Acórdão nº 426/15.5JAPRT de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelMANUEL AUGUSTO DE MATOS
Data da Resolução05 de Fevereiro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I – RELATÓRIO 1.

Nos autos de processo comum, com intervenção do Tribunal Colectivo, n.º 426/15.5JAPRT da Comarca do Porto – .... – Instância Central – ... Secção ... – J6, AA, ali identificado, actualmente detido no Estabelecimento Prisional do ..., foi submetido a julgamento e condenado, por acórdão proferido em 28 de Setembro de 2015, pela prática do crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21.º, n.º 1, com referência à Tabela I-B, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão.

  1. Inconformado, interpôs o arguido recurso para o Tribunal da Relação do Porto, formulando as seguintes: «CONCLUSÕES: A - A nosso ver o Tribunal a quo fez errónea interpretação e consequente violação da lei, designadamente no que tange às normas atinentes à determinação do quantum da pena, não tomando em consideração, na determinação da pena aplicada: - as condições pessoais do Arguido e as motivações para a prática do crime; - a falta de antecedentes criminais do arguido; - a idade do arguido; - o teor integral do relatório social junto aos autos.

    B - A nosso ver, o Tribunal a quo violou assim, por incorrecta interpretação, as seguintes normas: - artigos 70º, 71º e 72 º do Código Penal; - artigos 40º, 50º e 52º do Código Penal.

    C – Por outro lado, não considerou provados factos constantes do relatório social junto aos autos essenciais para a determinação da pena aplicável; D – Nem fez a atenuação da pena a que alude o artigo 72º do Código Penal.

    Termos em que deve a douta decisão recorrida ser revogada e provido o recurso: a) Serem considerados como provados os factos constantes do relatório social, designadamente: “AA terá beneficiado de um ambiente afectivo e condições de socialização ajustadas à aquisição e interiorização de regras e valores normativos junto da família de origem, o que lhe permitiu adquirir as competências académicas, ainda não terminadas e profissionais.

    Mostra-se intimidado relativamente à sua situação jurídica e consciente dos danos acusados, sendo que o seu trajecto prisional adaptado revela capacidade de adequação a normativos e à supervisão de instituições da administração da justiça penal; Em meio livre beneficiará de adequadas condições de suporte habitacional, familiar e afectivo, junto do grupo familiar de origem.

    Possui perspectivas de retomar a conclusão da sua formação académica superior.

    Pelo exposto, indicia-se que AA dispõe de factores de protecção capazes de potenciar e retomar um trajecto de vida que até à ocorrência dos factos em presença ter-se-á revelado normativo e socialmente inserido, percepcionando-se ainda que deste confronto com o sistema de administração da justiça penal terá resultado a aquisição de ganhos de maturidade que o consciencializam para a imperatividade do ordenamento jurídico vigente”.

    1. Nos termos do artigo 72º do Código Penal ser a pena aplicada especialmente atenuada; e, em consequência c) Revogada a pena de 5 anos e 6 meses aplicada pelo Tribunal a quo e substituída por uma pena próxima do limite mínimo e sempre inferior a cinco anos; d) Ser a referida pena suspensa na sua execução, mesmo que mediante a imposição de deveres ou regras de conduta ao arguido ou acompanhada do regime de prova. [[1]]».

  2. O Ministério Público na 1.ª instância respondeu ao recurso, pugnando pela improcedência do recurso. Formula as seguintes: «CONCLUSÕES: 1. O arguido AA foi condenado pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p e p. pelos artigos 21º, n 1, com referência à Tabela I-B, do DL n. 15/93 de 22/01, na pena 5 anos e 6 meses de prisão.

  3. O arguido alega que a decisão recorrida viola o disposto nos artigos 40º, 50º, 52º, 70º, 71º a 72, todos do Código Penal, porquanto na determinação da pena aplicada o colectivo não tomou em consideração as suas condições pessoais, incluindo idade e o facto de ser trabalhador estudante universitário; de estar inserido num ambiente afectivo com condições de socialização ajustadas à aquisição e interiorização de regras e valores; a ausência de antecedentes criminais; a confissão integral e sem reservas e demais circunstâncias pessoais descritas no relatório social, nomeadamente de que em meio livre beneficiará de adequadas condições de suporte habitacional, familiar e afectivo junto do grupo familiar de origem e que projecta concluir a sua formação académica superior.

  4. Não assiste razão ao recorrente, pois a decisão recorrida analisou todos os elementos acima referidos e considerados relevantes para a boa decisão da causa e cuja apreciação se impunha.

  5. Não enferma o acórdão recorrido de qualquer vício ou nulidade.

  6. O recorrente ignorou por completo o facto de ter transportado 2.919,812 gramas de cocaína, com um grau de pureza de 90,6%, correspondente a 13227 doses médias individuais de S. Paulo, Brasil até ao Porto, Portugal, local onde, caso não tivesse sido detido, entregaria o produto que depois de vendido seria distribuído.

  7. A natureza, quantidade e qualidade do produto justificaria por si só uma pena muito mais gravosa.

  8. A confissão resulta duma detenção em flagrante delito e não duma atitude de arrependimento e vontade de pôr fim a uma actividade ilícita que havia iniciado em São Paulo.

  9. As exigências de prevenção especial e geral são muito elevadas e é premente, que através da concreta medida da pena se possa dissuadir as pessoas, jovens ou não de fazerem o transporte de droga.

  10. A redução da pena e a suspensão da execução da mesma seria atentatória da estratégica nacional e internacional de combate a este tipo de crime e não serviria os imperativos de prevenção geral.

  11. A pena aplicada mostra-se pois adequada e justa e em harmonia com os dispositivos legais aplicáveis.» [[2]].

  12. Por decisão proferida no Tribunal da Relação do Porto, determinou-se a remessa dos autos ao Supremo tribunal de Justiça, por ser o competente para o conhecimento do recurso, «[a]tento o objecto do recurso – medida da pena – e a condenação do recorrente em 5 anos e 6 meses de prisão».

  13. Neste Supremo Tribunal, a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta apôs o seu «Visto», consignando «nada a acrescentar ao entendimento defendido pelo Ministério Público [da 1.ª instância]», pelo que não foi dado cumprimento ao disposto no n.º 2 do artigo 417.º do Código de Processo Penal, doravante CPP.

  14. Não tendo sido requerida audiência de julgamento, o recurso é apreciado em conferência, nos termos dos artigos 411.º, n.º 5, e 419.º, n.º 3, alínea c), do CPP.

  15. Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir.

    II – COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA De acordo com o disposto no artigo 432.º, n.º 1, alínea c), do CPP, recorre-se para o Supremo Tribunal de Justiça de acórdãos finais proferidos pelo tribunal do júri ou pelo tribunal colectivo que apliquem pena de prisão superior a 5 anos, visando exclusivamente o reexame da matéria de direito.

    No caso presente, o recurso vem interposto de acórdão final proferido pelo tribunal colectivo que aplicou ao recorrente a pena de 5 anos e 6 meses de prisão.

    O recorrente não questiona a matéria de facto, circunscrevendo o recurso que interpôs exclusivamente ao reexame da matéria de direito já que pugna pela atenuação especial da pena e consequente redução da mesma e, por fim, pela suspensão da sua execução.

    Nestes termos, considera-se correcta a decisão do Ex.mo Juiz Desembargador do Tribunal da Relação do Porto em determinar a remessa dos autos ao Supremo Tribunal de Justiça já que, efectivamente, lhe pertence, nos termos da disposição legal acima citada, a competência para o conhecimento e decisão deste recurso, o que se declara.

    III - FUNDAMENTAÇÃO 1. Matéria de facto O Tribunal Colectivo deu como assente a seguinte matéria de facto:

    1. Factos provados «1. No dia 21/02/2015, às 8h45, o arguido, desembarcou no aeroporto Francisco Sá Carneiro, Maia, no voo ...., proveniente de ....

  16. Nessa altura o arguido trazia consigo uma mala de mão e duas malas de porão, que foram apreendidas, contendo no seu interior, dissimulado no interior das respectivas estruturas rígidas, cocaína que ali havia sido colocada.

  17. A cocaína referida no número 2. tinha o peso líquido total de 2.919,812 gramas, um grau de pureza de 90,6% e, nos termos da tabela anexa à Portaria nº 94/96, de 26 de Março, corresponderia a 13227 doses médias individuais.

  18. O arguido trazia ainda consigo: - 1 telemóvel de marca “Apple”; - 1 máquina fotográfica Samsung; - um par de óculos de sol, - €900,00 (novecentos euros); - 200 reais - 3 malas, 1 marca Gladiador e 2 marca Lansay, objectos estes que lhe que lhe foram apreendidos.

  19. Os €900,00 referidos no número 4. dos factos provados foram entregues ao arguido, pela pessoa que encarregou o arguido do transporte do estupefaciente.

  20. O arguido iria usar o telemóvel referido no número 4. dos factos provados para contactos no âmbito do transporte e entrega do produto estupefaciente.

  21. Pelo transporte do produto estupefaciente, o arguido receberia 40.000,00 reais pelo transporte do produto estupefaciente.

  22. O arguido, no momento indicado no número 1., agiu da maneira descrita, de modo livre, deliberado e consciente de que transportava produto estupefaciente (droga).

  23. O arguido conhecia, em abstracto, as características, natureza e efeitos da substância cocaína.

  24. O arguido, no momento indicado no número 1., sabia que transportava produto estupefaciente e sabia igualmente que a detenção e transporte de produtos estupefacientes é proibido e punido por lei.

  25. O arguido, em julgamento, confessou os factos presentes nos números 1., 2. e 4. a 10. dos factos provados.

    Mais se provou que: 12. O arguido AA é filho único, tendo o seu processo de desenvolvimento deconido no contexto do agregado familiar de origem, com dinâmica equilibrada e funcional e com ambos os pais dedicados e atentos ao seu acompanhamento educativo.

  26. A situação económica do agregado, embora modesta, assente no trabalho por conta de...

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