Acórdão nº 2614/06.6TBMTS.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2010
Magistrado Responsável | GARCIA CALEJO |
Data da Resolução | 01 de Março de 2010 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : As prescrições presuntivas constituem presunções de pagamento, tendo como fundamento e base obrigações que costumam ser pagas em prazo curto e em relação às quais não se costuma exigir recibo de quitação.
Em contrário das prescrições extintivas, as prescrições presuntivas apenas dispensam o beneficiário do ónus de provar o pagamento. A presunção de pagamento por banda do devedor faz deslocar o ónus da prova do não pagamento para o credor. Ou seja, existindo a presunção de pagamento a favor do devedor, competirá ao credor ilidir essa presunção, demonstrando que aquele não pagou. Esta presunção de pagamento não dispensa, porém, o devedor de alegar o pagamento.
A ilisão da presunção de pagamento, só poderá ser feita por confissão expressa do devedor, sendo certo que a confissão extrajudicial só releva quando for realizada por escrito (art. 313º do C.Civil), ou por confissão tácita, considerando-se, neste contexto, confessada a dívida, se o devedor se recusar a depor ou a prestar juramento em tribunal, ou praticar em juízo actos incompatíveis com a presunção de cumprimento (art. 314º do mesmo Código).
O art. 317º al. b) do C.Civil estabelece a prescrição presuntiva relativamente a créditos de comerciantes, sobre coisas vendidas a quem não seja comerciante que se não destinem ao seu comércio (ou porque ele não se dedique a tal comércio ou porque dedicando-se, destine a coisa para uso próprio) e a créditos de industriais desde que a actividade desenvolvida pelo devedor se não destine à sua indústria.
A actividade de um condomínio de um imóvel (no sentido do exercício da compropriedade sobre o imóvel) deve circunscrever-se à gestão e administração do prédio, mais especialmente às partes comuns, o que se efectuará através de actos da assembleia de condóminos e do administrador, pelo que o desempenho de uma actividade comercial ou industrial foge, claramente, à concepção e à finalidade de um condomínio.
Por isso, não podendo um condomínio exercer qualquer actividade industrial, não existe qualquer hipótese de ser aplicado, no caso, a reserva constante na última parte do art. 317º al. b).
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I- Relatório: 1-1- AA, Serviços de Limpeza Ldª, com sede na Rua de M..., ..., Leça do Balio, Matosinhos, propôs a presente acção com processo ordinário contra Condomínio da BB, com sede na Rua A... F... C... nº …/…, Porto pedindo que a R. seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 15.676,68, acrescida de juros de mora à taxa legal sobre a quantia de 10.126,51 € desde a citação até efectivo e integral pagamento.
Fundamenta este pedido, em síntese, dizendo que prestou os serviços de limpeza à R. constantes das facturas que junta, que deviam ser pagos no prazo de 30 dias, o que não fez, apesar de ter sido interpelada para o efeito.
A R. contestou alegando, em resumo, que os trabalhos de limpeza a que dizem respeito as facturas, realizados no período compreendido entre Junho de 2000 e Fevereiro de 2001, foram pagos à A., pagamento que se presume, nos termos do art. 317º al. b) do C.Civil.
Termina pedindo se julgue improcedente a acção.
A A. respondeu sustentando que a R. não pagou as limpezas, sendo que o art. 317º al. b) do C.Civil não presume qualquer pagamento da dívida. Por outro lado a R., expressamente e por escrito, confessa a dívida.
Termina pedindo se julgue improcedente a excepção invocada pela R.
O processo seguiu os seus regulares termos posteriores, tendo-se proferido o despacho saneador, após o que se fixaram os factos assentes e se organizou a base instrutória, se realizou-se a audiência de discussão e julgamento, se respondeu à base instrutória e se proferiu a sentença.
Nesta julgou-se procedente a excepção da prescrição presuntiva do pagamento invocada pela R. e, em consequência, considerou-se a acção improcedente, absolvendo-se a R. do pedido.
Não se conformando com esta decisão, dela recorreu a A. de apelação para o Tribunal da Relação do Porto, tendo-se aí, por acórdão de 9-07-2009, julgado improcedente o recurso, confirmando-se a sentença recorrida.
1-2- Irresignado com este acórdão, dele recorreu a A. para este Supremo Tribunal, recurso que foi admitido como revista e com efeito devolutivo.
A recorrente alegou, tendo das suas alegações retirado as seguintes conclusões: 1ª- Salvo o devido respeito que é muito o douto acórdão violou o disposto no artigo 317°, Alínea b) do Código Civil e os artigos 1° e 7° do Código Comercial.
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- O douto acórdão faz uma errada interpretação dos artigos 317°, al. b), 314°, 355° e 357º, nº 2, 1436° e 1437° do Código Civil e dos artigos 502° e 552° do Código de Processo Civil.
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- A presente acção foi julgada improcedente dado que quer o meritíssimo juiz de primeira instancia quer os Excelentíssimos Desembargadores julgaram procedentes a excepção de prescrição invocada pela Ré.
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- Pode-se resumir em duas questões a fundamentação do Douto Acórdão: A) Que a qualidade de não comerciante de um condomínio é facto notório, não necessitando tal facto de ser alegado nem provado: “é o que resulta directamente da natureza jurídico-legal do condomínio que o julgador não pode ignorar” (sic) B) O documento nº 1 junto com a réplica, não impugnada pela Ré, não constitui confissão judicial da dívida.
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- Ora esta argumentação com todo o devido respeito que é muito labora em erro.
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- Louva-se o acórdão no artigo 1436° do Código Civil, onde são definidas as funções do administrador, para fundamentar o decidido.
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- Ora, entende a recorrente que este artigo nada pode ter a ver com a qualificação de comerciante ou não da Ré, ou ainda, sobre se a Ré recebeu a prestação da Autora como particular ou como destinada a uma actividade comercial.
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- Como é sobejamente sabido, e isso sim um facto notório, existem muitos condomínios onde se exerce o comércio.
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- Esses condomínios, que estiveram em voga nos anos 80 e 90, são construídos exclusivamente por fracções autónomas destinadas ao comercio, em que a Administração do Condomínio, normalmente entregue a empresas especializadas, é responsável pela limpeza das partes comuns, por fazer publicidade para atrair clientes, para gerir certos espaços comuns como espaços para atrair clientes, por exemplo com áreas de divertimento par crianças.
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- Exemplos conhecidos desses centros comerciais são os muito conhecidos Shoping Center Brasília e Dallas na Cidade do Porto 11ª- Shoping Center Amoreiras na cidade de Lisboa.
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- E um sem número mais de centros comerciais de pequena, médio e grande dimensão que proliferaram por todo o País nas décadas de 80 e 90.
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- Ora os serviços de limpeza contratados pelas administrações desses Centros Comerciais, são destinados em exclusivo ao comércio.
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- Todos estes exemplos, sobejamente conhecidos, são exemplos de prédios constituídos em propriedade horizontal em que a administração de condomínio contrata serviços, não como um simples particular, mas para os destinar a uma actividade comercial.
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- Pelo que não se pode considerar, sem mais, e como facto notório que os serviços de limpeza contratados por um condomínio sejam de não comerciante.
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- Na vida quotidiana, os condomínios praticam actos de comércio.
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- Mesmo não considerando o exemplo flagrante dos centros comercial constituídos em propriedade horizontal, é normal e correntes muitos prédios (constituídos em propriedade horizontal) terem uma parte habitacional e uma parte denominada comercial, onde existem lojas, normalmente situadas nos pisos térreos.
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- Nas denominadas partes comerciais onde só existem loja, o condomínio contrata a limpeza desses espaços.
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- Ora esse contrato não pode deixar de se considerar como um acto de comércio.
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- Relembrando aqui o que dispõe o artigo 1° do Código Comercial: “A lei comercial rege os actos de comércio sejam ou não comerciantes as pessoas que nele intervêm”.
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