Acórdão nº 741/03.0TBMMN.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 31 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelHELDER ROQUE
Data da Resolução31 de Maio de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA[1]: AA propôs a presente ação, com processo comum, sob a forma ordinária, contra a “Companhia de Seguros BB, SA”, ambos, suficientemente, identificados nos autos, pedindo que, na sua procedência, esta seja condenada a pagar-lhe, a título de indemnização pelos danos resultantes do acidente de viação inframencionado, a quantia de €45000,00, pelos danos emergentes da perda total do veículo de sua propriedade, conduzido pelo falecido marido da autora CC, e custos de aquisição de um veículo equivalente, a quantia de €3250,00, pelos danos emergentes da perda dos animais transportados, a quantia de €99112,35, pelas despesas emergentes e lucros cessantes, a quantia de €2275,00, relacionada com o parqueamento da viatura, com juros de mora, desde a citação, para além dos danos que ocorram, após a citação, mormente, com o avolumar dos danos emergentes e lucros cessantes, invocando, para o efeito, factos pertinentes.

Na contestação, a ré, admitindo que o acidente ocorreu como é descrito na petição inicial, impugna a generalidade dos danos alegados pelo autor, concluindo no sentido de que a ação deve ser julgada improcedente, por não provada, na parte que excede a confissão efetuada.

A sentença, no segmento que interessa considerar, julgou a ação, parcialmente, procedente, condenando a ré seguradora a pagar ao autor AA, a título de danos materiais, a quantia de €10.000,00 (dez mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa supletiva legal, desde a data da citação e até integral pagamento.

Desta sentença, o autor AA interpôs recurso, com subsequente apresentação de alegações, tendo o Tribunal da Relação julgado improcedente a apelação e, em consequência, confirmou a decisão impugnada.

Do acórdão da Relação de Évora, o autor AA interpôs agora recurso de revista, terminando as alegações com o pedido da sua revogação, formulando as seguintes conclusões, que se transcrevem, integralmente: 1ª – O ora Recorrente na conclusão IV das suas alegações em sede de Recurso de Apelação refere que: «Destarte, julgamos que a resposta aos quesitos - 13 deverá ser alterada/modificada, dando como provado que - Dos elementos documentais juntos aos autos (fls.Jls.305 e 307, 309, 312, 313, 315, 356 a 391, 393 a 406, 889 a 1096), bem como, da produção de prova testemunhal, resulta que o Autor tem necessidade de contratar "fretes" de transporte de gado vivo por si adquirido ou vendido, e ainda na gestão normal da sua presente actividade de criador de gado.».

  1. - No quesito 12 provar-se-á ou não se o Autor teve que contratar os serviços de outras empresas, incluindo a que detém participação social. No quesito 13 provar-se-á ou não se o Autor contratou com «terceiros» a realização de fretes. A relevância desta «pequena-grande» distinção releva no âmbito da própria fundamentação do Acórdão dada à resposta do quesito 13 «a sua resposta está dependente da solução encontrada pelo A. Dentro de uma outra empresa de que é proprietário e a que a Sra. Juiz não deixou de aludir (...)».

  2. - O Acórdão da Relação, não se pronunciou sobre a matéria do quesito 12, nem sequer apreciou a distinção existente entre o quesito 12 e o 13, e que importam uma apreciação distinta e bem diversa da fundamentação dada.

  3. - A nulidade de omissão de pronúncia prevista no art.615° n°1 alínea d) aplicável à 2a instância por força do disposto no art. 666° n°1 traduz-se no incumprimento, por parte do Julgador do dever prescrito no n°2 do art.608° todos do Cód. Proc. Civil, que é o de resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Não se trata dos argumentos ou razões jurídicas invocadas pelas partes. Ao invés trata-se das pretensões formuladas ou a elementos inerentes ao pedido e à causa de pedir.

  4. - Pelo que, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 684° n°2 do Cód. Proc. Civil, deverá decretar-se a baixa do processo ao Tribunal da Relação com base na omissão da pronúncia, e de forma restritiva ser proferida reforma do acórdão cuja anulação ora se invoca e se requer, com subsequente apreciação da matéria ínsita ao quesito 12, cuja matéria não foi distintivamente apreciada face à matéria do quesito 13.

  5. - Toda a prova contabilística abundantemente junta aos autos pelo Recorrente, a par da prova documental reunida pelos Srs. Peritos, acrescido de todos os movimentos bancários (o Apelante prescindiu do sigilo bancário) juntos aos autos de fls.358 a 391 pela própria BANCO CAIXA DD [com o canhoto identificativo onde foi depositado os cheques], e ainda todas as declarações oficiais para efeitos tributários de fls. 1029 a 1090, demonstram que o Recorrente expôs totalmente a sua escrituração comercial nos presentes autos, denunciando nada ter a esconder ao Tribunal nem à parte contrária.

  6. - Contra ela [prova documental e oficial], a Recorrida não produziu qualquer tipo de prova.

  7. - Importa articular com os critérios legais da repartição do ónus de prova, os critérios legais de eficácia probatória (regras probatórias fixadas em abstracto), na medida em que o ónus de contraprova ou carece de prova principal, a chamada prova do contrário em oposição à prova legal plena nos termos do art° 347° Cód. Civil, ou de simples contra-prova indirecta, nos termos do art° 346° Cód. Civil, bastando, neste caso, que a parte não sujeita ao ónus subjectivo lance a dúvida sobre os factos que ao outro incumbe provar.

  8. - Na apreciação da força probatória da documentação contabilística, art° 44° n° 1 C. Comercial - não revogado pelo DL 262/86 de 2.9 que aprovou o Código das Sociedades Comerciais - importa atender ao princípio da indivisibilidade da declaração, cfr. art°s. 376° n° 1 e 2 e 360° Cód.Civil.

  9. - Na medida em que as provas têm por função a demonstração da realidade dos factos, cfr. art° 341° Cód. Civil, não é juridicamente admissível postergar as normas de direito probatório e os critérios legais de eficácia probatória dos meios de prova, salvo em caso de disposição legal expressa nesse sentido, na exacta medida em que o princípio da livre apreciação das provas cede perante o principio da prova legal, isto é, cede perante provas com valoração legalmente tabelada, v.g. presunções legais, documentos e confissão - vd. Anselmo de Castro in "Direito Processual Civil Declaratório" Almedina, Vol III, págs. 308/309; Manuel de Andrade in "Noções Elementares de Processo Civil" Coimbra Editora/1979, págs. 211/212.

  10. - Quer o Tribunal a quo quer a Relação confundiram a validade intrínseca dos documentos contabilísticos e bancários, os quais por si só expressam e comprovam as declarações e os factos neles contidos, com a exigibilidade ou não dos danos reclamados.

  11. - A Relação, sem fundamentar ou evidenciar os elementos probatórios adversos, desconsiderou todos os movimentos bancários, efectivamente realizados e bem expressos nas cópias dos cheques originais junto aos autos pela própria BANCO CAIXA DD e que contêem o carinho da sua passagem pela câmara de compensações, e reflectidos contabilisticamente.

  12. - A todos estes elementos documentais não foi produzida QUALQUER contraprova relativa à sua autenticidade ou validade.

  13. - A matéria ínsita aos artigos 14°, 20 a 23.2, 135 e 136 da base instrutória não diz respeito à condição directa, adequada, necessária e causal da realização de tais despesas e encargos como consequência do evento danoso causado pelo sinistro. Apenas é indagado se despendeu determinadas quantias, por conta de tais transportes, e naturalmente o custo de tais serviços.

  14. - Vale, isto por dizer, que independentemente da qualificação e integração jurídica que sobre tais elementos de prova possa ser feita em sede de enquadramento jurídico a despeito do nexo causal ou não, que possa ser aferido sobre o dano causado pelo sinistro e tais despesas, certo é que, a formulação dos quesitos não se encontra efectuada de moldes a se pretender estabelecer uma condição sine qua non com a produção do evento lesivo.

  15. - O fito de tais perguntas destinam-se apenas e tão só a apurar a existência ou não, da realização de tais despesas e encargos, e claro da respectiva quantificação.

  16. - A resposta dada pela Relação [idêntica à do Tribunal a quo] reduz a NADA a existência legal e real, não só para efeitos comerciais como tributários de tais elementos documentais.

  17. - É, um nítido excesso de interpretação, traduzindo-se numa conclusão sobre a qual, não existe UM único elemento de contra-prova produzido.

  18. - Catapultar a análise de tais elementos para a sua inexistência técnica, legal e jurídica é admitir e assumir uma total repulsa à sua própria existência, sem que para tal haja fundamentação de facto ou de direito possível.

  19. - As análises às declarações fiscais derivadas de elementos colhidos na escrita contabilística de um contribuinte, se realizadas tecnicamente, de acordo com os preceitos da revisão, merecem, em principio, relativa fé, valendo como elemento de prova, se a matéria é levada à esfera judicial. Foi este o critério usado na prova pericial que envolveu dois elementos da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas.

  20. - Também alicerça a questão o facto da força probatória dos livros e escrituração comerciais, estar assegurada pelo Código Comercial, art. 44° e segs.

  21. - Trata-se de uma prova "pré-constituída" porque é preparada para em eventualidade futura vir a servir como um instrumento a ser acatado como verdadeiro, sendo esta uma prerrogativa dos empresários e gestores.

  22. - Nos presentes autos não foram apreciados ou apresentados quaisquer factos ou documentos que invalidem a escrituração comercial do Apelante.

  23. - In casu, não foram produzidos elementos de prova que contrariem um só dos documentos apresentados, nem um só item destes constantes.

  24. - No caso dos autos, o Recorrente foi alvo de perícia, que confirmou TODOS os elementos/factos alegados.

  25. - Ora as declarações fiscais feitas de acordo com os critérios exigíveis são...

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