Acórdão nº 458/08.0 GAVGS.C1-A.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Dezembro de 2009

Magistrado ResponsávelSOUTO DE MOURA
Data da Resolução15 de Dezembro de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: REJEITADO O RECURSO Sumário : I - O chamado cúmulo por arrastamento tem vindo a ser uniformemente rejeitado pelo STJ, podendo indicar-se, nesse sentido, os Acórdãos de 09-04-08, Proc. n.º 1011/08 - 5.ª, de 17-04-2008, Proc. n.º 681/08 - 5.ª, de 12-06-2008, Proc. n.º 1518/08 - 3.ª, de 10-07-2008, Proc. n.º 2034/08 - 3.ª, e de 10-09-2008, Proc. n.º 2500/08 - 3.ª, afirmando-se neste último que “Só podem entrar para o cúmulo crimes cujas penas não tenham transitado, representando o trânsito em julgado de uma condenação penal o limite temporal intransponível no âmbito do concurso de crimes, excluindo-se do âmbito da pena única os crimes praticados posteriormente; o trânsito em julgado de uma dada condenação obsta a que se fixe uma pena unitária que englobe as infracções cometidas até essa data e cumule as praticadas depois desse trânsito”.

II - À luz do n.º 1 do art. 77.º do CP, para a escolha da medida da pena única, importará ter em conta “em conjunto, os factos e a personalidade do agente”. E é apenas isto que directamente a lei nos dá como critérios de individualização.

III - Para usar expressões do Presidente desta 5.ª Secção, Conselheiro Carmona da Mota, a pena conjunta situar-se-á até onde a empurrar o efeito “expansivo” sobre a parcelar mais grave, das outras penas, e um efeito “repulsivo” que se faz sentir a partir do limite da soma aritmética de todas as penas. Ora, este efeito “repulsivo” prende-se necessariamente com uma preocupação de proporcionalidade, que surge como variante com alguma autonomia, em relação aos já aludidos critérios da “imagem global do ilícito” e da personalidade do arguido. Proporcionalidade entre o peso relativo de cada parcelar, em relação ao conjunto de todas elas.

IV - Se a pena parcelar é uma entre muitas outras semelhantes, o peso relativo do crime que traduz é diminuto em relação ao ilícito global, e portanto, só uma fracção menor dessa[s] pena[s] parcelar[es] deverá contar para a pena conjunta.

V - Importa também referir que a preocupação de proporcionalidade a que importa atender, resulta ainda do limite intransponível absoluto, dos 25 anos de prisão, estabelecido no n.º 2 do art. 77.º do CP. É aqui que deve continuar a aflorar uma abordagem diferente da pequena e média criminalidade, face à grande criminalidade, para efeitos de determinação da pena conjunta, e que se traduzirá, na prática, no acrescentamento à parcelar mais grave de uma fracção menor das outras.

Souto Moura (relator) ** ** Sumário revisto pelo relator Decisão Texto Integral: A – RECURSO O Ministério Público junto do Tribunal da Relação de Coimbra interpôs recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, ao abrigo do nº 2 do artº 437º do C.P.P., em síntese, com base no seguinte: 1. No Pº Sumário n.° 458/08.0GAVGS, do Tribunal Judicial da Comarca de Vagos, AA foi acusado da prática de um crime de Condução de Veículo em Estado de Embriaguez, previsto e punido pelos art.°s 292.° n.° 1 e 69.° n.° 1, ambos do C. P., e submetido a julgamento no dia 26/08/2008. Na verdade, a 24/08/2008, fora fiscalizado por uma patrulha da BT/GNR quando conduzia o veículo automóvel LQ-...-..., apresentando uma TAS de 1,97 g/l, a qual foi lida no aparelho marca Drager modelo 7110MKIII P n° série ARRA-0035 aprovado pela DGV em 06/08/1998.

O arguido confessou integralmente os factos, e também não foi nunca questionada, em julgamento, a fidelidade da leitura deste específico aparelho. No entanto, tendo em conta uma abstracta margem de erro admitida para o tipo de aparelho, considerou o Tribunal que o arguido conduzia com uma TAS corrigida de 1,82 g/l e não com a efectivamente lida TAS de 1,97 g/l, pelo que, em consonância com tal entendimento, condenou-o na pena correspondente à taxa corrigida.

O Ministério Público discordou da decisão, que entendeu estar viciada pela indevida correcção operada, (o valor da TAS de 1,82 gr/l foi fixado na matéria de facto, quando a apresentada pelo respectivo aparelho era de 1,97 gr/l), e interpôs recurso para o Tribunal da Relação, o qual, por acórdão de 11/03/2009 ratificou o entendimento da 1.ª instância, no que toca à correcção da referida margem de erro. Esta decisão não admite recurso ordinário e transitou em julgado em 27/03/2009.

  1. No Pº 350/07.5GBPMS.C1 do 2º Juízo da comarca de Porto de Mós, havia-se decido do mesmo modo, deduzindo -se o valor do erro máximo admissível (de 1,28 gr./l para 1,18 gr./l).

    Interposto recurso, o mesmo Tribunal da Relação de Coimbra alterou a decisão da primeira instância, o que teve lugar através do acórdão de 04/06/2008, transitado em julgado em 23/06/2008. Debruçando-se sobre a mesma questão jurídica, ou seja, a de se saber se, de forma automática, deve ou não proceder-se à correcção da TAS indicada pelo mesmo tipo de aparelho "Drager", Modelo 7110 MK111 P, no qual foi lida a TAS de 1,28 gr/l, e tendo igualmente o arguido confessado integralmente os factos, a Relação respondera, dessa vez, negativamente.

    Considerou, na verdade, que se deve atender para efeitos de condenação, sem mais, à leitura fornecida pelo aparelho em questão, porquanto “A margem de erro máxima admissível (EMA) reporta-se e tem por finalidade específica, a Aprovação e as Verificações periódicas subsequentes realizadas pelo IPQ como condição prévia da sua homologação e aprovação - e não casuisticamente, depois de os aparelhos terem sido aprovados e/ou verificados por quem de direito, ser aplicadas (novamente) pelas entidades fiscalizadoras de trânsito o que, além de extravasar as suas competências, redundaria numa duplicação”. E assim, “(...) a taxa a considerar, dando-a como provada, é aquela que foi registada peto aparelho utilizado “.

  2. Por isso é que, defende o Mº Pº, o Tribunal da Relação de Coimbra proferiu decisões contrárias, no domínio da mesma legislação e decidindo igual questão de direito, em sede de interpretação das mesmas normas jurídicas. Concretamente, a Portaria n.° 1556/2007, de 10/12, que aprovou o novo Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, por referência à Recomendação da Organização Internacional de Metrologia Legal (OIML R 126).

    Interpretações divergentes, que conduziram a soluções opostas, relativamente à mesma questão jurídica: No caso dos presentes autos (acórdão recorrido) procedeu-se à correcção da TAS de 1,97 g/l para 1,82 g/l, porque se considerou que a taxa de álcool a ter em conta resulta da subtracção da margem de erro máximo admissível ao valor indicado no aparelho.

    Enquanto que no caso do referido Acórdão deste Tribunal da Relação de Coimbra de 04/06/2008 (acórdão fundamento), se decidiu que a taxa de alcoolémia a considerar é aquela que foi registada pelo aparelho utilizado, não procedendo, nesse caso, a qualquer correcção oficiosa da TAS de 1,28 gr/l, lida.

  3. “Impõe-se, por isso, que: através do presente recurso extraordinário, seja fixada jurisprudência sobre a questão de saber se, relativamente ao aparelho marca "Drager", modelo 7110MKIII P, para efeitos da margem de erro a que se referem, Portaria n.° 1556/2007, de 10/12, que aprovou o novo Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, e por referência à Recomendação da Organização Internacional de Metrologia Legal (OIML R 126), confessando o arguido integralmente e sem reservas os factos, e não sendo em julgamento posta em causa a fiabilidade do específico e individualizado aparelho que procedeu à leitura, de forma automática e oficiosamente, poderá proceder-se à correcção da margem de erro admitida em abstracto para este tipo de aparelho.” Foi junta certidão do acórdão recorrido e do acórdão fundamento com a nota de trânsito em julgado.

    O MºPº neste S.T.J. teve vista nos autos, ao abrigo do nº 1 do artº 440º do C.P.P., e pronunciou-se no sentido do preenchimento dos pressupostos da prossecução do presente recurso por haver oposição de julgados no domínio da mesma legislação quanto à mesma questão de direito. Disse, entre o mais, que: “3.a.

    Quanto à verificação da oposição relevante de julgados, haverá que ter presente, antes do mais, que o Supremo Tribunal de Justiça se pronunciou, recentemente, sobre a mesma questão que ora vem suscitada – cf. o Acórdão de 15-04-2009, proferido no Processo nº 3263/08-3, o Acórdão de 21-05-2009, proferido no Processo nº 378/09-5 e o Acórdão de 18-06-2009, proferido no Processo nº 118/08.1GTTVD-A.S1.

    Em todos esses doutos Acórdãos se decidiu, por unanimidade, rejeitar os recursos de fixação de jurisprudência, por ausência de oposição relevante.

    Conforme se concluiu nos dois primeiros acórdãos referidos: “Estando subjacente em ambos os processos a aplicação e observância das indicações dos ofícios da DGV, constituindo no fulcro o objecto dos recursos a avaliação da bondade do recurso a tal informação administrativa, …não estamos perante a aplicação de normas jurídicas, não se colocando verdadeiramente uma questão de direito controvertida, sendo que o acórdão recorrido sobre a questão específica da valia do ofício nada disse, o que conduz a uma não oposição de julgados” – cf. fls. 11 do Acórdão de 15-04-2009, e fls. 4 do Acórdão de 21-05-2009, respectivamente.

    No mesmo sentido se pronunciou o Acórdão proferido no Processo nº 118/01.1GTTVD-A.S1, não se “vendo razões para nos afastarmos da decisão tomada nos doutos arestos que se acabaram de transcrever parcialmente [transcrição vertida no parágrafo imediatamente anterior deste parecer], concluindo também pela não oposição de julgados e pela rejeição do recurso.

  4. b. Como se relembra no citado Ac. STJ, de 18-06-2009, remetendo para vários outros arestos deste Supremo Tribunal, são os seguintes os recursos substanciais da admissibilidade do recurso extraordinário para fixação de jurispudência: - As asserções antagónicas dos acórdãos invocados como opostos tenham tido como efeito fixar ou consagrar soluções diferentes para mesma questão fundamental de direito; - As decisões em oposição sejam expressas; - A situação...

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