Acórdão nº 07B2944 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Julho de 2008
Magistrado Responsável | MARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA |
Data da Resolução | 10 de Julho de 2008 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: 1. Em 20 de Maio de 1999, Empresa-A, Lda., com sede na Av. Dr. Antunes Guimarães, ..., sala ..., Porto, e Empresa-B, Lda., com sede na R. Dr. Joaquim A. Pires de Lima, ..., Santo Tirso, propuseram no Tribunal Cível de Lisboa contra Empresa-C, SA, sociedade de direito espanhol com sede em Barcelona e sucursal em Portugal, na Av. da República, edifício República, ...., Lisboa, uma acção ordinária na qual pediram que fosse declarado nulo ou, pelo menos, anulado, o registo da marca internacional mista da ré, nº 483.246, "..." e que a ré fosse condenada a abster-se de utilizar a expressão "..." como marca e, em geral, de praticar quaisquer actos que pudessem provocar confusão entre os seus produtos e serviços e os das autoras.
Para o efeito, alegaram que a ré desenvolve actividade em Portugal através da referida sucursal; que a 1ª autora é uma sociedade comercial registada em 6 de Setembro de 1990 com a denominação de "Empresa-A, Lda.", na Conservatória do Registo Comercial do Porto, sob o nº 48.259 e que é titular, desde a sua constituição (em 14 de Novembro de 1989) da firma referida; que a 2ª autora é titular do nome de estabelecimento "...", que utiliza para designar o seu estabelecimento (pedido em 4 de Setembro de 1987, concedido em 24 de Abril de 1990 e publicado no BPI nº 4 de 1990); que a ré é titular do registo da marca internacional mista "..." nº 483.246, cuja extensão a Portugal foi pedida em 14 de Fevereiro de 1997 (com publicação a 27 de Março de 1997), tendo a ré renunciado a 13 do mesmo mês de Fevereiro, para evitar a respectiva caducidade, por não uso, nos termos do artigo 216º do Código da Propriedade Industrial de 1995, à anterior extensão, de 8 de Março de 1985, assim perdendo os direitos resultantes da anterioridade correspondente; que a extensão de 1997 viola os direitos das autoras, com registos anteriores, pela confusão que se estabelece entre a marca da ré, por um lado, e a denominação da 1ª autora e o nome do estabelecimento da 2ª autora, por outro, sendo certo que os produtos e serviços fornecidos por todos são "completamente coincidentes".
Contestando, a 28 de Setembro de 1999, a ré alegou tratar-se de uma sociedade comercial constituída em 1955, com 135 títulos de registo de propriedade industrial entre os quais se encontra a marca internacional "...", registada em 12 de Março de 1984 e em vigor em Portugal desde 8 de Março de 1985 (sendo esta extensão a Portugal que as autoras põem em causa); que acabava de lhe ter sido deferido o pedido de concessão da marca comunitária "..."; que um dos seus mais antigos estabelecimentos, denominado "..." e no qual sempre usou diversas marcas contendo a expressão "...", desde 1971, é o de Vigo, através do qual estabeleceu relações com milhares de clientes (incluindo fabricantes e comerciantes de artigos de óptica) portugueses e se tornou conhecida em todo o norte do país, sendo portanto falso o alegado "não uso" da marca em Portugal, já que a mesma é utilizada ininterruptamente desde 1985; que igualmente vem sendo usada em diversos países do espaço económico europeu; que é, portanto, uma "marca notória no ramo dos produtores e comerciantes de artigos ópticos", no sentido do artigo 190º do Código da Propriedade Industrial e "de grande prestígio", para os efeitos do artigo 191º do mesmo Código.
Assim, os direitos de propriedade industrial das autoras é que seriam inválidos, "por violarem os prévios direitos registrais da R. e o facto de a sua marca ser (...) uma marca notória e de grande prestígio"; a sua utilização pelas autoras traduzir-se-ia numa prática que se podia considerar como de concorrência desleal; que a firma da 1ª autora se confundia com o nome do estabelecimento da 2ª; que as autoras se conluiaram para a prejudicar, desenvolvendo uma prática proibida porque lesiva da concorrência, nos termos do artigo 2º do Decreto-Lei nº 371/93, de 29 de Outubro; e que, ao apresentarem-se em litisconsórcio nesta acção, o faziam em abuso de direito, o que provocava a respectiva ilegitimidade.
Em reconvenção, requereu a anulação da firma social da 1ª autora e do nome de estabelecimento da 2ª, "porque posteriores e idênticos aos títulos de propriedade industrial da R."; pediu, consequentemente, que as autoras, de cuja existência apenas tomou conhecimento quando foi citada para a presente acção, fossem condenadas a abster-se de os utilizar e a pagar-lhe uma indemnização por danos sofridos, a liquidar em execução de sentença.
Em 22 de Outubro de 1999, a ré pediu a apensação a este processo da acção pendente na 2ª Secção da 17ª Vara Cível do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, na qual as mesmas autoras pediram a declaração de nulidade ou a anulação da sua denominação social, a sua condenação a alterá-la e a abster-se de utilizar o termo "...", juntamente ou não com o termo "...", em qualquer actividade comercial que desenvolvesse.
As autoras replicaram, mantendo que a renúncia impedia a ré de invocar qualquer prioridade decorrente do registo da marca internacional, sustentando que a concessão da marca comunitária referida pela ré não tinha qualquer influência na presente acção e contestando a alegação de uso, de notoriedade ou de grande prestígio da marca da ré; rejeitaram a acusação de concorrência desleal e opuseram que, de todo o modo, teria prescrito a possibilidade de a invocar; e negaram que estivessem a exercer abusivamente qualquer direito.
Sustentaram ainda a improcedência da reconvenção e, a fls. 293, opuseram-se à apensação requerida.
A ré treplicou, refutando, segundo explica, as excepções opostas pela autora ao pedido reconvencional.
O pedido de apensação foi deferido, a fls. 327.
A acção prosseguiu os seus termos. A fls. 1313 foi julgada a matéria de facto e, a fls. 1340, foi proferida sentença, julgando a acção procedente, nestes termos: "Pelo exposto, julgo a acção procedente e em consequência: - anulo a extensão de registo de marca internacional mista ..., n.º 483 246; - anulo o registo da denominação social da sucursal da ré, Empresa-C, S. A.; - condeno a ré a abster-se de usar, por qualquer forma ou meio, as citadas expressões na qualidade de marca ou firma; -Faculta-se à ré o prazo de 120 dias, após trânsito da presente decisão, para alterar as designações de marca e firma ora anuladas; Mais julgo improcedente a instância reconvencional, e absolvo as autoras dos pedidos formulados." 2. Por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de fls. 2042, foi confirmada a sentença, sendo negado provimento, quer ao recurso principal, interposto pela ré, quer ao recurso subordinado, interposto pelas autoras (quanto a estas, questionando apenas que os 120 dias concedidos à ré para "alterar as designações de marca e firma ora anuladas" se contassem do trânsito em julgado da sentença e não da data em que foi proferida).
Assim, e em primeiro lugar, a Relação manteve a decisão da 1ª Instância relativamente à matéria de facto, não obstante ter sido parcialmente impugnada pela Ré.
A matéria de facto definitivamente assente nesta causa é, portanto, como se transcreve: " 1. A ré tem em Portugal uma sucursal sita na Av. da República, Lisboa.
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A autora Empresa-A é uma sociedade comercial por quotas, registada a 6 de Setembro de 1990, sob a denominação de Empresa-A, Lda., na Conservatória de Registo Comercial do Porto, sob o n.º 48 259.
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A 1ª autora requereu, em 1989, a admissibilidade de uma firma que integrou, sem alterações, a expressão ... e foi registada sob essa firma a 6 de Setembro de 1990.
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A 2ª autora pediu o registo de direitos de uso exclusivo do nome de estabelecimento ... em Setembro de 1987, pedido que lhe foi deferido a 24 de Abril de 1990.
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A ré é titular do registo de marca internacional mista ..., n.º 483 246, que assinala na classe 9ª, entre outros, aparelhos, instrumentos e artigos ópticos e na classe 35ª, a promoção e publicidade de produtos da área de óptica, fabricados e vendidos pelo titular.
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Tendo sido pedida a extensão a Portugal em 14 de Fevereiro de 1997, com publicidade a 27 de Março de 1997.
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A 8 de Março de 1985 foi concedida uma primeira extensão a Portugal da referida marca internacional.
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As autoras dedicam-se à comercialização de artigos de óptica.
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O nome de estabelecimento da autora Empresa-B, Lda. é composto única e exclusivamente pela expressão ..., que apenas difere da marca ora impugnada, na sua redacção escrita, ao formar uma só palavra.
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As expressões ... e ... têm os mesmos caracteres e pronunciam-se de forma idêntica.
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A actividade exercida pela ré é afim e conexa da exercida pelas autoras, bem como os seus sinais distintivos e objectos sociais respectivos.
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A ré tem actualmente pelo menos dois estabelecimentos comerciais ostentando a denominação ... em diferentes pontos do país, concretamente, Aveiro, nas Galerias Forum, loja ..., Rua Homem de Cristo e Matosinhos, no Centro Comercial NorteShopping, loja ..., Rua Sara Afonso, n.º ...-... Srª da Hora.
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A 1ª autora usa a sua firma desde 14 de Maio de 1989.
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A autora Empresa-B, Lda. é titular do nome de estabelecimento ..., que usa para designar o seu estabelecimento.
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A ré renunciou à extensão referida no n.º 6, a 13 de Fevereiro de 1997.
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A denominação social da primeira autora é Empresa-A, Lda., sendo que no giro comercial diário o que se destaca é apenas a expressão ....
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A ré é uma sociedade comercial sedeada em Barcelona, Espanha, constituída em 23 de Dezembro de 1958, e desde então dedicada à prestação de serviços e comercialização de produtos ópticos.
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A ré tem 135 títulos de registo de propriedade industrial que abrangem múltiplos produtos e serviços, entre os quais a sua firma social, o seu nome de estabelecimento e a sua marca, que ou integram a expressão ... ou têm por único objecto a expressão linguística e figurativa ....
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A 17 de Setembro de 1964, a Oficina Espanhola de Patentes e Marcas deferiu o pedido de registo da ré do nome de estabelecimento ....
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Esse nome distinguia o...
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