Acórdão nº 1240/15.3T8GRD.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Março de 2018
Magistrado Responsável | ANTÓNIO LONES DANTAS |
Data da Resolução | 08 de Março de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I AA instaurou a presente ação para impugnação da regularidade e licitude do despedimento apresentando o competente requerimento, mediante o qual deduziu oposição ao despedimento promovido por «BB, LDA».
Na audiência de partes, frustrando-se a composição amigável do litígio, apresentou o empregador o articulado motivador do despedimento no qual sustentou a regularidade e licitude do despedimento, invocando, à cautela, a responsabilidade do Estado nos termos do artigo 98º-N, nº 1, do Código de Processo do Trabalho, bem como as deduções previstas no artigo 98º-O do mesmo Código.
Contestou o trabalhador, alegando a falsidade do processo disciplinar – matéria em relação à qual requereu a condenação do empregador, como litigante de má-fé, em indemnização de valor não inferior a € 5.000,00 – e sustentando a invalidade do procedimento disciplinar, por violação do direito de defesa do trabalhador. Alegou ainda a violação do disposto no artigo 357º, nº 4, do Código do Trabalho, impugnando os fundamentos invocados pelo empregador para o despedimento.
Deduziu ainda reconvenção e concluiu pedindo que o Tribunal: 1. Declare inválido, nos termos do artigo 382º, nº 2, alínea c), do Código do Trabalho, o procedimento disciplinar que conduziu ao despedimento e consequentemente condene o empregador a indemnizar o trabalhador nos termos do artigo 389º, nº 1, do Código do Trabalho e a reintegrar o trabalhador, nos termos da alínea b) do referido nº 1 do artigo 389º, sem prejuízo de o trabalhador vir a optar por uma indemnização, nos termos do disposto no artigo 391º do Código do Trabalho; e ainda condene o empregador no pagamento ao trabalhador de todas as prestações pecuniárias vincendas até à data do trânsito em julgado da sentença, a liquidar em execução de sentença, tudo acrescido de juros, à taxa legal, até integral pagamento, conforme o disposto no artigo 390º. Caso assim não se conceda: 2. Declare improcedente a justa causa invocada pelo empregador e consequentemente seja declarado ilícito o despedimento comunicado ao trabalhador, com as legais consequências, condenando-se o empregador ao pagamento de uma indemnização ao trabalhador, nos termos do artigo 389º, nº 1, alínea a), do Código do Trabalho, e a reintegrar o trabalhador, sem prejuízo deste vir a optar por uma indemnização, conforme o previsto no artigo 391º do Código do Trabalho; e ainda no pagamento ao trabalhador de todas as prestações pecuniárias vincendas até à data do trânsito em julgado da sentença, a liquidar em execução de sentença, tudo acrescido de juros, à taxa legal, até integral pagamento. Caso assim não se conceda: 3. Declare abusiva a sanção disciplinar de despedimento aplicada ao trabalhador, nos termos do artigo 331º, nº 1, al b), e/ou alínea d), e, em consequência, seja a empregadora condenada a indemnizar o trabalhador, nos termos gerais e a reintegrar o trabalhador, sem prejuízo deste vir a optar por uma indemnização nos termos do artigo 392º, nº 2, e ainda condenar no pagamento ao trabalhador de todas as prestações pecuniárias vincendas até à data do trânsito em julgado da sentença, a liquidar em execução de sentença, tudo acrescido de juros, à taxa legal, até integral pagamento.
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Condene o empregador no pagamento do trabalho noturno e suplementar efetivamente prestado pelo trabalhador.
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Condene o empregador como litigante de má-fé, nos termos do artigo 542º, nº 2, do Código de Processo Civil, e consequentemente seja condenado ao pagamento de uma indemnização, a favor do trabalhador, em valor não inferior a € 5 000,00.
A ação instaurada prosseguiu seus termos e veio a ser decidida por sentença de 30 de abril de 2017, que integrou o seguinte dispositivo: «I. Na procedência da ação, julgar regular e lícito o despedimento do trabalhador AA, promovido pelo empregador «BB, Lda».
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Julgando parcialmente procedente a reconvenção, condenar o empregador «BB, Lda» a pagar ao trabalhador AA a importância de € 1 453,19 (mil quatrocentos cinquenta e três euros dezanove cêntimos), acrescida da quantia que se vier a determinar em incidente de liquidação, respeitante ao trabalho suplementar prestado pelo trabalhador AA no período de 11 de agosto a 31 de dezembro de 2010 e nos anos de 2012 e 2015, tendo como limite uma hora de trabalho suplementar por cada dia útil de trabalho efetivamente prestado.
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Absolver o empregador «BB, Lda» de todos os restantes pedidos formulados pelo trabalhador AA.
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Julgar não verificada a litigância de má-fé do empregador «BB, Lda».
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Fixar o valor da causa em € 109 585,77 (cento e nove mil quinhentos oitenta e cinco euros setenta e sete cêntimos).
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Condenar o empregador «BB, Lda» e o trabalhador AA no pagamento das custas do processo, na proporção de 2% (dois por cento) para o empregador e 98% (noventa e oito por cento) para o trabalhador.» Inconformado com esta decisão, dela apelou o autor para o Tribunal da Relação de Coimbra que conheceu do recurso, por acórdão de 29 de setembro de 2017, nos seguintes termos: «VI – Termos em que se delibera julgar a apelação parcialmente procedente em função do que se revoga a decisão impugnada pelo que se decide: Declarar a ilicitude do despedimento do trabalhador AA promovido pela empregadora BB, Lda e, em consequência, (i) condenar esta a reintegrá-lo no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade e (ii) a pagar-lhe todas as retribuições que aquele deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito da decisão do tribunal, acrescidas dos juros de mora, à taxa legal, a contar da data do trânsito em julgado da decisão que vier a declarar a ilicitude do despedimento.
Custas a cargo do recorrente e da recorrida na proporção de 1/10 para o primeiro e 9/10 para segunda.» Irresignada com esta decisão, dela recorre a Ré de revista para este Supremo Tribunal, integrando nas alegações apresentadas as seguintes conclusões: «a) À luz do disposto no artigo 80.° do CPT é admissível a revista, o que se requer; b) Na decisão recorrida o Recorrido solicitou à Relação de Coimbra a alteração da matéria de facto dada como não provada, mas não a alteração da matéria de facto dada como provada, solicitando que se desse como provado a conclusão vertida sob a letra "m" da matéria de facto dada como não provada; c) O Tribunal de primeira instância fixara a propósito da matéria de facto dada como não provada (maxime sob a letra "m") que "o trabalhador (Recorrido) logo informou o empregador (Recorrente) que, por motivos de saúde, seria difícil a execução de tais tarefas associadas à recolha do leite, porquanto os caminhos são feitos em más condições, que sujeitam o veículo a trepidações prejudiciais à sua condição clínica"; d) Mas na matéria de facto dada como provada, foi fixado (e sujeito à dupla conforme pelo Tribunal recorrido) que: "O empregador (Recorrente) procede à recolha do leite junto dos produtores de leite, pelo menos, dos distritos da Guarda e de Viseu", (cf. Ponto 9 da matéria de facto da sentença, não alterada pelo acórdão); "Tais tarefas implicam que os motoristas conduzam uma viatura da empresa, destinada à recolha de leite, até à propriedade dos pequenos produtores de leite dos referidos distritos, desçam da referida viatura de forma a ligar uma mangueira do carro do leite a um depósito já previamente instalado nos terrenos dos pequenos produtores de leite, abram a tampa do depósito e injetem a mangueira do carro do leite nesse depósito e pressionem o botão da bomba de extração do leite. Fechem a referida tampa do depósito, recolocando a mangueira no carro de transporte do leite, conduzam o carro do leite de regresso à fábrica, para que seja vazado o conteúdo do depósito num tanque" (cf. Ponto 10 da matéria de facto da sentença, não alterada pelo acórdão); "Em maio de 2015, o gerente do empregador (Recorrente) deu ordem ao trabalhador (Recorrido) para fazer a "volta do leite" em ..., sendo que esta volta compreende as deslocações mais pequenas e (...) ... tem 25,71 km2 de área e, entre a fábrica e o centro de ..., distam 25,5 km" (cf. Pontos 12 e 15 da matéria de facto da sentença, não alterada pelo acórdão); " A volta do leite não é feita todos os dias" (cf. Ponto 13 da matéria de facto da sentença, não alterada pelo acórdão).
e) Todo o processo gira, portanto, à volta de uma ordem dada diretamente pelo gerente da Empregadora (Recorrente) ao trabalhador (Recorrido).
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O Tribunal Recorrido ponderada a prova testemunhal - que apreciou ex novo - concluiu que "a verdade é que apenas se provou que o trabalhador disse que não ia aguentar. Assim, não se pode afirmar que o trabalhador transmitiu ao representante do empregador as razões para a recusa, designadamente os problemas de saúde (...) não resulta, contudo, de qualquer meio de prova, que ao empregador tivesse sido transmitido que essa incapacidade se devia à execução, durante poucos dias, como admite o trabalhador, da tarefa de condução na volta do leite".
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Apesar da prova produzida, no Acórdão conclui-se que "por outro lado, é das regras da experiência que a recolha do leite se faz primordialmente por caminhos agrícolas, não asfaltados, que dão acesso às explorações (...) cuja superfície é propícia a provocar trepidações e saltos nos veículos que nela circulam", e por nessa circunstância adita à matéria de facto dois novos pontos: "O trabalhador informou o empregador que não iria aguentar a execução das tarefas associadas à recolha do leite e esta recolha é feita por caminhos que sujeitam o veículo a trepidações".
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Os pontos aditados entram em contradição com a demais prova dada como matéria assente, sendo que estes aditamentos não o foram com base na reapreciação da prova, i) É o próprio Tribunal a quo a referir que de modo algum resulta demonstrado e provado que o Recorrido tenha informado o Recorrente de um qualquer motivo para a recusa, bem como sendo a volta de ... (a que estava na génese da recusa) a ordem dada, esta...
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