Acórdão nº 3901/10.4TJNF.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelFÁTIMA GOMES
Data da Resolução27 de Fevereiro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I. RELATÓRIO 1.

Por acórdão da formação a que se reporta o art.º 672.º, n.º 3 do CPC, foi admitido o recurso de revista excepcional, limitando-se o seu âmbito ao conhecimento das questões enunciadas nos pontos 9 a 11 do acórdão: montante indemnizatório relativo a danos patrimoniais futuros emergentes de incapacidade e montante compensatório dos danos não patrimoniais do lesado.

Para a primeira questão, alude-se no acórdão do STJ à oscilação legal, doutrinal e jurisprudencial que se tem feito sentir sobre o tema, nomeadamente desde o DL 352/2007, de 23 de Outubro – que introduziu os pontos, em substituição da anterior referência que se fazia à incapacidade (para o trabalho) – sem que se tenha desenvolvido a referência ao valor dos “pontos”, havendo também falta de critério claro para encontrar um capital, que dê rendimento, que proporcione o que se deixou de auferir e se extinga no fim presumível da vida activa da pessoa visada, ao surgimento do dano biológico e dúvidas que o seu uso fazem surgir – tudo à luz da situação do caso concreto em que estamos perante um menor (10 anos).

Para a segunda questão, questiona-se como calcular o montante compensatório dos danos não patrimoniais do lesado.

  1. AA (que à data da instauração da presente acção era menor, tendo entretanto atingido a maioridade) intentou acção emergente de acidente de viação contra BB, CC, Lda., e Fundo de Garantia Automóvel, pedindo a condenação solidária de todos os RR., ou apenas do 3o Réu, a pagar-lhe a quantia total de € 39 500, sendo € 26 000 a título de indemnização por danos patrimoniais e € 13 500 a título de indemnização por danos não patrimoniais, bem como as despesas com futuros tratamentos, acrescidas de juros de mora legais desde a citação até efectivo e integral pagamento.

    Alegou que, em 20/01/2006, quando se encontrava parado na berma direita da Via Inter Municipal (VIM), junto à passadeira de peões existente no local, e se preparava para atravessar a faixa de rodagem da VIM, foi atropelado por um veículo automóvel ligeiro de mercadorias, de características não concretamente apuradas, cuja matrícula se desconhece, de cor branca, com a publicidade "CC", da propriedade do R. BB ou da Ré CC, Lda. ou de alguém cuja identidade também se desconhece, conduzido pelo R. BB, que não tinha seguro válido, ou por um veículo cuja matrícula e identidade do condutor não foi possível apurar, por se ter posto em fuga logo após o embate.

    Do embate decorreram danos que pretendeu ver indemnizados.

    Na 1ª instância, os montantes indemnizatórios foram fixados em: i) € 6 000,00 a título de indemnização pelo dano patrimonial futuro decorrente da perda da capacidade de ganho, ponderando o Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica atribuído ao Autor (IPG de 3 pontos), a idade do lesado à data do acidente (o A. fez 11 anos de idade no dia seguinte ao do acidente), o facto do A. ser na altura (como ainda é hoje) estudante, a sua esperança média de vida (que situou nos 75 anos), o valor do provável futuro salário mensal do A. (atenta a escolaridade já alcançada) que fixou em € 700 e a redução que deverá introduzir-se por a indemnização ser paga de uma só vez; ii) € 2 500,00 a título de compensação pelos danos não patrimoniais por ele sofridos.

    O Autor recorreu da decisão, tendo pedido que lhe fossem arbitrados, no mínimo, os seguintes montantes: i) € 19 500,00 a título de indemnização por danos patrimoniais futuros (perda de capacidade de ganho/dano biológico), partindo da previsibilidade de que auferiria um salário médio mensal de 1 000 durante 14 meses, quando ingressasse no mercado de trabalho, considerando, ainda, a IPG de 3%, o facto de ser previsível terminar a sua formação académica com 25 anos de idade, uma esperança média de vida de 80 anos e a redução de 25% por receber a quantia indemnizatória de uma só vez, o que conduziria ao seguinte resultado: € 1 000 x 14 meses = € 14 000 x 3% (IPG) = € 420 x 55 anos [80 - 25] = € 23 100,00 - € 5 775,00 (25% de redução) = € 17 325,00, e com recurso à equidade peticiona a quantia de € 19 500,00; ii) € 25 000,00 como compensação pelos danos não patrimoniais sofridos, tendo em conta os factores por ele enunciados nas alegações de recurso.

    O Tribunal da Relação de Guimarães veio a apreciar a pretensão indemnizatória, ponderando se se mostrava correctamente fixado o quantum indemnizatório, tendo em conta a factualidade provada e os critérios legais previstos para a reparação dos danos sofridos, bem como a jurisprudência existente nesta matéria e decidiu que o valor indemnizatório por danos patrimoniais futuros fixado pela Ia instância se encontrava ligeiramente desfasado dos elementos fácticos provados e carreados para os autos, justificando-se, segundo as regras da equidade, que o mesmo fosse aumentado para € 10 000,00 e a compensação global pelos danos não patrimoniais sofridos fosse fixada em € 8. 000,00.

    Inconformado o A. pediu revista, tendo a formação admitido o conhecimento do recurso pelo STJ limitado à questão indemnizatória.

  2. Nas conclusões do recurso, diz o recorrente (transcrição parcial em face das questões circunscritas pela formação): 1) (…) a 2); 3) O Autor/Recorrente não concorda com o valor indemnizatório que lhe foi atribuído a título de danos patrimoniais futuros, mais concretamente a título de perda de capacidade de “ganhos”/dano biológico.

    4) O Autor/Recorrente não concorda com o valor indemnizatório que lhe foi atribuído a título de danos não patrimoniais.

    5) (…) a 44); 45) Atendendo à matéria de facto dada como provada, mais concretamente às alíneas a), ll), mm), oo), pp) e qq) dos factos julgados provados e com interesse para a determinação do montante indemnizatório a atribuir ao Autor/Recorrente a titulo de danos patrimoniais, mais concretamente a titulo de dano biológico, deverá o mesmo ser fixado equitativamente em quantia nunca inferior a 19.500,00€ (Dezanove Mil e Quinhentos Euros).

    46) Tal montante indemnizatório, deverá ter em linha de conta, os seguintes fatores: 1) O A. AA à data do acidente de viação em apreço tinha 10 (dez) anos de idade, já que nasceu em ... de 1995.

    2) O A. ficou a padecer de um défice funcional permanente da integridade físico-psiquica fixável em 3 pontos, que implica maiores esforços no exercício da atividade habitual 3) O Autor, à data do acidente de viação descrito nos presentes autos, era estudante, frequentando o 5.º ano de Escolaridade na Escola Preparatória em ....

    4) O A. é atualmente estudante, encontrando-se a repetir a disciplina de matemática de 12º ano desde o ano letivo 2012/2013.

    5) O A. manifesta intenção frequentar um curso superior e formar-se na área das Ciências Tecnológicas.

    47) Atendendo à matéria de facto dada como provada, mais concretamente nas alíneas ee), ff), gg), hh), ii), jj), kk), nn), rr), ss), tt), uu) e vv) dos factos julgados provados e com interesse para para a determinação do montante indemnizatório a atribuir ao Autor/Recorrente a titulo de danos não patrimoniais, deverá o mesmo ser fixado equitativamente em quantia nunca inferior a 20.000,00€ (Vinte Mil euros).

    48) Tal montante indemnizatório, deverá ter em linha de conta, os seguintes factores: 1) Em resultado do acidente referido em e), o A. foi assistido no Centro Hospitalar do ..., E.P.E., em ..., no dia 20-01-2006.

    2) Apresentando nessa data traumatismo do tornozelo direito, e fractura do maléolo tibial direito.

    3) No Centro Hospitalar Do ..., E.P.E., em ... o A. foi radiografado e submetido a imobilização com tala gessada, tendo alta hospitalar para o domicílio nesse mesmo dia 20-01-2006.

    4) O A. foi acompanhado em consulta externa no Centro Hospitalar Do ..., E.P.E., em ... até 23-05-2006, data em que teve alta clínica.

    5) O A. andou com a perna engessada durante seis semanas.

    6) O A. andou com canadianas mais duas semanas.

    7) As lesões sofridas pelo A. determinaram-lhe: a) 1 (um) dia de défice funcional temporário total (incapacidade geral temporária absoluta); b) 124 (cento e vinte e quatro) dias de défice funcional temporário parcial (incapacidade geral temporária parcial); c) 45 (quarenta e cinco) dias de repercussão temporária na actividade profissional total (incapacidade temporária profissional total); d) 79 (setenta e nove) dias de repercussão temporária na actividade profissional parcial (incapacidade temporária profissional parcial). (quesito 61º da base instrutória).

    8) O A. ficou a padecer de repercussão permanente nas actividades desportivas e de lazer fixável no grau 3/7.

    9) O A. em consequência das referidas lesões sofreu dores.

    10) Num “Quantum Doloris” fixado no grau 4.

    11) O A. à data da ocorrência do acidente de viação descrito nos presentes autos era uma pessoa saudável.

    12) Era também uma pessoa alegre e confiante.

    13) Antes do acidente o A. praticava futebol, jogando nos infantis, e treinando pelo menos 2 vezes por semana.

  3. Vêm provados os seguintes factos, da 1ª instância, e com relevância para a decisão da causa [transcrição]:

    1. O A. AA nasceu em ... de 1995, e encontra-se registado como sendo filho de ... e de ..., (alínea A) dos factos assentes).

    2. A presente acção deu entrada em Juízo no dia 24/11/2010, sendo que o R. Rui foi citado em 30/11/2010. (alínea B) dos factos assentes).

    3. Mediante sentença, proferida, em 25/10/2010, transitada em julgado, no âmbito do processo comum singular que, autuado sob o n° 57/06.0GBVNF.P1, correu os seus termos pelo 2° Juízo Criminal deste mesmo Tribunal, foi o Io R. condenado numa pena de 65 dias de multa, à taxa diária de 20,00 euros, pela prática de um crime de ofensa à integridade física por negligência, p. e p. pelo art. 148°, n° 1 do Cód. Penal, o que perfaz a multa de 1.300,00 euros, perpetrado na pessoa do aqui A., em 20 de Janeiro de 2006, entre as 18:00 h e as 18:15 h, na Via Inter-Municipal (VIM), na freguesia de ..., deste concelho e comarca, tudo conforme consta do teor do documento junto aos autos de fls. 97 a 111, cujo...

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