Acórdão nº 74/12.1SRLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelJOÃO SILVA MIGUEL
Data da Resolução23 de Fevereiro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam em conferência na 3.ª secção do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1.

Em processo comum, com intervenção do tribunal singular, AA foi submetido a julgamento e absolvido, por sentença proferida em 9 de fevereiro de 2015, da acusação contra si deduzida, pela prática de infrações ao disposto nos artigos 3.º, n.º 2, 7.º, n.º 2, 2.º, 29.º, 44.º e 146.º, alínea a), todos do Código da Estrada (CE), e pela prática de um crime de homicídio por negligência, previsto e punido pelo artigo 137.º, n.º 1, do Código Penal (CP).

  1. No decurso dos referidos autos, CC e DD constituíram-se assistentes e deduziram pedido de indemnização civil contra a “EE, SA.”, relativo a danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos em consequência do acidente, pedindo a condenação desta a pagar-lhes a quantia de 192.048,29 €, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos desde a data da notificação para contestar até efetivo e integral pagamento.

  2. O pedido cível deduzido por CC e DD contra EE, SA. foi declarado parcialmente procedente, pela referida sentença, e em consequência a seguradora foi condenada a pagar[1]: «. aos demandantes CC e DD a quantia de 75.000,00 Euros (setenta e cinco mil euros) a título de danos não patrimoniais e a quantia de 278,56 Euros (duzentos e setenta e oito euros e cinquenta e seis cêntimos) a título de danos patrimoniais; . à demandante CC a quantia de € 26.250,00 (vinte seis mil duzentos e cinquenta euros) a título de danos não patrimoniais; . ao demandante DD a quantia de € 26.250,00 (vinte seis mil duzentos e cinquenta euros) a título de danos não patrimoniais; quantias estas acrescidas de juros de mora vencidos e vincendos desde a notificação para contestar o pedido de indemnização cível, até efetivo e integral pagamento, calculados à taxa legal de 4%».

  3. Inconformados, recorreram os assistentes e demandantes civis para o Tribunal da Relação de Lisboa, pugnando pela revogação da sentença recorrida e pela sua substituição por outra que decidisse condenar o Arguido pela prática do crime de homicídio negligente, p. e p. pelo artigo 137.º, n.º 1, do Código Penal (CP) e respetivas contraordenações que lhe foram imputadas em sede de acusação, e, em consequência, ser a “EE - Seguros Gerais S.A.” condenada no pagamento aos Assistentes/Demandantes/Recorrentes do montante global de € 190.371,41, acrescido dos juros legais desde a notificação para contestação do pedido de indemnização civil até integral pagamento.

  4. Também inconformada, recorreu igualmente a demandada “EE - Seguros Gerais, S.A.” para o Tribunal da Relação de Lisboa, pugnando por seu turno pela revogação da sentença e substituição por outra que conduza à absolvição da recorrente do pedido, com todas as devidas e legais consequências.

  5. Foi proferido acórdão pelo Tribunal da Relação de Lisboa, no qual se decidiu: «1 - Declarar improcedentes os vícios de sentença que foram invocados pelos recorrentes e pelo Ministério Público; 2 - Declarar, oficiosamente, que a sentença sofre do vício de falta de fundamentação quanto ao ponto 4) do provado, vício esse corrigido nos termos supra referidos; 3 - Corrigir, oficiosamente, a redação dada aos pontos 5 e 20 do provado que passarão a conter-se, respetivamente, nos seguintes termos: “O arguido pretendia tomar o arruamento de acesso à estação fluvial pelo que iniciou manobra de mudança de direção à sua esquerda e prosseguiu a sua marcha, sem parar, em direção àquele arruamento, apesar de, em sentido contrário, circular o motociclo conduzido por BB não se apercebendo da presença do mesmo” e, “Existia um sensor que era acionado pela presença de veículos no acesso da Estação Fluvial de Belém à Av. de Brasília”; 4 - Declarar, oficiosamente, que a sentença recorrida padece do vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e, corrigindo o vício, em aditar-lhe os seguintes pontos de facto: “48- As marcas de derrapagem do motociclo no solo iniciaram-se antes do semáforo respetivo, e por uma distância pouco superior àquela em que só ficaram marcas de travagem no solo; 49- Os vestígios de sangue do condutor do motociclo situam-se uns metros para além do local do embate, atento o sentido de trânsito desse motociclo”.

    5 - Declarar, oficiosamente, que a sentença recorrida padece do vício de erro notório na apreciação da prova e, corrigindo o vício, determinar que o ponto 2 do provado se passe a conter no seguinte texto: “nessa via existe um entroncamento que permite o acesso ao arruamento de acesso à estação fluvial de Belém no qual se encontra colocado, na via de onde o arguido precedia, um semáforo que, entre o mais, suporta uma luz amarela intermitente, que regula a manobra de direção para a esquerda, atento o sentido de marcha do arguido”.

    6 - Julgar parcialmente procedente o recurso interposto pelos assistentes, quanto à responsabilidade penal do arguido e, em consequência, em revogar a decisão recorrida, nessa parte: i- Condenando o arguido pela prática, em autoria, do crime de homicídio por negligência, p. e p. pelo artº 137º/1, do CP, na pena de cento e cinquenta dias de multa, à taxa diária de seis euros, a que corresponde pena de cem dias de prisão; ii- Condenando o arguido pela prática da contraordenação prevista no artº 69º/1-b), do Decreto Regulamentar nº 22-A/98 de 1/10, na a coima de quarenta euros; iii- Condenando o arguido na inibição de conduzir, ao abrigo do artº 69º/CP, pelo período de cinco meses; 7- Julgar improcedente o recurso interposto pelos demandantes civis e parcialmente procedente o recurso interposto pela demandada civil, quanto ao enxerto civil deduzido pelos primeiros, e em consequência em revogar a decisão recorrida, nessa parte, e condenar a demandada Mapfre a pagar aos demandantes civis, a título de indemnização civil, as seguintes quantias: 1) Solidariamente, a ambos os demandantes, a quantia de cinquenta mil euros pela perda do direito à vida da vítima; ii- Solidariamente, a ambos os demandantes, a quantia de cento e oitenta e cinco euros e setenta e um cêntimos por despesas fúnebres; iii- A cada um dos demandantes civis, vinte mil euros pela morte do seu filho.” 7.

    Ainda inconformados com a procedência parcial do pedido de indemnização civil que deduziram pelo Tribunal da Relação de Lisboa, os demandantes recorreram para este Supremo Tribunal delimitando o recurso à parte civil, nos termos do artigo 400.º, n.º 3, do CPP, pedindo a revogação do acórdão recorrido no que concerne à questão cível - "quantum" indemnizatório e sua substituição por acórdão que decida condenar a “EE - Seguros Gerais S. A.”, no pagamento aos Demandantes/Recorrentes do montante global de € 180.371,41 ou € 144.297,12, acrescido dos juros legais desde a notificação para contestação do pedido de indemnização civil até integral pagamento, formulando as seguintes conclusões: «1 ª. O douto acórdão recorrido, ao contrário da sentença da 1.ª instância considerou que o arguido tinha tido grave responsabilidade no acidente "sub judice", tendo violado os artigos 69.º, n.º 1, al b) e 71.º, n.º 1, do Regulamento do Código da Estrada.

    1. Atenta a velocidade a que o arguido circulava (20 Km/hora) e a falta de veículos no seu sentido de marcha, muito facilmente, o Arguido poderia fazer parar o veículo em condições de plena segurança, sendo que não existe qualquer prova em contrário do que agora se afirma, pelo que os requisitos para a exceção da obrigatoriedade de paragem à passagem para amarelo fixo do sinal luminoso, não ocorreram "in casu", nem se encontram provados, bem pelo contrário.

    2. Acresce que, nesta situação, a sinalização amarela intermitente impunha cautelas redobradas ao arguido, ao contrário do que acontecia com a vítima, em que do sinal verde, passou imediatamente para o amarelo fixo, sendo certo que o arguido efetuava uma manobra perigosa de mudança de direção.

    3. Neste sentido o douto acórdão recorrido, considera a responsabilidade do arguido no acidente "sub judice", condenando-o no crime de homicídio por negligência, p. e p. pelo artigo 137.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 150 dias de multa, à taxa diária de € 6,00, a que corresponde pena de 100 dias de prisão, e, ainda, pela prática da contraordenação prevista no artigo 69º, n.º 1, al. b) do Decreto-Regulamentar n.º 92-A/98, de 01/10, na coima de € 40,00, e na inibição de conduzir, ao abrigo do artigo 69º do C. P. pelo período de 5 meses.

    4. Contudo, considerou que para efeitos indemnizatórios cabia verificar em que medida BB, vítima do acidente em apreço, havia contribuído para a sua ocorrência, concluindo que pelos elementos do processo e de acordo com o croqui de pág. 21 do douto acórdão, que, atendendo aos sinais de travagem e arrastamento, a vítima iria em excesso de velocidade.

    5. Ora, o arguido sem sombra de dúvida, viola grosseira e manifestamente a sinalização semafórica "amarelo fixo", não parando a sua viatura automóvel, e depois de ter sido avisado pela sinalização "amarelo intermitente", quando poderia e deveria ter parado em segurança.

    6. Na via onde seguia a vítima BB era permitido circular a 50 km/h e a sinalização passa diretamente do "verde" para "amarelo fixo", sendo que o BB, nestas circunstâncias, não estava obrigado nem podia parar, pois não lhe foi possível fazê-lo em condições de segurança.

    7. O veículo conduzido pelo arguido aparece à vítima BB, de surpresa e inopinadamente, obrigando-o a uma travagem de emergência que leva ao seu próprio desequilíbrio, não lhe sendo possível evitar o acidente, o que não se pode considerar ou reconduzir a imperícia como pretende o douto acórdão recorrido (e, infelizmente para o próprio e seus pais, não temos a sua versão dos factos, ao contrário do que acontece com o arguido).

    8. A travagem e os sinais de travagem de um motociclo não se podem equiparar aos de um veículo automóvel, não significando a mesma velocidade, sendo menor para o motociclo, sendo que o douto acórdão recorrido apenas levou em conta o fator velocidade, quando se sabe que há outros...

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