Acórdão nº 67525/14.6YIPRT.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA DO ROSÁRIO MORGADO
Data da Resolução22 de Março de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – Relatório 1. “AA - Construções e Empreendimentos Urbanisticos, Lda” instaurou procedimento de injunção, transmutado em ação declarativa, contra “BB - Exploração Hoteleira, Lda” e CC pedindo a condenação dos réus a pagar-lhe a quantia de EUR 82.690,10, acrescida de juros de mora vincendos até integral pagamento.

Para tanto, alegou, em síntese, que: Por contrato de arrendamento, datado de 1.1.2007, deu de arrendamento à ré a loja sita na rua …, nº …-B, em Lisboa, mediante o pagamento mensal de EUR 1.200,00.

O réu interveio no contrato, como fiador.

A ré, contudo, nos períodos indicados no requerimento inicial, não procedeu ao pagamento de rendas no montante de EUR 41.962,14.

Em face disso, a autora pediu a condenação dos réus a pagar-lhe a importância em dívida, a título de rendas, uma indemnização igual a 50% daquele quantitativo e ainda os respectivos juros de mora.

  1. Contestou o réu, alegando, em síntese, que os montantes das rendas se encontram pagos.

  2. No decurso da ação, a autora reduziu o pedido a “EUR 53,943,00, acrescidos de juros de mora à taxa legal desde a citação até efetivo pagamento”.

  3. Na 1ª instância, foi proferida sentença que absolveu os réus do pedido.

  4. Inconformada com a sentença, dela apelou a autora, tendo o Tribunal da Relação de … proferido acórdão em que, julgando parcialmente procedente a apelação, condenou, solidariamente, os réus a pagar à autora a quantia de EUR 37.469,00, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação da ré até integral pagamento.

  5. Inconformado com o decidido pela Relação, o réu veio interpor recurso para este Supremo Tribunal.

    Nas suas alegações, em conclusão, disse: 1. No douto acórdão, e com interesse para o objeto do presente recurso, foi decidido julgar parcialmente procedente a apelação apresentada pela Autora e, em consequência, condenar o Recorrente a pagar à Autora a quantia de € 37.469,00, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação.

  6. Entende o Recorrente que deverá o acórdão ser revisto, devendo, em consequência, manter-se a decisão proferida em sede de Primeira Instância.

    I - Da Nulidade do acórdão por excesso de pronúncia 3. Em sede de conclusões, no recurso apresentado pela Autora da decisão de primeira instância, submetia-se à reapreciação do Tribunal da Relação, apenas e tão-somente, a impugnação das matérias vertidas nos pontos 23 (“A Autora omitia a emissão de recibos de quitação das rendas") e 25 (“As rendas peticionadas estão, pelo menos, parcialmente pagas”) da matéria dada como provada.

  7. Assim, andou mal o Tribunal da Relação ao considerar como questões a resolver (citando o douto acórdão recorrido): "Saber se ocorre erro na apreciação dos pontos de facto da decisão recorrida: 23 "A Autora omitia a emissão de recibos de quitação das rendas" 25 "As rendas peticionadas estão, pelo menos, parcialmente pagas" e "Destes elementos emergiu com clareza para o tribunal que haverá rendas pagas, não se sabendo, porém, em que exato quantitativo",' e "Saber se ocorre na decisão recorrida erro na interpretação das disposições dos arts 342/2, 787, nºs 1 e 2 e 813 e 334 do CCiv.", Porquanto, em momento algum, tais premissas ou sequer disposições legais.

  8. Pelo que, o douto acórdão Recorrido ultrapassou largamente as questões que lhe foram submetidas para apreciação, quando relevou uma conclusão retirada pelo Tribunal de Primeira Instância, designadamente, "Destes elementos emergiu com clareza para o tribunal que haverá rendas pagas, não se sabendo, porém, em que exato quantitativo" e quando apreciou a aplicação e interpretação de determinados preceitos legais, porquanto estas não eram sequer do conhecimento oficioso, devendo portanto ser declarada a nulidade insuprível nos termos do artigo 615.º, n.º 1, al. d), in fine do Código de Processo Civil.

    Não obstante, unicamente à cautela, por mero dever de patrocínio e a título subsidiário, II - Da Nulidade do acórdão por omissão de pronúncia 6. Se pretendesse o Digm. Tribunal a quo apreciar a conclusão teria sempre de o fazer em toda a sua extensão e com base em todos os fundamentos em que aquela assenta e nunca apenas no ponto 23 e 25 da matéria dada como provada.

  9. Caso se entenda que andou bem o Digm. Tribunal a quo ao apreciar a conclusão alcançada pelo Tribunal de Primeira Instância, mais concretamente, "Destes elementos emergiu com clareza para o Tribunal que haverá rendas pagas, não se sabendo, porém, em que exato quantitativo, podendo mesmo dar-se o caso de estarem pagas na totalidade." teria de o ter feito uma exaustiva, no que respeita aos seus fundamentos e não apenas dos indicados nas alegações de recurso apresentadas, mais concretamente através da reapreciação dos pontos 6, 7, 18 a 27 da matéria de facto dada como provada, bem como, de outros factos instrumentais dados como assentes, porquanto apenas assim a referida conclusão era validamente entendida, o que não se verificou.

  10. Dessa forma, será de concluir que, caso se entenda que andou bem o Tribunal da Relação ao apreciar a referida conclusão, necessariamente teria de se concluir que, atendendo à forma superficial com que a mesma foi analisada, ignorando a sua total dimensão e fundamentos, incorreu em nulidade, desta feita por omissão de pronúncia, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, al. d) do Código de Processo Civil.

    III - Da Nulidade do acórdão por omissão de pronúncia - Inversão do ónus da prova 9. Acresce que, ao considerar que seria de apreciar se ocorre na decisão recorrida erro na interpretação das disposições dos arts. 342/2, 787, n.ºs 1 e 2 e 813 e 334 do CCiv., teria o Tribunal da Relação de verificar se haveria fundamento, ou não, para ter ocorrido inversão do ónus da prova, porém, em concreto e sobre a questão em que relevava discutir-se a questão da inversão do ónus da prova, nos termos do Artigo 344.º, n.º 2 do Código Civil, o Tribunal a quo absteve-se de se pronunciar.

  11. Mais, ao não considerar invertido o ónus da prova, o acórdão recorrido teria de desconsiderar a livre apreciação da prova por parte do Tribunal de primeira instância e ainda apreciar a conjugação de todos os elementos de prova e fundamentos, o que também não fez.

  12. Da análise da sentença, bem como, da respectiva fundamentação, dúvidas não podem restar que se encontram reunidas todas as condições necessárias para a inversão do ónus da prova, ou, em última instância, para uma livre apreciação da prova mas que em ambas as situações permitiram alcançar as conclusões jurídicas e de facto decididas em primeira instância, porém sem a devida análise e fundamentação, o Tribunal da Relação perfilhou entendimento diverso, omitindo uma análise que lhe era imposta, pelo que, incorreu em nulidade, por omissão de pronúncia nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, al. d) do Código de Processo Civil.

    Ainda que assim não se entendesse, mais uma vez unicamente à cautela e por mero dever de patrocínio, IV - Da Nulidade do acórdão por omissão de pronúncia - Abuso de direito 12. Em sede de sentença proferida em primeira instância, entendeu a meritíssima Juiz de Direito: "a presente ação se reconduz, na prática, à tentativa de fazer o fiador pagar por aquilo que a sociedade R., cujos sócios se confundem parcialmente com a A, poderia ter em dívida. Assim, mesmo a existir o direito da A, o que não se determinou, sempre este seria de obstaculizar no que concerne ao R., com fundamento na existência de abuso de direito, que nas modalidades supra elencadas, quer pelo relacionamento existente entre A e R.. " 13. Ora, em última instância, caso o Tribunal da Relação tivesse entendido de forma diversa da supra exposta, sempre se impunha a análise da decisão no que concerne à conclusão supra transcrita, estando obrigado o referido tribunal a pronunciar-se, em concreto, sobre a questão do abuso de direito e do entendimento pelo qual não o perfilha.

  13. Não obstante, facto é que, não só em primeira instância a Meritíssima Juiz faz constar da decisão que, ainda que não absolvesse os RR., sempre seria de concluir pela verificação do abuso de direito, como tal como tal verificação tem sido entendida como de conhecimento oficioso, pelo que, a sua análise se impunha.

  14. Ora, mais uma vez, a omissão de pronúncia quanto a esta matéria fere o douto acórdão de nulidade, nos termos do Artigo 615.º, n.º 1, al. d) do Código de Processo Civil.

    V - Da Violação ou errada aplicação da lei de processo - Inversão do ónus da prova 16. Andou mal o douto acórdão recorrido ao considerar, sumariamente, que não existe fundamento para que operasse a inversão do ónus da prova, nos termos do Artigo 344.º do Código Civil, tendo a Autora ora Recorrida logrado realizar a prova que lhe competia, bem como, a alegação do contrato, do montante das rendas e da falta de pagamento de rendas.

  15. Mais considerou que a Autora e ora recorrida logrou fazer prova e alegação da matéria que lhe competia, designadamente, contrato, montante das rendas e da falta de pagamento das rendas, não tendo, de outro modo, o ora Recorrente feito a demonstração do cumprimento, ou seja, do facto extintivo, nos termos do Artigo 342º, n.º 2 do Código Civil, não se verificando a presunção de culpa do credor contemplada no Artigo 1039º, n.º 2 do Código Civil.

  16. Porém, da mera análise dos autos, será forçoso concluir que a A. não logrou sequer provar os meses que considera efetivamente devidos, mais se dizendo que os cálculos por aquela apresentados também não sustentam sequer o alegado.

  17. Acresce que, e salvo o devido respeito e melhor entendimento, não pode o ora recorrente concordar com a distribuição do ónus da prova operada pelo Digm.º Tribunal a quo, em detrimento do plasmado na sentença de Primeira Instância.

  18. Com base nos inúmeros argumentos expendidos na...

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