factos não tinha sido condenado por qualquer crime.

7. O recorrente foi preso preventivamente à ordem do processo n.º 948/12.0SGL8A durante 10 meses, tendo sido libertado em maio de 2014, tendo este contacto com o mundo prisional sido o ponto de viragem que o fez perceber que esse não era o futuro que queria para si e decidiu que assim que fosse libertado iria refazer a sua vida de forma honesta.

8. O arguido afastou-se em definitivo da vida do crime, do consumo de estupefacientes, de companhias que não eram favoráveis à sua reinserção na sociedade e procurou apoio junto da família da sua companheira, que espera um filho seu, beneficiando de uma estrutura familiar e apoio como em nenhuma outra fase da sua vida teve, como resulta dos factos provados.

9. Dos factos provados consta que aquando da prática destes crimes tinha sido expulso do núcleo familiar da namorada, estava a viver com um amigo em situação precária, não exercendo qualquer atividade estruturada que lhe garantisse rendimentos e estabelecendo amizade com indivíduos que adotavam comportamentos ilícitos.

10. O arguido arranjou trabalho na construção civil.

11. O relatório social efetuado ao arguido e que consta dos factos provados diz que "A dinâmica familiar foi descrita como isenta de problemas dignos de revelo, tendo em conta que o arguido está ocupado laboralmente e terá mudado o seu comportamento, nomeadamente o convívio com pares com comportamentos associais, o qual é menos frequente, assim como o consumo de estupefacientes que segundo o próprio terá deixado de se verificar. A nível pessoal, o arguido apresenta reduzidos recursos internos que lhe permitem gerir conflitos ou ultrapassar de forma adequada às normas e valores sociais em vigência. Porém a situação de prisão preventiva que viveu, a relação afetiva que mantém, e que o próprio descreveu como gratificante, bem como, o enquadramento familiar de que dispõe, parecem estar a constituir-se como fatores desencadeadores de uma mudança a nível da definição de objetivos de vida e de tomada de consciência da necessidade de mudança de comportamento. O arguido apresenta autocrítica face ao presente processo, contextualizando no entanto a sua conduta na associação a indivíduos delinquentes e à instabilidade psicossocial que então vivenciava, o que denota uma atitude algo desculpabilizante e reveladora de uma menor interiorização das normas e valores sociais em vigência." 12. O recorrente começou a cumprir as medidas de coação de apresentações periódicas que constavam da acusação antes de serem decretadas, apenas por querer mostrar às autoridades que estava empenhado em cumprir tudo o que lhe fosse determinado (víde decisão da aplicação das medidas de coação do Tribunal de Instrução Criminal a fls. 419 a 421) nunca tenho falhado no seu cumprimento até à data.

13. O recorrente confessou os factos.

14. O arguido mostrou arrependimento e no decorrer do julgamento pediu desculpas ao ofendido que as aceitou e pretende muito em breve indemnizá-lo pelos danos causados, não o tendo feito até à data em virtude de ter tido despesas imprevistas devido a problemas de saúde que a sua companheira teve durante a gravidez.

15. O arguido tem consciência dos factos que praticou e da sua gravidade, tendo interiorizado a censurabilidade da sua conduta.

16.A evolução verificada desde a prática destes factos e em especial da prisão preventiva, indicam que o arguido reúne as condições necessárias, tanto de carácter e personalidade como sociais, para ser bem sucedido na sua reinserção e que tem a vontade necessária para que isso aconteça, elementos que o douto tribunal desconsiderou na sua decisão.

17.A atenuação especial da pena para jovens delinquentes não se aplica apenas à criminalidade menor, antes se torna mais necessária para crimes de moldura penal mais elevada, quando a imagem global que se forma dos factos e da personalidade do agente nos aponta no sentido de uma futura ressocialização.

18.A atenuação especial prevista no artigo 4.º do Decreto-Lei nº 401/82 é diferente da prevista no artigo 72° do Código Penal, porque naquele são razões de prevenção especial que fundamentam o regime, pelo que a necessidade de ressocialização se sobrepõe aos demais fins das penas.

19. Face ao exposto entendemos que o arguido AA reúne todas as características necessárias para ver aplicado o regime dos jovens delinquentes, em concreto o disposto no artigo 4° do Decreto-Lei n.º 401/82, atenuando-se especialmente a pena, e substituindo-se a pena aplicada por outra não privativa da liberdade e que melhor sirva a reinserção social que o recorrente vem alcançando.

20. A não aplicação do regime dos jovens delinquentes e a aplicação de pena da privativa da liberdade contraria as finalidades das penas no nosso ordenamento jurídico e iria comprometer em definitivo a ressocialização do arguido.» A final, reputando violadas as normas dos artigos 1.º, 2.º e 4.º do Decreto-Lei n.º 401/82 de 23 de setembro, pede que o recurso seja julgado procedente por provado e em consequência seja substituída «a decisão por outra que aplique a atenuação especial da pena prevista no regime jurídico aplicável aos jovens delinquentes».

2b. BB «1. O recorrente é um jovem de 21 anos que tem um passado familiar de violência por parte [do] progenitor.

2. O seu trajeto pela delinquência advém dos problemas familiares.

4. O recorrente foi internado no Lar de .... em 2006 até finais de 2007. Mas pelo consumo de substância aditivas bem como pela prática de atos ilícitos foi novamente internado, no âmbito desse internamento o seu desenvolvimento foi positivo, e este acaba por voltar ao seio familiar em 2010.

4. Quanto aos factos houve por parte do recorrente uma confissão integral e sem reserva.

5. O que demostra sobretudo a sua consciencialização quanto à gravidade dos mesmos.

6. Salvo [o] devido respeito, deve resultar em benefício do recorrente na aplicação da pena.

7. Não era o recorrente que estava na posse das armas e também não foi este que desferiu as facadas ao ofendido o que demostra o seu respeito pela vida humana.

8. Da análise do comportamento do recorrente resulta uma culpa diminuta.

9. Também foi o recorrente que teve alguma preocupação e cuidado com o ofendido.

10. Foi o BB ora recorrente que uma vez sozinho com o ofendido que deixou passar para o banco do passageiro e perguntou se queria comer ou beber alguma coisa.

11. O que leva a quer que o recorrente é uma pessoa influenciável e que o seu comportamento mudou com a ausência do arguido AA.

12. Dado toda a situação supra descrita é natural que o recorrente seja uma pessoa influenciável.» A final, pede a-procedência do recurso, «em conformidade com as conclusões», por não concordar «com a medida da pena aplicável [sic], pedindo que esta seja revista.» 3. Na resposta à motivação (fls 635-647), a Senhora Procuradora da República no tribunal recorrido suscita a questão prévia da competência do Tribunal de recurso, concluindo que a decisão dos mesmos caberá ao Tribunal da Relação de Coimbra, conforme jurisprudência deste Supremo Tribunal que cita, atendendo a que ambos os recorrentes visam o reexame das penas parcelares integrantes do concurso. Sobre o mérito, pronuncia-se pela improcedência dos recursos e consequente confirmação do acórdão recorrido, tendo concluído como segue: «1. A gravidade da atuação do arguido AA, a moldura penal do...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT