Acórdão nº 43/09.9YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Maio de 2009

Magistrado ResponsávelPAULO SÁ
Data da Resolução26 de Maio de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - AA veio, nos termos do preceituado nos artigos 1.094.º e seguintes do Código de Processo Civil, intentar, na Relação de Lisboa, acção especial de revisão de sentença estrangeira contra BB, pedindo a confirmação da sentença transitada em julgado e proferida em processo que correu em França, pelo Tribunal de Grande Instância d' Aix-enProvence, que homologou o acordo de modificação do regime matrimonial de bens celebrado entre ambos.

Foram juntas certidões da sentença e certidão do casamento dos cônjuges.

Devidamente citada, a requerida deduziu oposição., Observado o disposto no artigo 1099° do CPC, o requerente apresentou as suas alegações, pugnando pela revisão e confirmação da sentença estrangeira.

Também a requerida apresentou alegações no sentido do indeferimento da pretensão do requerente.

A final, a Relação proferiu acórdão a julgar a acção procedente, revendo e confirmando "a sentença proferida em 13 de Maio de 1987 que homologou a escritura datada de 23 de Dezembro de 1986, lavrada pelo Doutor ..., Notário em GARDANNE (França), nos termos da qual os cônjuges, AA e BB que estavam casados sob o regime da comunhão de bens adquiridos, declararam optar pelo regime da separação de bens, proferida pelo Tribunal de Grande Instância de Aix-en--Provence, França." Inconformada, interpôs a Requerida recurso de revista, recurso que foi admitido.

A Requerida apresentou as suas alegações, formulando as seguintes conclusões: a) O instrumento notarial outorgado em 23 de Dezembro de 1986, de alteração do regime matrimonial de bens de requerente e requerida, deve considerar-se parte integrante da decisão do Tribunal de Grande Instânce d'Aix-en-Provence, cuja revisão foi pedida no presente processo; b) Tal documento não foi junto pelo requerente, não tendo sequer sido ordenada oficiosamente a respectiva junção; c) Não constando tal instrumento dos autos é impossível verificar, nomeadamente, do respectivo conteúdo e termos, da existência do requisito de revisão da alínea f) do artº 1096º do CPC; d) Apesar de desconhecer tal conteúdo a decisão recorrida entendeu que ele se verificava; e) Imputa-se-lhe, pois, por erro de interpretação e de aplicação, a violação da alínea f) do art.º 1096º do CC impondo-se que seja concedida a presente revista com a consequente revogação da decisão recorrida; f) Ainda que se entenda não se estar perante uma situação subsumível a erro de decisão deverá entender-se que o acórdão recorrido é nulo por omissão de pronúncia, na medida em que não apreciou o conteúdo e os termos do acordo outorgado notarialmente e objecto do pedido de homologação de molde a apurar da verificação do requisito da alínea f) do artº 1096º; i) Fica, assim, arguida, subsidiariamente, tal nulidade, - artºs 668º nº 1 alínea d) e 716º do CPC, - cuja procedência implicará a baixa dos autos à Relação para que, junto que seja o instrumento notarial, aquele tribunal aprecie da verificação do referido requisito.

Houve contralegações.

Cumpre apreciar e decidir.

II - Fundamentação II.1.

Na Relação foi dada como provada a seguinte factualidade: a) Em 22-12-1984, o requerente e a requerida, residentes em 00, Résid. Côte ...., 0000 - Carry le Rouet (França), casaram entre si, sem convenção antenupcial (fls. 36); b) Na altura referida na alínea anterior, o requerente tinha nacionalidade portuguesa e a requerida nacionalidade francesa; c) Em 09-03-1987, o requerente e a requerida requereram junto do Tribunal de Grande Instância de Aix-en-Provence (França) a homologação da escritura lavrada pelo Doutor ..., Notário em GARDANNE, a 23 de Dezembro de 1986, nos termos da qual os cônjuges optaram pelo regime da separação de bens, do qual consta: "TÊM A HONRA DE EXPOR: Que casaram um com o outro perante o Conservador do Registo Civil de CARRY LEROUET em 22 de Dezembro de 1984.

Que, não tendo a sua união sido precedida de contrato de casamento, o Senhor e a Senhora BB ficaram sujeitos ao regime da comunhão de bens adquiridos.

Que, no entanto, o referido regime matrimonial já não se encontra actualmente adequado ao interesse da respectiva família.

Que, com efeito, o senhor AA encara a possibilidade de constituir sociedades em Portugal, pelo que pretende que o património da família fique protegido contra as vicissitudes das suas actividades.

Que, assim, decidiram mudar de regime matrimonial, conforme lhes é permitido pelas disposições do artigo 1397º do Código Civil francês.

Que, por escritura lavrada pelo Doutor ..., Notário em GARDANNE (França), em 23 de Dezembro de 1986, ambos declararam querer optar pelo regime da separação de bens, conforme se encontra definido pelos artigos 1536º a 1541º do Código Civil francês.

Que a alteração sujeita à homologação do Tribunal está de harmonia com o interesse da família."(fls. 13/14); d) Em 13-05-1987, pelo Tribunal de Grande Instância de Aix-en-Provence (França) foi proferida sentença que homologou "a escritura datada de 23 de Dezembro de 1986, lavrada pelo Doutor ..., Notário em GARDANNE (França), nos termos da qual os cônjuges, que estavam casados sob o regime da comunhão de bens adquiridos, declararam optar pelo regime da separação de bens. "(fls. 15); e) Em 05-06-1995, a requerida adquiriu a nacionalidade portuguesa (fls. 37); f) O requerente e a requerida vivem em Portugal, com carácter de permanência, desde o Verão de 1990 (art.º 14º da oposição e art.º 6º da resposta).

II.2. - Como resulta dos artigos 684.º, n.º 4 e 690.º do Código de Processo Civil as conclusões das alegações delimitam o âmbito do recurso.

As únicas questões em discussão são as seguintes: a) omissão de pronúncia relativamente ao conteúdo e os termos do acordo outorgado notarialmente e objecto do pedido de homologação; b) erro na interpretação e aplicação da alínea f) do artigo 1.096.º do Código de Processo Civil.

II.3.

Em matéria de reconhecimento de sentenças estrangeiras, perfilam-se duas orientações extremas: a da "revisão de mérito e a da "aceitação plena".

No primeiro caso, a recepção de uma sentença impõe uma revisão de mérito, o que implica quase que se ignore o aresto de origem, relegado para a posição de simples fundamento, para que o Estado do foro proceda a julgamento, emitindo a final uma nova decisão de mérito, só esta passando a assumir força de caso julgado com efeito executivo.

No segundo caso advoga-se o acolhimento amplo das sentenças estrangeiras, sendo certo que cedo se reconheceu a dificuldade da sua aplicação no...

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