Acórdão nº 647/11.0TBVPV.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelTÁVORA VICTOR
Data da Resolução01 de Março de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

1. RELATÓRIO.

Acordam na 7ª Secção cível do Supremo Tribunal de Justiça.

FUNDO DE GARANTIA AUTOMÓVEL, integrado no Instituto de Seguros de Portugal, com sede na …, …, Lisboa, intentou, em 24.11.2011, contra AA - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.

, com sede na Rua …, …, em Lisboa e, subsidiariamente, contra BB, residente na Rua …, …, 9700 -… Ribeirinha, acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, através da qual pediu que: 1. O condutor do veículo ...-...-BF seja considerado único e exclusivo culpado pela produção do acidente aqui em crise, e, consequentemente, 2. A Ré, AA - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A., seja condenada no pagamento da quantia de € 122.767,47, acrescida dos juros legais, vencidos e vincendos, contados desde a interpelação até efectivo e integral pagamento e incrementados em 25%, e ainda ao pagamento das despesas que o ora Autor vier a suportar com a cobrança do reembolso que serão oportunamente liquidadas em ampliação do pedido ou em execução de sentença, bem como em custas e procuradoria; 3. Subsidiariamente, para o caso de se provar que o veículo ...-...-BF circulava sem beneficiar de seguro automóvel válido e eficaz à data dos factos, ser o Réu subsidiário condenado nos precisos termos requeridos em 2.

Fundamentou o Autor a sua pretensão, no essencial, da seguinte forma: No dia 3 de Agosto de 2006, ocorreu um acidente de viação quando o segundo Réu conduzia um Opel Corsa vermelho, de 5 lugares, com a matrícula ...-...-BF; O Réu conduzia o BF acompanhado de CC, que seguia ao seu lado; No caminho até ao destino, o Réu passou pela freguesia de … para dar boleia a DD e EE, conforme haviam combinado; DD e a EE entraram no BF para o banco traseiro; Após a entrada daquelas, o segundo Réu mandou-as “apertar as fraldas”, acrescentando que tinha acabado de andar num carro de rally e informando que iriam circular a uma velocidade elevada; O segundo Réu arrancou, e seguiu a uma velocidade nunca inferior a 120 km/h; Ao descrever uma curva, o segundo Réu perdeu o controlo do BF, entrou em despiste, acabando por embater num muro ali existente; A colisão ficou a dever-se única e exclusivamente ao comportamento culposo do ora segundo Réu que, não obedecendo às mais elementares regras de circulação rodoviária, nomeadamente ao circular com velocidade excessiva, praticou uma conduta imprudente e irresponsável, provocando o acidente; Paralelamente, agiu com desconhecimento prático e em desacordo com as regras de aptidão para a condução – o que revela imperícia; com falta de atenção imposta pelos cuidados ou precauções que o dever geral de precaução aconselha – o que constitui inconsideração; e sem usar a diligência exigida pelas circunstâncias concretas para evitar o evento – o que integra negligência; Em todo este comportamento do condutor do veículo BF, segundo Réu, radica a causalidade do sinistro; O segundo Réu iniciou a condução com intentos perigosos, dizendo às passageiras que apertassem as fraldas e fazendo referência ao carro de rally em que havia circulado recentemente, donde se retira que o segundo Réu podia perfeitamente prever o que viria a acontecer e conformou-se com a situação, que não o demoveu, violando, assim, entre outros, o disposto nos artigos 18.º e 24.º do Código da Estrada; A conduta do segundo Réu consubstanciou a prática de um crime de ofensa à integridade física por negligência e dois crimes de homicídio por negligência, dando origem ao inquérito com o processo n.º 323/06.5PAVPV, que correu termos neste tribunal; O risco emergente da circulação do BF encontrava-se, à data do acidente, transferido para a primeira Ré, AA, mediante um contrato de seguro titulado pela apólice n.º 003…8; Contactada a seguradora referida, a mesma disse que o veículo BF não estava coberto, naquela data, uma vez que a referida apólice seria nula em virtude de terem sido prestadas declarações inexactas por parte do tomador; Está criada uma situação em que há fundadas dúvidas sobre o verdadeiro titular do dever de indemnizar, já que, a provar-se a existência de seguro válido à data dos factos, é a seguradora parte legítima no presente pleito, ou, caso contrário, será o Réu subsidiário parte legítima no presente dissídio.

Como causa directa e necessária do referido embate, resultou a morte de CC, de 20 anos e de DD, de 16 anos e ferimentos graves sofridos por EE, com 18 anos à data do acidente; Os referidos falecimentos implicaram sofrimentos inarráveis aos seus herdeiros e familiares mais próximos, sendo que a morte dos jovens não foi imediata, sofrendo ambos os jovens, nesse hiato de tempo que decorreu entre o acidente e a morte, dores incomensuráveis; CC deixou como seus herdeiros os seus pais, FF e GG; DD deixou como herdeiros os seus progenitores HH e II; Do acidente resultaram danos para a EE, com 18 anos à data do acidente - fractura da mandíbula, tendo ficado internada no Hospital de …. de 06.08.2006 a 11.08.2006, onde foi submetida a intervenção cirúrgica à mandíbula; Posteriormente foi acompanhada pelo Dr. JJ, na Clínica Dentária e Maxilofacial, em …; EE e os herdeiros da DD e do CC, face à posição assumida pela primeira Ré, contactaram o Autor no sentido de este proceder ao pagamento das indemnizações correspondentes; Instaurado o competente processo de averiguações, a que foi atribuído o n.º 72255, concluiu o Autor dever pagar, ao abrigo do artigo 50.º do Decreto-lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, as seguintes verbas: a) À Clínica Dentária Maxilofacial (…), a quantia de € 2700,00, em virtude da assistência prestada à lesada EE; b) À própria lesada EE, a título de despesas médico/medicamentosas, a quantia de € 446,16, paga em 24.11.2009; c) Aos herdeiros de DD, em 26.08.2009, o Autor pagou a quantia de € 81.000,00, assim discriminada: 1. € 30.000,00 (15.000,00 por cada progenitor), a título do sofrimento de perda da pessoa; 2. € 1.000,00, a título de sofrimento da própria vítima; 3. € 50.000,00, a título da violação do direito à vida; 4. À mãe de CC, em 04.03.2010, o Autor pagou a quantia de € 36.250, assim discriminada: 5. € 10.000,00, a título de sofrimento perda da pessoa; 6. € 1.250,00, a título de sofrimento da própria vítima; 7. € 25.000,00, a título de violação do direito à vida; Para prevenir uma hipótese de ilegitimidade passiva, formulou o Autor, o pedido, subsidiariamente, contra o Réu subsidiário, nos termos do disposto no artigo 31.º-B do Código de Processo Civil, invocando que o Réu subsidiário será sempre responsável ao abrigo do n.º 3 do artigo 25.º do Dec. Lei n.º 522/85 de 31 de Dezembro, entendimento legal que veio a ser acolhido no artigo 54.º, n.º 3 do novo diploma legal - Lei do Seguro Obrigatório - Dec. Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto.

Concluiu o Autor que se encontra sub-rogado nos direitos dos lesados, nos termos do n.º 1, n.º 3 e n.º 4 do artigo 54.º do Dec. Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto, sendo parte legítima nesta acção, assistindo-lhe o direito de exigir dos Réus a indemnização satisfeita, tendo ainda direito ao juro de mora legal e ao reembolso das despesas de liquidação e cobrança que houver feito.

Citados, apenas a Ré seguradora apresentou contestação, em 27.01.2012, aceitando a responsabilidade e dinâmica do acidente, tal como alegado, impugnou os valores pagos, bem como a sua responsabilidade no seu pagamento, excepcionando a existência de um contrato de seguro inválido, que a desonera desse pagamento, tudo se passando como se não existisse seguro que cobrisse aquela situação.

Concluiu a Ré, pedindo que seja julgado procedente a excepção invocada, decidindo-se pela sua absolvição do pedido.

O Autor apresentou réplica, em 25.06.2012, pugnando pela improcedência da arguida excepção, defendendo que o contrato de seguro se encontrava válido e eficaz à data do sinistro, não podendo a Ré seguradora furtar-se aos direitos e deveres a ele emergentes.

Concluiu, o Autor, pedindo a condenação dos Réus nos termos constantes da petição inicial.

Dispensada a audiência preliminar, foi proferido despacho saneador, em 11.03.2013, elaborada a condensação com a fixação dos Factos Assentes e a organização da Base Instrutória.

Em 15.03.2013, o Autor, FUNDO DE GARANTIA AUTOMÓVEL, deduziu ampliação do pedido, nos termos do n.° 2, do artigo 273.° do Código de Processo Civil, tendo por base os fundamentos seguintes: 1. O Autor intentou a presente acção em 24 de Novembro de 2011.

2. Com a propositura dessa acção o Autor pretende ser reembolsado dos prejuízos sofridos com a liquidação de indemnizações processadas a lesada EE, aos herdeiros de CC e aos herdeiros de DD, na sequência do acidente de viação ocorrido em 3 de Agosto de 2006; 3. O Autor, nesse articulado, conclui pela responsabilidade do condutor do...

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