Acórdão nº 08S321 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Setembro de 2008
Magistrado Responsável | VASQUES DINIS |
Data da Resolução | 16 de Setembro de 2008 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1. AA, através da presente acção instaurada em 2 de Dezembro de 2005 no Tribunal do Trabalho de Coimbra, demandou a Fundação E.... e C... F... P..., com os fundamentos que se resumem do seguinte modo: - Em Outubro de 2000, celebrou com a Ré um contrato de trabalho, sob falso termo certo, para exercer as funções docentes correspondentes à categoria profissional de Mestre Assistente, contrato que foi renovado em Outubro de 2001, tendo caducado em 1 de Outubro de 2002; - No dia 1 de Outubro de 2002, celebrou com a Ré um contrato de "prestação de serviços", que vigorou até Setembro de 2004, para o exercício da mesma actividade e nos mesmos moldes, mantendo-se sob a autoridade e direcção da Ré, pelo que deve considerar-se que ele era titular de um contrato de trabalho; - Em 6 Setembro de 2004, celebrou novo contrato de trabalho com falso termo certo, contrato este que o Autor viu terminar, em 5 de Setembro de 2005, por alegada caducidade.
- Durante todo o tempo em que esteve ao serviço da Ré, o Autor ministrou as disciplinas de Bioquímica e Química Fisiológica e tinha superiores hierárquicos, devendo-lhes obediência.
- A justificação para a contratação a termo era a mesma para todos os contratos e a Ré estava em perfeitas condições de evitar o alegado desdobramento de turmas, que, a existir, foi propositadamente criado por ela com o objectivo de permitir as contratações a prazo, pois a Ré sabia quantos alunos tinha em cada ano, organizava tais turmas e não existiram reorganizações curriculares.
- À data da cessação do contrato de trabalho, o Autor auferia mensalmente € 2.530,00; durante o período em que exerceu a sua actividade docente ao abrigo do "contrato de prestação de serviços", auferiu a quantia média mensal de € 1.087,92, em 2003, e € 1.016,50, em 2004, e durante estes anos a Ré não lhe pagou férias, subsídios de férias, nem subsídio de Natal, nem fez descontos para a segurança social.
- A estipulação de termo nos referidos contratos de trabalho é nula, por ter visado, tão só, iludir as disposições legais que regulam o contrato sem termo, devendo considerar-se sem termo a relação que vinculava as partes.
- Sendo o Autor titular de um contrato de trabalho sem termo, nunca a relação laboral que mantinha com a Ré poderia ter cessado com fundamento em alegada caducidade do contrato de trabalho.
- Assim, o Autor, que é Licenciado em Bioquímica, pela Universidade de ....., Mestre em Novas Tecnologias e Doutor em Bioquímica pela mesma Universidade, foi despedido sem justa causa e viu-se colocado na situação de desemprego, vexatória para quem possui tão elevadas qualificações académicas, geradora de incerteza, stress e ansiedade, que se prolongou por diversos anos.
- Consequentemente, a Ré deve ser condenada a indemnizá-lo de todos os danos patrimoniais e não patrimoniais causados; a reintegrá-lo ou a pagar-lhe a indemnização de antiguidade, bem como no pagamento de todas as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado da sentença e, ainda, da quantia de € 4.000,00 a título de ressarcimento por danos morais.
Concluiu, requerendo que: - O contrato de trabalho celebrado com a Ré seja considerado sem termo e a cessação do mesmo sem justa causa e ilícita; - A Ré seja condenada a reintegrá-lo ou a pagar-lhe a indemnização de antiguidade correspondente a 45 dias de trabalho por cada ano de antiguidade, no montante de € 27.000; - A Ré seja condenada a pagar-lhe todas as retribuições que deveria ter auferido desde a data do despedimento até à data da sentença transitada em julgado; - A relação jurídica que manteve com a Ré, no período entre Outubro de 2002 e Setembro de 2004, seja declarada de natureza laboral sem termo; - A Ré seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 6.313,26, a título de férias, subsídios de férias e de Natal, relativos ao período de Outubro de 2002 a Setembro de 2004; - A Ré seja condenada a efectuar todas as contribuições devidas à segurança social apuradas durante o período de Outubro de 2002 até Setembro de 2004; - A Ré seja condenada a pagar-lhe uma indemnização por danos morais, em quantia não inferior a € 4.000,00; - A Ré seja condenada a pagar-lhe juros de mora vencidos e vincendos, desde a data da citação até integral e total pagamento; - A Ré seja condenada, nos termos do artigo 829.º-A, do Código Civil, no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória, de valor não inferior a € 200,00, por cada dia de incumprimento das suas obrigações legais para com o Autor, desde a data em que for proferida a sentença condenatória.
Na contestação, a Ré, a pugnar pela improcedência da acção, disse, em síntese: - O Autor foi admitido ao serviço da Ré, em 02 de Outubro de 2000, mediante contrato de trabalho a termo certo e pelos exactos motivos que constam da cláusula 6.ª do mesmo, fazendo face a efectivas necessidades de contratação de pessoal docente, então, surgidas à Ré; - O Autor obrigou-se a prosseguir e rapidamente concluir os trabalhos e o processo formativo do seu doutoramento, que é pressuposto e condição do recrutamento dos docentes da Ré, sendo que o A. revelou grande dificuldade em prosseguir e concluir aquele no prazo a que se vinculara perante a Ré, tendo estado de baixa médica entre Outubro de 2001 e Setembro de 2002, o que, aliado ao facto de se terem alterado as condições de volume de serviço docente, motivaram que a Ré tenha deliberado não proceder à renovação desse contrato de trabalho; - O contrato de prestação de serviços foi querido e negociado pelo Autor, em perfeita consciência e integra manifestação de vontade, conciliando os interesses reais e efectivos de ambas as partes; - O Autor veio a concluir o seu doutoramento apenas em 6 de Setembro de 2004 e, em face de necessidades concretas e efectivas de pessoal docente então surgidas, a Ré decidiu admitir de novo o Autor ao seu serviço, ao abrigo de contrato de trabalho a termo certo, que foi celebrado pelas exactas razões enunciadas no mesmo e que não foi renovado por motivos internos à entidade patronal e também por factos imputáveis ao Autor; - Os contratos a termo caducaram, o que o Autor aceitou.
- Os contratos de prestação de serviços foram celebrados com vista à prestação de tarefas concretas e bem definidas nos respectivos textos, consonantes com a impossibilidade ou inconveniência de o Autor prestar trabalho dependente e a tempo integral.
- A Ré nada deve ao Autor, seja a que título for, e relativamente a eventuais créditos anteriores ao contrato celebrado em 6 de Setembro de 2004, há muito que teria ocorrido a prescrição dos alegados direitos do Autor.
Na 1.ª instância a acção foi julgada improcedente, com a consequente absolvição da Ré dos pedidos.
O Autor interpôs recurso de apelação, no qual, além de impugnar o sentido da decisão quanto ao fundo da causa, arguiu a nulidade da sentença por omissão de pronúncia, alegando não ter sido notificado da decisão proferida sobre a matéria de facto e a violação do disposto nos n.os 2, 4 e 5 do artigo 653.º do Código de Processo Civil (CPC).
O Tribunal da Relação de Coimbra considerou não padecer a sentença do vício de omissão de pronúncia e entendeu que, a existir nulidade, decorrente da irregularidade invocada, ela estaria sanada, por extemporaneidade de arguição, uma vez que não foi suscitada no prazo de 10 dias, e negou provimento ao recurso 2. Mantendo o seu inconformismo, vem o Autor pedir revista, terminando a respectiva alegação com as conclusões que se transcrevem: 1 - A decisão proferida pelo Tribunal a quo é recorrível, o Recorrente tem legitimidade para interpor recurso, o qual mostra-se interposto tempestivamente e a taxa de justiça inicial está auto-liquidada; 2 - O Acórdão impugnado ao não julgar a decisão proferida pelo Tribunal do Trabalho de Coimbra nula por omissão de pronúncia nos termos do disposto no art. 668.º, n.º 1 do C.P.C., alínea d), primeira parte e art. 653.º, n.os 2, 4 e 5, do C.P.C., uma vez que a decisão sobre a matéria de facto não foi notificada ao A, o qual não prescindiu de nenhum dos direitos previstos no art. 653.º, n.º 4 do C.P.C., violou o disposto nos arts. 77.º, n.º 1 e 80.º, n.º 2 do C.P.T.
3 - O Acórdão recorrido ao decidir que o A. tinha dez dias para arguir a nulidade da decisão proferida pela 1.ª Instância, violou o disposto nos arts. 77.º, n.º 1 e 80.º, n.º 2 do C.P.T., os quais estipulam que a nulidade da sentença, havendo recurso de apelação, deve ser arguida no requerimento de recurso, o qual pode ser apresentado em juízo em vinte dias.
4 - Nos termos e para os efeitos do disposto nas disposições conjugadas dos arts. 77.º, n.º 1 e 80.º, n.º 2 do C.P.T., o Autor tinha um prazo de vinte dias para arguir a nulidade da decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância, prazo que o A. cumpriu; 5 - Em Outubro de 2000 o A. celebrou com a Ré contrato de trabalho com termo certo nulo, renovado em Outubro de 2001, o qual veio a caducar em 01 de Outubro de 2002, tendo o A. celebrado contrato de "prestação de serviços" para o exercício da mesma actividade docente nos mesmos moldes do anterior contrato a termo, no dia 01 de Outubro de 2002 e que manteve até Setembro de 2004, data em que o A. celebrou com a R. novo contrato de trabalho a termo certo, em tudo idêntico ao já anteriormente celebrado; 6 - No período em que o A. exerceu a sua actividade docente para a R. ao abrigo de um "contrato de prestação de serviços", o A. esteve sempre sob o poder de autoridade e direcção da R. até Setembro de 2004, aliás, conforme resulta da matéria de facto dada como provada pelo Tribunal a quo; 7 - O contrato de "prestação de serviços" celebrado entre o A. e a R. é um verdadeiro e autêntico contrato de trabalho na acepção do disposto no art. 10.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei nº 99/2003 de 27 de Agosto, conforme resultou provado pelo Tribunal a quo que, não obstante e erradamente, assim não decidiu; 8 - Da matéria dada...
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