Acórdão nº 08P2485 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Fevereiro de 2010

Magistrado ResponsávelRODRIGUES DA COSTA
Data da Resolução04 de Fevereiro de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Referência Processo: DR Iª SÉRIE, 46, 08-03-2010, PÁG. 685-688 Privacidade: 1 Meio Processual: FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA Decisão: FIXADA JURISPRUDÊNCIA Sumário : Constitui modalidade afim, e não jogo de fortuna ou azar, nos termos dos arts. 159º, nº 1, 161º, 162º e 163º do DL nº 422/89, de 2 de Dezembro, na redacção do DL nº 10/95, de 19 de Janeiro, o jogo desenvolvido em máquina automática na qual o jogador introduz uma moeda e, rodando um manípulo, faz sair de forma aleatória uma cápsula contendo uma senha que dá direito a um prémio pecuniário, no caso de o número nela inscrito coincidir com algum dos números constantes de um cartaz exposto ao público.

Decisão Texto Integral: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça I. RELATÓRIO 1.

A Magistrada do Ministério Público junto do Tribunal da Relação de Lisboa veio, ao abrigo do disposto no art. 437.º do Código de Processo Penal (CPP) interpor recurso extraordinário para fixação de jurisprudência do acórdão da referida Relação de 09/04/2008, proferido no processo n.º 6544-07, da 3.ª Secção, com fundamento em estar ele em oposição com o acórdão de 28/11/2007, proferido no processo n.º 07P3186, do Supremo Tribunal de Justiça, transitados ambos em julgado, tendo tais acórdãos sido proferidos no domínio da mesma legislação.

Para tanto concluiu a respectiva motivação do seguinte modo: 1. No acórdão recorrido apreciou-se situação de maquinas de jogos expostas ao público em cafés, sem autorização da DGJ, máquinas para serem utilizadas pelos frequentadores de tais cafés, nas quais o jogador introduz moeda no manípulo fazendo sair, de forma aleatória, cápsula contendo senhas, ficando o jogador na expectativa de receber um prémio em dinheiro, ou em coisas com valor económico, caso as senhas contidas no interior da cápsula uma, ou mais, tenha escrito um número que seja coincidente com outro inscrito no cartaz, não pagando tais máquinas, directamente, fichas ou moedas.

  1. No acórdão recorrido decidiu-se que, face às características das máquinas de jogo em causa, o elemento diferenciador entre a configuração do tipo legal do crime de exploração de jogo de fortuna ou azar fora dos locais legalmente autorizados (p. pelos arts. 1°,3°,4°, 108) e o tipo legal da contra-ordenação das modalidades afins de tais jogos (p. pelo art. 159°) radica nas operações oferecidas ao público existentes nas modalidades afins de tais jogos e, inexistentes, no jogo de fortuna ou azar propriamente dito.

    2.1. No acórdão recorrido decidiu-se pela existência de crime de exploração de jogo de fortuna ou azar fora dos locais legalmente autorizados p. e p. pelos arts. 1°, 3°,4° e 108° do DL 422/89 de 2 de Dezembro, na redacção conferida pelo DL 10/95 de 19 de Janeiro.

  2. Sobre a mesma questão de direito e no âmbito da mesma legislação foi proferido o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça datado de 28.11.2007, no proc. 07P3186, disponível em www.dgsi.pt. (…) o qual consagrou solução oposta.

  3. Estando em causa, no referido acórdão do STJ, máquinas de jogo em tudo semelhantes às referidas em 1., decidiu-se que os jogos que as referidas máquinas proporcionavam, embora os resultados dependessem da sorte e não da perícia do utilizador, não exploravam temas próprios dos jogos de fortuna ou azar, nem pagavam directamente prémios em fichas ou moedas, faltando, deste modo, as características essenciais que permitam qualificar um jogo como sendo de fortuna ou azar, nos termos descritos e definidos no art. 4.°, n.o 1, do DL 422/89, de 02-12.

    Considerou-se que as características e os elementos dos jogos proporcionados por tais máquinas revertem para as modalidades afins dos jogos de fortuna ou azar, referidas no art. 159° do DL 422/89 de 2 de Dezembro, na redacção conferida pelo DL 10/95 de 19 de Janeiro, constituindo uma espécie de sorteio por meio de rifas ou tômbolas mecânicas. E que mesmo a circunstância de os prémios poderem ser em dinheiro ou em coisas com valor económico, não lhe retira a natureza de modalidade afim, uma vez que a atribuição de prémios em dinheiro, por si só, se não é permitida nos termos do art. 161.°, n.º 3, do DL 422/89, também não integra a específica configuração em que está definido o pagamento de prémios (pagamento directo em fichas ou moedas) nos jogos de fortuna ou azar.

    4.1. Considerou-se, pois, no citado acórdão do STJ, que as características e os elementos dos jogos proporcionados por tais máquinas, revertendo para as modalidades afins dos jogos de fortuna ou azar constituem, tão só, a prática da contra-ordenação p. e p. pelo art. 163° do referido diploma legal.

    5 .Tendo ambos os acórdãos transitados em julgado, e não sendo nenhum deles, já, susceptível de recuso ordinário, impõe-se a fixação de jurisprudência.

    É parecer da signatária que, no acolhimento da solução consagrada no Acórdão de 28.11.2007 do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no processo 07P3186, será de decidir neste último sentido.

  4. Foram juntas certidões dos acórdãos recorrido e fundamento, com nota do respectivo trânsito em julgado.

  5. Admitido o recurso, os autos subiram a este Supremo Tribunal, tendo o Ministério Público, na vista a que se refere o art. 440.º n.º 1 do CPP, emitido parecer no sentido de ocorrerem os pressupostos legais para o prosseguimento dos autos como recurso extraordinário para fixação de jurisprudência.

  6. Proferido despacho liminar e colhidos os necessários vistos, teve lugar a conferência a que se refere o art. 441.º do CPP, na qual foi decidido, por acórdão de 12/02/2009, ocorrer oposição de julgados entre o acórdão recorrido e o acórdão-fundamento.

  7. Notificado nos termos do art. 442.º n.º 1 do CPP, veio o M.º P.º apresentar as suas alegações.

    Começou por se referir à oposição de acórdãos, sustentando a sua existência, tal como decidido no acórdão que resolveu a questão preliminar.

    Fez depois o enquadramento legislativo da questão objecto do conflito de jurisprudência, referenciando, no passo seguinte, vários acórdãos no sentido do recorrido (todos das Relações) e vários outros no sentido do acórdão-fundamento, entre os quais, assinado pelo mesmo relator deste, um do Supremo Tribunal de Justiça e vários outros das Relações.

    Com adesão à tese do acórdão-fundamento, acabou por concluir deste modo: 1.º - São Tipos de jogos de fortuna ou azar os Jogos em máquinas pagando directamente prémios em fichas ou moedas, ou que, não pagando directamente prémios em fichas ou moedas, desenvolvem temas próprios dos jogos de fortuna ou azar ou apresentem como resultado pontuações dependentes exclusiva ou fundamentalmente da sorte - art. 4.°, n.° 1, ai. s f) e g) do Dec. Lei n.° 422/89, de 2 de Dezembro; 2.º - Para que a conduta integre o crime do art. 115.° do Dec.-Lei n.° 422/89, mostra-se necessário, entre outros elementos, que o «material ... seja(m) caracterizadamente destinado à pratica dos jogos de fortuna ou azar; 3.º - Os jogos de fortuna ou azar distinguem-se das “modalidades afins” previstas no art. 159.° do Dec.-Lei n.° 422/89, por um duplo critério: temática do jogo e natureza dos prémios. Tratando-se de um dos temas enunciados no n.°1 do art. 4, explorados apenas em casino, ou de prémios pagos em dinheiro ou fichas convertíveis directamente em dinheiro, são jogos de fortuna ou azar; no caso de prémios pagos em espécie são modalidades afins desses mesmos jogos de fortuna ou azar; 4.º - A máquina que, mediante a introdução de uma moeda no cofre e por mera rotação do manípulo, faz sair de forma totalmente aleatória uma cápsula com três senhas ou rifas com um número cada, ficando o jogador na expectativa de receber um prémio em dinheiro, caso um ou mais dos números seja coincidente com o inscrito num cartaz, não desenvolve temas próprios de jogos de fortuna ou azar, nem paga directamente prémios em fichas ou moedas.

    5.° - As características e os elementos dos jogos ... constituem uma espécie de sorteio por meio de rifas ou tômbolas mecânicas, com o sentido e a natureza de modalidades afins de jogos de fortuna ou azar.

    Propõe-se, pois, que o Conflito de Jurisprudência existente entre os acórdãos do Tribunal de Relação de Lisboa de 09 de Abril de 2008, proferido nos Autos de Recurso Crime n.° 6544/2007, 3 Secção, e o de 28 de Novembro de 2007, do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no processo 3 186/07, em 28 de Novembro de 2007, seja resolvido nos seguintes termos: «A máquina que, mediante a introdução de uma moeda no cofre e por mera rotação do manípulo pelo utilizador, faz sair de forma totalmente aleatória uma cápsula com senha ou rifa contendo um ou mais números, recebendo este ou não um prémio em dinheiro ou um objecto anunciado, caso se verifique coincidência de números com os inscritos num cartaz que acompanha aquela, não constitui o “material ou utensílios que sejam caracterizadamente destinados à prática dos jogos de fortuna ou azar” a que se refere o artigo 115.° do Decreto-Lei n.° 422/89, de 2 de Dezembro, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.° 10/95, de 19 de Janeiro, tratando-se antes de modalidade afim dos jogos de fortuna ou azar a que se reporta o artigo 159.° do mesmo diploma legal.» Terminou, pedindo que o recurso seja julgado procedente e, em consequência, se fixe a jurisprudência acima proposta, revogando-se a decisão recorrida e determinando-se que os autos sejam enviados à Relação de Lisboa, a fim de ali ser proferida decisão final de harmonia com a fixada por este acórdão.

  8. A oposição de acórdãos foi já decidida na fase preliminar, tendo-se concluído na conferência pela oposição de julgados relativamente à mesma questão de direito e no domínio da mesma legislação.

    Porém, não tendo a referida decisão força de caso julgado formal, podendo a mesma questão ser reapreciada pelo pleno das secções criminais, como vem sendo decidido uniformemente pelo Supremo Tribunal de Justiça, impõe-se proceder a tal reapreciação.

    6.1.

    No acórdão recorrido, partiu-se da seguinte situação de facto: (referente ao proc.

    n.º 06/01.2FIALM) Abril de 2001 - um expositor...

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