Acórdão nº 924/14.8TVLSB.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Maio de 2016
Magistrado Responsável | LOPES DO REGO |
Data da Resolução | 19 de Maio de 2016 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA – SOCIEDADE IMOBILIÁRIA, S.A., :intentou contra os RR. BB – INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS, LDA., e CC acção declarativa, visando o decretamento da resolução do contrato promessa celebrado com a primeira Ré, por incumprimento desta, com efeitos desde 15.5.2014, declarando-se perdido a favor da A. o sinal prestado de € 200.000,00 e condenando-se os RR. a pagarem-lhe € 200.000,00, mais a quantia de € 154.119, 89, correspondente a débitos, provenientes de despesas, reconhecidos pelo promitente comprador.
Alegou ter celebrado contrato de promessa de compra e venda de imóveis, em que figura como promitente compradora a sociedade Ré, que, todavia, tem vindo a protelar a assinatura do contrato definitivo, o que motivou a sua resolução pela A. Mais invoca a qualidade de fiador do R. e a assunção pela primeira R. da obrigação pagamento de um conjunto de valores associados a despesas suportadas pela A., relacionadas com a fruição dos imóveis pela promitente vendedora.
Não foi apresentada contestação pelos RR., apesar de devidamente citados para a causa.
Em consequência do efeito cominatório da revelia, ficou assente a seguinte matéria de facto: 1 - Em 16 de Abril de 2009, a A. celebrou com a sociedade comercial DD – SOCIEDADE IMOBILIÁRIA, LDA., NIPC 508….., um contrato de fls. 22 e ss., nos termos do qual a primeira prometeu vender à segunda, e esta prometeu comprar-lhe, a futura fração A (fracção essa que corresponderia ao 1º andar já existente e construído) do edifício existente no prédio urbano denominado “Lote 1” e sito em …, Vale das Flores, freguesia de Santo António dos Olivais, concelho de Coimbra, descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Coimbra sob o número 3115, inscrito na matriz predial urbana da referida freguesia sob o artigo 9…, e bem assim o prédio urbano denominado “Lote 2” e sito em …, Vale das Flores, freguesia de Santo António dos Olivais, concelho de Coimbra, descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Coimbra sob o número 3869, inscrito na matriz predial urbana da referida freguesia sob o artigo 95….
2 - Acordaram as partes que o preço global da compra e venda prometida era de €660.000,00 – cláusula segunda de fls. 24 - e a prometida escritura pública de compra e venda seria celebrada no prazo máximo de 30 dias contados da constituição do Lote 1 no regime de propriedade horizontal ou da aquisição do mesmo pela A., consoante o que ocorresse em ultimo lugar – clausula terceira de fls. 24. Mais se consignou que o preço seria pago mediante a quantia de € 200.000, 00, a título de sinal e princípio de pagamento, na data de assinatura do contrato, valor que a A. recebeu; o remanescente no ato da celebração da escritura (fls. 24).
3 - O Réu, CC, legal representante de DD, assumiu no referido contrato a posição de fiador, “pessoal e solidariamente responsável perante a AA e com renúncia ao benefício da excussão prévia, pelo cumprimento das obrigações da DD no presente contrato, designadamente pelo cumprimento das obrigações de outorga da escritura de compra e venda prometida e pela obrigação de pagamento da compensação devida pelo incumprimento definitivo, nos termos previstos na Cláusula 4.2 - clausula sexta de fls. 25 e 26. Na cláusula 4.2 (fls. 25) lê-se: “Em caso de incumprimento definitivo do presente contrato promessa de compra e venda pela DD, poderá a AA optar pela resolução do presente contrato promessa de compra e venda, caso em que terá direito a fazer seu o montante correspondente ao sinal prestado pela DD e a exigir desta o pagamento de uma indemnização no valor de € 200.000, a título de compensação pelo incumprimento”.
4 - Posteriormente, a DD solicitou à A. que a sua posição contratual fosse cedida a uma outra sociedade (a Ré BB), representada pelo mesmo gerente (o ora Réu CC) e com sede na mesma morada, cessão essa que foi autorizada pela A. e que só mais tarde veio a ser formalizada (doc. de fls. 39 e ss.), assumindo a Ré BB a posição de promitente compradora da fracão e lote acima identificados, bem como todas as demais obrigações assumidas pela DD no citado contrato e no acordo subscrito em 13 de Novembro de 2009 e constante de fls.46 e ss.
5 - Através de declaração assinada em 06 de Junho de 2011 e constante de fls. 50, a A. autorizou a Ré BB a celebrar com uma empresa terceira o contrato promessa de arrendamento de fls. 51 e ss. referente à fração acima mencionada, tendo tal contrato sido celebrado e entrado em vigor.
6 - Posteriormente, a Ré BB celebrou contrato com um outro terceiro que se encontra atualmente a laborar na fração sem que para tal tenha sido prévia e devidamente autorizado pela A..
7 - Não obstante encontrar-se a receber rendas há cerca de 3 anos e apesar de instada por diversas vezes para o efeito, a Ré BB não liquidou perante a A. quantias cujo pagamento as partes acordaram ser da responsabilidade daquela e referentes, nomeadamente, a projetos e obras referentes à fração (designadamente de esgotos, pintura de lugar de deficientes, projeto de eletricidade, telas finais da fração, projeto elétrico, execução de alimentação elétrica, execução do ramal), a consumos de eletricidade da fração e a comparticipação nas despesas e serviços comuns, as quais, a 31 de Outubro de 2013 ascendiam a €153.343,41.
8 - A A. interpelou por diversas vezes a Ré BB no sentido da regularização dos valores que se iam vencendo, tendo 27.11.2013 efetuado uma interpelação, enviada por correio, devolvida e, por esse motivo, entregue em mão (cfr. doc. de fls. 72 e ss.).
9 - Em 05 de Dezembro de 2013, a A. notificou a Ré BB da data agendada para a escritura pública de compra e venda prometida (03.01.2014), uma vez que se nessa data se encontrariam reunidas as condições para o efeito, designadamente a constituição do Lote 1 no regime da propriedade horizontal.
10 - A referida carta veio igualmente devolvida, tendo por isso a notificação sido entregue em mão (fls. 80 e ss.).
11 - Não obstante já estarem reunidas as condições para o efeito, a escritura não se realizou porque à Ré BB solicitou o respetivo adiamento e comprometeu-se a, nos dias subsequentes, indicar nova data para a realização da escritura prometida, ao que A. acedeu.
12 - Perante a ausência de notícias da Ré BB, em 24 de Janeiro de 2014, a A. remeteu-lhe nova carta para marcação de escritura, indicando duas datas para a realização da mesma, tendo a Ré BB manifestado preferência pela última data sugerida -11 de Fevereiro (doc. de fls. 98).
13 – Por doc. de fls. 99 e ss., a Ré BB reconheceu expressamente ser devedora perante a A. da quantia de €154.119,88, por conta das despesas referidas em 7, comprometendo-se a liquidar a mesma até à data da celebração da escritura pública prometida.
14 - A Ré BB não outorgou a escritura pública prometida em nenhuma das datas agendadas e tem vindo, desde então e de forma sucessiva, a prometer outorgar a mesma dentro de dias, o que até à presente data não se verificou, por motivos completamente alheios à A.
15 - Atendendo ao lapso de tempo decorrido desde a marcação inicial da escritura, perante a factualidade exposta, e considerando o disposto na Clausula Terceira do Contrato Promessa de Compra e Venda, a A. procedeu à resolução do contrato promessa de compra e venda, invocando incumprimento contratual definitivo imputável à Ré BB, o que fez através de notificação judicial avulsa de fls. 110 e ss., notificada aos ora Réus e à mencionada DD em 15 de Maio de 2014 (doc. de fls. 119).
Foi proferida sentença a julgar parcialmente procedente a acção, condenando a Ré BB – Investimentos Imobiliários, Ldª, a pagar à A. a quantia de € 154.119, 89, mas absolvendo esta do pedido de resolução do contrato, por não se mostrar alegada a perda do interesse objectivo do credor em celebrar o contrato definitivo, ocorrendo apenas uma situação de mora do devedor - que só se converteria em incumprimento definitivo quando a promitente vendedora interpelasse admonitoriamente o contraente em mora, fixando-lhe um prazo razoável para cumprir, findo o qual se poderia então ter a obrigação por definitivamente incumprida.
Por sua vez, o segundo R. foi absolvido do pedido, por se considerar extinta a fiança prestada.
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Inconformada, apelou a A., tendo a Relação concedido provimento ao recurso interposto: - reconhecendo à Recorrente o direito à resolução do contrato promessa de compra e venda nos Autos identificado, com fundamento em incumprimento contratual definitivo, exclusivamente imputável à Ré BB, e com efeitos desde 15 de Maio de 2014; - e no seguimento da resolução operada, e nos termos da Cláusula Quarta, 4.2 do contrato promessa de compra e venda junto aos Autos, declara-se perdido em favor da A. o montante de € 200.000,00 (duzentos mil Euros), correspondentes ao sinal prestado; - também no seguimento da resolução operada, se condena a Ré BB a pagar à autora a compensação prevista na Cláusula Quarta, 4.2, 2ª parte, do contrato promessa de compra e venda, junto como doc. Nº3, no valor de € 200.000,00 (duzentos mil Euros); Assim se revogando, nesta parte, a decisão recorrida, no mais a permanecer intangível.
Como fundamento de tal decisão, considerou-se, nomeadamente, no acórdão recorrido: É “o interesse do credor que deve servir como ponto de referência para o efeito de apreciação da gravidade ou importância do inadimplemento capaz de fundamentar o direito de resolução” – Baptista Machado, ob. cit., pág. 352. – cfr. Ac. da Relação de Coimbra de 29.9.1992, in CJ. Ano XVII, Tomo IV, pág.82.
Mas admite-se, em homenagem ao princípio do pontual cumprimento dos contratos – art. 406º, nº1, do Código Civil – e à confiança que os contraentes colocam no cumprimento das prestações recíprocas, que constitui fundamento para a resolução do contrato a violação grave do princípio da boa-fé, que abrange os deveres acessórios de conduta, como nos casos em que o comportamento do devedor evidencie uma clara e inequívoca vontade de não cumprir.
Esta clara vontade de não...
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Acórdão nº 989/07.9TBMCN-Y.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 08 de Maio de 2017
...112, A. VARELA, op. cit., I volume, pág. 336-337; a nível da jurisprudência vide, ainda, por todos, AC STJ de 19.05.2016, processo n.º 924/14.8TVLSB.C1.S1, relator LOPES do REGO, AC STJ de 12.01.2010, processo n.º 628/09.3YFLSB, relator PAULO SÁ, além, ainda, da vasta recensão de jurisprudê......
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Acórdão nº 989/07.9TBMCN-Y.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 08 de Maio de 2017
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