Acórdão nº 6/05.3TTFAR.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Fevereiro de 2010

Magistrado ResponsávelSOUSA PEIXOTO
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : 1. A não audição do trabalhador na fase de inquérito não constitui nulidade do processo disciplinar, por tal não se traduzir numa violação do direito de defesa do trabalhador posteriormente alvo de procedimento disciplinar.

  1. O facto de, na nota de culpa, o empregador manifestar o entendimento de que a conduta imputada ao trabalhador deve ser sancionada com uma repreensão registada não viola o direito de defesa do trabalhador, nem o princípio de presunção de inocência do arguido.

  2. Constitui infracção disciplinar, por violação do dever de zelo e diligência a que, nos termos do art.º 20.º, n.º 1, alínea b), da LCT, estava obrigado, a conduta do trabalhador que subordinadamente exercia as funções de Técnico Oficial de Contas ao serviço da ré, que consistiu em estar largos meses sem comunicar à Direcção da ré a divergência que existia entre o preço por que a venda de um imóvel tinha sido lançada na contabilidade da empresa e o preço por que a venda tinha sido efectivamente realizada e constava da respectiva escritura.

  3. A sanção de repreensão escrita que lhe foi aplicada mostra-se perfeitamente adequada e proporcionada à infracção cometida.

    Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1.

    AA propôs, no Tribunal do Trabalho de Faro, a presente acção emergente de contrato de trabalho contra a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo do Sotavento Algarvio, C.R.L.

    , pedindo que a sanção disciplinar de repreensão escrita que lhe foi aplicada pela ré fosse anulada e declarada abusiva e que a ré fosse condenada a pagar-lhe uma indemnização nos termos do art.º 375.º do Código do Trabalho, acrescida de juros de mora desde a data da citação.

    Em resumo, o autor alegou que o processo disciplinar era nulo, por violação do seu direito de defesa, e que não cometeu a infracção de que foi acusado.

    Contestada a acção e realizado o julgamento, foi proferida sentença, julgando a acção totalmente improcedente.

    O autor recorreu, mas o Tribunal da Relação de Évora confirmou a decisão da 1.ª instância.

    Mantendo o seu inconformismo, o autor interpôs recurso de revista, tendo concluído a respectiva alegação da seguinte forma: 1. A douta sentença e o douto Acórdão objecto do presente recurso não considerou nulo o procedimento disciplinar, pese embora admita a sua própria fragilidade, admitindo o tribunal a quo “…se não ignora a existência de alguma jurisprudência em sentido contrário, antes se pretende deixar afirmada a nossa opinião segundo a qual a mesma é desprovida de suporte legal…”.

  4. Por sua vez, mesmo antes de o Recorrente ser ouvido, ou até lhe ser facultada a possibilidade de requerer qualquer diligência com vista à sua defesa, vem a própria Nota de Culpa entender que o trabalhador-arguido, agora Recorrente, «(…) se deva aplicar a sanção de repreensão escrita (…)».

  5. A nota de culpa estabelece de forma inequívoca a sanção que a Recorrida já tinha decidido aplicar ao Recorrente, mesmo antes de produzir a sua defesa, ofendendo princípios constitucionais e as mais elementares regras do processo disciplinar.

  6. A forma de actuação da Recorrida viola manifestamente o princípio da presunção de inocência do trabalhador-arguido.

  7. Diga-se que o modus operandi que a Recorrida levou a efeito afectou irremediavelmente, o direito de defesa do trabalhador-arguido, aqui Recorrente, facto que não foi valorado no Acórdão em crise.

  8. No caso sub judice, deve o processo disciplinar ser declarado nulo pelos vícios supra mencionados, não procedendo a tese defendida no douto Acórdão em crise.

  9. Não pode o douto tribunal a quo alterar os fundamentos do pedido e da defesa tal como as partes os identificaram, apenas podendo conhecer de factos instrumentais que eventualmente tenham a ver com a causa de pedir – art.º 156°, 660.ºe 661.º todos do C.P.C., o que não conhecido pelo douto Acórdão, que merece censura.

  10. Em conformidade com o vertido nos n.os 1 e 3 do art.º 659.º do C.P.C., o M.mo Juiz a quo tinha a obrigação legal de respeitar o princípio do dispositivo, ou seja, decidir em conformidade com os limites da demanda, o que foi violado; para além da manifesta insuficiência da matéria de facto, que também viola o disposto no n.º 2 do art.º 653.º do C.P.C. o que também não foi conhecido pelo douto Acórdão, que merece censura.

  11. Ainda quanto a esta matéria, o Meritíssimo Juiz a quo deveria ter atendido à prova documental junta pelo recorrente, bem como ao processo disciplinar junto pela recorrida, no entanto, para fundamentar a douta decisão, o Meritíssimo Juiz a quo nada refere quanto à prova documental (apenas se lhe refere na matéria dada como assente), nem se houve algum motivo para que a mesma fosse desconsiderada, o que também não foi conhecido pelo douto Acórdão, que merece censura.

  12. No entanto, entendeu o M.mo Juiz do tribunal a quo fazer "tábua rasa" das evidências documentais e assentar a sua fundamentação apenas nas suas convicções, afastando-se claramente das questões que lhe foram colocadas pelas partes, o que viola o princípio do dispositivo, e que também não mereceu censura por parte do douto acórdão.

  13. Dos documentos juntos ao processo disciplinar verifica-se que a procuração em causa foi outorgada no dia 28 de Dezembro de 1999 e a escritura publica de compra e venda em 28 de Novembro do ano 2000, não alegando a recorrida que o recorrente teria tido ou tinha conhecimento da referida procuração, nem que a mesma lhe foi entregue.

  14. Apenas e tão só a recorrida, e tal como ficou provado na audiência de discussão e julgamento refere que a D. BB, à data fazia a procuradoria para a recorrida, em colaboração directa com o advogado desta, Dr. CC, entregou, a pedido do recorrente, cópia da referida escritura a este e também ao advogado da recorrida, Dr. CC.

  15. Andou mal a douta sentença quando decidiu que "o que se apurou foi que em momento não concretamente apurado mas anterior a 30-07-2002 o Autor formou a convicção de que tendo a escritura atrás referida sido celebrado com a Ré na posição de vendedora e pelo preço em tal escritura declarado, tinha que ser justificado o não lançamento na contabilidade da Ré dos 165.000 contos que constituíam a diferença entre os 135.000 pelos quais fizera o negócio com o DD e os 300.000 que faltavam da escritura, que a escritura pública aquela venda se encontrava em falta no arquivo do Autor junto a todo o processo e que a mesma chegou à posse dele em 30 de Julho de 2002, através da Sra. D. BB, funcionária da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo que então deu a conhecer também ao advogado da Ré o Dr. EE”.

    l4. Ora, não se verifica do atrás dito que o recorrente tivesse conhecimento naquela data, 30/07/2002, do teor e conteúdo da procuração irrevogável outorgada pela recorrida a favor do Sr. DD, nem tal afirmação é fundamentada pelo douto acórdão.

  16. Na verdade, não pode o douto tribunal a quo concluir sem que subsuma tais conclusões a factos dados como provados, e em momento algum se provou que o recorrente teve conhecimento, em 30/07/2002 ou em momento anterior da referida procuração, nem o douto Acórdão conseguiu encontrar ou fixar tal data, apenas refere “…antes de 30/07/2002…”, não conseguindo encontrar a data exacta, mas só uma hipótese.

  17. Ainda a douta sentença refere: "ora, sabendo nós que o Autor exerce as funções inerentes à categoria profissional de Técnico Oficial de Contas, naturalmente que não podia deixar de ter presente que à Ré era de todo relevante saber que o procurador havia desrespeitado a procuração pela qual lhe concedera poderes de transmissão de um prédio em termos tais que a poderiam responsabilizar pela mais valia gerada pela venda e em beneficio exclusivo dele. O que, diga-se em abono da verdade, nem é facto controvertido…”, também aqui o douto Acórdão não se pronunciou o que merece censura.

  18. Aliás, poder-se-á até entender que o Meritíssimo Juiz a quo, violou o n.º 1 do art. 661.º do CPC, bem como o n.º 2 do art. 660.º também do CPC, o que o douto Acórdão não se pronuncia.

  19. A douta sentença diz mais “…pois que se apurou ao ficar assente que, com toda a certeza, o Autor ficou a saber, em 30 de Julho de 2002, da venda pelo procurador em nome da Ré do prédio por valor superior ao que esta lhe havia permitido e, que por isso, tinha que ser justificado o não lançamento na contabilidade da Ré da diferença entre esses dois valores…”.

  20. Ora, na matéria assente apenas ficou provado o que consta no ponto 12., logo, não resultou provado que "o...

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