Acórdão nº 159/09.1YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Junho de 2009

Magistrado ResponsávelALBERTO SOBRINHO
Data da Resolução18 de Junho de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório AA intentou, a 29 de Novembro de 2006, a presente acção declarativa, com processo ordinário, contra - BB - IMPRENSA LIVRE, S.A.; - CC; - DD; - EE; e - FF, pedindo que sejam condenados, solidariamente, a indemnizá-lo, a título de danos não patrimoniais, na quantia de € 70.000,00, acrescida de juros de mora.

Em fundamento desta sua pretensão alega, em síntese, que foi publicada na edição impressa do jornal diário Correio da Manhã, de 25 de Julho de 2006, uma notícia da autoria dos réus CC, DD, EE e FF com desenvolvimento na edição do dia seguinte, a que o director do jornal não se opôs a que fosse publicada apesar de a não desconhecer, em que lhe é imputada a imagem de alguém que beneficia de algo que não merece, notícia que mereceu amplo destaque em outros meios de comunicação social. E que o teor desta notícia, que os réus sabiam ser falsa, abalou a sua imagem de seriedade, honradez e integridade, causando-lhe grande desgosto e ansiedade, assim como um sentimento de mal estar e revolta.

Contestaram os réus, alegando, no essencial, que os factos noticiados são verdadeiros e assumiam relevância e interesse informativo por respeitarem a uma personalidade pública e que nunca foi sua intenção ofender o autor na sua honra e consideração.

Ainda replicou o autor para manter a posição inicialmente assumida.

Saneado o processo e fixados os factos que se consideraram assentes e os controvertidos, prosseguiu o processo para julgamento.

Na sentença, subsequentemente proferida, foi a acção julgada parcialmente procedente e as rés CC e DD condenados, solidariamente, a pagar ao autor, a título de danos não patrimoniais, a quantia de € 15.000,00, acrescida de juros de mora desde o trânsito em julgado da sentença e até integral pagamento; e os restantes réus absolvidos.

Inconformados quanto ao assim decidido apelaram autor e rés condenadas, e com parcial êxito o autor, porquanto o Tribunal da Relação de Lisboa condenou, solidariamente, todos os réus, à excepção do FF que foi absolvido, a indemnizar o autor na importância de € 25.000,00, acrescida de juros de mora desde a prolação da decisão de 1ª instancia.

De novo irresignados, recorrem agora de revista para este Tribunal o autor e os réus condenados, pugnando aquele pela fixação da indemnização na peticionada quantia de € 70.000,00 e estes pela improcedência total da acção.

Contra-alegaram os recorridos em defesa da improcedência dos recursos interpostos pela parte contrária.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir II. Âmbito do recurso A- De acordo com as conclusões, com que rematam as suas alegações, o inconformismo dos recorrentes radica, sinteticamente, no seguinte: Autor 1- Dos factos provados, decorre que a imagem de seriedade, honradez e integridade do autor foi abalada junto de muitos portugueses, e que este sofreu grande desgosto, ansiedade e revolta, como consequência dessa série de noticias e comentários publicados, em dois dias seguidos, no jornal diário Correio da Manhã.

2- Se, aquando da noticia de 25.7.06, se poderia colocar a dúvida quanto a saber se a ré BB se limitou a conformar-se com a eventualidade da ilicitude da sua conduta, a verdade é que a falta de publicação de um desmentido, agravada pela manutenção intencional do leitor num estado de crença na veracidade daqueles factos falsos, aliada á escolha do apelante como exemplo para a noticia do fim de um "privilegio injustificado", levam á conclusão necessária de que houve um processo intencional, tendo ela agido com dolo directo.

3- Também é manifesto que a ré CC, ao redigir o texto noticioso, não se mostra movida por qualquer intuito de informar, nem, sequer, de criticar, mas, tão só, pelo ataque achincalhante, com clara intenção de atingir a imagem do autor, com desrespeito, inclusivamente, pela própria imagem da classe política, fazendo apelo a um sentimento de desilusão relativamente à sua personalidade, agindo também com dolo directo.

4- O autor é um dos políticos de maior prestigio em Portugal, ambos os grupos de notícias têm por resultado prático qualificá-lo como alguém que é oportunista, materialista, privilegiado e hipócrita, o que foi amplamente divulgado, com consequências muito danosas para a sua honra.

5- Por outro lado, os rendimentos da ré BB serão incomparavelmente superiores aos do autor e as indemnizações arbitradas em situações semelhantes têm sido bem mais elevadas do que a fixada no acórdão recorrido, pelo que a mesma deve ser fixada em quantia não inferior a € 70.000,00.

6- Acresce que, ao supor que a situação patrimonial do autor e da ré BB é razoável, o acórdão recorrido adoptou um critério absolutamente vago e impreciso, que não preenche os requisitos de fundamentação, com a consequência prevista no art. 668°, n° 1, al. b), do CPC.

Réus 1- As notícias publicadas são verdadeiras, os recorrentes basearam-se num documento oficial, e têm claro interesse informativo.

2- O director do jornal não teve conhecimento das notícias antes da sua publicação e, consequentemente, a recorrente BB não pode ser responsabilizada com os autores das notícias.

3- Os restantes recorrentes foram autores de notícias diferentes, com conteúdos diferentes, não podendo responder nos mesmos termos e não sendo solidária a responsabilidade.

4- Quanto ao artigo de opinião, a opinião deve ser expressa de forma livre, cabendo a cada um decidir se considera determinado assunto com interesse suficiente para formular a sua opinião sobre o mesmo.

5- Nunca foi intenção dos recorrentes, ao publicar as peças jornalísticas em questão, ofender o recorrido na sua honra e consideração, mas tão só desenvolver e relatar factos de elevado interesse para todos os leitores do jornal Correio da Manhã e do público em geral.

6- Foram respeitados todos os deveres deontológicos que obrigam um jornalista no âmbito da sua profissão, pelo que a conduta em análise não pode ser culposa, sequer negligente.

7- Por outro lado, a matéria de facto dada como provada sempre seria insuficiente para se concluir pela existência de danos relevantes, para efeitos direito à indemnização prevista no art. 496º C.Civil, além de não existir nenhum nexo de causalidade entre os danos alegadamente sofridos pelo autor e as noticias publicadas.

8- Os recorrentes actuaram no exercício de um direito fundamental da liberdade de expressão e informação pela imprensa (arts. 37° e 38° Constituição da República Portuguesa e Decreto-Lei 2/99 de 13 de Janeiro).

9- O acórdão recorrido ao condenar os recorrentes fez uma errada aplicação da lei aos factos, violando o disposto nos arts.483°, 484º e 487° C.Civil, 37°, n°1 e 38.° n°1 da Constituição da República e 10° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

B- Face ao teor das conclusões formuladas, delimitativas do âmbito do recurso, as questões controvertidas a dilucidar reconduzem-se, no essencial, a averiguar: - se o acórdão enferma do vício da nulidade por falta de fundamentação; - montante da indemnização devida; - inexistência de pressupostos da responsabilidade dos réus/recorrentes.

  1. Fundamentação A- Os factos No acórdão recorrido deram-se como assentes os seguintes factos: 1. Na edição impressa do jornal diário "CORREIO DA MANHÃ", de 25.7.2006, foi publicado, na primeira página, juntamente com fotografia do autor, o seguinte título: "AA vai receber reforma da rádio, tem direito a três mil euros/mês por ter trabalhado meses na RDP. Vai receber 1/3".

    1. Na página 24 dessa mesma edição, em desenvolvimento daquele título, foi publicada uma notícia, que se dá por totalmente reproduzida, em página inteira, com fotografia do autor, com cabeçalho "Profissão Esquecida - AA reformado da rádio portuguesa", assinada pelos 3ª e 4º réus, e com o seguinte teor: "AA, vice-presidente da Assembleia da República, era até há pouco tempo coordenador de programas de texto da RDP (Rádio Difusão Portuguesa), cargo do qual se reformou, com 3.219,95 euros mensais, segundo a lista dos aposentados e reformados divulgada pela Caixa Geral de Aposentações (CGA). Político e escritor, AA tinha bem escondida dos portugueses e dos amigos a profissão de funcionário da RDP. E nem ele mesmo se lembrava (...). Admitindo ter ingressado nos quadros da RDP pouco depois de "regressar a Portugal, vindo do exílio em Argel, AA confessa que esteve "pouco tempo nas funções de director dos Serviços Criativo e Culturais da RDP.

    2. Nessa mesma página, em caixa intitulada "perfil", foi incluída uma citação do autor com o seguinte teor: "herdei de minha mãe uma certa energia, o gosto da intervenção. De meu pai o desprendimento, uma irresistível e por vezes perigosa tendência para o desinteresse. Inclusivamente pelos bens materiais.".

    3. Na segunda página da edição em causa, na coluna "Dia a Dia", assinada pela 2ª ré, com o título "A ética de AA", afirma-se ainda: ---Faz o que eu digo, não faças o que eu faço é seguramente a máxima do povo mais utilizada por políticos em Portugal. AA era seguramente o último a quem se esperava que ela se aplicasse. AA não valeu um milhão de votos nas últimas Presidenciais pelas medidas que propôs. Muito menos pela acutilância nos debates. O estatuto de herói da democracia foi-lhe restituído após uma campanha em defesa da ética e dos princípios morais na política. Os portugueses, já se sabe, gostam de vítimas. AA, o candidato traído, pelo partido e pelo amigo GG, que...

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