Acórdão nº 08P2878 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Outubro de 2008

Magistrado ResponsávelPIRES DA GRAÇA
Data da Resolução08 de Outubro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça---Nos autos de processo comum com o nº 2666/06.9PBPDL do 5º Juízo de Ponta Delgada, o arguido AA, divorciado, desempregado, filho de BB e de CC, natural da freguesia da Sé, concelho de Angra do Heroísmo, onde nasceu a 15 de Agosto de 1960, residente que foi na Rua do ....................., Ponta Delgada, actualmente preso no Estabelecimento Prisional Regional de Ponta Delgada, fora submetido a julgamento na sequência de acusação formulada pelo Ministério Público que lhe imputara a prática de: - Um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punível pelo artigo 21°, nº 1, do DL nº 15/93, de 22 de Janeiro - Um crime de receptação, previsto e punível pelo artigo 231º, nº 1, do Código Penal - Um crime de detenção de arma proibida, previsto e punível pelo artigo 86°, nº 1, alínea d), com referência ao artigo 3°, nº 2, alínea f), da Lei nº 5/2006, de 23.02 - Seis crimes de condução de veículo automóvel sem habilitação legal, previstos e punidos pelos nºs 1 e 2 do artigo 3° do Decreto-Lei n° 2/98, de 2 de Janeiro, com referência aos artigos 121°, nº 1, e 122°, nº 2, do Código da Estrada, aprovado pelo Decreto-Lei nº 114/94, de 3 de Maio, e alterado pelos Decretos-Leis nº 2/98, de 2 de Janeiro, 265-A/200l, de 28 de Setembro, Lei n° 20/2002, de 21 de Agosto, e Decreto-Lei nº 44/2005, de 23 de Fevereiro.

Interposto recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, da decisão então proferida, veio posteriormente a ser proferido novo acórdão em 23 de Junho de 2008, - em reformulação do proferido em 8 de Janeiro de 2008, constante de fls 463 e sgs, - de acordo com o decidido no acórdão do STJ de fls 585 e sgs , que decidiu: - Absolver o arguido dos crimes de receptação e de condução sem habilitação legal que lhe eram imputados (o arguido foi entretanto absolvido do crime de detenção de arma proibida, no acórdão do STJ de fls 585 e sgs) - Condenar AA pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no artigo 21º, nº 1, do DL n° 15/93, em 5 anos e 3 meses de prisão - Condená-lo nas custas.

- Determinar a perda a favor da Região Autónoma dos Açores dos telemóveis, navalha e dinheiro apreendidos - Ordenar a destruição do produto estupefaciente apreendido.

Determinou-se o demais de lei.

Inconformados, recorreram: - O Arguido, que apresentou a sua motivação em 9 de Julho, com as seguintes CONCLUSÕES: 1- Por Douto Acórdão proferido nestes autos, o Arguido foi condenado na pena de 5 anos e 3 meses de prisão pela prática de um crime p. e p. pelo art° 21°/1 DL 15/93 de 22-01, pena esta que a nosso ver mostra-se excessiva e desproporcional "in casu". Vejamos: 2- Em Julgamento o arguido confessou parcialmente os factos, nomeadamente o facto de ter vendido droga no período temporal dado por provado no Ac., mas frisou que na altura era consumidor de drogas e negou que tivesse tido qualquer lucro ou compensação monetária. Além disso, não foi apreendida ao arguido qualquer quantia monetária avultada, o mesmo não tem bens e é pobre.

3- Tal também se conclui pela leitura do Ac. recorrido e da matéria de facto dada por provada, que não faz qualquer referência a que esse arguido alegadamente apresentasse, em algum momento que fosse, quaisquer sinais exteriores de riqueza, nem faz qualquer referência a quaisquer concretos lucros que este concreto arguido alegadamente tivesse concretamente auferido.

4- O arguido frisou nos autos ser à data dos factos consumidor de drogas, o que o Acórdão de modo algum refuta, ao ter considerado como matéria de facto não provada que: "O arguido nunca consumiu de forma habitual substâncias estupefacientes".

5- O arguido não tem antecedentes criminais por tal tipo de crime, quis prestar declarações em audiência e aí assumiu os factos em que efectivamente interveio; encontra-se desde fase de inquérito sujeito a m.c. de prisão preventiva, o que, por si, embora não seja teórica nem praticamente o mesmo que cumprimento de pena, acaba sempre por ter o efeito de "lição".

6- Tais circunstâncias não foram devidamente atendidas no Ac. recorrido e indubitavelmente deviam ter sido consideradas na ponderação e determinação da medida da sua pena, e valoradas a favor deste arguido; não tendo ainda o Ac. atendido ao arrependimento demonstrado pelo arguido em julgamento.

7 - O Ac. recorrido embora aluda ao artº 71 °CP, não atendeu a todos esses factores aqui referidos, e aplicou pena de prisão em medida excessiva ao arguido, o qual não tem quaisquer antecedentes criminais por tal tipo de crime.

8- E isto não obstante o Ac. expressamente reconhecer em págs.12-13 da sua fundamentação que: "o arguido não enriqueceu nem ao menos viu o seu nível de vida aumentado", pois o que auferia na venda de estupefacientes o mesmo gastava no custeio das necessidades diárias de alimentação ou o usava para adquirir mais produtos estupefacientes como resulta da m. f dada por provada; a sua culpa "resulta in casu francamente diminuída"; a confissão do arguido dá um sinal inequívoco de contrição, que não pode ser ignorado enquanto indício de propósito sério de não reincidência" - razões e factores estes que referidos e dados por assentes no Ac., impunham e impõem a nosso ver a fixação de pena nunca superior a 5 anos de prisão e suspensa na sua execução.

9- As penas devem visar sempre a reinserção social do condenado (art° 40º CP) e não só o castigo puro e simples. Actualmente, as penas de prisão nem sempre reinserem, porém são sempre estigmatizantes. Condenar este arguido a cumprir 5 anos e 3 meses de prisão, seria estigmatizá-lo irremediavelmente e em vez de se reinserir estar-se-á a dificultar a sua reinserção. Já bastam todas as dificuldades sociais e laborais por que o mesmo num passado remoto atravessou em virtude do seu repatriamento dos E.UA. para esta ilha de S. Miguel, para onde foi remetido sem saber em que lugar e com quem viveria.

10- Atento o princípio da Justiça Relativa que deve estar subjacente à determinação das penas, não deve ser aplicada "in casu" pena de 5 anos e 3 meses de prisão a este arguido, o qual não tem quaisquer antecedentes criminais por tal tipo de crime e confessou os factos em que interveio, quando relativamente a outros arguidos igualmente sem antecedentes criminais por tal tipo de crime e ainda que não tenham confessado os factos foram aplicadas penas de prisão em medida muito próxima dos mínimos legais e suspensas na sua execução.

11- O Ac. recorrido ao ter decidido como decidiu, tendo-lhe aplicado uma pena superior a 5 anos de prisão, não atendeu devidamente a todas estas circunstâncias concretas e supra referidas nestas Conclusões, e incorreu pois na violação do disposto nos arts. 40º, 71°/1,2, a), c), d) e e) CP, devendo pois ser revogado, procedendo-se à redução da pena de prisão aplicada, aplicando-se-lhe uma pena concreta próxima dos mínimos legais da moldura penal abstracta aplicável ao tipo de crime em que foi condenado, não devendo nunca a pena a aplicar exceder os 5 anos de prisão. E, por outro lado, 12- considerando que: o arguido não tinha quaisquer antecedentes criminais de especial relevo criminal, nem tem qualquer outra conduta posterior censurável penalmente, é pessoa repatriada dos E.U.A. e vítima dos entraves que a própria sociedade portuguesa (em particular, a sociedade açoriana) criou à sua então integração social; já trabalhou como pedreiro e pretende voltar a trabalhar; e apenas por força do seu repatriamento está longe de sua mãe e familiares- deve ora ser dada uma oportunidade ao arguido, permitindo a sua reinserção social, decretando-se para tal, e uma vez operada a redução da pena de 5 anos e 3 meses de prisão para uma pena não superior a 5 anos, a suspensão da execução da pena de prisão que lhe for aplicada (art° 50° CP) acompanhada de um forte regime de prova, sendo que a simples censura do facto e ameaça da pena bastariam para prevenir que o Arguido não volte a delinquir, satisfazendo-se as necessidades de prevenção geral e especial "in casu".

13- Tudo isto tendo em conta os fins das penas, principalmente a ressocialização do arguido, o princípio da graduação e proporcionalidade na aplicação das penas, a "ultima ratio" da pena de prisão efectiva, e princípios da razoabilidade e adequação das penas, que de certo modo alicerçam as recentes alterações introduzidas na nossa Legislação Penal e Processual Penal.

Nestes termos e nos melhores de direito, sempre com o Douto Suprimento de V. Exas., Venerandos Juízes Conselheiros, deverá ser dado provimento ao presente recurso e por conseguinte: ser revogado o Douto Acórdão ora recorrido, devendo proceder-se a final e em todo o caso à redução da pena de prisão aplicada ao Arguido, aplicando-se-lhe uma pena próxima dos mínimos legais e nunca superior a 5 anos de prisão, e suspensa na sua execução- tudo nos termos e com os fundamentos atrás expostos.

Deste modo, V. Exas. farão a costumada JUSTIÇA! ---- O Ministério Público, que em 10 do mesmo mês, apresentou a sua motivação de recurso, explicitando: EM CONCLUSÃO: 1.O douto acórdão declarou o perdimento de objectos apreendidos nos autos, em obediência ao artº 35° do DL 15/93, de 22/1).

  1. Do mesmo passo, decidiu que os objectos fossem atribuídos à Região Autónoma; 3.A declaração de perdimento não é feita em função de interesses patrimoniais do Estado, mas porque há que dar destino a objectos que não podem ser devolvidos ; 4. A declaração de perdimento cria um direito de propriedade sobre a coisa para o Estado; 5.A partir desse momento, é ao proprietário da coisa que compete, em exclusivo, dar o destino aos objectos sobre que incide aquele seu direito (artº 1.305° do C.C.), mesmo que esse proprietário seja o Estado (art° 1.304° do C.C.); 6.Não existe disposição legal que consinta ao tribunal ser ele a fazer a afectação dos objectos perdidos em processo crime.

    Posto isto, Decidindo como decidiu, o douto acórdão sob recurso violou o disposto nos arts 1.304° e 1305°, do Cód. Civil e, por erro de interpretação, o disposto nos art°s 35° e...

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