Acórdão nº 09P0240 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Março de 2009

Magistrado ResponsávelSANTOS MONTEIRO
Data da Resolução19 de Março de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam em conferência na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça : Em P.º comum com intervenção do tribunal colectivo sob o n.º 602/02.OGDPTM , do Tribunal de Portimão , foram submetidos a julgamento AA e BB , vindo , a final , a serem condenados , cada um , como co-autores de um crime de homicídio simples ,tentado , p . e p . pelos art.ºs 131 .º , 22.º e 23.º , do CP , na pena de 5 anos e 10 meses de prisão e , ainda , ao pagamento ao assistente CC, da indemnização de 25 .000 € , por danos não patrimoniais , acrescida de juros legais desde a notificação do pedido .

I . Os arguidos interpuseram recurso desse acórdão condenatório para a Relação que lhes negou provimento por seu acórdão de 18.9.2008 e daquela para este STJ .

O procedimento criminal foi declarado extinto quanto ao arguido , nos termos do art.º 128.º n.º 1 , do CP , em consequência do seu óbito , entretanto ocorrido e documentado .

II .A arguida , na parte que interessa consignar , em termos de conclusões apresentou as seguintes : O Tribunal da Relação entendeu que se não verificavam quaisquer dos vícios elencados no art.º 410.º n.º 2 , do CPP , nada impedindo que o STJ possa vir a conhecê-los oficiosamente , caso considere que não é adequada e suficiente a matéria de facto para decidir de direito.

O Tribunal recorrido considerou que a arguida tinha o domínio dos factos , pois levou objectos a si pertencentes ou que se achavam no veículo , indicou o caminho a percorrer até à casa do ofendido e , aí chegados , recolheu os cães , o que tem de ser compreendido à luz de resolução a que não é alheia .

No entanto deu-se como assente que a faca de ponto e mola não era sua , além de se concluir que o aparelho de choques era pertença da recorrente sem qualquer apoio em factos .

Mas dos factos produzidos em audiência ressalta que nunca foi visto na sua posse , o mesmo não sucedendo em relação ao arguido .

Resulta dos factos provados que a faca de ponta e mola é que provocou os ferimentos no corpo do assistente e que a violência do seu uso é que fez com que sofresse as lesões mencionadas no relatório pericial .

Essas lesões é que poderiam causar a morte , foram causa directa e necessária desse efeito , mas tendo a posse do meio taco de bilhar atribuída à recorrente a verdade é que tal objecto nunca foi usado pelo arguido nunca foi causa directa das lesões sofridas pelo assistente .

Resulta ter o tribunal imputado à recorrente a propriedade dos instrumentos usados pelo arguido do facto de estarem a ser transportados no seu veículo o que integra os vícios elencados no art.º 410.º n.º 2 , do CPP.

A aferição da comparticipação criminosa a partir do fornecimento dos meios de transporte , indicação da morada da vítima , a retirada do local dos cães do assistente , o fornecimento de alguns meios de agressão e o ter promovido a retirada do local do crime , não são elementos integrantes da co-autoria como a relação considerou , pois quem executou o crime foi o arguido .

O tribunal recorrido não conseguiu imputar à propriedade da arguida mais do que meio taco de bilhar .

A existência de acordo prévio para a prática do crime é alcançado pelo tribunal " a quo " a partir dos actos praticados pelo arguido .

Não se provou qualquer acto materialmente relevante ou contribuição na produção do resultado ou acto com significado específico do processo causal de onde resultou o ilícito tentado .

O acto de acompanhar o arguido , a ausência do domínio funcional do facto , a inexistência de acordo prévio entre os arguidos determinante da prática dos factos perpetrados pelo arguido e a inexistência da intenção de matar não integram intenção de matar , homicídio tentado , embora não questione a intenção de ofender .

Donde formular-se uma conclusão exígua e contraditória , pois se não imputa a prática de qualquer acto concreto à recorrente e depois se afirma que agiram com intenção de tirar a vida ao assistente , tendo sido ela até que impediu o uso da faca que podia causar a morte , devendo , antes , ser condenada pela prática de ofensas corporais .

A recorrente não pode mostrar arrependimento pela prática do crime de homicídio tentado quando na verdade o não praticou .

Uma pena de prisão de 3 anos suspensa na sua execução já envolve reprovação pública para o facto , castigo para ela , satisfazendo-se o sentimento jurídico da comunidade e , deste modo , as exigências de prevenção geral da ordem jurídica .

A recorrente ao longo dos 6 anos não pode viver , devido à constante ansiedade com o desfecho dos autos , como o comum dos mortais .

O tribunal não valorou , na fixação da medida concreta da pena , o tempo decorrido sobre os factos , a ausência de antecedentes criminais de relevo , a sua inserção familiar , profissional e social , bem como a consideração pelos amigos , familiares e pessoas conhecidas .

Fez formação profissional na área do turismo e hotelaria, que lhe permitam explorar um restaurante por conta própria , em Albufeira .

Tem , actualmente , 41 anos , o que só lhe permitiria recomeçar a vida aos 46 anos , a aplicar-se-lhe a pena em que foi condenada .

O tribunal fez uma deficiente aplicação dos art.ºs 71.º e 72.º , do CP , prevendo a atenuação da pena .

O tribunal fez uma alusão genérica às necessidades de prevenção especial da pena , não se alcançando que o tribunal tenha valorado o tempo decorrido e que não possa ter influência na medida da pena .

A celeridade é , também , reclamada no interesse do arguido , sendo um verdadeiro direito fundamental de forma a prevenir os riscos da estigmatização e adulteração da irreversível identidade do arguido , que pode culminar no compromisso com uma carreira delinquente.

A própria CRP , por influência da CEDH , conferiu ao arguido aquele estatuto de direito fundamental .

O decurso do tempo reduz significativamente as exigências de prevenção geral e as necessidades de execução da pena .

Parece resultar do acórdão recorrido que a condenação em dois crimes de condução ilegal não serviram para atenuar a pena mas acentuá-la .

A recorrente deu mostras de que o seu futuro não passa pelo cometimento de novos ilícitos , como resulta do comportamento da recorrente nos autos anteriores e posteriores .

A pena peca por excessiva , desproporcionada , desajustada , não equitativa , por não ter considerado o princípio da prevenção geral , especial e de ressocialização da arguida ante a dissuasão no cometimento de novos ilícitos .

III . Neste STJ a Exm.ª Procuradora Geral-Adjunta perfilha entendimento no sentido de que os recursos -o óbito do arguido ainda não havia sido noticiado , donde a alusão no plural - não mereciam provimento, tomando expressa posição quanto à questão derivada da circunstância de o recurso do arguido interposto do acórdão proferido pela primeira vez em 1.ª instância não ter sido apreciado pela Relação e esta quando o STJ lhe ordenou que tomasse posição, determinou que o arguido aguardasse o desfecho do reenvio parcial deferido à 1.ª instância e , depois , se determinasse , recurso que , posteriormente , a Relação , com acerto , julgou intempestivo , simplificando ma dificuldade processual introduzida nos autos .

  1. Colhidos os legais vistos , observado o disposto no art.º 417.º n.º 2 , do CPP , cumpre decidir , tendo em apreço o seguinte complexo factual fixado , após reenvio parcial do processo para julgamento com relação à arguida : A -A arguida AA viveu em união de facto com CC, pelo menos , onze anos , tendo-se separado do mesmo no início do ano de 2002 .

    B.Na 1.ª quinzena do mês de Julho de 2002 , a arguida AA iniciou vida em comum com o arguido BB .

    C. No dia 25 de Julho de 2002 , cerca das 01h30 , os arguidos AA e BB , dirigiram-se à casa de CC , a fim de do mesmo tirarem desforço , molestando-o na sua integridade física .

    D . Para o efeito muniram-se do aparelho de choques marca " Boelectric Shocker 120, 00 volt " , com o número de série 848166 , pertencente à AA , de metade de um taco de bilhar em madeira , com cerca de 60 cms de comprimento , que se encontrava no carro da arguida AA e de uma faca de ponta e mola com cerca de 20 cm de comprimento e lâmina de 9 cm de comprimento, pertencente ao BB.

    E. Deslocaram-se ambos os arguidos no veículo automóvel da arguida , conduzido pelo arguido BB , sendo que foi aquela primeira que lhe indicou o caminho a seguir , já que o arguido não conhecia o local e não sabia onde ficava a casa do assistente .

    F . Chegados ao local a arguida de imediato recolheu os dois cães do assistente -que a conheciam já que durante o tempo em que viveu com este último foi também dona dos animais -os quais se achavam soltos na propriedade , fechando-os na sua viatura , de modo a evitar que os mesmos viessem a impedir ou dificultar a...

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