Acórdão nº 08B3011 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Outubro de 2008

Magistrado ResponsávelSALVADOR DA COSTA
Data da Resolução16 de Outubro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I AA e C....-C... e G...., Ldª intentaram, no dia 1 de Março de 2001, contra BB, a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, pedindo a sua condenação na realização das obras necessárias à eliminação definitiva das infiltrações de água verificadas em identificada fracção autónoma, no prazo máximo de 15 dias, no pagamento de uma indemnização pelos prejuízos causados na estrutura, paredes e tecto da referida fracção, a liquidar em execução de sentença, e, à segunda autora, no pagamento de uma indemnizaçao pelos prejuízos causados nos equipamentos, revestimentos e demais bens do seu estabelecimento, também a liquidar em execução de sentença, e de uma indemnização, a título de danos não patrimoniais, em montante não inferior a 2 000 000$ pelos prejuízos causados na imagem comercial desta e pelos incómodos resultantes da situação, e no pagamento a ambos, metade a cada um, a título de sanção pecuniária compulsória, por cada dia de atraso na conclusão das obras, de quantia não inferior a 50 000$.

Alegaram ser o autor o proprietário da fracção precial, exercer a autora nela, sob cedência gratuita, a prestação de serviços de contabilidade e gestão, bem como a realização de obras, em Abril de 2000, no prédio urbano em que a fracção se integra, mandadas executar pelo réu, a infiltração de água nela por virtude daquelas obras, a não reparação da anomalia, o dano no equipamento informático e no revestimento de madeira, a afectacção negativa da imagem e a impossibilidade de realizarem aquelas obras por deverem ocorrer no interior do prédio.

O réu, em contestação, invocou a sua ilegitimidade, por não ter feito obras nas escadas do prédio indicado, mas que, como administrador, as fez no prédio em que a fracção predial em causa se integra, em cumprimento da deliberação da assembeleia de condóminos, negou os outros factos e pediu a condenação dos autores a indemnizá-lo por por litigância de má fé.

Na réplica, os autores afirmaram a legitimidade ad causam do réu, com fundamento em não haver condomínio válido em relação à parte do prédio de que o réu se diz administrador, e irem chamar a intervir as pessoas que o incumbiram de realizar as obras.

Relegada no despacho saneador para final o conhecimento da questão da legitimidade ad causam do réu, seleccionada a factualidade assente e controvertida, já começada a audiência de julgamento, foi admitida a intervenção principal provocada de M... Â... T..., J... G... da C..., N... S..., M.... C... da R... C... P..., J... F... M..., J... P... N..., M... T... M... S..., L... C..., J... L... dos S... e A... de J... R... .

Na contestação, invocaram os três primeiros a sua ilegitimidade ad causam, referindo a primeira não ser proprietária de nenhuma fracção do prédio em causa, e os demais que as obras de conservação das escadas do prédio foram decididas por todos os condóminos, e impugnaram os factos alegados na petição inicial.

Os autores, na resposta, pronunciaram-se no sentido da inverificação da excepção, sendo que a aludida arguição foi julgada improcedente por decisão proferida no dia 9 de Maio de 2006.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença, no dia 27 de Julho de 2007, por via da qual foi julgada improcedente a excepção de ilegitimidade ad causam invocada pelo réu, que, tal como os intervenientes, foram absolvidos do pedido.

Apelaram os autores, impugnando também a decisão da matéria de facto proferida no tribunal da 1ª instância, e a Relação, por acórdão proferido no dia 31 de Março de 2008, negou-lhes provimento ao recurso.

Interpuseram os apelantes recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - os fundamentos em que se fundou a Relação, face aos factos provados, não conduzem à decisão recorrida; - a existência de mais de um condomínio com administração própria na mesma propriedade horizontal pressupõe que o título constitutivo especifique concretamente cada zona ou edífico, fracções autónomas que o compõem e respectivas partes comuns, o que se não verifica no caso; - como no título constitutivo da propriedade horizontal não está individualizada a existência de quaisquer blocos nem concretamente identificadas partes comuns que só a esses blocos pertencem, bem como as fracções autónomas que os compõem, não é admissível o afastamento da regra da unidade e administração do condomínio; - a referida situação não é prevista no artigo 1438º-A do Código Civil, porque se não trata de um conjunto de edifícios funcionalmente ligados entre si, mas de um único edifício habitacional e centro comercial, conforme consta do título constitutivo da propriedade horizontal; - perante um único edifício, ainda que composto por parte habitacional e comercial, trata-se de um único condomínio, nos termos do artigo 1430º, nº 1, do Código Civil; - o alegado condomínio do edifício Pérola do Mar é juridicamente inexistente, sem personalidade judiciária, o que implica a sua insusceptíbilidade de ser responsabilizado como tal por quaisquer danos ou ser parte em acção judicial; - o responsável pelos danos causados aos recorrentes é o réu, porque mandou realizar as obras que os causaram, pelo que deve ser revogado o acórdão e condenado o recorrido no pedido que contra ele formularam.

Respondeu o recorrido, em síntese de conclusão: - a única escritura da propriedade horizontal, celebrada há mais de vinte e cinco anos, cujo conjunto arquitectónico integra vários prédios, comporta a existência de diversos condomínios; - o artigo 1421º do Código Civil define as partes comuns de cada edifício e é sobre estas que a lei determina a existência de um condomínio; - intentada a acção contra o recorrido, arguida por este a sua ilegitimidade, resolvida definitivamente a questão no processo com anuência dos recorrentes, há caso julgado entre as partes; - não podem os recorrentes vir em recurso arguir novamente a questão, apelando para a exclusiva responsabilidade do recorrido, sob pena de ofensa do caso julgado; - os recorrentes litigam contra a verdade, pelo que devem ser condenados no pagamento em indemnização por litigância de má fé.

II É a seguinte a factualidade considerada assente no acórdão recorrido, inserida por ordem lógica e cronológica: 1. O prédio descrito na Conservatória do Registo Predial da Póvoa de Varzim sob o nº ....., constituído em propriedade horizontal, encontra-se implantado e a confrontar com a Avenida ....., do Norte, com A... R... e outros, do Sul, com o Largo...., do Nascente, e com a Sociedade de C... C... G..., Lda, do Poente, sendo composto, de acordo com o título constitutivo da propriedade horizontal do imóvel, por um edifício habitacional e centro comercial, composto de cave, sub-nível, rés-do-chão e 13 andares, integrando no seu conjunto 164 fracções autónomas.

  1. O condomínio invocado pelo réu refere-se a parte do referido prédio que tem entrada pelo nº ... da Avenida .... - é apenas uma pequena parte, cerca de 20 das fracções autónomas e partes comuns que compõem e constituem a totalidade da propriedade horizontal do prédio, tal qual resulta do título constitutivo da mesma.

  2. O autor, AA, é proprietário de uma fracção autónoma designada pela letra ..., correspondente a uma loja com o nº ..., no sub-nível, do prédio constituído em propriedade horizontal sito na Avenida ..... e Largo ...., nesta cidade, inscrito na matriz sob o nº .... .

  3. A autora é uma sociedade comercial que se dedica à prestação de serviços de contabilidade e gestão, exercendo a sua actividade na sobredita fracção, cedida gratuitamente pelo autor, tem no seu quadro de pessoal permanente mais de dez empregados, prestando serviços de contabilidade e similares a mais de quatrocentos clientes.

  4. A autora, em Outubro e Novembro de 1999, endereçou uma carta à Câmara Municipal da Póvoa de Varzim, queixando-se das infiltrações de água provindas de canalizações públicas defeituosas e/ou mal limpas, alegando que os prejuízos em materiais ascendiam a 681 935$.

  5. Actuando na qualidade de administrador do prédio denominado Edifício Pérola do Mar, blocos nascente (entrada nº 53) e poente (entrada nº ...), na Avenida ...., no qual a fracção C está integrada, o réu mandou efectuar, em Abril/Maio de 2000, obras nas escadas desse prédio, incluindo as da entrada com o nº 83, em cumprimento do deliberado em assembleia pelos condóminos do referido prédio, obras essas que também abrangeram a entrada com o nº 53.

  6. O autor teve conhecimento que os condóminos do referido prédio tinham tomado a deliberação referida sob 6.

  7. No decurso das obras, a autora começou a...

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