Acórdão nº 3/12.2GAAMT-D.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelMANUEL AUGUSTO MATOS
Data da Resolução14 de Setembro de 2016
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - RELATÓRIO 1.

Por acórdão de 2 de Fevereiro de 2016, o Tribunal Colectivo da Comarca do Porto Este – Penafiel – Instância Central – Secção Criminal procedeu à realização do cúmulo jurídico das penas aplicadas nos presentes autos (Proc. n.º 3/12.2GAAMT) e no processo n.º 494/09.9GALVC do 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Valongo, condenando o arguido AA na pena única de 9 (nove) anos e 6 (seis) meses de prisão efectiva.

  1. Inconformado, interpôs o arguido o presente recurso, rematando a respectiva motivação com as conclusões que se transcrevem: CONCLUSÕES: 1. Vem o recurso interposto porquanto não pode o arguido conformar-se com o facto de a pena aplicada no processo 823/08.2TBLSD não ter sido incluída no cúmulo, entendendo ainda que a medida da pena é exagerada e desproporcional, violando o artigo 70.º do CP, padecendo ainda ao acórdão de falta de fundamentação.

  2. Dispõe o art.º 77.º, n.º 1 do Código Penal que, quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles, é condenado numa única pena, sendo que, na medida da pena, são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente.

  3. Dispõe, ainda, o art.º 78.º, n.º 1 do mesmo código que se, depois de uma condenação transitada em julgado, se mostrar que o agente praticou, anteriormente àquela condenação, outro ou outros crimes, são aplicáveis as regras do artigo anterior, sendo a pena que já tiver sido cumprida descontada no cumprimento da pena única aplicada ao concurso de crimes. Nos termos do n.º 2 deste último preceito, o que acaba de ser dito só é aplicável aos crimes cuja condenação transitou em julgado.

  4. Nos presentes autos, foi efectuado o cúmulo jurídico, com base em duas condenações transitadas em julgado, nos presentes autos e no processo 494/09.9GAVLG.

  5. Sucede que, apesar de legalmente admissível, não foi incluído no cúmulo a pena de três anos de prisão aplicada no processo 823/08.2TBLSD.

  6. O processo n.º3/12.2GAAMT tem como data de condenação 18 de Fevereiro de 2014, data dos factos 2011/2012, Facto A – desde o Natal de 2011 e até ao momento da sua detenção, em 10 de Outubro de 2012 e data do trânsito em julgado 13 de Outubro de 2014, tendo sido aplicada pena de seis anos e seis meses de prisão. O processo 494/09.9GAVLG tem como 26 de Junho de 2012 data de condenação, data dos factos 2010 facto n.º 5 “ entre pelo menos de marco e Julho de 2010, e data do trânsito em julgado 18 de Julho de 2013, tendo sido aplicada a pena de seis anos de prisão. O processo 823/08.2TBLSD tem como data de condenação 7 de Abril de 2010, data dos factos Finais de 2004 e Janeiro de 2005 e data do trânsito em julgado 28 de Abril de 2010, tendo sido condenado na pena de três anos de prisão suspensa na sua execução por igual período.

  7. Relativamente ao processo 823/08.2TBLSD, no qual foi proferido acórdão em 7 de Abril de 2010, devidamente transitado em julgado, o arguido foi condenado, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. e p, pelo art. 25º, alínea a) do Decreto-Lei nº 15/93 de 22 de Janeiro, na pena de 3 anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo, suspensão esta acompanhada de regime de prova e subordinada ao cumprimento do plano de reinserção social que viesse a ser definido em concreto pela DGRS.

  8. Uma vez que, o arguido foi condenado nos presentes autos, em 10/9/2014 pela pratica em autoria material e em co-autoria, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21º, nº1 do Decreto-Lei nº 15/93 de 22 de Janeiro, na pena de 6 anos e 6 meses de prisão, por factos ocorridos durante o período de suspensão da execução da pena de prisão foi revogada a suspensão da execução da pena de prisão que foi decretada, tendo o arguido ficado obrigado a cumprir a pena de 3 anos de prisão que foi condenado no processo 823/08.2TBLSD.

  9. A situação prevista na lei ocorre quando o tribunal teve conhecimento, depois de ter transitado em julgado uma dada condenação, que outro ou outros crimes foram praticados pelo arguido antes desse trânsito, estando, por isso, esse ou esses crimes em concurso com o primeiro e devendo ser objecto, todos eles, de uma pena única ou conjunta. O requisito essencial é pois que, exista anterioridade da prática dos crimes em relação ao trânsito em julgado da primeira condenação.

  10. Como se expôs, o trânsito em julgado da condenação no processo 823/08.2TBLSD, a primeira, ocorreu em 28 de Abril de 2010 pelo que sendo os factos criminosos pelos quais foi condenado no processo 494/09.9GAVLG anteriores ao trânsito em julgado como resulta do Facto n.º 5 “ entre pelo menos de marco e Julho de 2010”, teria a pena que lhe foi aplicada de ter sido engloba no cúmulo. De facto, tratam-se de uma Pluralidade de crimes com julgamentos efectuados em momentos diferentes sendo essencial a anterioridade da anterioridade da prática dos crimes em relação ao trânsito em julgado da 1.ª condenação.

  11. O STJ tem entendido, de forma pelo menos maioritária, que o momento relevante para a determinação do cúmulo jurídico de todas as penas é o trânsito em julgado da 1.ª condenação, ou seja, os crimes de que só houve conhecimento posterior terem sido cometidos antes dela.

  12. No caso concreto, tendo ocorrido o trânsito em julgado no processo 823/08.2TBLSD, a primeira, em 28 de Abril de 2010, e tendo sido condenado por factos de Março de 2010 no processo 494/09.9GAVLG está claro que apenas por lapso tal pena não terá sido incluída, pelo que deve o acórdão ser substituído por outro que considere incluída no cumulo a pena parcelar aplicada em tal processo.

  13. Entende o recorrente, que no douto acórdão do qual ora se recorre foi violado o dever de fundamentação. O tribunal que procede ao cúmulo jurídico de penas, não deve limitar-se a enumerar os ilícitos cometidos pelo arguido de forma genérica, mas descrever, ainda que resumidamente, os factos que deram origem às condenações, por forma a habilitar os destinatários da decisão a perceber qual a gravidade dos crimes, bem como a personalidade do arguido, modo de vida e inserção social. Se a decisão recorrida não contém elementos que permitam apreender, ainda que resumidamente, os factos e as circunstâncias em que ocorreram e que foram julgados no processo da condenação, e as circunstâncias pessoais que permitam construir uma base de juízo e decisão sobre a personalidade, necessária para a determinação da pena do concurso, tal omissão não permite ao tribunal de recurso tomar uma decisão cuja base de ponderação é, pela lei, precisamente a consideração, no conjunto, dos factos e da personalidade do agente.

  14. É a própria legalidade e jurisdicionalidade de uma decisão judicial que exige a verificabilidade da sua motivação, como de resto, no nosso ordenamento jurídico, o impõe a Constituição da República Portuguesa ao prescrever, no seu art. 205.º/1.

  15. Para além dos factos que foram dados como provados em ambos os processos, o tribunal apenas se refere ao arguido para encontrar a medida da pena e fundamentar o cumulo com a seguinte expressão “considerando os factos supra mencionados, além de que: Não se poderá olvidar os seus antecedentes criminais o que não milita a seu favor pois é demonstrativo de uma conduta contrária aos ditames do direito penal, sentindo-se, assim, as necessidades de prevenção especial, com uma certa tendência para o crime. As penas em concurso reportam-se ao mesmo tipo legal de crime – tráfico de estupefaciente – sendo que a data da prática dos factos é muito próxima, o que Tribunal tomará em consideração na ponderação da pena única.” 16. Não pode considerar-se que se encontra efectuada uma avaliação conjunta da globalidade dos factos e da personalidade do agente que seja suficiente para fundamentar uma pena de prisão.

  16. É nulo o acórdão, por insuficiência de fundamentação de facto e de direito, quando se limita a indicar os crimes que foram objecto da condenação, quando nada esclarece sobre a avaliação da personalidade do arguido e da globalidade dos factos por ele praticados, como sucede no caso concreto, nulidade que se invoca.

  17. A especificação dos fundamentos que presidiram à escolha e à medida da pena integra-se no dever de fundamentação das razões de direito da decisão, a que se refere o n.º 2 do art. 374.º do CPP, e que a omissão de tal especificação determina a nulidade da sentença (cf. art. 379.º, n.º 1, al. a), do CPP).

  18. É nulo o acórdão, por insuficiência de fundamentação de facto e de direito, quando se limita a indicar os crimes que foram objecto da condenação, sem especificar, embora de forma concisa, os factos que os consubstanciaram, quando é absolutamente omisso quanto à personalidade do arguido e quando nada esclarece sobre a avaliação da personalidade do arguido e da globalidade dos factos por ele praticados.

  19. Apenas para o caso de improceder o alegado em A) quanto à não inclusão no cúmulo da pena parcelar aplicada no Processo 823/08.2TBLSD, sempre se dirá que a pena aplicada de 9 anos e 6 meses de prisão é manifestamente exagerada.

  20. Nos presentes autos foram englobados no cúmulo as penas aplicadas nos seguintes processos: Seis anos e seis meses de prisão - n.º3/12.2GAAMT; Seis anos de prisão - 494/09.9GAVLG.

  21. Feito o cúmulo jurídico das penas aplicadas nos processos supra referidos, foi o arguido condenado na pena de 9 anos e 6 meses de prisão efectiva.

  22. Parece-nos que, salvo o devido respeito por melhor opinião, a ter em consideração os factos dados como provados, o Tribunal “a quo” na determinação da medida da pena não apreciou devidamente as circunstâncias que depuseram a favor do arguido.

  23. De harmonia com o já citado art.º 77.º, n.º 1 do Código Penal na medida da pena do concurso são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente. Na fixação da pena única do concurso há que partir da visão integrada de todos os crimes que integram o concurso e apurar de que modo é que essa visão do conjunto...

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