Acórdão nº 07S4478 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Maio de 2008

Magistrado ResponsávelSOUSA GRANDÃO
Data da Resolução07 de Maio de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1 - RELATÓRIO 1 -1 AA intentou, no Tribunal, do Trabalho de Aveiro, acção declarativa de condenação, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra "BB 7 - Comércio de Mobiliário S.A.", pedindo se declare que foi despedida pela Ré sem justa causa e que, em decorrência directa disso, seja a mesma condenada a pagar-lhe os componentes retributivos e indemnizatórios descriminados na P.I., sem prejuízo da sua reintegração optativa nos quadros da empresa, além das quantias, que também discrimina, a título de trabalho prestado em dias de descanso semanal, em feriados obrigatórios e em dias de descanso compensatório, tudo acrescido dos correspondentes juros de mora.

A Ré contrariou expressamente o fundamento de todas as pretensões accionadas, afirmando nuclearmente a licitude do despedimento e, quanto às prestações atinentes a trabalho suplementar, refere que as mesmas se reportam a um período em que os seus estabelecimentos eram explorados por outra empresa - "BB 2 - Comércio, Móveis e Electrodomésticos S.A." - tendo a Ré convidado os seus trabalhadores a reclamar eventuais créditos relativos a esse período, o que a Autora não fez.

Admitido, sob o impulso da demandante, o chamamento da "BB 2", veio a mesma aduzir a prescrição dos créditos reclamados, aderindo, no mais, à defesa da Ré.

1-2 Instruída e discutida a causa, foi a acção julgada parcialmente procedente, em consequência do que se decidiu: - reconhecer como ilícito o despedimento da Autora, por improcederem os motivos para tal invocados; - condenar a Ré a reintegrar a Autora no seu posto de trabalho, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade; - condenar a Ré a pagar à Autora a quantia de €1.557,98, tantas vezes quanto os meses decorreram e decorram entre 20/8/2005 e o trânsito em julgado da decisão, a título de compensação conforme art.º 437º do C.T. ("somando actualmente € 24.927,68"), acrescida de juros de mora "desde a presente data" até pagamento, à taxa de 4%, com dedução daquilo que a Autora tiver recebido, a título de subsídio de desemprego ou por via de outra actividade que tenha iniciado; - absolver a Ré do demais peticionado; - absolver a chamada do pedido.

Debalde apelou a Ré, porquanto o Tribunal da Relação de Coimbra confirmou integralmente a sentença da 1ª instância.

1-3 Continuando irresignada, a Ré pede a presente revista, onde convoca o seguinte núcleo conclusivo: 1 - a decisão que julgou ilícito o despedimento da Autora, ao basear-se em ordem de transferência temporária de local de trabalho considerada ilegal, não se compatibiliza com a valoração do conjunto da matéria de facto provada, nem com as disposições legais aplicáveis; 2 - Com efeito, o princípio da estabilidade do local de trabalho - art.º 154º do C.T. - não é um princípio absoluto, pois o próprio normativo prevê que deve ceder perante a verificação das condições e circunstâncias fixadas nos art.ºs 315º a 317º do mesmo Código; 3 - "In casu", tratava-se de uma ordem de transferência temporária, comunicada por escrito à A., com a indicação da sua justificação e do tempo previsível da alteração (3 meses), bem como da informação de que a R. custearia as despesas da trabalhadora impostas pela transferência, decorrentes do acréscimo de custos de deslocação, concretamente as despesas de transporte; 4 - a justificação, que deve ser avaliada numa óptica de gestão empresarial, teve a ver com o interesse legítimo da R. em avançar com uma reestruturação que estava em curso, com vista à melhoria da performance das lojas e, consequentemente, da sua melhor rentabilidade, como era entendimento da própria A., na reunião que tivera com o Director dos Recursos Humanos; 5 - justificação essa que depois foi desenvolvida, explicada e complementada em reuniões que o Director de Serviços e o Director dos Recursos Humanos (este, por 2 vezes) tiveram com a A. em Aveiro; 6 - tal reestruturação, como ficou provado, teve origem na grave crise económica que atingiu a empresa, provocando a redução geral das vendas, em especial na loja de Aveiro, cujos resultados eram fracos, colocando-se mesmo a hipótese do seu encerramento; 7 - reestruturação que, como também ficou provado, passava pela rotação temporária dos vários gerentes das lojas com vista à implementação de novos métodos de trabalho para motivar os recursos humanos, medida que deu resultados positivos nas lojas onde foi aplicada, enquanto a loja de Aveiro continuava em quebra de vendas e com risco de encerramento; 8 - no sentido de evitar para a A. prejuízos sérios na organização da sua vida familiar, que ela invocara em carta, a R. assegurou-lhe por escrito, que o tempo das deslocações entre Aveiro/Porto/Aveiro seria computado como tempo de trabalho, mantendo-se assim inalterado o horário que a A. praticava na loja de Aveiro, entre as 10h e as 20h; 9 - Com esta medida, a R. garantiu que a deslocação diária da A. para o Porto e regresso a Aveiro não afectaria negativamente o tempo disponível que esta dedicava ao apoio familiar, que era exactamente igual ao que dispunha antes da transferência; 10- de resto, a A. nem alegou em concreto, nem provou, o modo e o tempo que dedicava ao apoio familiar e de que maneira esse apoio seria afectado pela transferência nas condições proporcionadas pela empresa; 11- também perante a indisponibilidade da A., manifestada na referida carta, de conduzir e ao facto de ter um veículo velho, a R. acedeu a que utilizasse o transporte público, designadamente o comboio; 12- a viagem de comboio dura cerca de 45 minutos - tempo incluído no horário de trabalho da A.

- tratando-se de um tempo semelhante ou até inferior à média gasta pelos trabalhadores que residem nas periferias das cidades, independentemente do meio utilizado, devido aos problemas de trânsito; 13- além disso, a R. garantiu que não alteraria os dias de folga semanal da A. enquanto estivesse na loja do Porto, ponto também muito importante para a estabilidade da sua vida familiar; 14- afastados estes obstáculos, restava a própria viagem que, podendo ser um incómodo ou transtorno, não seria seguramente um prejuízo sério que legitimasse a recusa da A. em comparecer na loja do Porto, onde nunca se apresentou, continuando a fazê-lo na loja de Aveiro, em claro desafio à ordem de transferência; 15- não se provando a existência de prejuízo sério mas, tão só, de eventual incómodo que, aliás, teria uma duração curta, a ordem em causa era lícita, sendo ilegal e ilegítima a recusa da A. em acatá-la, o que constitui infracção disciplinar - art. 121º n.º 1 al. D) do C.T. - que integra justa causa de despedimento - art.º 396º n.º 1 e n.º 3 al. A) do mesmo Código; 16- por outro lado, recusando o cumprimento da ordem, a A. não compareceu no novo local de trabalho, faltando injustificadamente ao serviço durante 16 dias, o que também constitui infracção disciplinar e íntegra justa causa de despedimento - art. 396º n.º 3 al. G); 17- mesmo que se entendesse que a ordem era ilegal, ainda assim ficaram provados comportamentos graves praticados pela A. que, por si sós, constituíram infracções disciplinares susceptíveis de conduzir ao despedimento, como consta da decisão final do processo disciplinar; 18- na verdade, provado ficou que a A. desrespeitou determinações superiores da empresa no sentido de conceder as legais compensações aos trabalhadores da loja de Aveiro que laboraram em dias de folga semanal e em feriados em Novembro e Dezembro de 2003, não só por ser uma imposição legal mas como factor de motivação adicional; 19- provado também ficou que a A., desrespeitando de novo determinações superiores da empresa, não concedeu 15 dias de férias aos trabalhadores da loja de Aveiro nos meses de Julho, Agosto e Setembro de 2004, prática que não era habitual nos anos anteriores, inviabilizando um factor adicional de motivação dos trabalhadores, que não gozaram desse benefício por incumprimento da A.; 20- a agravar este comportamento, e como também ficou provado, a A. procurou esconder este facto do conhecimento da sua hierarquia, dizendo à colega CC que não enviasse o mapa de férias para a Direcção dos Recursos Humanos, em Lisboa; 21- sendo a A. a responsável máxima da loja, em quem a R. tinha de confiar na execução das suas instruções e determinações, competia-lhe dar o exemplo, cumprindo determinações legais e actos de gestão enquadrados na política de recuperação da empresa então em curso; 22- esses incumprimentos puseram em causa a aplicação da lei e a realização dos direitos dos trabalhadores, subordinados da A., com os ónus dessa situação a recaírem injustamente sobre a empresa; 23- perante tais comportamentos, não era possível à R. contar com a colaboração da A., como responsável da loja, pela recuperação desta e pela motivação dos trabalhadores nesse esforço de recuperação; 24- neste contexto, estas infracções disciplinares assumiram uma maior relevância e gravidade, fazendo com que se quebrasse, de forma irremediável, o grau de confiança indispensável ao exercício do cargo, pela A., de responsável de loja, tornando impossível a manutenção do contrato de trabalho; 25- tais infracções, em si mesmas ou, por maioria de razão, associadas à desobediência anteriormente referida - ordem de transferência - são de elevada gravidade, atenta, por um lado, a alta responsabilidade funcional da A. e, por outro, a violação de disposições legais, dos direitos dos trabalhadores e de determinações superiores; 26- ao decidir em contrário - desvalorizando as gravíssimas infracções apontadas - as instâncias não valoraram correctamente os factos provados e fizeram uma errada interpretação e aplicação dos arts. 315º a 317º, 121º als. B), C), D) e G) e 396º n.ºs 1 e 3 als. A), B), D) e C do C.T..

27- assim, deverá ser revogado o Acórdão da Relação, considerando-se legítima a ordem de...

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