Acórdão nº 907/15.0T8PTG.E1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelTOMÉ GOMES
Data da Resolução08 de Março de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na 2.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I – Relatório 1. AA (A.) intentou ação declarativa, sob a forma de processo comum, em 26/06/2015, contra a BB - Companhia de Seguros, S.A.

(R.

), alegando, no essencial, o seguinte: .

A A. que é a única herdeira por óbito do seu filho CC, falecido no dia 22/12/2012; .

Este e a sua companheira DD, conjuntamente, haviam adquirido, por compra e venda celebrada em 29/08/2006, uma fração autónoma em prédio para habitação; .

Para tal, ambos contraíram um empréstimo hipotecário no valor de € 125.000,00, junto da Caixa Geral de Depósitos, responsabilizando-se, solidariamente, pelo respetivo pagamento; .

No ato da referida escritura, de acordo com o clausulado da mesma, celebraram contratos de seguro facultativo do Ramo 11 Vida Grupo, contratados pelo falecido CC para pagamento do capital seguro, em caso de morte, nos valores de € 110.000,00 e € 15.000,00, respetivamente, devidos à Caixa Geral de Depósitos, que ali figura como beneficiária; .

As respetivas apólices estavam em vigor à data do falecimento de CC, estando, nessa data, em dívida à Caixa Geral de Depósitos, cerca de € 99.289,14 e € 13.539,45; .

Todavia, interpelada para tanto, a R. seguradora declinou a responsabilidade pelo pagamento do capital seguro, invocando que o segurado ingeriu bebidas alcoólicas nos momentos que precederam a sua morte; .

Porém, o segurado morreu em consequência das lesões sofridas em agressão, conforme resulta do teor do acórdão condenatório de EE; .

Desde a data da morte de CC, nem a A. nem a companheira do falecido procederam ao pagamento do mútuo, em consequência do que a Caixa Geral de Depósitos interpôs ação executiva, para cobrança dos respetivos valores, que corre termos sob o n.º 622/15.5T8PTG do Tribunal da Comarca de ….

Concluiu a A. a pedir que a R. fosse condenada a pagar à Caixa Geral de Depósitos (CGD), no âmbito das invocadas Apólices Vida, a quantia que, à data do decesso de CC, estava em dívida, no valor aproximado de € 112.825,59, no âmbito do alegado contrato de mútuo celebrado por aquele falecido e companheira DD com a CGD, bem como nos juros vencidos desde então e vincendos, em valor correspondente ao que é reclamado por esta na execução n.º 622/15.5T8PTG.

Requereu ainda a A. a intervenção principal de DD e da Caixa Geral de Depósitos.

2.

A R. contestou, por via excetiva, alegando que: .

O sinistro em causa se encontra excluído das condições gerais do contrato apólice vida Grupo n.º 9…2, nos termos da estipulação contratual constante da cláusula 5.ª, parágrafo 5.1, al. b), sob a epigrafe “Exclusões aplicáveis a todas a coberturas” das condições gerais da apólice, nos termos da qual: “Estão sempre excluídas do âmbito de todas as coberturas do seguro as seguintes situações: (…) b) - Ações ou omissões praticadas pela Pessoa Segura quando acuse consumo de produtos tóxicos, estupefacientes ou outras drogas fora da prescrição médica, bem como quando lhe for detectado um grau de alcoolémia no sangue superior a 0,5 gramas por litro”.

.

De acordo com o relatório do INML, aquando do evento, o segurado apresentava uma taxa de alcoolemia no sangue de 1,97 g/l, que determina necessariamente, a par da diminuição das capacidades de vigilância, perturbação dos reflexos e da coordenação motora, também uma influência no comportamento individual, na capacidade de avaliação dos acontecimentos, causando euforia associada a comportamentos temerários e irrefletidos ou mesmo inconscientes.

.

Na altura dos acontecimentos, conforme resulta da matéria de facto provada constante do acórdão que condenou EE, como autor do homicídio do aqui segurado, a morte deste ocorreu na sequência de interpelações que ele dirigira àquele arguido e de envolvimento físico entre ambos.

.

Foi, pois, conduta do segurado que desencadeou todo o processo causal que culminou na sua morte, quando o mesmo se encontrava embriagado.

Nessa base, concluiu a R. pela improcedência da ação com a sua consequente absolvição do pedido.

3.

Foi deferida a intervenção de DD e da CGD, por se considerar terem interesse idêntico à A., respetivamente na qualidade de beneficiária do seguro e de mutuária.

4.

Citada, veio a CGD declarar fazer seu o articulado da A, esclarecendo que: .

Existem dois contratos de mútuo, ambos objeto de seguro de vida grupo com a R. BB, sendo que a A. apenas juntou comprovativo documental respeitante à outorga de um deles – o mútuo no montante de € 110.000,00; .

Porém, foi celebrado também outro contrato de mútuo em 29/08/ 2006, pelo montante de € 15.000,00; .

Assim, em 22/12/2012 - data do óbito de CC – o capital em dívida ascendia aos seguintes valores: € 99.473,74, relativamente ao mútuo de € 110.000,00; € 13.564,62, quanto ao mútuo de € 15.000,00.

5.

Realizada a audiência final, foi proferida sentença de fls. 152-162, datada de 26/09/2016, a julgar a ação procedente, condenando-se a R. BB - Companhia de Seguros, S.A., a pagar à CGD, o capital em divida nas apólices acima identificadas, bem como os juros vencidos desde então e vincendos, correspondendo ao valor exequendo na ação executiva n.º 622/15.5T8PTG e que, em 15/04/2016, era de € 130.246,23.

6.

Inconformada com tal decisão, a R. recorreu, em sede de impugnação de facto e de direito, para o Tribunal da Relação de … que, através do acórdão proferido a fls. 198-228, datado de 27/04/2017, julgou, por unanimidade, improcedente a apelação confirmando a sentença recorrida. 7.

Desta feita, vem a R. pedir revista excecional, ao abrigo das alíneas a), b) e c) do artigo 672.º do CPC, tendo sido proferido o acórdão de fls. 360-363/v.º, datado de 20/12/2017, pela formação dos três juízes deste Supremo Tribunal a que se refere o n.º 3 do mesmo artigo, a considerar verificado o pressuposto previsto na sobredita alínea a) respeitante à relevância jurídica da questão em apreço para uma melhor aplicação do direito, sem necessidade de apreciar os demais pressupostos invocados. 8.

A Recorrente formulou, no que ora releva, as seguintes conclusões recursórias: 1.ª – A questão a apreciar no recurso resulta da necessidade de determinação de um regime interpretativo de uma cláusula comum a uma generalidade de contratos de seguro e que têm vindo a obter decisões díspares no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito; 2.ª - Neste âmbito, cumpre apreciar e decidir se a referida cláusula de exclusão se reconduz ao da verificação objetiva de que no momento do sinistro e na pessoa do segurado, foi detetado um volume de álcool no sangue superior a 0.5 g/l. bastando-se a existência desse grau de alcoolemia no momento da ação ou omissão causadora da morte, ou se pelo contrário se terá de se verificar um nexo causal entre a alcoolemia e a ação ou omissão que determinou a morte da pessoa segura.

  1. - Acresce que a situação dos presentes autos tende a “ultrapassar os limites da situação singular contendo uma questão bem caracterizada, passível de se repetir em casos futuros”, dado que situações de existência de cláusulas de exclusão por existência de um certo grau de alcoolémia, habitualmente têm lugar no âmbito dos contratos de seguros de vida, celebrados pela generalidade das Seguradoras, que não só a ora Recorrente, e cujo enquadramento e interpretação carece de concretização por parte do STJ, por forma a garantir a certeza jurídica no tratamento das mesmas, 4.ª - Encontra-se verificada “in casu” a clara necessidade desta revista para que a pronúncia que venha a emitir sobre a questão em apreço possa servir de orientação para os restantes tribunais, por forma a assegurar “uma melhor aplicação...

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