Acórdão nº 26/14.7GAAMR de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Março de 2016
Magistrado Responsável | MANUEL AUGUSTO DE MATOS |
Data da Resolução | 09 de Março de 2016 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I – RELATÓRIO 1.
AA foi julgado em processo comum pelo Tribunal Colectivo na Comarca de Braga – Braga – Instância Central – 1.ª Secção Criminal – J3 no âmbito do processo n.º 26/14.7GAAMR, tendo sido condenado, por acórdão de 23 de Outubro de 2015: - pela prática de oito crimes de furto qualificado, p. e p. pelo artigo 204.º, n.º 2, alínea e), do Código Penal, respeitantes aos factos do processo principal e apensos A, B, D, F, H, I e J, respectivamente nas penas de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de prisão, de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de prisão; de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de prisão, de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de prisão, de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de prisão, de 2 (dois) anos e 9 (nove) meses de prisão, de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de prisão e de 2 (dois) anos e 9 (nove) meses de prisão; - pela prática de dois crimes de furto simples, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, alínea e) e n.º 4 do Código Penal, pelos factos dos apensos C e E, desqualificados pelo valor, respectivamente nas penas de 1 (um) ano de prisão e de 6 (seis) meses de prisão; - pela prática de um crime de dano qualificado, p. e p. pelos artigos 212.º e 213.º, n.º 1, alínea c), do Código Penal, pelos factos do processo principal, na pena de 15 (quinze) meses de prisão; - pela prática de um crime de condução ilegal, p. e p. pelo artigo 3.º, n.
os 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, na pena de 6 (seis) meses de prisão.
Em cúmulo jurídico das penas parcelares, foi o arguido condenado na pena única de 9 (nove) anos de prisão.
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Desta decisão recorreu o arguido para o Tribunal da Relação de Guimarães, apresentando as conclusões que se transcrevem: «1 - Prima facie, entende o recorrente que as diversas condutas por si empreendidas, objecto destes autos, foram na sua quase totalidade confessadas de forma directa e sem rodeios.
2 - Tendo colaborado com o Tribunal, explicando, dado detalhes, conforme consta da douta sentença, o que facilitou a tarefa do Tribunal, conforme refere a douta sentença a fls...nos factos a favor do arguido, nomeadamente, confessando espontaneamente os furtos do processo principal, do apenso I, 3 -..." e ainda quanto ao apenso F, aqui muito relevante face à ausência de correspondência dos vestígios recolhidos e as impressões digitais do arguido...sic douta sentença.
4 - Melhor colaborador não há! Até confessou o que a acusação não iria conseguir provar.
5 - Na verdade, não fora a colaboração do arguido na maioria dos casos teria sido muito morosa e delongada a averiguação dos elementos acusadores do mesmo.
6 - Ora, conforme se pode verificar, apesar da colaboração do arguido o Tribunal a quo na maioria das situações aplicou quase o tecto da pena.
7 - Verificando-se que nos casos em que confessou, conforme resulta da douta sentença, a pena foi quase a mesma...diferença de 1 mês ou dois de pena em relação àqueles que não confessou.
8 -Tendo o Tribunal optado menos nos casos em que o crime foi desqualificado pelo valor, pela pena de prisão em vez de optar por outra menos gravosa, ver douta sentença.
9 - O Tribunal não interpretou, nem aplicou, correctamente as normas ínsitas nos arts 374, nº 2 e 379, nº1, al. a) e c) e 344 do Código Penal, as quais se mostram violadas.
10 - Pelo que, como se referiu, a pena deverá ser outra.
11 - Bem como a nulidade da pena única.
Nestes termos e nos melhores de direito, que V. Excias suprirão, deverá ser dado provimento ao recurso ora apresentado, revogando-se a sentença recorrida e substituindo-se por outra, se fará a habitual e necessária JUSTIÇA!» 3.
O Ministério Público respondeu, rematando a sua motivação com as seguintes conclusões: «1 – AA, foi condenado nos presentes autos na pena única de nove anos de prisão resultante da penas parcelares aplicadas pela prática como autor material de oito crimes de furto qualificado, previstos e puníveis pelos artigos 203.º, n.º1 e 204.º, n.º2, alínea e) do Código Penal, de dois crimes de furto, previstos e puníveis pelos artigos 203.º, n.º1 e 204.º, n.º2, alínea e) do Código Penal, um crime de dano qualificado, previsto e punível pelo artigo 212.º, e 213.º, n.º1, alínea c) do Código Penal e um crime de condução de veículo sem habilitação legal, previsto e punível pelo artigo 3.º, n.ºs 1 e 2 do D.L. n.º2/98, de 3/1; 2 – Inconformado com tal condenação, veio recorrer visando exclusivamente o reexame da matéria de direito, pondo em causa unicamente a medida das penas parcelares e única, considerando: - que relativamente à pena única “não foi verificado o dever especial de fundamentação” que deve “ser justificada em termos precisos e descritivos e não meramente genéricos. Devendo o tribunal especificar os motivos pelos quis determina a pena única”; - que “atendendo ao facto de o arguido ter colaborado, sem reservas, confessando a quase totalidade dos crimes praticados, foram excessivas as penas aplicadas a cada crime, bem como a pena única”, onde na “maioria das situações aplicou quase o tecto da pena” e “nos casos em que confessou (…) a pena foi quase a mesma diferença de 1 mês ou dois de pena em relação àqueles que não confessou”, razão pela qual deveria ser condenado em termos “menos gravosos” 3 – Muito embora na sua motivação o recorrente dirija o recurso ao Tribunal da Relação de Guimarães, é nosso entendimento que compete ao Supremo Tribunal de Justiça o conhecimento do recurso em causa.
4 – Com efeito, visando o recurso interposto pelo arguido exclusivamente o reexame da matéria de direito impõe o artigo 432.º, n.º1, alínea c) e n.º 2 do Código de Processo Penal que se recorre para o Supremo Tribunal de Justiça de acórdãos finais proferidos pelo tribunal colectivo que apliquem pena de prisão superior a 5 anos, não sendo admissível recurso prévio para a relação.
5 - E a tal não obsta o facto de para aquela pena única de 9 anos de prisão tenham sido consideradas penas parcelares que individualmente não ultrapassam os 5 anos – cfr. designadamente a título de mero exemplo o acórdão do STJ de 9/07/2014, processo n.º 95/10.9GGODM.s1 in www.dgsi.pt 6 - Pela conteúdo com que se apresenta a argumentação aduzida na motivação, é nosso entendimento que se encontram reunidos os pressupostos para que seja determinada a rejeição do recurso por manifesta improcedência na aplicação do disposto no artigo 420.º, n.º1, alínea b) do Código de Processo Penal.
7 - Com efeito, o recorrente ao invocar o dever de fundamentação das decisões limita-se a afirmar um conjunto de generalidades e abstracções sem dizer quais as falhas que concretamente detecta na decisão proferida nos autos e que possam integrar o vício que invoca para uma demonstração séria das suas razões de falta de fundamentação e procede do mesmo modo quando não refere qualquer facto objectivo ou concreto que, no cotejo com a decisão, se possa verificar que não tenha sido (e devesse ser) atendido pelo tribunal, não evidenciando os motivos pelos quais deveria ter sido aplicada uma outra pena e que concreta pena; 8 - Acresce ainda a evidente falta de sustentação no todo alegado na crítica que aponta às penas fixadas pelo tribunal a quo afirma que o tribunal “na maioria das situações aplicou quase o tecto da pena”, quando se verifica que no acórdão colocado em crise aos crimes de furto qualificado puníveis com penas de prisão entre 2 e 8 anos foram fixadas penas entre 2 anos e 4 meses e 2 anos e 9 meses (ou seja próximo do seu limite mínimo), nos crimes de furto, puníveis com pena de prisão até 3 anos são fixadas penas de 1 ano e de 6 meses (ou seja também muito próximas do limite mínimo), no crime de dano qualificado punível com pena até 5 anos é fixada a pena de 15 meses (ou seja situado no primeiro terço da moldura) e no de condução ilegal punível com pena até 2 anos é fixada uma pena de 9 meses (ou seja numa medida situada entre o primeiro terço e a primeira metade); 9 – Mas assim se não entendendo, ao contrário do que defende o recorrente, verifica-se que na fundamentação de direito relativo à medida da pena única o tribunal a quo fez menção dos pertinentes factos e a sua integração no direito naquilo que faz remeter para o todo explanado a propósito da fundamentação das penas parcelares, sendo possível constatar a clareza do raciocínio vertido para a escolha e medidas das penas parcelares e única, não se vislumbrando qualquer falta de indicação da motivação dos juízos sobre tal matéria, pelo que o acórdão não violou o disposto nos artigos 374.º, n.º 2 e 379.º, n.º 1, alínea a) ou c) do Código de Processo Penal.
10 - Pelo que assim visto sendo a questão colocada com o recurso interposto a de saber-se se o tribunal ao aplicar aquelas pena parcelares e única ao ora recorrente violou os requisitos previstos para a medida da pena a que alude o artigo 71.º do Código Penal, perante as generalidades invocadas pelo recorrente, o certo é que o repetido argumento que aduz relativo à confissão de parte dos crimes em questão não são novidade para os autos naquilo que constitui o conjunto de motivação expendida pelo tribunal e que ali surgem devidamente escalpelizados e de onde se retira o bem fundamentado que se mostra a decisão colocada em crise, não havendo censura a fazer ao todo apreciado pelo julgador.
11 - Com todo o respeito que nos merece a opinião contrária, e naquilo que a decisão condenatória espelha e se nenhuma censura pode apontar à qualificação jurídica dos factos dados como provados, concordando-se pela opção pela pena de prisão em detrimento da pena de multa nos crimes em que tal seria permitido, perante a moldura abstracta de cada um dos crimes e da moldura resultante das penas em concurso é nosso entendimento que não assiste razão ao recorrente naquilo que invoca para que vingue o por si peticionado.
12 - Face aos factos dados como provados, as medidas das penas parcelares e única aplicadas ao arguido, situadas tão próximo do seu mínimo ou junto do limite do primeiro terço das respectivas...
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