Acórdão nº 5500/09.4TDLSB-A.L1-A.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelISABEL SÃO MARCOS
Data da Resolução18 de Fevereiro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO PLENO DAS SECÇÕES CRIMINAIS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA * I. Relatório 1.

O demandante Instituto da Segurança Social, I.P. interpôs, em 11.06.2014, ao abrigo do disposto nos artigos 437.º e 438.º do Código de Processo Penal, recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, com fundamento em oposição de julgados – o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 14.05.2014, proferido no Processo n.º 5.500/09.4tdlsb-A.L1, da 3.ª Secção, e o acórdão do mesmo Tribunal, de 17.12.2013, prolatado no Processo n.º 826/09.0TDLSB.L1, da 5.ª Secção, ambos transitados em julgado.

Em síntese, alegou o recorrente: - Que o acórdão recorrido, proferido no Processo n.º 5.500/09.4 tdlsb-A.L1, chamado a decidir o recurso que o Instituto da Segurança Social, I.P. interpôs da decisão que indeferiu a reclamação que apresentou contra o despacho que, na sequência da sentença prolatada pelo então 2º Juízo Criminal da Comarca de Lisboa [que, julgando procedente por provada a acusação formulada e bem assim o pedido cível deduzido, em 08.11.2010, contra a arguida e demandada, condenou-a, pela prática do crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, previsto e punido pelos artigos 7.º, número 3, 107.º, números 1 e 2, e 105.º, número 1, do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), e 30.º, número 2, do Código Penal, e no pedido de indemnização civil, com custas pela mesma arguida e demandada], notificou-o para, nos termos do disposto no artigo 15.º, número 2, do Regulamento das Custas Processuais (RCP), proceder à autoliquidação da taxa de justiça devida pelo pedido de indemnização civil, confirmou o decidido, por considerá-lo acertado.

E isto, em suma, na consideração de que, no pedido de indemnização cível enxertado na acção penal, deduzido na vigência do Regulamento das Custas Processuais, na redacção aprovada pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26.02, tendo o demandante ficado previamente dispensado do pagamento da taxa de justiça, deve o mesmo, independentemente de condenação a final, ser notificado para efectuar, no prazo de 10 dias, o seu pagamento, nos termos do artigo 15.º número 2, daquele Regulamento, aplicável por força do seu artigo 8º, número 9, ambos na redacção introduzida pela Lei n.º 7/2012, de 13.02; - Que, por seu turno, o acórdão fundamento, prolatado no Processo n.º 826/09.0TDLSB.L1, chamado a resolver idêntica questão, colocada no recurso que o Instituto da Segurança Social, I.P. interpôs da decisão que indeferiu a reclamação que apresentou contra o despacho que, na sequência da sentença proferida, em 28.02.2012 e depositada em 27.03.2012, pelo então 3.º Juízo Criminal da Comarca de Lisboa [que, julgando procedente por provada a acusação formulada e bem assim o pedido de indemnização civil deduzido, em 10.10.2010, contra os arguidos e demandados, condenou-os pela prática do crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, previsto e punido pelos artigos 7.º, número 3, 107.º, números 1 e 2, e 105.º, número 1, do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), e 30.º, número 2, do Código Penal, e no pedido cível, com custas pelos demandados], notificou o mesmo Instituto para, nos termos do disposto no artigo 15.º, número 2, do Regulamento das Custas Processuais (RCP), proceder à autoliquidação da taxa de justiça devida pelo pedido de indemnização civil, revogou o ali resolvido.

E fê-lo por entender que, no pedido de indemnização cível enxertado na acção penal, deduzido na vigência do Regulamento das Custas Processuais, na redacção aprovada pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26.02, tendo o demandante ficado previamente dispensado do pagamento da taxa de justiça, não deve o mesmo, independentemente de condenação a final, ser notificado para proceder, no prazo de 10 dias, ao seu pagamento, sendo inaplicável o disposto no artigo 15.º, número 2 daquele Regulamento, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 7/2012, de 13.02, por força do que estabelece o artigo 8.º, número 9, desta mesma Lei.

  1. Foram juntas ao processo as certidões do acórdão recorrido e fundamento, com nota do respectivo trânsito (o do recorrido, em 02.06.2014, e o do fundamento em 29.01.2014).

  2. Tendo sido dado cumprimento ao disposto no artigo 439.º do Código de Processo Penal, os autos subiram a este Supremo Tribunal, onde o Senhor Procurador-Geral-Adjunto, na vista a que se refere o artigo 440.º, número 1 do mesmo diploma, emitiu parecer no sentido de se verificarem os pressupostos legais para o prosseguimento dos autos como recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, tal qual havia considerado a Senhora Procuradora-Geral-Adjunta no Tribunal da Relação de Lisboa.

  3. Proferido despacho liminar e colhidos os respectivos “vistos”, teve lugar a conferência a que se refere o artigo 441.º do Código de Processo Penal, onde se decidiu, por acórdão, que, ocorrendo oposição de julgados relativamente à mesma questão de direito e no domínio da mesma legislação, o recurso é admissível, ordenando-se o prosseguimento dos autos.

  4. Notificados os sujeitos processuais interessados, nos termos e para efeitos do disposto no artigo 442.º, número 1, do Código de Processo Penal, vieram apresentar as suas alegações, que sintetizaram, 5.1 – O Ministério Público, nas seguintes conclusões: «1. Uma das prioridades da alteração normativa introduzida pela Lei n.º 7/2012, de 13 de Fevereiro, foi a padronização das custas judiciais, objectivo com o qual visava assumidamente o legislador «a aplicação do mesmo regime de custas a todos os processos judiciais pendentes, independentemente do momento em que os mesmos se iniciassem» [art.º 8.º, n.º 1 da referida Lei]. 2. Essa padronização foi no entanto adoptada com a introdução de uma norma transitória – o sobredito art.º 8.º, n.ºs 2 a 13 – que tinha por único e também assumido objectivo evitar perturbações decorrentes da aplicação da lei nova aos processos pendentes e bem assim agilizar procedimentos, tendo em conta os vários regimes até então aplicáveis, mas sem se afastar nunca daquele desiderato.

  5. Assim, e no que especificamente diz respeito à responsabilidade pelo pagamento da taxa de justiça no âmbito dos processos pendentes em que tenha havido lugar à dispensa do seu prévio pagamento, a previsão contida no n.º 9 do citado preceito não pode ser interpretada – desde logo por não colher, de todo, a mínima correspondência nem na letra nem no espírito da norma – no sentido de que a parte dispensada de tal pagamento prévio só será responsável pelo pagamento, a final, daquela taxa se, na respectiva sentença, vier efectivamente a ser condenada no pagamento das custas.

  6. No que respeita à letra da lei porque, vista a sua dimensão declarativa, ela comporta e desdobra-se, essencialmente, em dois segmentos, um deles a apontar no sentido de que a dispensa de pagamento prévio de taxa de justiça, prevista na lei anterior, se mantém incólume, e o outro a indicar por seu turno no sentido de que o pagamento do respectivo montante (o montante de que a parte foi dispensada) é devido apenas a final.

  7. E convirá aqui evidenciar que a previsão contida naquele primeiro segmento normativo – no sentido da manutenção da dispensa desse pagamento prévio –, é imediatamente seguido pela expressão: “sendo o pagamento dos montantes que a parte teria de ter pago caso não tivesse [sido]dispensada devidos apenas a final”.

  8. Ora, uma das circunstâncias em que, linguístico-gramaticalmente, o termo verbal do gerúndio é utilizado destina-se precisamente a “exprimir um processo durativo que se realiza progressivamente em direcção ao tempo-espaço definido pela pessoa que fala”.

  9. E é precisamente este, in casu, o sentido da norma, vista esta na dimensão conjunta que lhe é fornecida pelos dois segmentos acima identificados: aquela forma verbal “sendo”, usada naquele contexto, visa expressar precisamente a ideia de que, nos processos que ainda estão pendentes à data da entrada em vigor da nova lei, à medida que forem findando, o pagamento irá sendo feito a final.

  10. O que tudo significa portanto que o único sentido possível que pode decorrer da letra da lei é o de que, nos processos pendentes em que houve lugar à dispensa do pagamento prévio da taxa de justiça, essa dispensa mantém-se, no decurso do processo, e o pagamento dos montantes que a parte teria de ter pago caso não estivesse dispensada vai sendo devido a final, ou seja, à medida que esses processos vão sendo findos.

    9. Tanto mais que, como decorre da “exposição de motivos” da respectiva Proposta de Lei, com o novo regime pretendeu o legislador, afirmando-o expressamente, o objectivo de padronização das custas judiciais, com o que, disse, visava, «a aplicação do mesmo regime de custas a todos os processos judiciais pendentes, independentemente do momento em que os mesmos se iniciassem», 10. Solução que adoptou com a introdução daquela norma transitória – o sobredito n.º 9 do art.º 8.º –, que tinha por único, e também assumido, objectivo evitar perturbações decorrentes da aplicação da nova lei aos processos já pendentes e agilizar procedimentos, tendo em conta as regras distintas que lhes sejam aplicáveis, mas sem nunca se afastar daquele desiderato. E daí que, anota a mesma exposição de motivos, «para o efeito, foram identificadas as diferenças entre os diversos regimes ainda aplicáveis e o regime previsto neste diploma e definidos os procedimentos necessários à aproximação daqueles com as regras ora definidas, com o objectivo de, com aplicação da norma transitória, se possível aplicar a todos os processos o regime que se consagra no presente diploma». Esta anotação evidencia, sem margem para dúvidas, que, com a norma transitória em causa, o legislador quis tão só evitar que, por força da aplicação imediata da nova lei aos processos pendentes pudesse, por exemplo, vir a ser exigido, independentemente da fase em que o processo se encontrasse, o imediato pagamento da taxa de justiça.

  11. Como resulta do disposto no n.º 2 do art.º 9.º do Código Civil, em sede de...

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