Acórdão nº 175/09.3TBOLH.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelFERNANDA ISABEL PEREIRA
Data da Resolução08 de Setembro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório: AA e BB instauraram a presente declarativa, sob a forma ordinária, contra CC e DD, pedindo que lhes fosse reconhecido o direito de preferência na aquisição de um prédio rústico e de um prédio misto que o segundo réu vendeu ao primeiro.

Para fundamentar o seu pedido alegaram, em suma, serem proprietários de um prédio misto confinante com os prédios rústico e misto vendidos, comprados pelo réu CC, que não é proprietário confinante, os quais têm área inferior à unidade de cultura e são, tal como o dos autores, aptos para a agricultura e a ela destinados.

Contestou o réu CC, alegando que comprou os prédios para integrarem uma exploração agrícola do tipo familiar, sendo o urbano para constituir a sua residência permanente, referindo que os autores não se dedicam à agricultura nos prédios de que são proprietários.

Subsidiariamente, caso a acção proceda, deve o direito de preferência verificar-se apenas em relação à parte rústica, pedindo, em reconvenção, a condenação dos autores no pagamento de € 8.102,79 relativos a despesas que efectuou nos prédios.

Também EE, herdeira habilitada do réu DD, contestou, pugnando pela improcedência da acção.

Houve réplica.

Realizado o julgamento, foi proferida a sentença de fls. 384 a 419, a qual, julgando a acção parcialmente procedente, decidiu: «

  1. Julgar parcialmente procedente, por provada, a presente acção e, em consequência, considerar verificado o direito legal de preferência na venda invocado pelos Autores AA e marido BB, declarando transmitida para estes a propriedade do prédio rústico sito em …, composto de terra de cultura arvense, alfarrobeiras, amendoeiras e figueiras, com a área de 3.000 m2, inscrito na matriz sob o artigo 41º da Secção G da freguesia de Quelfes, descrito na Conservatória do Registo Predial de Olhão sob o numero 3749/… da freguesia de Quelfes, pelo preço de € 5.000,00 e do prédio rústico sito em ..., composto de terra de cultura arvense, eira, amendoeiras, alfarrobeiras, citrinos, figueiras, nespereiras, oliveiras e duas moradas de casas térreas, com a área total de 11.840 m2, inscrito na matriz a parte rústica sob o artigo 46º da Secção G da freguesia de Quelfes (actuais artigos 172º e 173º da mesma Secção G), descrito na Conservatória do Registo Predial de Olhão sob o numero 3750/…, pelo preço de € 5.000,00, concedendo aos Autores o prazo de 15 dias para comprovarem nos autos o pagamento do preço devido, absolvendo os Réus do demais peticionado.

  2. Absolver os Autores do pedido reconvencional deduzido pelo Réu CC».

    Apelaram os autores e o réu CC.

    Por acórdão de 17 de Dezembro de 2015 o Tribunal da Relação de Évora julgou: «a) a apelação interposta pelo R. improcedente.

  3. A apelação interposta pelos autores procedente e, em consequência, considerar verificado o direito legal de preferência na venda invocado pelos Autores AA e marido BB, confirmando a transmissão para estes da propriedade do prédio rústico sito em …, composto de terra de cultura arvense, alfarrobeiras, amendoeiras e figueiras, com a área de 3.000 m2, inscrito na matriz sob o artigo 41º da Secção G da freguesia de Quelfes, descrito na Conservatória do Registo Predial de Olhão sob o numero 3749/… da freguesia de Quelfes, pelo preço de € 5.000,00 e também do prédio misto sito em …, composto de terra de cultura arvense, eira, amendoeiras, alfarrobeiras, citrinos, figueiras, nespereiras, oliveiras e duas moradas de casas térreas, com a área total de 11.840 m2, inscrito na matriz a parte rústica sob o artigo 46º da Secção G e a parte urbana sob os artigos 820º e 824º, todas da freguesia de Quelfes, descrito na Conservatória do Registo Predial de Olhão sob o numero 3750/… da freguesia de Quelfes, pelo preço global de € 40.000,00, correspondendo € 5.000,00 ao prédio rústico do artigo 46º-G e € 17.500,00 ao preço de cada um dos prédios urbanos referidos (art. 820.º e 824.º)».

    Irresignado, recorreu de revista o réu CC.

    Na alegação oportunamente apresentada, formulou a seguinte síntese conclusiva: «

    1. O Recorrente, tendo a posse titulada por contrato-promessa de compra e venda, com a totalidade do preço pago e com a tradição do imóvel, sobre o prédio rústico inscrito sob o artigo 38 da Secção G da freguesia de Quelfes do concelho de Olhão, e actuando por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade sobre esse imóvel, deveria ter sido considerado, à luz do art. 1251º do Código Civil e para efeitos do disposto nos arts. 1380º e 1381º do mesmo Código, proprietário de prédio confinante; B) O acórdão recorrido, ao não ter considerado, para efeitos da qualificação de confinante, essa posse do Recorrente, fez uma incorrecta interpretação e aplicação da lei substantiva, concretamente o disposto nos arts. 1251º, 1268º, 1380º e 1381º do Código Civil, preceitos que violou; C) Por outro lado, resultando patentemente dos factos provados que o Recorrente exercia no prédio confinante e em prédios próximos, uma exploração agrícola tipo familiar, que já ocorria à data da compra dos prédios objecto da acção de preferência (e tendo em conta que na realidade e estrutura minifundiária dominante na agricultura do Sotavento algarvio esse exercício não é de dedicação exclusiva nem o predominante no confronto com outras actividades eventualmente exercidas pelos seus exploradores) e que visou prosseguir de forma empresarial, com a ampliação e redimensionamento da área de cultivo através da compra de prédios contíguos entre si (onde se incluem os prédios preferidos nesta acção) - verifica-se que, relativamente ao direito de preferência exercido pelos Recorridos, ocorre a excepção contida e prevista na alínea b. do art. 1381º do Código Civil; D) Ao não entender assim, como era imposto pelos factos dados como provados, o acórdão recorrido fez uma errada interpretação, determinação e aplicação do disposto nos arts.1380º e 1381º, alínea b., do Código Civil.

    2. Deverá ser, por isso, revogado o acórdão ora recorrido e, consequentemente, ser substituído por outro que julgue totalmente improcedente e não provada a pretensão dos aqui Recorridos e determine a absolvição do aqui Recorrente do pedido de preferência formulado.

      CASO ASSIM NÃO SE OPINE, F) Deverá considerar-se que, ao tornar o direito legal de preferência extensível aos prédios urbanos transmitidos, apenas pelo critério da localização da totalidade do prédio misto em zona não urbanizável e espaço agrícola definidos por instrumentos administrativos de ordenamento e gestão do território, o acórdão recorrido desconsiderou o não acolhimento pela lei civil do conceito de e subverteu a regra da livre transmissão autónoma e separada de prédios urbanos e prédios rústicos, como tal qualificados, independentemente da classificação administrativa do espaço onde estão enquadrados e se localizam.

    3. Ao ter assim decidido, o acórdão recorrido inobservou o disposto nos arts. 204º e segs. do Código Civil, que violou por errada interpretação e aplicação.

    4. Devendo, nessa medida, ser revogado esse acórdão ora em recurso».

      Na contra-alegação pugnaram os autores pela inadmissibilidade da revista por existir «dupla conforme», verificando-se erro de escrita na decisão da 1ª instância quando julgou a acção apenas parcialmente procedente, mas transmitiu para os autores a propriedade do prédio descrito sob o n.° 3570 da freguesia de Quelfes, Olhão, composto de terra de cultura arvense, eira e duas moradas de casas térreas.

      Defenderam ainda que, a não ser assim entendido, não pode ser admitida a revista com a amplitude pretendida pelo réu/recorrente face à absoluta coincidência de decisões no que respeita à questão de não assistir ao possuidor o direito de preferência e à improcedência da excepção fundada na previsão da al. b) do artigo 1381º do Código Civil, ou seja, de que a alienação abrange um conjunto de prédios que, embora dispersos, formam uma exploração agrícola do tipo familiar, situação impeditiva do direito de preferência.

      Colhidos os vistos legais, cumpre decidir: II. Fundamentos: De facto: É a seguinte a facticidade julgada provada: 1) Os Autores AA e BB são os únicos donos e legítimos possuidores de um prédio misto, situado em …, composto por terra de cultura, alfarrobeiras, amendoeiras e oliveiras, com a área total de 7.240 m2 e casas de habitação, sendo a área coberta de 155 m2 e a área descoberta de 7.085 m2, inscrito na matriz, a parte...

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