Acórdão nº 09A0679 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Abril de 2009

Magistrado ResponsávelHELDER ROQUE
Data da Resolução28 de Abril de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: "AA Leasing, SA", anteriormente, denominada "BB -Sociedade de Locação Financeira, SA", propôs a presente acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra CC, residente em Benavente, pedindo que, na sua procedência, seja reconhecida, judicialmente, a legalidade, validade e eficácia da resolução do contrato de locação financeira, operada pelo autor, por incumprimento contratual do réu, e este condenado a restituir-lhe os equipamentos objecto do contrato de locação financeira, bem assim como no pagamento da cláusula penal, prevista no artigo 18º das condições gerais do contrato, equitativamente, reduzida, nos termos do disposto pelo artigo 812º, do Código Civil, do montante previsto, contratualmente, em €123.508,24, atento o tempo, entretanto, decorrido, para a quantia de €50.000,00, até à respectiva restituição, alegando, para tanto, e, em síntese, que celebrou com o réu um contrato de locação financeira, que teve por objecto uma máquina «Uniloader Case», modelo 1840UL, que resolveu, com fundamento em incumprimento daquele, o qual, não obstante ter pago as quantias em dívida, não procedeu à restituição do equipamento locado, encontrando-se em mora, há cento e trinta e sete meses.

Regularmente citado, com a advertência de que a não contestação importaria a confissão dos factos articulados pelo autor, o réu não apresentou qualquer defesa.

A sentença julgou a acção improcedente, absolvendo o réu do pedido.

Desta sentença, o autor interpôs recurso, tendo o Tribunal da Relação julgado improcedente a respectiva apelação, confirmando a decisão impugnada.

Do acórdão da Relação de Lisboa, o mesmo autor interpôs recurso de agravo, posteriormente, convolado para revista, por decisão do relator deste acórdão, terminando as alegações com a formulação das seguintes conclusões, que se transcrevem: 1ª - O acórdão de que se recorre está frontalmente em oposição com o acórdão nº 84/2006 da 1a Secção (Cível) do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 21 de Fevereiro de 2006.

  1. - Por sentença datada de 22. de Janeiro de 2008, a fls. 64 a 79 dos autos, proferida pelo Tribunal a quo, foi julgada improcedente a acção declarativa.

  2. - A mencionada acção declarativa foi proposta em 29 de Março de 2006.

  3. - O Contrato de Locação Financeira celebrado entre a locadora, ora apelante, e o locatário, ora apelado, foi resolvido por aquela por carta registada com aviso de recepção datada de 12 de Setembro de 1994 e junta a fls. 17.

  4. - Nunca tendo o locatário procedido à devolução do equipamento locado.

  5. - O Tribunal a quo entendeu que a carta de resolução enviada pela apelante ao locatário não continha a fundamentação bastante para se proceder à resolução uma vez que não indicava quais os motivos concretos da resolução e quais as rendas em dívida e respectivos montantes.

  6. - A apelante concorda que na carta de resolução devem constar os fundamentos da resolução.

  7. - Mas na carta de resolução junta a fls. 17 encontram-se todos os fundamentos para a resolução, uma vez que o locatário tem conhecimento das cláusulas contratuais e das rendas que se encontram em atraso na data da resolução uma vez que estas são pagas por transferência bancária e é do conhecimento do locatário quais os débitos feitos na sua conta.

  8. - Para além disso o locatário tem conhecimento da fórmula de cálculo do valor de resolução o que por simples leitura das Cláusulas das Condições Gerais do Contrato de Locação Financeira e da carta de resolução lhe possibilita o conhecimento dos montantes das rendas vencidas e não pagas.

  9. - E tanto que entendeu o conteúdo da carta de resolução e sabia quais eram os montantes em dívida que o locatário, posteriormente, procedeu ao pagamento de tais valores.

  10. - Sempre se tendo recusado a restituir o equipamento locado.

  11. - E, como consequência de tal recusa, deverá ser condenado a pagar uma cláusula penal de quantia igual à última renda por cada mês ou fracção de mês que a mora na devolução do equipamento perdure, ou assim não se entendendo, num valor nunca inferior a 50.000,00 €.

  12. - E a restituir o equipamento locado.

  13. - A agravante é uma sociedade anónima que tem por objecto o exercício da actividade de locação financeira, nos termos da legislação que regula esta actividade.

  14. - A locação financeira é o contrato através do qual uma das partes se obriga, mediante retribuição a ceder à outra o gozo temporário de uma coisa, móvel ou imóvel, adquirida ou construída por indicação desta, e que o locatário poderá comprar, decorrido o período acordado por um preço nele determinado ou determinável mediante simples aplicação dos critérios nele fixados.

  15. - Como ensina o Professor Leite de Campos, "A locação financeira é um contrato a médio ou longo prazo dirigido a "financiar" alguém não através de uma quantia em dinheiro mas através do uso de um bem. Está-lhe subjacente a intenção de proporcionar ao "locatário" não tanto a propriedade de determinados bens, mas a sua posse e utilização para um determinado fim (in BFDUC, vol. LXIII, 1987, pág. 10).

  16. - A zona nuclear do contrato é porém constituída pela relação locador-locatário na qual se integram os direitos e os deveres que a caracterizam: a obrigação do locador de ceder o equipamento ao locatário para que este o use e o correspondente direito do locatário; o dever do locatário de pagar a renda e o correspectivo direito do locador; o direito do locatário de comprar o equipamento no fim do contrato.

  17. - O art° 26° do Dec-Lei n° 171/79, de 06.06 consigna que "O contrato de locação financeira pode ser resolvido por qualquer das partes, nos termos gerais com fundamento no incumprimento das obrigações da outra parte não sendo aplicáveis as normas especiais constantes de lei civil relativas à locação.

  18. - Foi exactamente esse o procedimento da agravante.

  19. - Deverá ser judicialmente reconhecida a legalidade, validade e eficácia da resolução do contrato de locação financeira operada pela autora, por incumprimento contratual da parte do réu; e, ainda, ser o réu condenado à restituição do equipamento objecto do contrato de locação financeira, bem como no pagamento da cláusula penal prevista no artigo 18° das "Condições Gerais" do contrato.

  20. - A cláusula penal, não sendo indeterminável, é válida.

  21. - Não pode confundir-se o valor da cláusula penal com o valor residual estabelecido no contrato.

  22. - O locatário deixou de pagar as rendas a partir da renda n° 10 até à 17, vencidas de 23.01.1994 a 23.08.1994.

  23. - Não podia, pois, ter a expectativa de aquisição do equipamento, pois não cumpriu o acordado, não liquidou as rendas todas.

  24. - Não podia exercer qualquer opção de compra do bem locado, pois incumpriu o contrato.

  25. - Ao invés, resolvido o contrato, o locatário fica obrigado a restituir o equipamento, não podendo, no caso em apreço, adquiri-lo.

  26. - Assim, é legítimo à autora pedir uma indemnização pela não entrega do bem locado, decorridos tantos meses após a comunicação da resolução do contrato.

  27. - O locatário liquidou os valores em dívida (calculados, pressupondo a retoma do bem) mas nunca restituiu o equipamento conforme estava obrigado por força da resolução contratual operada, caso, pretendesse adquirir o bem, os valores a liquidar seriam outros.

  28. - As "cláusulas" ou "condições" contratuais do contrato em apreço obedecem às características essenciais da definição legal de cláusulas contratuais legais constante do art. 1º, nº 1 do Decreto-lei nº 446/85, de 25 de Outubro (e sucessivas alterações, designadamente pelo Decreto-lei n°220/95 de 31 de Agosto), quais sejam, a pré-elaboração (predisposição unilateral), rigidez (inalterabilidade), e indeterminação (generalidade).

  29. - Isto significa, no essencial, que estas convenções contratuais não resultam de negociação prévia entre as partes.

  30. - E esta estrutura jurídica é pois característica da locação financeira, como contrato nominado misto que é, pelo menos, na face da relação locadora/locatário.

  31. - Por outro lado, nos termos do art. 3o do Decreto-lei n°149/95 de 24...

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