Acórdão nº 18084/15.5T8LSB.L1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelROQUE NOGUEIRA
Data da Resolução18 de Janeiro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1 – Relatório.

AA e BB intentaram, em 20.06.2015, contra CC S.A.., acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, formulando os seguintes pedidos:

  1. Seja condenado o Réu CC S.A. a pagar aos Autores o montante de 270.882,03 euros (duzentos e setenta mil, oitocentos e oitenta e dois euros, e três cêntimos), correspondente a valor de obrigações, identificado como papel comercial do DD, produto do EE, vendido pela sua área de retalho, aos seus balcões, e devidamente assumido pelo EE, e posteriormente pelo Réu CC S.A., como de sua responsabilidade; b) Seja o Réu CC condenado a pagar o montante correspondente a juros de mora desde a citação da presente acção e até integral pagamento.

Para o efeito, alegam que: 1. Os Autores são casados, e há muitos anos clientes do Banco ..., agora CC.

  1. Em 15 de Outubro de 2012 e 26 de Novembro de 2013 os Autores foram interpelados para transferir valor de sua conta para o que denominavam ser uma oferta de poupança, a celebrar com o Banco ..., agora CC.

  2. Os Autores viram-se confrontados com a pressão, sem qualquer explicação, por parte dos interlocutores no então BES, agora CC.

  3. Aliás tal foi demonstrado em sede de uma célebre Comissão de Inquérito da Assembleia da República, onde o responsável pelo Departamento de Risco da entidade bancária foi claro quando afirmou que existia um Departamento que sempre tratava de oferta de poupança, sendo que o departamento de Marketing comunicava então às áreas comerciais ofertas, com colocação nos clientes, em alternativa a quaisquer outras poupanças.

  4. Sendo que até era reconhecido que a colocação de tais ofertas faziam parte dos objectivos dos diferentes trabalhadores.

  5. E aí os Autores foram confrontados pelo seu gestor de conta, com um contrato de aquisição de produtos colocados no mercado por aquela instituição bancária ..., agora CC.

  6. A verdade é que na data de 15 de Outubro de 2012 vieram a ver um valor do seu depósito bancário transferido para obrigações no montante de 85.316,02 euros em nome do Autor AA, e o valor de 85.316,01 euros em nome da Autora BB.

  7. Posteriormente vieram os Autores a serem confrontados com uma nova oferta de produto ..., agora CC, na data de 29 de Novembro de 2013, no montante de 100.250,00 euros, constando o nome da Autora BB.

  8. Não tiveram os Requerentes qualquer outra informação, para além de que se tratavam de “Produtos ...”, sendo que nem mesmo em todos eles constavam a assinatura das partes ou de alguma delas.

  9. Nos próprios formulários juntos ao presente articulado, contém o seguinte texto, citando: «Os elementos aqui solicitados terão tratamento autonomizado e destinam-se a integrar uma base de dados de clientes para uso exclusivo do Banco ... S.A., de outras instituições de crédito e sociedades financeiras integradas no âmbito da supervisão em base consolidada a que está sujeito o Banco ..., que fazem parte do denominado Grupo Banco ..., com o fim de adequação do fornecimento de produtos de crédito a cada cliente…» 11. Este foi o texto disponível aos clientes como os aqui Autores, sendo que identifica claramente de que se estava perante produtos do EE, agora CC, bem como constava dos produtos dirigidos aos clientes do Banco, nada mais sendo comunicado aos Autores.

  10. Assim sendo, as obrigações contratadas foram sempre assim entendidas como produto ..., com a garantia ..., e por isso agora garantia CC.

  11. Os Requerentes não receberam qualquer informação adicional do seu gestor de conta, pelo que estavam assim a adquirir produto ... (agora CC), sendo que até recentemente, no respectivo sítio do Banco, eram identificados tais fundos de investimento como seus produtos, ali mesmo constando a seguinte informação «O ... criou uma gama completa de Fundos de Investimento que vai ao encontro das suas necessidades».

  12. Posteriormente, após a denominada crise ..., vieram os Autores a descobrir que estariam a comprar alguma coisa diferente do que lhe foi comunicado e apresentado.

  13. Ainda antes da alteração da estrutura do EE e a constituição do agora denominado CC, que o substituiu em termos de direitos e deveres societários, vieram os Autores a escrever ao Presidente da Comissão Executiva do então Banco ..., em carta datada de 25 de Julho de 2014, onde mostravam a vontade de resgatar os montantes em causa.

  14. A verdade é que após a assunção pela entidade CC dos deveres e direitos até então atribuídos ao EE, veio já o Réu CC a enviar carta aos Autores, na pessoa do Autor AA.

  15. Nessa carta vem o CC assumir perante os Autores o seguinte, e cita-se: «O CC S.A., continua determinado em apresentar propostas comerciais aos clientes que detenham certo tipo de obrigações próprias e instrumentos de dívida emitidos por entidades do Grupo .... . . Lamentamos os inconvenientes que esta situação está a provocar nos nossos clientes e reafirmamos todo o nosso empenho na rápida disponibilização de soluções, que desejamos que suceda num curto prazo.» 18. Aliás tal informação personalizada mais não foi do que o reflexo de comunicado do CC, aqui Réu, e não de qualquer outra entidade, comunicado esse que foi datado de 14 de Agosto de 2014, afirmando o seguinte, no que diz respeito à compra de papel comercial subscrito na rede de retalho do ... até 14 de Fevereiro de 2014: «O CC está determinado em comprar aos clientes de retalho do CC o papel comercial . . . Este proceder sofreu algum atraso, face ao que era desejado pelo CC, atendendo à necessidade de acerto de algumas questões técnicas com o Banco de Portugal, nomeadamente salvaguarda de obrigações prudenciais e de outras obrigações que resultaram do próprio processo de resolução. O CC conta ter todas essas questões resolvidas, com o Banco de Portugal, num curto prazo, para apresentar aos clientes propostas comerciais de compra do referido papel comercial.» 19. Assim sendo só podiam, e só podem, os Autores ver as aplicações efectuadas entendidas claramente como produtos a serem tratados pelo CC, e de sua única e inteira responsabilidade, assumida no texto citado da carta dirigida aos Autores, na qualidade de clientes, e bem assim no comunicado oficial dirigido a todos os clientes CC.

  16. Face ao acontecido, e até tendo em conta a falta de resolução da situação, vieram os Autores a proceder a Notificação Avulsa do CC S.A., na qual se confirma a situação, e o claro entendimento da responsabilidade do Réu CC, bem como notificando-o de que os Autores pretendem ver o montante total de 270.882,03 euros ser resgatado, e pago aos Autores, devendo tal ter sido concretizado no prazo de trinta dias.

  17. A mencionada Notificação Avulsa foi recebida devidamente pelo Réu CC, como o atesta documento elaborado pela senhora Solicitadora nomeada para o efeito, onde se junta o conteúdo da mencionada Notificação.

  18. A propósito da vontade expressa na mencionada Notificação Avulsa, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários veio concluir o que se extrai de comunicado datado de 20 de Fevereiro de 2015, e do qual se extrai, entre outras conclusões, a seguinte: «A CMVM sempre acompanhou as determinações do Banco de Portugal no sentido da constituição de provisões para eventuais encargos do BES com o reembolso do papel comercial em caso de incumprimento dos emitentes; A CMVM sempre esteve também de acordo com a posição assumida pelo Conselho de Administração do CC, publicada em comunicado de 14 de agosto de 214, na sequência de deliberação do Banco de Portugal do mesmo dia, bem como nas “Perguntas e Respostas mais Frequentes” patentes no sítio do CC até 15 de janeiro de 2015, no sentido de ser assegurado o reembolso do capital investido pelos seus clientes não institucionais; No quadro descrito nos dois pontos anteriores, a solução do problema dos clientes de retalho do ... que subscreveram papel comercial não oferece dúvidas; A CMVM reitera que, face ao teor da informação divulgada, entende que foram criadas expectativas jurídicas aos subscritores destes produtos, quanto à restituição do capital investido, susceptíveis de determinar ou de interferir com decisões quanto à manutenção ou não dos investimentos; Tendo em conta o referido nos pontos anteriores, a CMVM entende – e já o transmitiu nos fora e pelos meios próprios – que deverá haver a adoção pelo CC de soluções de compensação dos investidores não qualificados vítimas das más práticas de comercialização de papel comercial ... vendido aos balcões do Banco ...» 23. Ora como facilmente se conclui, é manifesto que a Autoridade Reguladora do mercado de valores mobiliários, entende, e bem, de que o CC S.A., aqui Réu, é responsável por encontrar a solução para que os Autores possam ser ressarcidos.

  19. Tal só pode acontecer não apenas pelas expectativas jurídicas criadas, como também, e não menos importante, por terem sido transferidas para o Réu CC S.A., as respectivas garantias e provisões para as identificadas obrigações, como é público, entre outras a Companhia de Seguros ..., avaliada então em perto de setecentos milhões de euros.

  20. Ora não pode o Réu CC S.A. receber no seu balanço tais garantias, e depois alguém, com uma ideia peregrina, e de uma forma arbitrária, vem entender que as responsabilidades relacionadas não seriam de sua responsabilidade, sendo que tal proceder violaria o princípio constitucional mais elementar da confiança e igualdade, e bem assim toda a legislação comercial que regula a transferência de activos e passivo de uma entidade a outra entidade.

  21. Aliás, comprovando-se o entendimento, o anterior Presidente da Comissão Executiva do CC assumiu publicamente de que o Réu reembolsaria o capital investido aos balcões do EE, conforme o mencionado comunicado, sendo que afinal até à presente data nada aconteceu.

  22. Veja-se ainda a este propósito, e como objecto de prova do já invocado, notícia pública publicada no “Correio da Manhã” de 20 de Julho de 2014 (antes de criação do CC) que sob o título “Bento garante pagamento”, vem mencionar o seguinte: «O ... garante que “tem...

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