Acórdão nº 29368/03.5TJLSB.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Outubro de 2009

Magistrado ResponsávelALBERTO SOBRINHO
Data da Resolução15 de Outubro de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA Legislação Nacional: DL 446/85, DE 25 DE OUTUBRO; DL 220/95 DE 31 DE AGOSTO; DL 249/99, DE 7 DE JULHO; DL 143/2001 DE 26 DE ABRIL; LEI 24/96, DE 31 DE JULHO; AVISO DO BANCO DE PORTUGAL Nº 11/2001 Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO STJ DE 2008/05/15, Pº 08B357 IN WWW.DGSI.PT ACÓRDÃO STJ DE 2000/10/12 IN C.J. VIII, 3º, 67 Sumário : 1. Na ausência de legislação específica sobre a forma de utilização de cartões e de pagamento electrónico, será de acordo com as cláusulas do contrato de adesão prefixadas pelos bancos a que os clientes, candidatos à obtenção de um cartão, se limitam a aderir, que esta matéria será resolvida. Não sendo as cláusulas do contrato discutidas nem negociadas pelos clientes, que se limitam a aderir ao contrato de adesão, estas cláusulas gerais estão sujeitas ao regime preconizado pelo Dec-Lei 446/85.

  1. Com a cláusula em que o cliente se reconhece devedor ao Banco dos valores registados electronicamente está o banco a criar, nas transacções efectuadas em ambiente aberto, uma presunção de dívida relativamente aos valores registados electronicamente.

    De acordo com esta presunção imposta ao titular do cartão, decorre que, mesmo no caso da dívida real ser inferior à constante dos registos electrónicos, se não conseguir fazer essa prova se tem como assente que deve as quantias assinaladas electronicamente.

    Ao estabelecer-se uma presunção de dívida do titular do cartão nos termos apontados e ao conceder-se um valor absoluto ao registo electrónico, está-se a alterar os critérios de repartição do ónus da prova e a subtrair ao juiz a livre apreciação de um documento particular, o que a torna absolutamente proibida.

  2. O banco emissor dos cartões não é totalmente alheio às relações estabelecidas entre o titular do cartão e os terceiros prestadores de serviços, porquanto, e desde logo, com eles acordou a aceitação do cartão como meio de pagamento.

    O banco, ao pôr-se à margem, de um modo genérico, de todo e qualquer conflito que possa surgir entre o titular do cartão e o terceiro prestador do serviço, está a eximir-se a qualquer responsabilidade decorrente das operações realizadas com o cartão, mesmo que ocorresse uma sua actuação dolosa ou gravemente culposa.

  3. O risco não tem que ser suportado apenas pelo banco, assim como não tem de o ser unicamente pelo titular do cartão. Se alguém tira proveito de uma coisa, sob tutela jurídica, justifica-se, por equitativo, que suporte os prejuízos que a sua utilização acarreta. Se é certo que só o banco está em condições de impedir o uso indevido do cartão após comunicação do seu titular, também é verdade que este até pode não ter tomado prévio conhecimento da sua utilização abusiva e nem ter qualquer responsabilidade nessa indevida utilização.

  4. Para que as cláusulas a inserir num contrato passem a fazer parte integrante dele imprescindível se torna que sejam aceites pela outra parte, o que só acontecerá se ela tomar conhecimento do seu significado e das suas implicações.

    A um contraente minimamente diligente exige-se que, de um modo razoável, exerça um controle sobre as suas disponibilidades financeiras de modo a não ultrapassar os limites de crédito atribuídos, identicamente a não fazer investimentos sem o correspondente suporte financeiro. E a consequência daí decorrente, tal qual o débito fosse prontamente processado, é sempre o débito imediato do montante excedido.

    Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório ASSOCIAÇÃO P... P... A D... D... C...

    , ao abrigo do disposto nos arts. 25º, 26º, nº 1, al. a) e 27º, nº 2 do Dec-Lei 446/85, de 25 de Outubro, na redacção dada pelos Dec-Lei 220/95, de 31 de Agosto e 249/99, de 7 Julho, intentou, a 14 de Julho de 2003, acção inibitória, contra BANCO C... P..., S.A., pedindo que o réu seja condenado a: a- abster-se de utilizar definitivamente as cláusulas contratuais gerais, que identifica; b- e dar publicidade a esta proibição, afixando o teor da sentença em todos os balcões das suas dependências, e nos jornais diários e semanários de maior tiragem no país.

    Estriba, essencialmente, esta sua pretensão no facto do banco réu vir a utilizar, na contratação com os seus clientes, cláusulas violadoras do regime jurídico das cláusulas contratuais gerais constantes do Dec-Lei 446/85.

    Contestou o réu para, em síntese, defender que as cláusulas aludidas pela autora não enfermam de qualquer invalidade e que outras já não são utilizadas, pedindo, por isso, a improcedência da acção.

    Respondeu a autora para sustentar a utilidade da lide mesmo relativamente àquelas cláusulas que o réu alegou já não serem utilizadas.

    Procedeu-se seguidamente à elaboração do despacho saneador com selecção dos factos que se consideraram assentes e dos controvertidos, prosseguindo o processo para julgamento.

    Na sentença, subsequentemente proferida, foi a acção julgada parcialmente procedente e o réu condenado a abster-se de utilizar determinadas cláusulas nos contratos com os seus clientes.

    Inconformados com o assim decidido apelaram autora e réu, tendo o recurso daquela obtido procedência total e o deste apenas parcial.

    Ainda irresignado, recorre novamente o réu, agora de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, continuando a defender que as cláusulas que foi impedido de utilizar não são proibidas.

    E recorre subordinadamente a autora sustentando a nulidade de cláusula considerada válida no acórdão.

    Contra-alegou a autora em defesa da improcedência do recurso interposto pelo banco réu.

    *** Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

    1. Âmbito dos recursos A- De acordo com as conclusões, a rematar as respectivas alegações, o inconformismo dos recorrentes radica, em síntese, no seguinte: recurso principal 1- As cláusulas que estabelecem que «O titular compromete-se a, após a sua adesão ao serviço de pagamentos MBNet, utilizar esses servidos de pagamentos em todas e quaisquer transacções que venha a efectuar em ambientes abertos (Internet, WAP, televisão interactiva, etc.) e, ao fazê-lo, reconhece-se devedor ao Banco dos valores registados electronicamente» tem duas partes distintas e só a última parte (em que se lê: «e, ao fazê-lo, reconhece-se devedor ao Banco dos valores registados electronicamente») pode, eventualmente, ser considerada violadora da norma que proíbe exclusão ou limitação da responsabilidade pelo não cumprimento definitivo, mora ou cumprimento defeituoso, em caso de dolo ou culpa grave.

      2- Ainda assim, esta parte das aludidas cláusulas não constitui uma exclusão ou limitação da responsabilidade pelo não cumprimento definitivo, mora ou cumprimento defeituoso, em caso de dolo ou culpa grave, pois não está em causa nestas cláusulas qualquer exclusão ou limitação de responsabilidade do emitente dos cartões, mas apenas o reconhecimento de que o titular do cartão, ao utilizar os serviços de pagamentos e ao efectuar transacções com o cartão em ambientes abertos assume a obrigação de reembolsar o emitente do cartão pelo valor de tais pagamentos ou transacções.

      3- Já a primeira parte dessas cláusulas estabelece, unicamente, uma obrigação para os titulares dos cartões, não constituindo qualquer exclusão ou limitação da responsabilidade pelo não cumprimento definitivo, mora ou cumprimento defeituoso.

      4- Por isso, o acórdão recorrido, ao condenar a recorrente a abster-se de...

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