Acórdão nº 08P2501 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Novembro de 2008

Magistrado ResponsávelARMÉNIO SOTTOMAYOR
Data da Resolução06 de Novembro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.

Na comarca de Matosinhos, no âmbito do proc. 4471/06.3TAMTS, do 4º Juízo Criminal, foram julgados AA e BB, ambos reclusos no Estabelecimento Prisional do Porto, a quem o Ministério Público imputa a prática, em co-autoria, de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelos arts. 21º nº 1 e 24º al. h) do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, com referência à Tabela I-C. Produzida a prova, foi a acusação julgada não provada e improcedente e, consequentemente, dela foram absolvidos os arguidos.

Inconformado, o Ministério Público interpôs recurso para o Tribunal da Relação do Porto, o qual foi julgado procedente, sendo os arguidos condenados como autores materiais do crime de tráfico de estupefacientes na forma tentada, previsto pelos arts. 21º nº 1 e 24º al. h) do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, com referência à Tabela I-C e arts. 22º e 23º do Código Penal, em idêntica pena de 2 anos e 6 meses de prisão.

Recorrem agora os arguidos ao Supremo Tribunal de Justiça, tendo-o feito autonomamente. Após a apresentação dos respectivos recursos, os arguidos requereram junto da Segurança Social apoio judiciário, o qual só foi concedido a BB.

Notificado o arguido AA para proceder ao pagamento da taxa de justiça, condição do seguimento do recurso, nada pagou. Por isso e em face do disposto no art. 80º nº 3 do Código das Custas Judiciais, o recurso interposto por AA tem de ser considerado sem efeito.

  1. O recorrente BB extraiu da sua motivação as seguintes conclusões: 1º O presente recurso vai interposto do acórdão penal condenatório proferido nos autos e tem por objecto a matéria de facto e a matéria de direito seguinte: 2° O acórdão recorrido procedeu ao enquadramento jurídico-penal dos factos no âmbito do artigo 24° do Decreto-Lei n° 15 / 93, de 22 de Janeiro, sem que tenha procedido à ponderação da questão da qualidade do produto estupefaciente e à circunstância de o arguido e recorrente, BB, no quadro da factualidade apurada, poder desconhecer a quantidade respectiva.

    1. Neste seu segmento, não se encontra motivado de forma bastante, et pour cause, padece do vício de falta de fundamentação.

    2. A omissão ocorrida, consistente na violação de normas de direito processual é, nos termos do nº 1 e do nº 2 do artigo 374º e do artigo 379º ambos do Código Processo Penal.

      causa de nulidade que ora se invoca.

    3. Nos termos do disposto no n° 3, do artigo 410º do Código de Processo Penal, o recurso pode ter como fundamento a inobservância de requisito cominado sob pena de nulidade que não deva considerar-se sanada.

    4. A decisão a quo não dá por apurada a co-autoria do terceiro interveniente com os então arguidos e recorridos, BB e AA.

      Neste contexto, 7º Resulta duvidoso que estes tivessem conhecimento da natureza estupefaciente dos produtos.

      Ademais, 8º Ressalta inequívoco que não praticaram qualquer um dos actos típicos previstos no artigo 21º, nº 1, do Decreto-Lei nº 15 / 93 de 22 de Janeiro, tendo por objecto plantas, substâncias ou preparações compreendidas na Tabelas I-C.

    5. O nº 2, do artigo 22° do Código Penal, consagra um critério objectivo de distinção entre actos preparatórios e actos de execução, que exige, para fundamentar a tentativa, que a intenção se exteriorize em actos que contenham já, eles próprios, um momento de ilicitude.

    6. Os actos do arguido e recorrente, AA, não estão dotados de idoneidade e de inequivocidade.

    7. Os actos de preparação da infracção penal praticados não são puníveis, por não serem descritos ou previstos no tipo.

    8. É manifesta a inexistência do objecto essencial à consumação do crime.

    9. Nos termos do artigo 23°, nº 3, do Código Penal, a tentativa impossível não é punível.

      Do que resulta, 14º Sendo os então arguidos-recorridos, BB e AA, alheios à actividade do terceiro, afigura-se, inexistem actos de execução do crime de tráfico de estupefacientes que lhe possam ser imputados.

      Subsidiariamente, 15º Os actos de execução do crime foram, tão-somente, praticados pelo terceiro interveniente não identificado.

    10. O artigo 26° do Código Penal, pressupõe que o autor tenha intervenção na execução do crime.

      Assim, 17° Ainda que, por alguma forma, fosse de dar por apurada a co-autoria com o terceiro interveniente, o arguido e recorrente, BB deveria, in limine, ter sido condenado como cúmplice, por não haver praticado actos de execução do crime de tráfico respectivo.

    11. No tocante a estes dois aspectos, subscreve-se a totalidade das considerações contidas na declaração de voto anexa ao acórdão recorrido.

      19Q O texto a quo incorreu em erro no enquadramento jurídico-penal dos factos, por violação do disposto nos artigos 21 ° e 24° do Decreto-Lei nº 15 / 93 de 22 de Janeiro e nos artigos 22°, 23°, 27° e 73°, todos do Código Penal.

    12. O artigo 24° não consagra verdadeiras circunstâncias agravantes vinculativas, excludentes do tipo legal base do artigo 21°, ambos do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro.

    13. É este o entendimento que melhor se integra no princípio da proporcionalidade do artigo 3°, nº 4, da Convenção da O. N. U., de 20 de Dezembro de1988, subjacente ao Decreto-Lei nº 15 /93, de 22 de Janeiro.

    14. A situação sub judice não atingiu a razão de ser da referida agravante qualificativa.

    15. É adequada a aplicação do regime regra, do crime de tráfico na forma simples.

    16. A decisão a quo incorreu em erro na determinação da norma jurídica aplicável, por violação do que vem disposto nos artigos 21 ° e 24° do Decreto-Lei nº 15 /93 de 22 de Janeiro.

    17. Nos termos do disposto no n° 1, do artigo 40° do Código Penal, «A aplicação das penas visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade».

    18. Na procedência das questões suscitadas a respeito do erro na qualificação jurídico-penal, impõe-se se proceda a uma determinação da medida legal ou abstracta do crime de tráfico simples e da cumplicidade.

    19. O acórdão recorrido não valorou a causa atenuativa especial da cumplicidade, no que incorreu em violação do que vem disposto nos artigos 27° e 73°, ambos do Código Penal.

    20. A determinação da medida judicial ou concreta da pena, nos termos do artigo 71° do Código Penal, é feita em função da culpa, tomando-se em conta as exigências de prevenção de futuros crimes e as demais circunstâncias do nº 2 daquele preceito que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor ou contra o arguido.

    21. As exigências de prevenção geral definem o limite mínimo da pena e a culpa o limite máximo criando, assim, a moldura dentro da qual se hão-de fazer sentir as exigências de prevenção especial ou de ressocialização.

    22. O texto a quo não aquilatou da qualidade do produto estupefaciente aquando da subsunção jurídica dos factos, nem valorou tal circunstância no plano das causas atenuantes gerais, no momento de proceder à determinação da medida judicial ou concreta da pena.

      Ademais, 31º Não se tendo dado por fixada a co-autoria com o terceiro interveniente, o arguido e recorrente, BB, poderia não conhecer a quantidade de produto estupefaciente envolvido, tornando-se mister ponderar tal circunstância.

    23. Num juízo breve dir-se-á, pois, que o acórdão recorrido não ponderou ou não ponderou adequadamente os factores a que a lei manda atender em sede de atenuação geral da pena violando, nesta conformidade, o disposto nos artigos 40º e 71º do Código Penal.

    24. Na procedência das questões da qualificação jurídico-penal, tudo devidamente ponderado, a pena julgada adequada é de 18 (dezoito) meses de prisão efectiva.

      Sem prescindir, 34º Sempre, em qualquer caso, se afigura excessiva a pena aplicada, a qual se deverá cifrar em 2 (dois) anos de prisão.

      Requer, em consequência, seja declarado inválido o acórdão recorrido e reenviado o processo para novo julgamento, ou, caso assim se não entenda, deverá proceder-se à requalificação jurídica dos factos e à redefinição da medida abstracta; no menos, se reduza o quantum da pena.

      O Ministério Público, em resposta, argumentou no sentido da improcedência do recurso.

  2. Remetidos os autos ao Supremo Tribunal de Justiça, o Ministério Público, na vista inicial, pronunciou-se no sentido da admissibilidade do recurso por aplicação da redacção anterior do Código de Processo Penal, que era a vigente à data da decisão de 1ª instância, considerando que os autos devem prosseguir para julgamento.

    O parecer foi notificado ao arguido, nos termos do art. 417º nº 2 do Código de Processo Penal, por ele nada tendo sido dito.

    Não...

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