Acórdão nº 08B2318 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Outubro de 2008

Magistrado ResponsávelSERRA BAPTISTA
Data da Resolução23 de Outubro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: AA veio intentar acção, com processo ordinário, contra BB, S.A, CC, LDA e DD pedindo a condenação destes a pagarem-lhe a quantia de € 632.464,00, acrescida de juros.

Alegando, para tanto, e em suma: No dia 4/7/2001, pelas 19H15, nas demais condições de lugar e modo melhor descritas na p. i., ocorreu um acidente de viação, por culpa exclusiva do condutor do veículo automóvel de matrícula 01-02-AI, o réu DD, pertencente à ré CC, Lda, na sequência do qual advieram para a A. danos, que também melhor discrimina, no montante peticionado.

A responsabilidade civil dos danos causados pelo veículo estava transferida para a ré seguradora, nos termos da respectiva apólice.

Citados os réus, apenas a seguradora veio contestar, impugnando o montante dos danos.

Foi chamada a COMPANHIA DE SEGUROS TRANQUILIDADE como interveniente principal, por ter indemnizado já a A., dado que o acidente foi também de trabalho.

Deduzindo no seu articulado pedido de condenação da ré BB no pagamento da quantia de € 49.137,76, acrescida da que se vier a liquidar em execução de sentença, bem como de juros a contar da data da notificação do pedido.

Tendo tal pedido sido, posteriormente, ampliado.

Foi proferido o despacho saneador, tendo sido fixados os factos tidos por assentes e organizada a base instrutória.

Realizado o julgamento, foi decidida a matéria de facto da base instrutória pela forma que do despacho junto de fls 501 a 555 consta.

Foi proferida a sentença, na qual, na parcial procedência da acção, foi a ré BB condenada a pagar: a) à autora: · a quantia de € 362.416,00 a que se deduzirá a totalidade do valor que lhe for pago pela ré por força da decisão proferida no procedimento cautelar; · juros de mora sobre essa quantia, às taxas legais aplicáveis, desde a citação até integral pagamento; · a quantia que se vier a apurar em liquidação de sentença, a título de danos futuros, até ao limite de € 100.000.

  1. à interveniente Tranquilidade: · a quantia de € 73.167,77; · juros de mora, às taxas legais aplicáveis, desde a notificação do pedido de reembolso até integral pagamento.

    · Outras quantias que venha a pagar à A., em consequência do acidente, cuja liquidação se relega para liquidação de sentença.

    Inconformadas, vieram a ré BB e a autora AA interpor recurso de apelação, sendo o desta, subordinado.

    Por acórdão da Relação de Guimarães e na sequência da parcial procedência da apelação da ré BB, foi esta condenada: a) a pagar à A.: · a título de danos patrimoniais, a quantia de € 139.447,52 [ 175.100,00 - 35.652,28 (12.544$00 + 23.068,28)], a que se deduzirá a totalidade do valor que lhe for pago pela ré por força da decisão proferida no procedimento cautelar, sendo devidos juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação até integral pagamento; · a título de danos não patrimoniais, a quantia de € 75.000, acrescida de juros, à taxa legal, desde a data do acórdão até integral pagamento; · a título de danos futuros, a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença, até ao limite máximo de € 100.000.

  2. a reembolsar a interveniente TRANQUILIDADE: · a quantia de € 23.068,28 acrescida de juros de mora, às taxas legais aplicáveis, desde a notificação do pedido de reembolso até integral pagamento.

    · Os montantes das pensões que vier pagar à A., no cumprimento do contrato de seguro por acidente de trabalho e serão abatidas no montante da indemnização ora fixada à autora, a título de danos patrimoniais futuros.

    Tendo sido julgada improcedente a apelação da autora.

    Ainda irresignadas, vieram, a AUTORA e a TRANQUILIDADE pedir revista.

    Formulando aquela, na sua alegação, as seguintes conclusões: 1ª - É irrelevante para o cálculo do montante indemnizatório por danos não patrimoniais do lesado por prática de facto ilícito, o que a jurisprudência em cada momento possa apontar como justa indemnização para violação do direito à vida.

    1. - Os próprios Senhores Julgadores agora recorridos tal aceitam, pois decidiram, contraditoriamente ao que antes afirmaram, fixar o montante indemnizatório parcelar em € 75.000,00 a título de danos não patrimoniais, quando apontam os montantes de cinquenta a sessenta mil euros como os valores adoptados pela jurisprudência para indemnizar a violação do direito à vida.

    2. - Nem tão pouco a jurisprudência portuguesa, que desde há muito reconhece que tal tipo de indemnizações não podem nem devem ser miserabilistas, aponta no sentido da decisão recorrida.

    3. - Para tanto bastará ler o acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 28 de Fevereiro do corrente ano, lavrado no processo 088388, onde numa situação donde resultaram consequências bem menos graves do que as sofridas pela aqui Recorrente, fixou tal indemnização parcelar em € 125.000,00.

    4. - Na verdade, confrontando a factualidade apurada em cada um dos casos, logo se percebe que o montante de € 200.000,00 fixado a tal título a favor da Autora é o que equitativamente mais se harmoniza com os danos não patrimoniais sofridos por ela.

    5. - Atendendo até ao facto de o lesado naquele caso julgado, se ter mantido inconsciente e depois semiconsciente, enquanto a Autora dos presentes autos tudo suportou com total consciência do que a cada momento estava a acontecer.

    6. - E foi isso que fortemente sensibilizou o Meritíssimo Juiz em Primeira Instancia, pois directamente tomou conhecimento de toda a tragédia da Autora.

      Autentico purgatório que durou mais de dois anos.

    7. - Aquela quantia de € 200.000,00, não só não indemniza os sofrimentos físicos e morais da Autora, nem são tão pouco, grande compensação para os mesmos. Por tal preço, nenhum voluntário admitiria suportá-los.

    8. - Mas também o Acórdão recorrido viola expressamente o disposto no artigo 805° do Código Civil, nomeadamente o seu nº3, quando ordena que os juros de mora devidos à Autora sejam contabilizados tão só a partir da data da sentença.

    9. - Com efeito, o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência deste Supremo Tribunal de 24 de Janeiro de 2002, é inaplicável ao caso sub judice uma vez que este deixou de ser fonte de direito, como em anterior legislação o era, pela via dos Assentos que nele eram lavrados.

    10. - Daí que, a interpretação a dar ao Acórdão de fixação de jurisprudência, tenha de ser harmónica com a legislação vigente, não a ofendendo.

    11. - No caso em análise só seria aplicável se o Senhor Juiz em Primeira Instância tivesse declarado que o montante que arbitrou a tal título, tinha sido objecto de actualização à data da sentença.

    12. - O que não aconteceu.

    13. - Donde resulta que à presente indemnização é aplicável o nº 3 do artigo 805º do Código Civil que ordena que a mora persiste desde a citação para os termos da acção.

    14. - Também no que concerne ao deferimento do pedido de alteração do decidido sobre eventual acumulação de indemnizações por acidente de viação e acidente laboral, o Acórdão ora recorrido também viola a legislação processual vigente.

    15. - Porque, o Tribunal de Recurso em princípio, tem de aceitar a matéria de facto dada como provada em Primeira Instância e só essa pode ser fundamento da decisão a proferir.

    16. - Acontece que no caso dos autos, tão-somente as respostas aos quesitos 134, 136 e 137 se referem a quantias susceptíveis de serem deduzidas no montante da indemnização cível por danos patrimoniais futuros.

    17. -No entanto, para além de tais verbas o Acórdão Recorrido legitimaria a dedução de maiores valores, num total de € 23.068,28.

    18. -Pelo que a procedência, mesmo que parcial, das conclusões 68 a 88 da Ré Apelante, não tem base jurídico - processual que a apoie, pelo que deve ser revogada.

    19. -Quanto à incapacidade permanente futura, tem ela também de ser arbitrada em montante determinado por um critério de equidade.

    20. -Mas subordinado aos factos provados em julgamento, nomeadamente e principalmente à incapacidade permanente que à Autora foi atribuída, ou seja, 65%.

    21. -Sendo que tal incapacidade é total para o exercício da profissão habitual da Autora.

    22. - O que significa que a sua capacidade residual de 35%, só algum interesse terá se a Autora apesar da sua limitação funcional, tiver possibilidade de ser reconvertida noutra qualquer actividade lucrativa.

    23. - De contrário, a incapacidade permanente parcial de 65%, traduzir-se-á numa incapacidade absoluta para o trabalho economicamente rentável.

    24. - Ou seja, a capacidade residual de 35% da lesada, em termos económicos, traduz-se numa total incapacidade de angariar meios de subsistência.

    25. - Ora dos autos não constam quaisquer factos provados de onde os Exmos Julgadores possam concluir que a Autora / Recorrente é reconvertivel em actividade, onde o seu residual de 35% de capacidade, lhe possa proporcionar qualquer rendimento.

    26. - Facto que, só podendo favorecer a Ré, a ela competisse prová-lo, o que nem tão pouco tentou.

    27. - Daí que justificadamente, a titulo de indemnização de danos patrimoniais pela incapacidade permanente de que a Autora é portadora, deva ser-lhe arbitrada a indemnização parcelar de € 291.364,21, 29ª- Em vista do seu vencimento mensal de € 548,67 à data do sinistro e à sua expectativa de vida até aos 78 anos de idade, 30ª- Também a Autora necessitará do auxílio de terceira pessoa até ao fim da sua vida útil ou seja, por mais cerca de 50 anos.

    28. - Acrescidos da desvalorização normal da moeda e do aumento do preço de quem lhe preste serviços.

    29. -Razão pela qual a tal titulo, a indemnização parcelar deva ser aumentada para € 110.000,OO.

    30. -Sem que esse aumenta se traduza em condenação para além do pedido global formulado.

    31. - Tendo o acórdão recorrido violado o disposto nos artigos 483º e seguintes e 805º ambos do Código Civil Português e 712º do Código de Processo Civil.

      Formulando a interveniente, por seu turno, as seguintes conclusões: 1ª - O presente recurso visa apenas sobre o excesso de pronúncia do douto acórdão recorrido.

    32. - Na acção ordinária que correu termos no Tribunal Judicial de Guimarães, a recorrente era interveniente activa, pois deduzira...

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