Acórdão nº 1149/14.8T8LRS.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelHENRIQUE ARAÚJO
Data da Resolução20 de Março de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

PROC. N.º 1149/14.8T8LRS.L1.S1 REL. 18[1] * ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. RELATÓRIO “AA – ,,,, Lda.” intentou contra “BB, S.A.” acção declarativa comum, pedindo que a Ré seja condenada a pagar-lhe uma indemnização de clientela no montante de 1.343.611,88 €, acrescido de juros de mora à taxa legal em vigor, contados desde 15 de Novembro de 2013 até integral e efetivo pagamento.

Tendo a Ré deduzido, na contestação, a incompetência absoluta do tribunal, por preterição de tribunal arbitral voluntário, a Mmª Juíza julgou procedente essa excepção no despacho saneador e absolveu a Ré da instância.

A Autora interpôs recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa, tendo este revogado a decisão da 1ª instância e ordenado o prosseguimento dos autos no tribunal judicial.

Recorre agora a Ré, de revista, para o STJ, concluindo do seguinte modo: 1. O presente recurso de revista tem por objecto o Acórdão proferido nos autos, o qual julgou, "no essencial", procedente a apelação e revogou totalmente a sentença recorrida, decretando a sua substituição por uma outra que julgue improcedente a excepção de preterição de tribunal arbitral invocada pela Ré, ora Recorrente, e determinando o consequente prosseguimento da tramitação do processo.

  1. A Recorrente não pode conformar-se com o Acórdão recorrido porquanto o mesmo consagra uma solução jurídica incomportável, atento o caso concreto, violando as mais elementares garantias decorrentes da lei, assim como as legítimas expectativas da ora Recorrente quanto à aplicação da arbitragem em disputas originárias devido ou relacionadas com o contrato celebrado entre as Partes.

  2. As Partes celebraram, a 25 de Abril de 1996, um Contrato de Distribuição, pelo qual se vincularam a uma convenção de arbitragem, na modalidade de cláusula compromissória - por reportada a qualquer litígio, decorrente de uma concreta e específica relação contratual-, especificamente prevista na Cláusula 19, alínea c}.

  3. A cláusula compromissória vertida na cláusula 19, alínea c) do Contrato é válida e eficaz, preenchendo os requisitos legais inscritos na Lei n.º 31/86, de 29 de Agosto, então aplicável, e, bem assim, na actual Lei n.º 63/2011, de 14 de Dezembro (Lei da Arbitragem Voluntária).

  4. A cláusula compromissória foi livre e esclarecidamente subscrita por ambas as Partes, demonstrando a real vontade destas de submeter todo e qualquer litígio que tivesse origem ou fosse decorrente do contrato de distribuição celebrado pelas Partes, a um Tribunal Arbitral a constituir em Barcelona.

  5. Entendem os Venerandos Desembargadores, no acórdão recorrido, que a cláusula compromissória respeita somente a questões relativas a uma "quebra ou violação do contrato" e que o seu âmbito de aplicação se encontra limitado a estas questões. Mal, no entender da Recorrente.

  6. O entendimento vertido no acórdão recorrido quanto ao âmbito de aplicação da cláusula compromissória subtrai todos os efeitos garantísticos advenientes da segurança e confiança jurídica que se impõem, subvertendo as prerrogativas conferidas pela lei nesta matéria, além de frustrar as legítimas expectativas da ora Recorrente de, ao ser assinado o referido Contrato, ver todos os litígios submetidos ao Tribunal Arbitral da Cidade de Barcelona.

  7. A cláusula compromissória subscrita pelas Partes é clara ao referir-se a litígios que surjam ao abrigo ou em conexão com o Contrato ou relacionadas com qualquer alegada violação do Contrato, estando as questões sub judice claramente abrangidas pelo seu âmbito de aplicação.

  8. O pedido e a causa de pedir formulados nos autos resultam da relação jurídica emergente do contrato de distribuição que consagra a cláusula arbitral, inserindo-se no seu âmbito de aplicação.

  9. A cláusula compromissória no contrato de distribuição de onde emergem os pedidos formulados nos presentes autos produz necessariamente efeitos sobre as respectivas pretensões substantivas e processuais, não fazendo qualquer sentido que se faça aqui uma cisão sobre as matérias sujeitas à cláusula arbitral.

  10. Como decidiu o tribunal de primeira instância, e bem: "analisando a cláusula contratual supra citada, do ponto de vista de um declaratário normal, e de harmonia com o disposto nos arts. 236º e 238º do CC, somos levados a concluir que as partes subscreveram cláusula compromissório pela qual se comprometeram a resolver conflitos emergentes ou relacionados com o contrato celebrado, segundo a lei espanhola e mediante tribunal arbitral situado na cidade de Barcelona." 12. O entendimento vertido no acórdão recorrido conduz, inclusivamente, a uma clara violação da máxima pacta sunt servanda.

  11. Não obstante, e como refere, e bem, o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, uma das questões a decidir nos presentes autos é saber se é ou não devida uma indemnização de clientela à Recorrida. Para responder à questão colocada, o tribunal que conheça do mérito da acção terá necessariamente de analisar e decidir sobre matérias relativas à "quebra ou violação do que se encontra estipulado em qualquer das cláusulas desse contrato".

  12. Para conhecer da questão relativa à atribuição, ou não, de indemnização de clientela o Tribunal que conheça da questão sempre terá de apreciar as matérias atinentes ao incumprimento contratual que terão estado na origem da cessação do contrato sub judice, desde logo atendendo à defesa apresentada nos autos pela aqui Recorrente.

  13. A Recorrente entende que o contrato sub judice é um contrato de distribuição e não de concessão comercial. Não obstante, e ainda que equacionando a aplicação do regime emergente do Decreto-Lei n.º 178/86, de 3 de julho, importa notar que a lei é clara ao prever que a indemnização de clientela não é devida quando o contrato haja cessado por motivo imputável ao agente (nesse sentido, o n.º 3 do artigo 33.º do aludido Decreto-Lei n.º 178/86, de 3 de julho).

  14. E isto independentemente de a cessação do contrato ter operado por denúncia ou resolução - nesse sentido o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Proc. nº 06A027, de 7 de Março de 2006, disponível para consulta em www.dgsLpt.

  15. Para conhecer da questão de saber se é ou não devida indemnização de clientela, sempre terá o tribunal de conhecer e decidir se a cessação do contrato se deve, ou não, a razões imputáveis ao agente e, como tal, conhecer e decidir sobre questões atinentes ao incumprimento do contrato - matéria essa que, em face da sentença e acórdão proferidos nos presentes autos, é inegável e indubitavelmente da competência exclusiva dos tribunais arbitrais.

  16. Foram os inúmeros incumprimentos e violações do contrato e da lei por parte da Recorrida que determinaram a cessação do contrato de distribuição, sendo que o conhecimento de tais incumprimentos e violações - da competência exclusiva dos tribunais arbitrais - se impõe como juízo prévio ao conhecimento e determinação da atribuição, ou não, da indemnização de clientela.

  17. Ainda que seguindo a interpretação vertida no acórdão recorrido - a qual não se aceita -...

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