Acórdão nº 1583/1999.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Junho de 2009

Magistrado ResponsávelALVES VELHO
Data da Resolução02 de Junho de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. - AA e mulher BB, intentaram acção declarativa de condenação contra "E...I...., L.da" e "E...- Construções P...C.... § F..., S.A.", pedindo que as Rés sejam condenadas a: - Reconhecer a sua propriedade sobre o prédio identificado no art. 1º da petição inicial; - Retirar do seu prédio as "ancoragens de betão injectado" ou, subsidiariamente, a indemnizá-los pela ocupação do solo deste prédio com a indemnização de esc. 15 000 000$00; - Reconhecer que os danos sofridos pelo seu prédio foram causados pelo desaterro e pelas ancoragens no mesmo colocadas e pela construção do seu edifício contíguo do lado sul; - Reparar todos os danos existentes no referido prédio ou, subsidiariamente, a indemnizá-los com a quantia de Esc. 5.590.000$00 acrescidos de IVA à taxa legal; - Indemnizá-los com a quantia de Esc. 900.000$00 mensais desde Fevereiro de 1998 inclusive até à data em que se mostrarem os danos em causa integralmente reparados, ou até ao fim do prazo de 40 dias posteriores à data em que os indemnizarem com a indemnização prevista na alínea d); - Pagar juros legais de mora à taxa de 10 % desde a data da mora (15/04/98) até efectivo pagamento.

Como fundamento, alegaram que a 1ª Ré "E...I...." desenvolve em seu prédio a construção de um edifício de cave, sub-cave, rés-do-chão e 6 andares, construção efectuada pela 2ª Ré, "E....".

Que para essa construção efectuou trabalhos de desaterro na parte contígua ao prédio dos Autores, introduzindo neste, no subsolo, 21 "ancoragens" de betão injectado, sem o seu conhecimento e autorização.

Que de tais trabalhos resultaram danos no prédio dos Autores, para além de terem ficado impedidos de rentabilizar o mesmo, uma vez que, em virtude da actuação das Réus, a arrendatária do prédio acabou por abandoná-lo.

As Rés contestaram, impugnando parcialmente os factos alegados.

Declinando a respectiva responsabilidade, concluíram pela improcedência da acção.

A final, na parcial procedência da acção, foi decidido: a) - Reconhecer a propriedade dos Autores sobre o prédio identificado no art. 1º da Petição Inicial e no item 1º dos Factos Provados; b) - Condenar solidariamente as Rés "E...I...., L.DA" e "E...- Construções P...C.... § F..., S.A." a indemnizar os Autores pela ocupação do subsolo deste prédio com uma indemnização no montante de € 10.000,00 (dez mil Euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4 % ao ano, contados desde a presente data e até efectivo pagamento; c) - Condenar as mesmas Rés a reconhecer que os danos sofridos neste prédio dos Autores foram causados pelo desaterro, pelas ancoragens no mesmo colocadas e pela construção do edifício contíguo do lado sul; d) - Condenar solidariamente as mesmas Rés a reparar todos os danos existentes no referido prédio dos Autores, em consequência das suas descritas actuações; e) - Condenar solidariamente as mesmas Rés a indemnizar os Autores com a quantia de € 2.652,75 (dois mil seiscentos e cinquenta e dois Euros e setenta e cinco cêntimos) mensal, desde Fevereiro de 1998, inclusive, até à data em que se mostrarem os danos aludidos em d) integralmente reparados, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 10 % ao ano até ao dia 17 de Abril de 1999, à taxa legal de 7 % ao ano até ao dia 1 de Maio de 2003 e à taxa legal de 4 % ao ano após essa data, contados desde a data da citação e até integral pagamento - absolvendo as Rés do demais contra si peticionado.

Mediante apelação da Ré "E...", a Relação revogou o sentenciado no que concerne à indemnização no montante de 10.000,00€ que a "E....." deveria pagar aos Autores pela ocupação do subsolo com as ancoragens, confirmando-a quanto ao mais.

A mesma "E..." pede agora revista, insistindo na absolvição de todas as condenações, a coberto das seguintes conclusões: I - Nem a actividade de construção civil em geral, nem a actividade específica de desaterro podem ser consideradas, só por si, como actividades perigosas para efeitos do disposto no artigo 493/2 do CC. Teria sido necessário demonstrar que o desaterro em causa nos autos havia sido realizado com existência ou antecedência de condições especiais que o tornaram uma actividade de particular risco. Não obstante ter produzido alguns factos (vibrações, movimentações de solos) que tiveram influência no prédio vizinho, nada nos autos nos mostra que a actividade não se tenha desenrolado num quadro de normalidade, o que afasta, salvo melhor opinião, a sua qualificação como actividade perigosa para efeitos desse artigo. Em consequência, devem ser revogadas todas as condenações que foram decretadas contra a Recorrente; Porém, sem conceder, mesmo que assim não fosse, II - Para se verificar se foi ou não elidida a presunção de culpa, nos termos e para os efeitos do art.,. 493º-2 do CC, não se pode assumir uma perspectiva de obrigação de resultado, mas sim de obrigação de meios.

III - Nos termos do citado art. 493º-2 CC, se aquele que causou danos no decurso de uma actividade perigosa empregou todas as providências exigidas pelas circunstâncias com o fim de os prevenir, não será, por esses danos, responsável. Esse emprego verificou-se se as medidas foram apropriadas e foram postas em acção com elevado grau de intensidade de zelo, averiguação que se deve fazer tendo por base o nível de diligência em relação a um bom pai de família.

IV - Estando provado que a técnica de ancoragens e o processo Munique que foram seguidos, eram os mais adequados, seguros e tecnicamente apropriados ao caso concreto, que, ao segui-los, a Recorrente adoptou um processo mais dispendioso em relação a outras alternativas e que, verificados efeitos no prédio contrário, de imediato ofereceu a sua reparação, verifica-se que esta, analisada tal conduta com base na diligência de um bom pai de família, empregou todas as providências exigidas pelas circunstâncias com o fim de prevenir os danos, razão pela qual, nos termos do artigo 493/2 parte final do CC, elidiu a sua presunção de responsabilidade. Em consequência, devem ser revogadas todas as condenações que foram decretadas contra a Recorrente; V/VI - Os factos provados relativos à correspondência trocada pelas partes entre Outubro de 1997 e Fevereiro de 1998 indicados no relatório da sentença com os números : 21, 22, 24, 25, 26, 29, 30 e 31) permitem formar juízo e concluir que: i) a reparação dos danos foi pronta e inequivocamente oferecida pela Recorrente logo em Outubro de 1997 e com carácter de urgência; ii) foi oferecida com mais do que suficiente detalhe do seu conteúdo e método; iii) O recorrido apôs a condição (de verificação impossível (factos 83 e 76) de retirada das ancoragens do subsolo do seu prédio e nunca a retirou, mesmo na correspondência posterior a Março de 1998); iv) - o valor da insistência do Recorrido numa alegada falta de descrição detalhada e minuciosa das reparações é nulo, desfasado do contexto e só constitui a evidência de que este quis, efectivamente, não obter a reparação que lhe foi oferecida.

VII - Tendo em conta o exposto, deve ser excluído qualquer direito dos autores a serem indemnizados por perda de rendas (ou qualquer outro lucro cessante em relação ao imóvel), não só pelos termos do artigo 483/1 do CC, como pelo artigo 570 do mesmo Código. Em consequência, deve ser revogada a condenação indicada na alínea e) da sentença; VI - Tendo apenas ficado provado um valor locativo abstracto, tendo em conta um valor por metro quadrado de área equivalente que os peritos consideraram e não tendo os Autores demonstrado que, não fossem as circunstâncias ocorridas, o seu imóvel teria efectivamente sido arrendado, existindo no processo não mais do que indícios claros de perda de capacidade locativa do imóvel, tal como supra se salientou pela presença de um facto provado nos termos do qual o inquilino - a GG - já tinha programada a sua saída do mesmo imóvel, não podem as RR. ser condenadas a indemnizar os autores por quaisquer lucros cessantes de locação. Em consequência, deve ser revogada a condenação indicada na alínea e) da sentença; VII - Tem-se presente tudo o que foi alegado supra, relativamente ao modo como os Autores impediram a reparação do seu imóvel. Em consequência, por força desse facto e tendo em conta que a reparação será hoje extremamente mais onerosa e dispendiosa, não pode a Ré ser condenada a efectuar a mesma. Em consequência, deve ser revogada a condenação indicada na alínea d) da sentença; IX - A sentença recorrida violou ou fez errada interpretação das normas legais assinaladas especificamente nestas conclusões, mormente os artigos 483/1, 493/2 e 570 do CC e das que com elas estejam conexas.

Os Recorridos apresentaram contra-alegações defendendo a manutenção do julgado.

  1. - Propostas para apreciação e decisão, segundo as conclusões da Recorrente, perfilam-se as seguintes questões: A. 1. - Se a actividade levada a cabo pela Recorrente deve qualificar-se como perigosa, para efeito de aplicação do regime de responsabilidade previsto no art. 493º-2 C. Civil; A. 2. - Em caso afirmativo, se se encontra ilidida a presunção de culpa da Recorrente; B. 1. - Se deve excluir-se o direito à indemnização por lucros cessantes (perda de rendas), em virtude de o respectivo dano se dever a facto do lesado, por recusa da reparação oferecida; B. 2. - Se esse mesmo direito deve também ser excluído, por ausência de pressupostos quanto à prova da efectiva frustração de arrendamento e do valor da renda; C. - Se, devido à sua actual onerosidade actual "extrema", provocada pelo impedimento de realização da reparação pelo Autor, a obrigação de reparação imposta deve ser revogada.

  2. - Em face das alterações introduzidas no acórdão recorrido, a matéria de facto a tomar em consideração é assim a seguinte: 1) - A propriedade do prédio urbano de rés-do-chão destinado a indústria e logradouro situado na Rua Eng. ..............., freguesia de Vermoim, concelho da Maia, registado na Conservatória do Registo Predial da Maia sob o nº ........, a fls. 99 verso do...

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