Acórdão nº 635/09.6YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Janeiro de 2010

Magistrado ResponsávelPAULO SÁ
Data da Resolução27 de Janeiro de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA E NÃO CONHECIDO O RECURSO SUBORDINADO Sumário : I - O terraço de cobertura é parte comum do edifício constituído em propriedade horizontal, nos termos do art. 1421.º, n.º 1, al. b), do CC. A constituição de propriedade horizontal importa a extinção do direito de propriedade antigo, com a constituição, em sua substituição, de um direito real novo, pelo que, com aquele acto, melhor com a alienação da primeira das fracções autónomas (como condição suspensiva da eficácia daquele) o arrendamento quanto àquele concreto objecto se extingue por caducidade – cf. art. 1051.º, al. c), do CC.

II - A colocação de anúncios luminosos na fachada do edifício constitui inovação nas partes comuns, entendida a fachada como parte da sua estrutura para efeitos da al. a), do n.º 1, do art. 1412.º do CC.

III - O regime dos diversos tipos de deteriorações ou obras que o locatário pode fazer nos espaços locados só tem razão de ser relativamente aos imóveis arrendados e às áreas dos mesmos sobre os quais o locador só pode acordar com o seu inquilino que este último efectue obras de conservação ordinária, extraordinária e/ou de beneficiação, nos exactos limites do que se contém licitamente na sua esfera jurídica e foi cedido temporariamente ao arrendatário.

IV - O senhorio, ainda que seja proprietário de um dado imóvel, só pode consentir em obras a realizar pelo arrendatário nas estritas fronteiras do que foi especificamente cedido a este, já não podendo acordar obras com ele que afectem outros espaços, arrendados ou pertencentes a terceiros, por não ter legitimidade para o fazer.

V - Toda a autorização para obras, posterior à constituição da propriedade horizontal e à alienação de, pelo menos, uma fracção, está ferida, de ilegitimidade, pois que, ao tempo em que foi concedida, a ré não se encontrava na posição relativa, face ao direito, que lhe permitisse o respectivo exercício.

VI - A ilegitimidade conduz à ineficácia da autorização; como acto ineficaz, o mesmo não á apto a produzir os seus efeitos, maxime, em relação aos demais condóminos do prédio.

VII - Se a situação pré-existente à constituição da propriedade horizontal, no que concerne às partes comuns, deve ser acatada pelos condóminos, já qualquer modificação introduzida nas mesmas, em momento posterior (ainda que em virtude de autorização do senhorio anterior à constituição da propriedade horizontal, que, no que respeita aos espaços comuns, caducaria) tinha de ser sujeita à sua aprovação, nos termos gerais.

VIII - A conduta da ré violou culposamente o princípio contratual da boa fé, ao não informar devidamente o inquilino relativamente à situação do prédio e ao induzir em erro a autora, quando consentiu, sem limitações, as obras sobre as partes comuns daquele, tendo-a levado a realizar, inadvertida e ilicitamente as mesmas e a sofrer depois a inerente condenação judicial no sentido da sua demolição e/ou reposição do imóvel no seu estado anterior, podendo inscrever-se, dessa maneira, na sua esfera jurídica de prejuízos ressarcíveis, traduzidos nas despesas com as obras realizadas.

Decisão Texto Integral: 34 Processo n.º 635/09.6YFLSB-1 Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I – AA – COMÉRCIO DE VIATURAS, LDA (posteriormente substituída, na pendência dos autos e por via de incidente de habilitação de cessionário, por T… – COMERCIO DE AUTOMOVEIS, S.A), intentou, em 17.09.2002, acção declarativa de condenação com processo comum, sob a forma ordinária, contra BB – SOCIEDADE AGRÍCOLA E DE ADMINISTRAÇAO DE IMOVEIS, L.DA, pedindo, em síntese, que a Ré seja condenada: 1) a pagar-lhe a quantia de € 236.598,00 (Esc. 47.433.639$30), correspondente ao valor de 3/10 da amortização das despesas de instalação realizadas pela Autora; 2) a pagar-lhe a quantia de € 12.839,06 (Esc. 2.574.000$00), correspondente ao montante gasto para cumprimento do acórdão que a condenou na demolição das obras; 3) a reconhecer que, em virtude da redução da área locada por razões exclusivamente imputáveis à Ré, deve a renda global do locado, para o futuro, ser reduzida e fixada em € 4.987,98 (Esc. 1.000.000$00); 4) a pagar, à Autora, o reembolso da parte da renda já paga, no montante de € 144.834,31 (Esc. 29.036.672$00); 5) a pagar, à Autora, as custas pagas na acção movida pelo condómino, no montante de € 704,80 (Esc. 141.300$00).

Para tanto alega, em síntese: Explora um estabelecimento comercial, de que é arrendatária, na fracção designada pela letra “A” do prédio, sito na Rua D. E…, n. os 118, 118- A, 118-B, 120-A e 120-B nesta cidade, fracção que é propriedade da Ré, exercendo naquele estabelecimento as actividades de garagem, estação de serviço, venda de combustíveis e lubrificantes, recolha de automóveis, lavagens e lubrificações, reparações, venda e exposição de veículos novos e usados, venda e armazém de acessórios, peças de automóveis e escritórios.

Recebeu o arrendamento em causa por fusão da sociedade R… − Comércio de Automóveis, L.da, sendo que o relativo aos n.os 118-A e 118-B havia sido celebrado em 26 de Agosto de 1969 e o pertinente ao n.º 120-A em 5 de Março de 1982.

Por forma a adequar as instalações aos fins prosseguidos pelas actividades a que se dedicavam as sucessivas arrendatárias, foram sendo efectuadas, ao longo dos anos, obras no locado, as quais foram autorizadas pelos contratos de arrendamento e pela Ré, sendo que, por escritura pública de 28 de Março de 1993, foram alterados os contratos de arrendamento, com vista à realização de obras, vindo a ser aumentados os valores das rendas cobradas.

Essas obras foram executadas, com, entre outras, a alteração do tecto da construção existente nos terraços de tardoz, a impermeabilização e repavimentação do chão do terraço, a abertura de um buraco no canto esquerdo do terraço e instalação de um monta-cargas, a substituição de rede na vedação do terraço e a colocação de um novo anúncio na fachada do prédio.

A Ré sempre se apresentou junto das sucessivas arrendatárias como a única e exclusiva proprietária do prédio onde se situavam os locados, facto que, contudo, deixou de se verificar em 18 de Março de 1983, data em que foi outorgada escritura pública que anexou os prédios sob os n.os 118-A, 118--B, 120-A e 120-B e constituiu a respectiva propriedade horizontal.

Devidamente citada, a Ré veio contestar, nos moldes constantes de fls. 205 e seguintes, impugnando parte da realidade afirmada pela Autora, quer a título de falsidade, quer de desconhecimento, invocando, em síntese, que apenas o arrendamento da loja sob o n.º 118 compreendia o respectivo terraço, nunca tendo sido dado à antecessora da Autora e para esta transmitido o direito de utilizar o terraço da loja com entrada pelo n.º 120 que era contíguo àquele outro.

Argumentou, bem assim, que as únicas obras autorizadas foram as relativas à garagem do n.º 118 e terraço de cobertura da mesma e as pertinentes ao interior da loja com entrada pelo n.º 120, sendo que, à data da escritura de alteração do arrendamento, a Autora já sabia que a Ré não era a proprietária única de todo o imóvel, facto que lhe foi comunicado em conversas havidas, tendo a Autora assistido às vistorias camarárias efectuadas para a atribuição da licença de constituição da propriedade horizontal.

Invocou, ainda, o desconhecimento das acções judiciais relatadas pela Autora, aduzindo que apenas por culpa desta não foi, ela Ré, chamada a intervir na demanda, não tendo aquela agido diligentemente na sua defesa, nomeadamente, omitindo a prova de que era detentora do direito de utilização do terraço de cobertura do n.º 118 e que a autorização para o anúncio já lhe havia sido dada antes da constituição da propriedade horizontal.

Replicou a Autora, a pretexto de excepção deduzida na contestação, invocando que o terraço de cobertura do n.º 120 sempre foi incluído no arrendamento e que, mesmo a provar-se o alegado pela Ré, nunca esses factos podem conduzir à total improcedência da acção, uma vez que as obras realizadas o foram na totalidade do terraço que constitui actualmente a cobertura do prédio.

Pugnou pela procedência da acção, nos termos oportunamente peticionados.

Após a realização de Audiência Preliminar, onde as partes requereram a suspensão da instância, com vista a tentarem chegar a um acordo, que nunca veio a acontecer, foi proferido despacho saneador bem como fixada a matéria de facto assente e elaborada a respectiva base instrutória, que foram objecto de reclamação pela Autora, tendo a mesma sido deferida, com a eliminação de um artigo da base instrutória (que passou a alínea da matéria de facto assente) e o aditamento de 6 novos artigos a essa mesma peça processual.

As partes apresentaram os seus requerimentos de prova, tendo a Autora requerido a gravação da prova a produzir na audiência de discussão e julgamento, o que veio a ser deferido.

Foi efectuada uma peritagem, por determinação oficiosa do tribunal recorrido, encontrando-se o respectivo relatório junto a fls. 628 e seguintes.

Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, com observância do legal formalismo, tendo-se respondido aos factos da base instrutória, em ter havido reclamações.

Foi proferida, de seguida, sentença, que julgou os pedidos formulados pela autora parcialmente procedentes e, nessa mesma medida, condenou a ré a pagar àquela a quantia que, em liquidação posterior a esta sentença, se apurar, como correspondendo a 1/3 das custas suportadas pela primeira, na acção declarativa de condenação movida por A… M… M… V… S…, que correu os seus termos no 10.º Juízo Cível, 3.ª Secção, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, até ao limite de Euros 704,80 (setecentos e quatro euros e oitenta cêntimos).

No mais, julgaram-se os pedidos formulados pela autora improcedentes e dos mesmos se absolveu a ré.

Nas custas condenaram-se autora e ré, em proporção que se fixou, provisoriamente, em 0,17% para a segunda e, no restante, para a primeira, proporção essa, a...

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