Acórdão nº 08P2811 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Outubro de 2008
Magistrado Responsável | SANTOS CARVALHO |
Data da Resolução | 16 de Outubro de 2008 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
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Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.
A foi condenado, juntamente com outros, no âmbito do proc. 388/05.7GASPS do Tribunal Judicial de S. Pedro do Sul (acórdão de 02/07/2007), por um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelos artigos 2.°, n.º 1, s), 3° n.º 2, i), 4.°, n.º 1 e 86.°, n.º 1, c), todos da Lei n.º 5/2006, de 23/2, na pena de 8 (oito) meses de prisão, por um crime de furto previsto e punido pelo artigo 203.°, n.º 1, do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão, por um crime de furto qualificado previsto e punido pelos artigos 203.°, n.º 1 e 204.°, n.º 2, alínea e), com referência à alínea d) do artigo 202.°, todos do Código Penal, na pena 4 (quatro) anos de prisão e por um crime de homicídio, na forma tentada, previsto e punido pelos artigos 22.°, n.º 1, b), 23.°, n.ºs 1 e 2, 73.°, n.º 1, a) e b) e 131.°, todos do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos de prisão e, em cúmulo jurídico destas penas, na pena única de 5 (cinco) anos e 8 (oito) meses de prisão.
Do acórdão condenatório recorreu esse arguido para o Tribunal da Relação de Coimbra, onde, por acórdão de 5 de Março de 2008, foi rejeitado o recurso por manifesta improcedência.
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Deste último acórdão recorre agora aquele arguido para o Supremo Tribunal de Justiça e, da sua motivação, formula as seguintes conclusões: I. Os disparos efectuados contra o assistente B surgiram como parte integrante da realidade complexa global constituída pelo "assalto", mas as Instâncias entenderam retalhar esse «facto global» e em consequência fraccionaram a sua qualificação jurídica, concluindo pela comissão de três crimes, um de furto qualificado, outro de homicídio tentado e um último de detenção de arma proibida.
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Sucede que existe previsão legal expressa e específica para o tipo de situações como aquelas dadas aqui como provadas, designadamente, o tipo legal de crime de roubo agravado, p. e p. pelo art. 210.°, n.ºs 1 e 2, a) e b), do Código Penal.
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Com efeito, na primeira parte da alínea a) do n.º 2 do art. 210.° do CP deverão integrar-se as hipóteses, como a dos autos, em que um dos agentes do roubo pratica, com conhecimento e vontade, determinado acto adequado a matar a vítima, sem que porém chegue a consumar-se a sua morte.
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Pois não se vê como possa existir uma situação em que o agente actua com o propósito de criar perigo para a vida alheia, pondo em marcha uma acção efectivamente idónea a causar esse perigo para a vida, sem que simultaneamente, caso se verifique tão-só um resultado de perigo e não chegue a produzir-se a morte, se constitua autor de um homicídio doloso na forma tentada.
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Deve, nessa medida, concluir-se que cabe na circunstância agravante incluída na alínea a) do n.º 2 do art. 210.° do CP a conduta daquele que, na comissão do roubo, realiza dolosamente uma acção apta a retirar a vida da pessoa que sofre a violência necessária à subtracção da coisa móvel, sem que todavia ocorra a morte.
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Em suma, na perspectiva do recorrente houve erro das Instâncias na qualificação jurídica da factualidade provada, pois em face dela e atenta a regra da especialidade em matéria de concurso de infracções (lex specialis derogat legi generali), o aqui arguido deveria ter sido condenado não por furto qualificado em concurso efectivo com homicídio doloso tentado, mas sim por um único crime de roubo agravado, previsto e punido pelas normas legais assinaladas.
Mais, VII. Verifica-se existir ainda erro na autonomização do crime de detenção de arma proibida e na sua punição em concurso efectivo com as demais infracções imputadas.
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Tanto no roubo (art. 204.°-2, f), ex vi art. 210.°-2, b), ambos do CP) como no furto (art. 204.°-2, f), do CP) existe disposição legal expressa agravante ou qualificadora dos respectivos tipos-de-ilícito referente ao uso de arma: "trazendo, no momento do crime, arma aparente ou oculta".
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Por isso mesmo, sob pena de dupla valoração do mesmo substrato real para efeitos de condenação penal, em interpretação ilegal (por violadora do art. 30.°-1 do CP) e materialmente inconstitucional do art. 204.°-2, f), do CP e do art.ºs 2.°-1, s); 3.°-2, l); 4.°-1; e 86.°-1, c), da Lei n.º 5/2006, de 23/2, por infracção ao princípio constitucional do ne bis in idem (art. 29.°-5 da Constituição), será de entender que entre aqueles preceitos incriminadores existe uma relação de unidade criminosa por especialidade, a qualificar como unidade de norma ou de lei (FIGUEIREDO DIAS, Direito Penal. Parte Geral, I, 42.° Cap., § 1 e ss.).
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Aliás, será pelo menos de reconhecer que entre a posse da arma proibida e o roubo existe uma relação de instrumentalidade que gera uma inequívoca dominância do ilícito-típico de roubo e esbate o relevo do ilícito-típico da detenção de arma proibida, o que aponta para um quadro de unidade criminosa por concurso aparente.
Isto posto, XI. Deverá consequentemente reponderar-se a medida e a espécie de pena a aplicar ao recorrente, sem prejuízo do princípio da proibição da reformatio in pejus (art. 409.°-1 do CPP e art. 32.°-1 da CRP).
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Deverá a pena pelo crime de roubo agravado ser fixada em medida concreta próxima do limiar mínimo de defesa do ordenamento jurídico apontado, 4 anos de prisão (vd. supra, n.º 47 e ss.), não devendo exceder os 4 anos e seis meses de prisão, que se revela perfeitamente compatível com a carência de socialização revelada pela prática do crime.
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Nessa medida, se assim se decidir, a pena única conjunta a formar com a pena aplicada ao crime de furto simples (6 meses de prisão) será sempre não superior a 5 anos (cf. art. 77.°-2 do CP), o que desde já se requer.
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Considerações todas elas que valerão, mutatis mutandis, para a determinação de uma pena única conjunta caso se decida manter a qualificação jurídica dos factos adoptada pelas Instâncias.
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Aliás, quanto à pena de prisão de 6 meses aplicada ao crime de furto simples, quando a lei prevê a multa em alternativa, houve infracção ao disposto nos art.ºs 70.° e 77.°-1 e -2 do CP, pois a escolha da pena não foi realizada avulsamente, independentemente da circunstância de existir um concurso de crimes.
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Fixada uma pena única conjunta de medida não superior a 5 anos, nos termos peticionados, requer-se igualmente a aplicação retroactiva do art. 50.°-1 do Código Penal, na redacção introduzida pela Lei n.º 59/2007, de 4/9, porque concretamente mais favorável, e a substituição dessa pena única de prisão por pena de suspensão de execução da pena de prisão.
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Pois tomando aqui igualmente em conta as condições pessoais do arguido, a ausência de quaisquer antecedentes criminais, a manutenção de uma actividade profissional regular e a continuidade da relação com a sua companheira mesmo após o deflagrar do presente processo, não pode senão concluir-se que a simples ameaça da prisão, necessariamente acompanhada de regime de prova (art. 53.°-3 do CP, na nova redacção), constituirão factores a suficientemente fortes para o dissuadir da prática futura de crimes.
Nestes termos, e nos melhores de direito que V. Exas. proficientemente suprirão, requer-se a V. Exas.: a) na parte respeitante ao assalto ao estabelecimento comercial, a condenação em um único crime de roubo agravado, p. e p. pelo art. 210.°, n.ºs 1 e 2, a) e b), do Código Penal, esta última alínea por referência às alíneas e) e f) do n.º 2 do art. 204.° do mesmo diploma, e consequentemente a fixação de uma pena de prisão, para esse crime de roubo agravado, de medida concreta não superior a 4 anos e seis meses; b) a revogação da pena de prisão de 6 meses aplicada ao crime de furto simples (art. 203.°-1 do Código Penal) e a aplicação, em vez dela, de uma pena de multa; e c) por fim, a determinação de uma pena única conjunta de medida concreta não superior a 5 anos e a sua substituição por pena de suspensão de execução da pena de prisão (art. 50.°-1 do Código Penal, na redacção introduzida pela Lei n.º 59/2007, de 4/9), tanto no caso de provimento do peticionado em a), como, subsidiariamente, no caso de manutenção da condenação pelos crimes de detenção de arma proibida, de furto simples, de furto qualificado e de homicídio tentado, imposta pelas Instâncias.
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O Ministério Público na 1ª instância respondeu ao recurso e pronunciou-se pela irrecorribilidade da decisão e, caso assim não se entendesse, pela rejeição do recurso, por nele serem abordadas questões que não foram suscitadas perante o tribunal recorrido.
O Excm.º PGA neste Supremo Tribunal, no seu Parecer, disse, em suma, o seguinte: «...se é certo que nada obsta ao conhecimento do recurso sob o prisma da determinação da medida da pena, também é certo que este Supremo Tribunal não está obrigado à qualificação jurídica das...
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