Acórdão nº 205/07.3GTLRA.C1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Novembro de 2009

Magistrado ResponsávelPIRES DA GRAÇA
Data da Resolução13 de Novembro de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: PROVIDO EM PARTE Sumário : I - No que diz respeito à indemnização pelo dano morte, a Portaria 377/2008, de 26-05, tem um âmbito institucional específico de aplicação extrajudicial, sendo que, por outro lado, e, pela natureza do diploma que é, não derroga Lei ou DL, situando-se em hierarquia inferior, pelo que o critério legal necessário e fundamental, em termos judiciais, é o definido no CC.

II - À míngua de outro critério legal, na determinação do concernente quantum compensatório importa ter em linha de conta, por um lado, a própria vida em si, como bem supremo e base de todos os demais. E, por outro lado, conforme os casos, a vontade e a alegria de viver da vítima, a sua idade, a saúde, o estado civil, os projectos de vida e as concretizações do preenchimento da existência no dia a dia, designadamente a sua situação profissional e sócio-económica.

III - Tendo em conta que: - o acidente de viação ocorreu em 1-05-07; - o falecido encontrava-se a trabalhar como engenheiro informático, a exercer funções de desenvolvimento de “software”; concluiu com sucesso um curso na Oracle University; - à data do seu falecimento a vítima auferia mensalmente a quantia de € 1450, a título de vencimento base, acrescida da importância diária de € 6,05 a título de subsídio de refeição; - faleceu com 33 anos de idade; - era um amigo muito dedicado a todos os seus amigos, que o estimavam e admiravam; - era doador de sangue e encontrava-se inscrito para doar medula óssea; - possuía uma cultura geral acima da média e interessava-se sobre uma variedade enorme de assuntos; - praticava frequentemente natação e corrida; - tinha uma relação muito próxima com o demandante, seu filho único, existindo entre ambos um entendimento profundo e muito afectivo; - era o melhor amigo do demandante; - apoiava e orientava em tudo o demandante, acompanhando-o na evolução do ensino, dedicando-lhe todos os tempos livres e aproveitando por inteiro todo o tempo que o regime de visitas estipulado na regulação do poder paternal lhe permitia aproveitar; - dava assistência ao demandante em relação aos seus estudos e actividades escolares, entende-se adequada a indemnização pelo dano morte de € 60 000.

IV - O âmbito da prestação de alimentos devida a filho menor da vítima abrange as despesas com a saúde e com a educação, que seriam a suportar pelo progenitor se não tivesse falecido, e traduzem um dano advindo da sua privação pelo falecimento do progenitor, e deve atender ao momento da sua maioridade ou emancipação, sem prejuízo da prestação alimentar e referidas despesas continuarem a ser suportadas pela demandada Companhia de Seguros após a maioridade ou emancipação do demandante, nos termos do art. 1880.º do CC, caso o interessado o requeira demonstrando os respectivos pressupostos.

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça --- Nos autos de processo comum supra referenciado oriundo do 1º Juízo do Tribunal Judicial da comarca de Torres Novas, o arguido AA, solteiro, industrial, nascido a … de … de 19… em cabo Verde, residente em …., Loures. foi submetido a julgamento, em processo comum, com intervenção do tribunal singular, na sequência de acusação formulada pelo Ministério Público, que lhe imputava a prática de um crime de homicídio por negligência, p. e p. pelo art. 137º, nº 1, de um crime de omissão de auxílio, p. e p. pelo art. 200º, nºs 1 e 2, todos do C. Penal, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3º, nº 2, do Dec. Lei nº 2/98, de 3 de Janeiro, de uma contra-ordenação por violação do art. 24º, nº 1, do C. da Estrada, de uma contra-ordenação por violação do art. 38º, nºs 1 e 2, b), do C. da estrada e de uma contra-ordenação por violação do art. 11º, nº 1, do Dec. Regulamentar nº 7/98, de 6 de Maio,-O assistente e demandante civil BB deduziu pedido de indemnização civil contra a G… – Companhia de Seguros, SPA., dela reclamando o pagamento da quantia de € 441.691,11, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação e até integral pagamento.

-Contra a mesma Seguradora, o Instituto de Segurança Social formulou, pedido de reembolso do subsídio por morte e pensões de sobrevivência que pagou a BB, pedindo a condenação da demandada no pagamento da quantia de € 11.162,47, e no pagamento das pensões que se vencerem e forem pagas na pendência do processo, bem como nos juros legais desde a citação e até integral pagamento.

-Proferida sentença em 28 de Julho de 2008, o arguido foi absolvido da prática do crime de omissão de auxílio e da contra-ordenação por violação do art. 38º, do C. da Estrada, e foi condenado, pela prática de um crime de homicídio por negligência, p. e p. pelo art. 137º, nº 1, do C. Penal, na pena de 1 ano de prisão, pela prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3º, nº 2, do Dec. Lei nº 2/98, de 3 de Janeiro, na pena de 6 meses de prisão, e em cúmulo, na pena única de 1 ano e 4 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo, sob condição de entrega da quantia de € 800, no prazo de dez meses, aos Bombeiros Voluntários de ….. Foi ainda o arguido condenado pela prática da contra-ordenação por violação ao art. 24º, nºs 1 e 3 do C. da Estrada, na coima de € 350 e pela prática da contra-ordenação por violação ao art. 6º, nº 1, do Dec. Regulamentar nº 7/98, de 6 de Maio, na coima de € 175.

Relativamente ao pedido de reembolso deduzido pelo Instituto de Segurança Social, contra a … – Companhia de Seguros, SPA, foi esta condenada no pagamento da quantia de € 1.437, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal, desde a notificação do pedido E quanto ao pedido de indemnização civil deduzido pelo assistente BB foi a … – Companhia de Seguros, SPA condenada nos seguintes termos: - No pagamento do valor venal do veículo de matrícula …, a liquidar no incidente próprio, com o limite de € 4.500, acrescidos de juros de mora, desde a data da liquidação, à taxa legal de 4% e até integral pagamento; - No pagamento da quantia de € 5.119,24, correspondente às prestações de alimentos vencidas entre Maio de 2007 e Julho de 2008, acrescida de juros desde a data da decisão, à taxa legal de 4% e integral pagamento; - No pagamento das prestações da pensão de alimentos que se vencerem a partir de Agosto de 2008 inclusive, e até 16 de Abril de 2022, que se encontra fixada para 2008 em € 370,53, e que será actualizada anualmente, de acordo com a taxa de inflação publicada pelo INE para o ano imediatamente anterior e com efeitos a partir de Janeiro de cada ano, devendo o pagamento de cada prestação ser efectuado no primeiro dia de cada mês e ficando a demandada obrigada ao pagamento de juros de mora à taxa legal dos juros civis que vigorar, em caso de atraso na prestação; - No pagamento da quantia de € 25.000 por danos não patrimoniais próprios do demandante, no pagamento da quantia de € 55.000 pelo dano morte, e no pagamento de juros de mora sobre estas quantias, à taxa legal de 4%, desde o trânsito da decisão e até integral pagamento.

Tendo a demandada sido absolvida do demais peticionado.

--- Inconformado com a sentença, dela recorreu o assistente e demandante BB, para o Tribunal da Relação de Coimbra, que por seu acórdão de 25 de Março de 2009, decidiu: “A) 1. Condenar a demandada … – Companhia de Seguros, SPA, no pagamento, ao recorrente, da quantia de € 60.000 (sessenta mil euros), a título de indemnização devida pelo dano morte.

  1. Condenar a demandada ... – Companhia de Seguros, SPA, no pagamento, ao recorrente, da quantia de € 5.485,50 (cinco mil quatrocentos e oitenta e cinco euros e cinquenta cêntimos), referente às prestações de alimentos vencidas desde Maio de 2007 a Julho de 2008. 3. Condenar a demandada ... – Companhia de Seguros, SPA, no pagamento, ao recorrente, das prestações de alimentos que se vencerem a partir de Agosto de 2008, inclusive, até este perfazer 25 anos ou seja, até 16 de Abril de 2024, prestação que foi de € 370,90 (trezentos e setenta euros e noventa cêntimos) para o ano de 2008.

  2. Condenar a demandada ... – Companhia de Seguros, SPA, no pagamento, ao recorrente, de metade das despesas com saúde e educação – com excepção das despesas relativas a actividades extracurriculares – por este feitas e devidamente comprovadas, a partir de 15 de Maio de 2008 e até este perfazer 25 anos ou seja, até 16 de Abril de 2024.

  3. Condenar a demandada ... – Companhia de Seguros, SPA, no pagamento, ao recorrente, da quantia de € 3.631,43 (três mil seiscentos e trinta e um euros e quarenta e três cêntimos), referente a metade das despesas de saúde e educação por este feitas até 15 de Maio de 2008.

    *B) Confirmar quanto ao mais a sentença recorrida.

    * Custas na proporção de vencido, por demandante e demandada.”--- Inconformada com o acórdão, dele recorre a demandada ...

    – Companhia de Seguros, SPA apresentando as seguintes conclusões: 1º. Com a publicação da Portaria 377/2008 de 26 de Maio, tentou o legislador fixar os critérios orientadores que permitam, por forma a evitar diferenças indemnizatórias significativas para situações similares, o apuramento do valor monetário em que se deverá traduzir os danos físicos e psíquicos sofridos por vitimas de acidentes de viação.

    1. Ora, para o caso da morte da vitima, fixa a referida Portaria, como compensação devida pela perda do direito à vida, quando esta se compreenda entre os 25 e os 49 anos, um montante máximo de € 50.000,00.

    2. O valor correspondente ao bem VIDA fixado pelo Tribunal da Relação mostra-se desajustado da realidade, por excessivamente valorado, devendo ser de manter o valor fixado na Sentença proferida pelo Tribunal de Primeira Instância.

    3. Nos termos da lei, o falecido CC encontrava-se obrigado a prestar alimentos ao seu filho BB, enquanto o mesmo fosse menor, isto é, até o mesmo perfazer 18 anos, cfr. artº 1877º do Cód. Civil.

    4. Quer isto dizer que, com a maioridade cessa o poder...

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