Acórdão nº 246/12.9TBMMV.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Dezembro de 2016
Magistrado Responsável | OLINDO GERALDES |
Data da Resolução | 14 de Dezembro de 2016 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I – RELATÓRIO AA - Materiais de Construção, Lda.
, instaurou, em 18 de maio de 2012, na então Comarca de Montemor-o-Velho (Instância Central de Coimbra, Secção Cível, Comarca de Coimbra) contra BB, S.A.
, ação declarativa, sob a forma de processo ordinário, pedindo que a Ré fosse condenada a pagar-lhe a quantia de € 87 488,21, acrescida dos juros de mora à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.
Para tanto, alegou, em síntese, que do acidente de viação, ocorrido no dia 6 de agosto de 2010, pelas 10:22 horas, na Rua …, no lugar de …, freguesia de Arazede, envolvendo o veículo pesado de mercadorias, matrícula ...-...-UH, e o semi-reboque, matrícula L-97…, sua propriedade, e o quadriciclo, matrícula GT-7…, propriedade de CC, que o conduzia, e por sua culpa exclusiva, sofreu diversos danos.
Citada, a R. contestou, por impugnação, devolvendo a culpa ao condutor do veículo da A., e concluiu pela improcedência da ação.
Entretanto, por despacho de 4 de abril de 2014, foi ordenada a apensação da ação 285/13.2TBMMV, pendente no mesmo Tribunal desde 4 de julho de 2013.
Nessa ação declarativa, sob a forma de processo ordinário, instaurada por DD, EE, FF e GG contra HH - Comp. de Seguros, S.A., AA - Materiais de Construção, Lda., II e Fundo de Garantia Automóvel (FGA), pediram as Autoras que a Ré HH fosse condenada a pagar-lhes a quantia de € 547 983,50, acrescida de juros a partir da citação, ou então, subsidiariamente, serem condenados os RR. MAF, Lda., II e FGA, com fundamento no mesmo acidente de viação, do qual resultou a morte de CC, com 49 anos de idade, seu marido e pai.
Contestaram os RR. HH, FGA e AA, Lda., alegando a culpa exclusiva de CC e concluindo pela improcedência da ação.
Convocada a audiência prévia, foi proferido o despacho saneador, sendo os RR. AA, Lda., II e Fundo de Garantia Automóvel absolvidos da instância, por ilegitimidade passiva, identificado o objeto do litígio e enunciado os temas da prova.
Realizada, depois, a audiência de discussão e julgamento, foi proferida, em 16 de dezembro de 2015, a sentença, que condenou a R. BB, S.A., a pagar à A. AA, Lda., a quantia de € 28 338,21, acrescida de juros, à taxa legal de 4 %, desde a citação até integral pagamento, e absolvendo a R. HH do pedido.
Inconformadas, apelaram a Ré BB, S.A., e as Autoras (do apenso) para o Tribunal da Relação de Coimbra, que, por acórdão, de 6 de julho de 2016, dando procedência parcial à apelação, condenou a Ré BB, S.A., a pagar à Autora AA, Lda., a quantia de € 17 002,93, e a Ré HH a pagar às Autoras (do apenso) a quantia de € 148 520,00, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.
Inconformada, a Ré HH recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça e, tendo alegado, formulou essencialmente as conclusões:
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O recurso tem por fundamento a violação da lei do processo (art. 674.º, n.º 1, alínea b), do CPC), bem como assim a nulidade de que padece o acórdão recorrido (arts. 674.º, n.º 1, alínea c), e 615.º, n.º 1, alínea c), ambos do CPC).
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Os então AA. não identificaram com exatidão as passagens em concreto da gravação onde constavam os depoimentos em que fundavam o recurso apresentado e, por esse facto, não foram apreciados.
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No entanto, a Relação não rejeitou o recurso, tendo sido violado o disposto no art. 640.º, n.º 2, alínea a), do CPC.
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A Relação proferiu acórdão apenas com base na prova documental, violando o disposto no art. 413.º do CPC.
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Deverá ser proferido acórdão rejeitando o recurso de apelação interposto pelas AA., mantendo-se a sentença.
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Caso assim se não entenda, não poderia a Relação ter recorrido a regras da experiência comum e presunções para dar determinados factos como provados, quando existe prova testemunhal produzida em sentido contrário.
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A prova produzida não foi considerada na sua globalidade, tendo assim sido violado o disposto no art. 413.º do CPC.
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A conjugação da matéria dos factos n.º s 4 e 22 com o teor das fotografias 7 e 8 constantes do relatório do NICAV elaborado pela GNR e que a Relação atendeu para formar a sua convicção no que respeita à dinâmica do acidente, terá que conduzir a outra decisão.
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O embate entre os veículos não ocorreu no centro da faixa de rodagem, mas na hemi-faixa de rodagem destinada ao trânsito do veículo pesado de mercadorias.
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Foi produzida prova testemunhal demonstrando que o condutor do pesado efetuou uma manobra de recurso, virando o volante para a direita, tendo o pesado passado a circular parcialmente na berma de areia.
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Tal prova foi transcrita nas suas contra-alegações e encontra-se transcrita na motivação deste recurso.
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O acórdão recorrido enferma de nulidade, uma vez que os factos considerados como provados no mesmo teriam de conduzir a uma decisão diversa, a qual teria de ser no sentido de atribuir a totalidade da culpa do acidente ao condutor do quadriciclo.
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A Recorrente não poderia ter sido condenada no pagamento de qualquer indemnização, visto que foi o condutor do quadriciclo que invadiu a hemi-faixa de rodagem contrária àquela por onde deveria circular, violando assim o disposto no art. 13.º do Código da Estrada.
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Existindo contradição entre os factos dados como provados e a decisão constante do acórdão, terá que se concluir que o acórdão padece de uma nulidade, nos termos do disposto nos arts. 674.º, n.º 1, alínea c), e 615.º, n.º 1, alínea c), do CPC.
Pretende a Recorrente, com a revista, a revogação do acórdão recorrido e a sua substituição por decisão que a absolva do pedido.
Contra-alegaram as Autoras (do apenso), no sentido de ser negado provimento ao recurso.
Pelo Tribunal da Relação de Coimbra foi entendido não existir a nulidade arguida.
Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
Neste recurso, está em discussão, para além da nulidade do acórdão recorrido, a decisão sobre a matéria de facto e a culpa no acidente de viação.
II – FUNDAMENTAÇÃO 2.1. A Relação deu como provados os seguintes factos: 1.
No dia 6 de agosto de 2010, estando bom tempo, sem chuva e sem nuvens, neblina ou nevoeiro, cerca das 10:22 horas, na Rua …, lugar de …, freguesia de Arazede, concelho de Montemor-o-Velho, ocorreu um acidente de viação, no local onde esta estrada entronca com uma outra sem prioridade.
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Naquele local, existem dois sentidos de marcha, sendo destinada uma hemi-faixa de rodagem ao sentido Mata-Bebedouro e outra hemi-faixa de rodagem ao sentido inverso.
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A Rua da … é marginada por casas de habitação, com acessos diretos e por terrenos, com caminhos.
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A estrada tem uma berma em areia com 0,65 m do lado direito, atento o sentido do veículo...
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