Acórdão nº 07P4551 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Maio de 2008

Magistrado ResponsávelRAUL BORGES
Data da Resolução07 de Maio de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

AA, Advogado, com domicílio profissional na Rua ........, n.° ..., ..° andar, em Lisboa, participou criminalmente contra BB, Procurador da República adjunto, CC, Escrivão adjunto, DD, Escrivão adjunto, EE, Escrivão de direito, todos em exercício de funções no Tribunal do Trabalho de Cascais, FF, jurista, em exercício de funções no Estabelecimento Prisional de Sintra, e GG, à data detido no Estabelecimento Prisional de Sintra, todos melhor identificados nos autos, imputando-lhes a prática de factos que enquadrou como integrantes de crime de difamação agravada, p. e p. pelos artigos 180.º, n.º 1, 184.º e 132.º, n.º 2, al. j), crime de injúria agravada, p. e p. pelos artigos 181.º, 184.º e 132.º, n.º 2, al. j), crime de falsidade de depoimento ou declaração, p. e p. pelo artigo 359.º, e crime de denúncia caluniosa, p. e p. pelo artigo 365.º, todos do Código Penal.

O inquérito correu termos no Tribunal da Relação de Lisboa, atenta a qualidade de Procurador da República Adjunto do primeiro denunciado (artigo 92.º do Estatuto do Ministério Público, aprovado pela Lei 47/86, de 15-10, na redacção dada ao indicado preceito pela Lei 60/98, de 27-08), e culminou com a prolação de despacho de arquivamento, nos termos do artigo 277.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, com fundamento: a) na extinção do direito de queixa quanto aos crimes de difamação e de injúria imputados, dado que o procedimento criminal depende de queixa e esta foi apresentada após o decurso do prazo fixado para o efeito no artigo 115.º do Código Penal; b) na inexistência de indícios suficientes da prática dos crimes de falsidade de depoimento ou declaração e de denúncia caluniosa imputados, dado que o teor da decisão de pronúncia proferida contra o aqui queixoso no âmbito do processo crime pendente no Tribunal de Oeiras com o NUIPC 1483/06.0TAOER (que teve início em queixa apresentada pelo ora 1.º denunciado), afasta qualquer prognose indiciária de que os aqui denunciados tenham cometido os aludidos crimes públicos.

Admitido a intervir como assistente, o denunciante requereu a abertura de instrução, nos termos constantes do requerimento de fls. 71 a 75, no qual sustenta que: - apresentou atempadamente a queixa, em 04-04-2007, dado que só teve conhecimento dos crimes pelas declarações prestadas pelos denunciados, em sede do debate instrutório realizado em 23-03-2007, no âmbito do processo crime com o NUIPC 1483/06.0TAOER, que corre termos no Tribunal de Oeiras; - o aludido processo, pendente no Tribunal de Oeiras, «não tem nada que ver com os presentes autos, na medida em que, o que nele se discute, são as palavras proferidas, pelo aqui assistente (...) se são ou não crime de difamação ou outros crimes», sendo que «estas palavras, foram o modo de exprimir, a inconformidade, de uma decisão judicial, quando liderava o processo laboral de Cascais, no desempenho das suas funções de advogado», «enquanto que, nos presentes autos, está a suspeita dos arguidos contra a honestidade, honorabilidade, bom nome, reputação e credibilidade, do aqui assistente» e «com esta conduta, os arguidos, cometeram em autoria material na forma consumada, cada um; um crime de difamação, um crime de injúrias, um crime de calúnias, um crime de denúncia caluniosa, um crime de falsas declarações e um crime de cumplicidade contra o aqui assistente, p. e p. nos termos dos art.°s 180.°, 181.°, 182.°, 183.°, 27.°, 359.° e 365.°, com a agravação do art.° 184.°, por se tratar de um profissional, que foi ofendido, lesado, no exercício das suas funções al. j) do n.° 2 do art.° 132.°, todos do CP»; - do pedido de abertura de instrução faz parte integrante a queixa crime anteriormente apresentada.

Por despacho de fls. 81 a 87, o Tribunal da Relação de Lisboa rejeitou liminarmente o requerimento de abertura de instrução, por inadmissibilidade legal da instrução - com fundamento na manifesta carência de objecto, em virtude de o requerimento carecer, totalmente, da menção de factos, e do correspondente enquadramento jurídico, bem como da concreta imputação dos mesmos aos respectivos agentes - determinou o arquivamento dos autos e condenou o assistente em custas, fixando a taxa de justiça em 8 UC.

Inconformado, o assistente interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, apresentando a motivação de fls. 89 a 94, donde extrai as seguintes conclusões: 1. Não foram considerados, no inquérito, os factos, produzidos pelos arguidos, que manifestamente, traduzem a suspeita da honestidade e seriedade do recorrente.

  1. Os factos estão claramente vertidos, quer na queixa crime, quer no requerimento de abertura de instrução.

  2. Não foram tidas em conta, quer as provas documentais, quer as provas testemunhais.

    Na procedência do recurso, defende que o despacho de arquivamento do requerimento de abertura de instrução, isto é, o despacho recorrido deve ser anulado e substituído por outro, que admita a instrução e absolva o recorrente do pagamento da taxa de justiça.

    O Ministério Público junto do Tribunal da Relação de Lisboa apresentou a resposta constante de fls. 113 a 119, na qual defende a manutenção do decidido, apresentando as seguintes conclusões: 1. O requerimento do assistente de abertura de instrução não cumpre minimamente as exigências legais (artigo 283.°, n.º 3, ex vi artigo 287.°, n.º 2, ambos do CPP), pelo que não permite a definição do objecto da instrução, assim tornando-a inexequível.

  3. O que é motivo para a sua rejeição - por inadmissibilidade legal, nos termos do n.º 3 do artigo 287.° do CPP - não havendo lugar a prévio «convite» de aperfeiçoamento.

  4. Pelo exposto, o recurso não merecerá provimento, mantendo-se o arquivamento dos autos.

    O recurso foi admitido por despacho de fls. 120.

    Notificada a admissão, veio o recorrente apresentar a "resposta" de fls. 124 a 128.

    Neste STJ, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto teve vista e pronunciou-se, a fls. 136/7, no sentido de, sem «questionar a tese avançada na decisão que rejeitou a instrução (... o entendimento que defende a necessidade do requerimento de instrução formulado pelo assistente constituir uma "acusação alternativa", imprescindível para a definição do objecto do processo e acatamento do princípio acusatório), poder-se-ia aceitar que a remissão feita no n.° 12 do requerimento (para a queixa crime apresentada) preencheria formalmente o requisito constante do n.° 3, al. b) do art.º 283.° do CPP (aplicável por remissão do art.° 287.°, 2). Porém, certo é que, materialmente, a referida queixa, como se salienta no despacho recorrido (...) não indica factos que, aos olhos do cidadão comum, e numa análise de bom senso, não só fossem aptos a provocar a referida ofensa à honra e consideração, como, também, preenchessem a previsão típica dos imputados crimes». Termina concluindo que, não merecendo censura a decisão recorrida, o recurso deverá ser julgado improcedente.

    Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do CPP, o recorrente respondeu ao parecer do Exmo. Procurador-Geral Adjunto, reiterando a posição defendida no recurso e repetindo em parte o que constava da aludida "resposta".

    No exame preliminar foi determinado o desentranhamento e restituição da "resposta" junta pelo recorrente, por inadmissível, pois que não está prevista na lei processual penal um articulado de resposta do recorrente à resposta à motivação de recurso apresentada pelo recorrido.

    Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir.

    Como é jurisprudência pacífica, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, nas quais sintetiza as razões do pedido (artigo 412.º, n.º 1, do Código de Processo Penal).

    Questão a resolver A única questão a apreciar prende-se com a aferição da existência de motivo legal de rejeição da instrução, face ao requerimento para abertura da instrução apresentado pelo assistente.

    Apreciando.

    O artigo 286.º, n.º 1, do Código de Processo Penal indica expressamente como objectivo da instrução a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito em ordem a submeter ou não a causa a julgamento.

    A abertura da instrução, como decorre do artigo 287.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal, pode ser requerida pelo assistente, se o procedimento não depender de acusação particular, relativamente a factos pelos quais o Ministério Público não tiver deduzido acusação.

    Dispõe o n.º 2 do supra citado artigo 287.º que o requerimento para abertura da instrução não está sujeito a formalidades especiais, mas deve conter, em súmula, as razões de facto e de direito de discordância relativamente à acusação ou não acusação, bem como, sempre que disso for caso, a indicação dos actos de instrução que o requerente pretende que o juiz leve a cabo, dos meios de prova que não tenham sido considerados no inquérito e dos factos que, através de uns e de outros, se espera provar, sendo ainda aplicável ao requerimento do assistente o disposto no artigo 283.º, n.º 3, alíneas b) e c), do CPP.

    Reportando-se à acusação pelo Ministério Público, estabelece este...

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