Acórdão nº 08A191 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Julho de 2008

Magistrado ResponsávelMOREIRA ALVES
Data da Resolução01 de Julho de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Relatório*No Tribunal Judicial da Comarca de Oliveira de Azeméis, AA intentou processo especial de injunção, posteriormente distribuído como acção declarativa de condenação, na forma ordinária, contra BB Ld.ª Com vista à obtenção de pagamento do crédito de 24.048,11 €, correspondente ao preço de mercadorias que vendeu à Ré e esta não pagou.

Peticiona ainda os respectivos juros moratórios.

Contestou a Ré, que também deduziu pedido reconvencional.

No essencial nega a existência do alegado crédito, embora, com excepção de uma das facturas invocadas pelo A., aceite que lhe foi fornecido o material constante das demais facturas, no total de 23.419,09 €.

Alega, porém, ter pago, através de cheques diversos, por conta daquele preço, a quantia de 22.479,24 €. Por outro lado, alega também que as três últimas facturas, no valor total de 18.816,88 €, respeitantes a botas de inverno, devem ser desconsideradas, dado os defeitos dessa mercadoria, cuja devolução o A. aceitou, recebendo-as nas suas instalações, conforme guias de remessa e nota de débito de 23/10/2003, que juntou aos autos.

Assim sendo, do total reclamado pelo A. a Ré apenas é devedora da quantia de 4.602,21 €, pelo que considerando a aludida nota de débito, no valor de 18.816,88 € a Ré reconvinte é credora do A. pelo valor de 17.877,03 € e respectivos juros de mora, que assim peticiona em via reconvencional.

Replicou o A., alegando que os cheques que recebeu da Ré no dia 17/7/2003 perfaziam o valor global de 20.146,51 e destinaram-se ao pagamento de outras facturas anteriores, referentes a fornecimentos atrasados, do ano de 2002, distintos dos que agora invoca na presente acção e que se encontram totalmente por pagar.

Alega, por outro lado, que as botas vendidas e facturadas à Ré nas três últimas facturas não tinham qualquer defeito e que as respectivas guias de remessa juntas pela Ré são falsas.

Aliás, o A. não recebeu qualquer devolução de material fornecido.

Treplicou a Ré, mantendo todo o anteriormente alegado.

Dispensada a audiência preliminar, foi proferido despacho saneador, sendo organizada a matéria de facto assente, e a base instrutória, de que houve reclamação com deferimento.

Procedeu-se à audiência de julgamento e, lida a decisão sobre a matéria de facto, proferiu-se sentença final que julgou a acção procedente, condenando a Ré no pedido, e improcedente a reconvenção.

Inconformada recorreu a Ré, de facto e de direito e juntou aos autos, com as alegações, novos documentos, que, na sua opinião, destruiriam a versão fáctica tida por provada.

A Relação, porém, não admitiu a junção de tais documentos, que por isso não considerou.

Quanto ao fundo, julgou improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida.

É deste acórdão que recorre novamente a Ré, agora de revista e para este S.T.J..

Conclusões Apresentadas tempestivas alegações, formulou a recorrente as seguintes conclusões: Conclusões da Revista CONCLUSÕES MATÉRIA DE FACTO 1ªO Autor diz que a Ré lhe deve 24.048,17 € relativos a fornecimento de calçado.

  1. A Ré afirma ter pago 22.479,24 €.

  2. E devolvido material com defeito no valor de 18.816,88 €.

  3. Concluindo que lhe são devidos 17.817,03 €.

  4. O Autor por sua vez confessa ter recebido 20.146,51 €.

  5. Mas que não aceitou devoluções.

  6. A Ré diz que o que pagou foi para saldar dívidas de 2003.

  7. E o A., que o que recebeu foi para pagar o saldo credor de 2002.

  8. A sentença resolveu o litígio a favor do Autor baseando-se essencialmente no depoimento da testemunha CC, que é na verdade o "Autor de facto" da acção.

  9. Pelo que a Ré recorreu, apresentou novos documentos que "arrasam" o depoimento da testemunha CC, mostrando a razão da sua superveniência de forma clara e decompondo o depoimento da testemunha CC de forma a desconsiderá-lo.

  10. Apresentou ainda uma versão diversa relativamente ao ónus da prova.

  11. O Tribunal da Relação do Porto "não quis julgar de facto".

  12. E, por isso, ouvida a gravação, e sem mais delongas, deu razão ao "juiz a quo" sustentando a sua decisão.

  13. Não se pronunciou sobre a junção de documentos.

  14. Nem sobre a questão do ónus da prova.

  15. Quanto à primeira omissão foi corrigida através de novo Acórdão em resposta ao pedido de reforma do primeiro Acórdão.

  16. Quanto à segunda omissão mantém-se integralmente.

    DE DIREITO 18ªO Tribunal da Relação do Porto esteve mal ao não revogar a sentença do tribunal "a quo" na medida em que aquela se baseava no depoimento 'de uma testemunha com manifesto interesse na causa.

  17. Ainda que se tenha esse depoimento por isento e esclarecedor para a boa decisão da causa, subsistem questões de direito que colocam a razão inequivocamente do lado da Ré.

  18. Estamos perante um contrato de conta corrente nos termos do artigo 344° do Código Comercial.

  19. Resulta deste contrato que só é exigível o saldo resultante da conta corrente.

  20. Pelo que quem alega a dívida é que tem que a provar, e não o contrário.

  21. "In casu" é o Autor quem alega a dívida.

  22. Nos termos do n° 1 do artigo 342° do Código Civil é ao Autor que cabe fazer prova dos factos constitutivos do direito que invoca.

  23. E não o faz pelo que deve improceder o seu pedido.

  24. Ainda que consideremos estar perante sucessivos contratos de compra e venda o ónus da prova pertenceria ao Autor.

  25. É que perante a invocação da dívida pelo Autor a Ré excepcionou afirmando que já tinha procedido ao pagamento e imputou-o a dívidas do ano de 2003.

  26. Nos termos do n° 1 do artigo 783° do Código Civil é ao devedor que compete imputar o pagamento e não ao credor.

  27. Termos em que é o Autor que tem que provar a existência de dívidas relativas a 2002.

  28. O Tribunal da Relação do Porto não teve em conta os documentos juntos pela Ré com a sua apelação, não mostrando consideração pelos motivos apresentados pela Ré para a sua superveniência.

  29. Mandou, erroneamente, a Ré pagar as custas quando o pedido de reforma do acórdão se deveu, tal como reconhece, a um lapso seu.

  30. O Acórdão recorrido enferma do vício da nulidade nos termos da alínea d) do n°l do artigo 668° do Código de Processo Civil, na medida em que se não pronuncia sobre as questões de direito levantadas na apelação.

  31. O Venerando Tribunal da Relação do Porto mal interpretou os artigos 342°, 344° e 783° do Código Civil e os artigos 344° e 345° do Código Comercial.

    Termos em que deve proceder a presente revista, revogando-se a decisão do Tribunal da Relação do Porto, absolvendo-se a Ré.

    Sem prescindir, deverá ser ordenada a baixa à Relação para anulando o julgamento decida que o processo baixe à Comarca para nova Audiência.

    Assim se fará JUSTIÇA.

    O A. ofereceu contra-alegações, pugnando pela confirmação do acórdão recorrido Os FactosA 1ª instância teve por provados os factos a seguir descritos, que a Relação não alterou.

    1- O A. forneceu à R. as mercadorias que sob as descrições, referências, quantidades e preços, constam das facturas n°s 1505, 1511, 1516, 1519, 1526, 1530, 1533, 1538, 1539, 1543, 1548, 1572, 1598, 1602 e 1611; 2- Fornecimentos esses no valor total de € 24.048,11 conforme melhor adiante se discrimina: Factura n° 1505 14/02/2003 € 1.949,22 (doc. 1) Factura n° 1511 21/02/2003 € 624,75 (doc. 2) Factura n° 1516 28/02/2003 € 871,67 (doc. 3) Factura n° 1519 07/03/2003 € 321,89 (doc. 4) Factura n° 1526 17/03/2003 € 254,66 (doc. 5) Factura n° 1530 21/03/2003 €...

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