Acórdão nº 08S3085 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Junho de 2009

Magistrado ResponsávelMÁRIO PEREIRA
Data da Resolução03 de Junho de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I - No Tribunal do Trabalho de Portalegre, e em acção com processo comum, o autor AA pediu a condenação da ré BB Portugal, S.A.

a reintegrá-lo e a pagar-lhe as retribuições que deixou de auferir desde que foi despedido, e até ao trânsito em julgado da sentença, acrescidas de juros de mora, à taxa legal, desde a citação.

Para o efeito, alegou em resumo que, sendo trabalhador da R., desde 12/6/1982, foi despedido em 12/6/2006, com alegação de justa causa, em conclusão de processo disciplinar que lhe havia sido instaurado; porém, tal despedimento é inválido, porque o demandante não praticou conduta grave e culposa que pudesse fundamentá-lo.

A R. contestou, impugnando os factos alegados na p.i., pugnando pela validade do despedimento proferido, e concluindo pela improcedência da acção e consequente absolvição do pedido.

Saneada, instruída e julgada a causa, foi proferida sentença, que julgou a acção procedente, condenando a R. a reintegrar o A. no seu posto de trabalho, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, e bem assim a pagar-lhe as retribuições que o mesmo deixou de auferir, desde 31/8/2006, e até ao trânsito em julgado da decisão, à razão mensal ilíquida de € 861,92 mensais, sem prejuízo da sua antiguidade vir a determinar uma retribuição superior, acrescida de juros, contados, à taxa legal, desde 8/9/2006 e até integral pagamento.

Inconformada, a R. apelou da sentença, pedindo que seja julgada verificada a justa causa de despedimento, com a sua absolvição do pedido.

Por seu douto acórdão, o Tribunal da Relação de Évora julgou improcedente a apelação e confirmou a sentença.

II - Novamente inconformada, a R. interpôs a presente revista, em que formulou as seguintes conclusões: 1ª) Vem o presente recurso interposto do douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, que, confirmando a decisão recorrida, declarou ilícito o despedimento do A., por entender que o comportamento do Recorrido, não obstante ser susceptível de sanção disciplinar, não foi de tal forma grave, que traduza uma impossibilidade de subsistência da relação de trabalho.

  1. ) De salientar, como questão preliminar, e por se entender a chamada de atenção para a Reclamação para a Conferência apresentada pela ora Recorrente, do despacho do Sr Juiz Desembargador Relator de fls. 433, na parte em que entendeu que o efeito meramente devolutivo da presente Revista, não prejudica a exequibilidade da decisão recorrida, designadamente no que toca à reintegração do A., o que não se aceita, porquanto, 3ª) Inconformada com a decisão proferida em 27.02.2007, pelo Tribunal de 1ª Instância, a Recorrente interpôs recurso de Apelação, tendo prestado caução por meio de depósito autónomo junto da Caixa Geral de Depósitos, no montante de € 5.830,83, tendo em vista suspender o efeitos da sentença recorrida.

  2. ) Proferido Acórdão pela Relação de Évora em 08.04.2008, decisão aliás de que agora se recorre, foi negado provimento ao recurso, julgando improcedente a Apelação, e confirmando a sentença recorrida, tendo a Ré interposto recurso de Revista admitido a fls 433 dos autos. Ora, 5ª) Ao ser atribuído efeito suspensivo ao recurso de Apelação, salvo o devido respeito, por opinião diversa, entende a Recorrente, que fica suspensa a exequibilidade da decisão recorrida até ao trânsito em julgado da decisão do Tribunal Superior que decidir o recurso de Apelação.

  3. ) Se é certo que a lei atribui efeito devolutivo ao recurso de Revista - art° 723° CPC, contudo, como a decisão da Relação não transitou em julgado face à interposição de recurso de Revista para o Supremo Tribunal de Justiça e, mantendo-se sem alteração a caução prestada, garantida está a não executoriedade da sentença, confirmada pela Relação, enquanto não houver decisão proferida pelo Tribunal Superior com trânsito em julgado - neste mesmo sentido vide Ac. TRC in CJ, ano 1999, Tomo I, pag 69 e 70, e STJ em 27.01.1999 in AD ( 451,1999,1002) - CPT Anotado Mestre Albino Batista, pags.169). É esta a questão ainda pendente.

  4. ) No que respeita ao Acórdão propriamente dito objecto do presente recurso, concluíram os Meritíssimos Juízes Desembargadores que o que está em causa é apenas a probidade do Recorrido, traduzida no repetido desinteresse e aparente despreocupação em fazer acerto de contas com a R.

  5. ) De salientar que o que está em causa é o comportamento de um trabalhador, dirigente sindical, que participou em 2 reuniões Plenárias, uma em Paris a 12.03.2004, e outra em Cracóvia nos dias 12 a 14.03.2005, enquanto representante dos trabalhadores portugueses no Comité Europeu dos trabalhadores do Grupo BB, tendo recebido um adiantamento no valor de € 600,00 por cada uma das viagens, por parte da Recorrente, tendente a fazer face a despesas durante a sua viagem e estadia, e, 9ª) No seu regresso, não só não prestou as devidas contas atempadamente, como deveria, como usou em proveito próprio dinheiro da empresa, ficando por justificar a quantia de € 977,21, como ainda, face a ordens expressas, e legítimas da empresa para prestar as devidas contas, não as acatou em clara desobediência e afronta à Administração da mesma. Ora, 10ª) Salvo o devido respeito pela decisão recorrida, o cerne da questão não está na aparente despreocupação do trabalhador em fazer o acerto de contas, mas sim, no desrespeito por parte do mesmo às ordens legítimas dadas pela Entidade Patronal, e suas consequências, assente num "abuso" face ao seu estatuto de delegado sindical, constituindo esta atitude um exemplo negativo na comunidade de trabalho em que estava inserido, e colocando em causa a autoridade da direcção e da própria Administração, pelo [que a] questão deveria ter sido apreciada e centrada de forma substancialmente diferente, daquilo que se entendeu.

  6. ) O motivo da rotura da relação de trabalho não assentou no facto de não ter apresentado as contas e respectivos justificativos atempadamente. Também não está em causa qualquer comportamento do trabalhador ocorrido nas reuniões do Conselho Europeu, no desempenho das suas funções de representante sindical, mas antes, o desrespeito e desobediência a uma ordem legítima da entidade patronal, agravado pelo especial estatuto do trabalhador enquanto dirigente sindical e representante dos trabalhadores.

  7. ) Não podemos igualmente concordar com a Veneranda Relação no sentido de "desvalorizar" o comportamento do Recorrido, ao entender que, por não estarem em causa factos respeitantes à execução e disciplina do trabalho a que o mesmo estava obrigado no âmbito do conteúdo funcional da sua categoria profissional, mas sim factos relativos à actividade do mesmo enquanto representante dos trabalhadores da empresa, como tal o seu comportamento é lateral e afim ao normal quotidiano e desempenho do trabalhador.

  8. ) Não nos podemos esquecer que a relação de trabalho é só uma, sendo os deveres quer do trabalhador, quer do empregador, vistos e assentes nesse universo complexo que é a relação de trabalho.

  9. ) Se é certo que, no caso concreto, o Recorrido ao participar nas reuniões instituídas nos termos do acordo celebrado pela BB no âmbito e termos do Art° 13° da Directiva n° 32/94/CE e que o CT consagrou nos art°s 471° a 474°, fá-lo na qualidade de trabalhador da BB, e no âmbito da execução da sua relação de trabalho, ainda que não resulte das suas funções habituais, circunscritas às tarefas no posto da fábrica, não deixam no entanto de ser mais ou menos importantes, pois uma e outras, estão intrinsecamente ligadas sendo expressão da execução da própria relação de trabalho, não podendo ser autonomizadas, sobretudo em matéria disciplinar.

  10. ) No caso em apreço, o comportamento do Recorrido, traduzido na desobediência a uma ordem legítima da empresa, impõe uma especial valoração, pois atenta a sua qualidade de dirigente sindical e representante dos trabalhadores portugueses no Comité Europeu, tal traduz-se numa relação directa com a Administração e direcção de recursos humanos, relação esta assente num alto grau de confiança e lealdade, até pela reserva e confidencialidade com que muitas das questões são tratadas.

  11. ) É esta especial posição na organização e este especial estatuto que impõe uma especial responsabilidade do Recorrido na valorização do seu comportamento e respectivo reflexo na comunidade laboral.

  12. ) Não nos podemos esquecer que o mesmo na sua qualidade de dirigente sindical (pertencente à comissão executiva de um dos principais sindicatos do país), está habituado a participar em reuniões de alto nível e em valorizar as palavras e actos, tendo perfeita noção e conhecimento do que uns e outros possam implicar, impondo um acréscimo de censura face a idênticos comportamentos levados a cabo por um trabalhador indiferenciado.

  13. ) Se é certo que o Recorrido, para além de um mero trabalhador, é também representante dos trabalhadores e dirigente sindical, enquanto tal deverá ser um exemplo de cumprimento das suas obrigações, e deve ter especial cuidado em dar o exemplo, pois o seu comportamento pode ter um efeito indutor nos demais trabalhadores, pondo em causa o próprio poder organizativo.

  14. ) No caso dos presentes autos, o trabalhador após o regresso das viagens que efectuou, deveria ele próprio ter tomado a iniciativa de prestar as devidas contas dos montantes entregues, o que aliás foi feito pelos seus Colegas presentes nas mesmas reuniões.

    Não o fez! 20ª) Ao lhe ter sido solicitado, num primeiro momento verbalmente, pelo Director de Pessoal da Fábrica (al. r) factos provados), num segundo momento por carta registada com aviso de recepção e telegrama (alínea s) e num terceiro momento, por carta assinada pela Administração - Enq° CC -, e ainda por sucessivos contactos do responsável de Controle Interno, Sr DD (alínea x), z), e aa) factos provados), continuou sem o fazer, numa clara afronta e desobediência à hierarquia e Administração da Ré, 21ª) O dever de obediência é um dever genérico que se reconduz no seu núcleo a tudo o...

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