Acórdão nº 1407/04-QTBRG-AC.1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelSEBASTIÃO PÓVOAS
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : 1) No âmbito do recurso de revista a intervenção do Supremo Tribunal de Justiça, quanto à matéria de facto, é muitíssimo limitada, apenas podendo averiguar da observância das regras de direito probatório material (artigo 722.º, n.º 2) ou mandar ampliar aquela decisão (artigo 729.° n.º 3). Só a Relação pode censurar as respostas ao questionário ou anular a decisão proferida na 1.ª instância, através do exercício dos poderes conferidos pelos n.ºs 1 e 4 do artigo 712.º. O Supremo Tribunal de Justiça só pode usar da faculdade do n° 3 do artigo 729.º do Código de Processo Civil, perante patente contradição da matéria de facto apurada pelas instâncias ou se a mesma for de tal modo omissa que se revele insuficiente para decidir.

2) Sendo um documento particular da pena da recorrida e cuja autoria (letra e assinatura) não foi impugnada pela recorrente, tem a força probatória a que se refere o artigo 376.°, n.°s 1 e 2 do Código Civil, ou seja, os factos nele compreendidos “consideram-se provados na medida em que forem contrários aos interesses do declarante”, sem prejuízo da indivisibilidade da declaração, nos precisos termos do artigo 360.°.

3) Tal documento faz plena prova da proveniência das declarações nele contidas e de quem as subscreveu, valendo como declaração confessória se produzido “inter partes”.

Mas só é de considerar se relevar para a decisão da causa.

4) A agência – “nomen juris” da representação comercial — é “o contrato pelo qual uma das partes se obriga a promover por conta da outra a celebração de contratos, de modo autónomo e estável e mediante retribuição, podendo ser-lhe atribuída certa zona ou determinado circulo de clientes” (n.° 1 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 178/86, de 3 de Julho – alterado pelo DL n.º 118/93, de 13 de Abril). São elementos essenciais a obrigação que o agente tem de, por conta de outrem, promover a celebração de contratos, promoção que, ao contrário do mandato não implica a ulterior outorga, já que, sem mais, o contrato de agência não envolve a prática de actos jurídicos (cf., o artigo 1157.° do Código Civil), ressalvada a situação do artigo 2.° (agente com representação).

5) A indemnização de clientela destina-se a compensar o agente pelos lucros, ou benefícios, que o principal continua a auferir, após a cessação do contrato, com a clientela por aquele angariada.

6) Só é devida se verificados cumulativamente os requisitos do n.° 1 .do artigo 33.° do Decreto-Lei n.° 178/86 de 3 de Julho (alterado pelo Decreto-Lei n.° 118/93 de 13 de Abril).

7) Tais requisitos são constitutivos do direito à indemnização de clientela, devendo o agente, que quer ser ressarcido daquele dano contratual, alegar e provar os factos que os integram, nos termos do n.° 1 do artigo 342.° do Código Civil.

8) Constitui matéria de facto da exclusiva competência das instâncias a criação de presunção judicial consistente no afirmar de que a parte beneficiou consideravelmente, após a cessação do contrato, da actividade desenvolvida pelo agente (alínea b) do n.º 1 do artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 178/86) quando se lance mão de um juízo de prognose ou verosimilhança para chegar a essa conclusão.

9) A demonstração do requisito da alínea c) do n.º 1 daquele artigo 33.º não implica a prova de um “pagamento” como facto extintivo da obrigação mas a demonstração do “não recebimento” como facto constitutivo de direito à indemnização pelo dano de clientela.

10) A compensação legal (ou unilateral) é uma causa potestativa de extinção de créditos exigindo-se a verificação de três requisitos: reciprocidade de créditos; sua validade, exequibilidade e exigibilidade; homogeneidade (traduzida em idêntica natureza) das prestações.

Decisão Texto Integral: Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça “AA – Representações de Moda, Limitada”, executada na execução comum que lhe moveu “BB, SA”, deduziu oposição.

Aí, nuclearmente, e na parte que ora releva alegou deter sobre a exequente um crédito de 2.187.000,00 euros resultante da resolução de um contrato de concessão comercial celebrado, entre ambos o que lhe causou prejuízos vários, pedindo ainda a diminuição da taxa de juro da quantia exequenda.

Pediu, por isso, a extinção da execução e a condenação da exequente como litigante de má fé.

No Círculo Judicial de Aveiro a oposição foi julgada procedente quanto à taxa de juro e improcedente quanto ao restante sendo determinado o prosseguimento da execução pelas quantias tituladas pelas letras executadas, acrescidas de juros moratórios à taxa de 4%.

A executada apelou para a Relação de Coimbra que confirmou o julgado.

Pede, agora, revista, assim concluindo as suas alegações: - Com base no art°. 712, n°. 3 do art°. 729 e n°. 4 do art°. 653, todos do Cód. Proc. Civil, foram conferidos ao Colendo STJ poderes para se pronunciar sobre as decisões de facto das Instâncias e conferir se estas fizeram “bom uso dos poderes que a lei lhe confere”, o que se reclama (vidé art°. 730 do Cód. Proc. Civil).

- Haverá que ser reapreciada a resposta aos quesitos n°s. 1 e 44, na parte em que se não deu como provada a “exclusividade da concessão”: b

  1. A interpretação dada pelo Acórdão recorrido não tem sentido, pois entende que o teor do fax, tanto pode “significar que a AA tinha a distribuição da marca exclusivamente no país, .. como pode significar a distribuição da marca em regime de exclusividade (sem que possa haver outra distribuidora)”; bb) Qualquer destas interpretações não se excluem, primeiro, porque não foi sequer posta em causa nem discutida a territorialidade da concessão, pelo que a distribuição só podia ser em regime de exclusividade; bc) Existe, portanto, no Acórdão recorrido manifesta correlação ilógica entre a factualidade existente e as conclusões e decisões inerentes; bd) O próprio declarante refere os condicionalismos em que acordaram, pelo que a ‘teoria da impressão do destinatário’, conforme estipulada pelo n°. 1 do art°. 236 do Cód. Civil, implica a maior protecção deste; be) Sustenta, de resto, esta interpretação, o depoimento das 3 testemunhas da “AA”, entre as quais uma que declarou ter feito ‘um estudo de viabilidade com base na exclusividade da distribuição e, se não fosse essa condição, a empresa não tinha sido constituída, pois não tinha viabilidade’; bf) Depois durante 3 anos e meio (meados de 1998 a Fev. de 2002) o exercício da distribuição foi exclusivo; bg) A “AA” ainda, criou 5 lojas M... e angariou 70 novos clientes; bh) As lojas M... implicam a exclusividade, pois não se investe se houver a possibilidade de concorrência na área, o que é facto notório; bi) Era a exequente que elaborava catálogos das confecções “P… M…” com a indicação do “Distribuidor em Portugal” ser a “AA” (factos x), z), a-1) e, ainda, a publicação de revistas, suportes, publicidade, sacos, e desdobráveis, com as mesmas indicações, sendo de presumir judicialmente a veracidade da exclusividade, a que o Acórdão recorrido não procedeu, havendo omissão de pronúncia, quanto a esta matéria; - Consequentemente deverá o art°. 45 ser dado como provado; - A parte final da resposta ao q°. n°. 47 deve ser alterada, não só devido à questão da exclusividade, como ainda pelo facto da concorrência desleal ter causado o encerramento do estabelecimento, o que causou danos directos à “AA”; - Deverão ser dados como provados os q°s. n°s. 51 e 52, não só pela questão óbvia da falta de margem, pois era o “C… I…”, fornecido directamente, como ainda pela violação da exclusividade; - Da resposta ao quesito n°. 57 deve ser dado como não escrita a parte final, onde se refere ‘invocando a falta de pagamento de fornecimentos anteriores no prazo estabelecido’, pois esta matéria excrescente não foi alegada, nem instruída — ‘quod non est in actis, non est in mundo’ — havendo manifesta violação dos art°s. 664 e n.º 1 do art°. 264 do Cód. Proc. Civil; fa) Trata-se de uma asserção excrescente, de mero conteúdo técnico-jurídico, de cariz conclusivo ou normativo, pelo que deve ser irradicada da condensação; fb) Não se trata de factos instrumentais, pois não servem ‘para demonstrar a verdade ou falsidade dos factos pertinentes’, constituindo, de resto, matéria de direito a questão da exorbitância ou excesso da resposta a um quesito; fc) Tratando-se de uma resposta explicativa, como o Acórdão recorrido pretende, o que se alega por mera questão ‘a latere’, a mesma sempre seria conclusiva e implicaria a prova de nova factualidade, tais como a discussão sobre os fornecimentos, pagamentos, prazos .

    - No que tange às respostas aos q°s. n°s. 71, 75, 80 e 81, os mesmos devem ser alterados, não tendo sido apreciada a prova relativa aos quesitos n°s. 71 e 75, pelo que foi violado o art°. 712 do Cód. Proc. Civil; - Por sua vez, existe incompatibilidade entre a resposta ao q. no. 53 e a dos q°s. n°s. 80 e 81; - A resposta ao quesito n°. 134 deve ser dada como provada, pois a prova documental aqui foi considerada como ‘essencial’ e para a prova da ‘exclusividade’ não foi tomada tal circunstância, havendo incompatibilidade de fundamentos e meios, bem como as provas documentais não são de força hierárquica superior; - Quanto ao valor probatório do fax, datado de 19.5.98, importa apreciar o seguinte: j

  2. A parte contra quem o documento é produzido — “AA” — pode tomar a atitude de reconhecer expressamente a autenticidade do mesmo, que foi o que inelutávelmente aconteceu (ut art°s. 374 Cod. Civil e art°s. 484, 490 e 505 do Cód. Proc. Civil); jb) Consequentemente, é de ‘considerar-se inatacável a autenticidade do documento, visto ele ser apresentado como facto pessoal da parte contra quem é produzido’; jc) Determinada a força probatória formal do documento, a sua força probatória material ‘encontramo-la na doutrina do art°. 376 do Cód. Civil’; jd) Por sua vez, tratando-se de declarações documentadas só em parte desfavoráveis ao declarante (exclusividade da concessão), por força do princípio da indivisibilidade da...

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