Acórdão nº 08P2868 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Novembro de 2008
Magistrado Responsável | HENRIQUES GASPAR |
Data da Resolução | 12 de Novembro de 2008 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA foi condenado por acórdão de 19 de Janeiro de 2008, na pena de 5 anos e 6 meses pela prática de um crime de homicídio simples na forma tentada - artigos 22.°, 23.° e 131º do Código Penal, por factos ocorridos em 18 de Abril de 1988.
Recorreu para o tribunal da Relação do Porto, que considerou pertencer a competência ao Supremo Tribunal, visto o recurso ser restrito a questões de direito.
O recorrente, entretanto, invocando o acórdão de fixação de Jurisprudência de 6/02/08, «que versa sobre a contumácia e prescrição do procedimento criminal», afastando a jurisprudência fixada em Assento n° 10/2000 de 10 de Novembro, e «pese embora nos autos já ter havido recurso fundamentado quanto à prescrição do procedimento criminal», pede que seja «objecto de análise quanto à prescrição do procedimento criminal que [...] se encontrava já extinto pelo decurso dos 15 anos, cuja prescrição se operou muito antes da leitura do acórdão condenatório [...]».
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No Supremo Tribunal, o Exmº Procurador-Geral Adjunto suscita também a questão prévia da prescrição do procedimento criminal.
Trata-se - refere - de um crime de homicídio tentado a que, face à respectiva moldura penal, corresponde um prazo de extinção do procedimento criminal de 15 anos
.
A declaração de contumácia, única causa de suspensão possível no caso, foi tida pelo Acórdão n.° 5/2008 de 09.04.08 - Rec. N.° 2569/07/3ª, publicado no DR, I série-A, de 13.05.08, como não constituindo causa de suspensão da prescrição do procedimento criminal no domínio da vigência do Código Penal de 1982 e do Código de Processo Penal de 1987, nas suas versões originárias
.
Não existe outra causa de suspensão ou interrupção do procedimento criminal, sendo certo que à data da primeira notificação pessoal do arguido (2.05.06) já tinham decorrido mais de 15 anos
.
A existência de decisão anterior sobre o mesmo tema de sentido contrário não impede a sua reapreciação à luz do novo sentido jurisprudencial sobre os efeitos da contumácia».
Assim sendo, considerando que o acórdão recorrido já foi proferido em momento em que se encontrava prescrito o procedimento criminal contra o arguido
, requer que se julgue o mesmo extinto - art. 117°, n° l, alínea a) do CP.
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Cumpre decidir a questão prévia suscitada - artigo 417º, nº 6, alínea c) do CPP.
Os factos foram praticados em 18 de Abril de 1988.
A contumácia foi declarada em 30 de Janeiro de 1989 (fls. 30).
O recorrente foi constituído arguido em 2 de Maio de 2006.
Apresentou-se e prestou termo de identidade e residência em 2/05/2006.
A contumácia foi declarada cessada por decisão de 19/09/2006.
O recorrente foi notificado da acusação em 25/01/2007 (despacho de fls. 369).
O recorrente foi condenado por acórdão de 19 de Janeiro de 2008.
O procedimento criminal extingue-se, por efeito da prescrição, logo que sobre a prática do crime tiverem decorrido quinze anos, quando se trate de crimes puníveis com pena de prisão cujo limite máximo for superior a dez anos - artigo 118º, nº 1, alínea a) do CP.
O recorrente foi acusado, e acabou por ser condenado, por um crime de homicídio, na forma tentada, punível com pena de prisão de máximo superior a dez anos - artigos 131º, 23º, nº 2 e 73º, nº 1, alínea b) do CP.
O prazo de prescrição do procedimento criminal é, assim, de quinze anos para o crime por que o recorrente foi acusado.
A prescrição do procedimento criminal, que corre a partir da data da prática do crime (artigo 118º, nº 1 do CP), suspende-se ou interrompe-se, no entanto, nas condições referidas nos artigos 120º e 121º do CP (na redacção actualmente vigente, introduzida pelo Decreto-Lei nº 65/98, de 2 de Setembro).
O prazo suspende-se, entre outras situações, a partir da notificação da acusação (artigo 120º, nº 1, alínea b) do CP), ou vigorar a declaração de contumácia (alínea c)), sendo que no caso da alínea b) a suspensão não pode ultrapassar três anos - artigo 120º nº 2 do CP.
A prescrição volta a correr a partir do dia em que cessar a causa da suspensão - artigo 120º, nº 3 do CP.
Por seu lado, a prescrição interrompe-se com a constituição de arguido - artigo 121º, nº 1, alínea a) do CP; com a notificação da acusação ou da decisão instrutória que pronunciar o arguido - alínea b); ou com a declaração de contumácia - alínea c).
Depois de cada interrupção começa a correr novo prazo de prescrição - artigo 121º, nº 2 do CP.
Mas, de qualquer modo, a prescrição do procedimento criminal terá sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvando o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal acrescido de metade - artigo 212º, nº 3 do CP.
Isto é, no que mais releva, a declaração de contumácia passou a constituir um dos actos que interrompem a prescrição, e do mesmo passo, que suspendem o prazo de prescrição, porquanto o processo suspende-se durante o tempo em que vigorar a declaração de contumácia.
Porém, na redacção originária do artigo 119º do Código Penal de 1982, a declaração de contumácia não estava directamente prevista como acto processual com consequências ou efeitos no prazo de prescrição do procedimento criminal.
A não previsão de consequências da declaração de contumácia sobre o prazo de prescrição do procedimento criminal, quando a figura foi instituída pelo CPP de 1987, que parecia revelar, em matéria de prescrição, algum desfasamento legislativo entre os dois diplomas, produziu a oportunidade para o surgimento de divergências jurisprudenciais sobre os efeitos da contumácia, e a ulterior uniformização pelo Assento do STJ nº 10/2000, de 19 de Outubro.
Esta circunstância introduz a necessidade de analisar o caso concreto perante a sucessão de regimes e respectivas consequências.
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Por seu lado, a prescrição do procedimento criminal constitui uma categoria que, exclusiva ou ao menos predominantemente, se situa na dimensão material e não processual.
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