Acórdão nº 329/09.2TBVVD.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Dezembro de 2016

Magistrado ResponsávelFERNANDA ISABEL PEREIRA
Data da Resolução14 de Dezembro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

1. Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 2. 3. I. Relatório: 4. AA e BB intentaram contra Caixa CC, Electrodomésticos DD, Lda., EE e FF a presente acção declarativa, sob a forma ordinária, na qual pediram: que se declare nulo e sem qualquer efeito o contrato de mútuo referido no artigo 22.º da Petição Inicial; caso assim não se entenda, que se declare nula e sem qualquer efeito a fiança dos autores; que, em qualquer dos casos, sejam condenados os réus, solidariamente, a pagarem a cada um dos autores a quantia de € 10.000,00, a título indemnização por danos não patrimoniais e, bem assim, a pagarem a indemnização por danos patrimoniais que se vier a liquidar.

5. Alegaram, em síntese, que: 6. - A ré Electrodomésticos DD, Lda., da qual o réu GG é sócio gerente, obteve um financiamento da Caixa CC, tendo esta ré exigido para renegociar o empréstimo concedido uma fiança capaz de garantir a quantia mutuada, o que foi solicitado ao autor por aquele réu; 7. - O autor, irmão da ré HH, anuiu à pretensão com a condição de a autora, sua mulher, não intervir na fiança, o que foi aceite pelo réu GG, que lhe entregou a minuta do contrato na qual figurava como mutuante a ré CC, como mutuária a ré DD e como fiadores os réus GG, HH, e o próprio autor, AA, o qual ali apôs a sua assinatura na última página do contrato, no lugar destinado ao fiador, e rubricou as demais folhas do mesmo; 8. - Em meados de Abril de 2008, os autores foram informados pelo CC do incumprimento do contrato e de que iria ser intentada acção judicial para recuperar os créditos devidos, vindo, então, a ser apresentado por aquele banco ao autor um contrato que não era o por si assinado e rubricado e no qual figurava também a autora como fiadora, sem que as assinatura fossem dos seus punhos; 9. - O autor marido não acederia em ser fiador caso soubesse que a sua mulher, a autora BB, intervinha na fiança, o que era do conhecimento dos réus; 10. - Figurando os autores como fiadores no contrato de mútuo, também eles são tidos numa situação de mora contratual perante o Banco de Portugal e figuram na listagem de incidentes bancários, facto que lhes traz prejuízos e os tem feito passar por um estado de ansiedade, tendo ficado profundamente abatidos em termos psicológicos.

11. 12. A ré Caixa CC contestou, impugnando parcialmente os factos alegados na petição inicial.

13. Os Autores replicaram.

14. 15. Por despacho de fls. 459 e 460 foi julgada extinta a instância relativamente à ré HH com fundamento na inutilidade superveniente da lide por ter sido declarada a sua insolvência.

16. Procedeu-se a julgamento, tendo sido proferida sentença com o seguinte segmento decisório: 17. «Nestes termos e face ao exposto, julgo parcialmente procedente a acção e, em consequência: 18. a) Declaro nulo e sem qualquer efeito o contrato de referido no artigo 22.º da Petição Inicial; 19. b) Condeno solidariamente os Réus, Caixa CC, Electrodomésticos DD, Lda., e EE a pagar à Autora, BB, a quantia de € 7.500,00; 20. c) Absolvo os Réus do restante peticionado».

21. 22. Desta decisão apelou a ré Caixa CC.

23. O Tribunal da Relação de Guimarães, por acórdão de 10 de Março de 2016, julgou parcialmente procedente a apelação e revogou a sentença recorrida no segmento em que declarou nulo a totalidade do contrato, declarando-o inexistente quanto à autora BB e subsistente relativamente aos demais intervenientes. No restante manteve a decisão recorrida.

24. Inconformado, recorre agora de revista o autor AA, o qual finalizou a sua alegação, no que ora releva, com a seguinte síntese conclusiva: 25. 1ª Deveria o tribunal recorrido ter concluído que o recorrente não produziu qualquer declaração tendente à constituição da fiança constante do documento particular subjacente aos autos. Deveria ter concluído que se verificou uma total ausência de declaração. Não podendo haver negócio relativamente à pessoa que não prestou a declaração. Não o fazendo o douto Acórdão recorrido viola o preceituado nos artigos 246 e 292° ambos do Código Civil.

26. 2ª No que concerne ao recorrente não há nada negociável que possa vir a ser conservado. Aos olhos do homem comum dir-se-ia que não se pode reduzir aquilo que não existe.

27. 3ª O princípio da conservação/redução dos negócios não tem aplicação no caso dos autos, que pressupõe a existência de um negócio jurídico (declaração negocial), não interessando nos casos em que uma declaração não produz qualquer efeito.

28. 4ª Reduzir o negócio e declará-lo existente quanto ao autor recorrente seria aproveitar parte do negócio que não é sã. Seria aproveitar parte inválida do negócio, o que, desde logo, inquina e afasta a hipótese de redução do mesmo e a viabilidade de aplicação do referido preceito -o art° 292°do CC.

29. 5ª Por outro lado, de acordo com o princípio da liberdade contratual, verdadeira trave mestra da teoria dos contratos, têm as partes a faculdade, dentro dos limites da lei, de fixar livremente o conteúdo dos contratos, celebrar contratos diferentes dos previstos na lei ou incluir neles as cláusulas que lhes aprouver - n° 1 do art. 405° C.C. E como afloramento deste princípio, podem ainda as partes reunir no mesmo contrato regras de dois ou mais negócios, total ou parcialmente regulados na lei - n° 2 do mesmo artigo. As partes, a coberto do princípio da autonomia privada podem manter negócios jurídicos, mas só os podem reduzir às partes que não são afectadas por uma invalidade. De modo que, a decisão recorrida viola, ainda, o disposto no art. 405 do Código Civil.

30. 6ª O Acórdão recorrido assenta, neste particular segmento em que revogou a douta decisão da 1ª Instância, no total vazio da fundamentação, em violação expressa do disposto no artigo 607°, n° 4 do C.P.C., encerrando, assim, uma nulidade nos termos e para os efeitos no disposto no artigo 615° do CPC.

31. 7ª Pugna-se, assim, pela manutenção da decisão de 1ª Instância - apenas estando aqui em causa a parte em que foi revogada - e/ou, caso assim se não entenda, o que se equaciona por cautela de patrocínio, pugna-se pela manutenção da decisão da 1ª Instância no que ao recorrente respeita.

32. 8ª Não obstante, "lura novit curia" e...

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