Acórdão nº 08P1422 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Abril de 2008

Magistrado ResponsávelSOUTO DE MOURA
Data da Resolução24 de Abril de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

A - O MANDADO O Tribunal Correccional de Tours, em França, a 9 de Março de 2006, manteve os efeitos de um Mandado de Detenção Europeu (M.D.E.) emitido pelo juiz de instrução francês, em 1/10/2004, contra o cidadão português AA, nascido em Lisboa, em 20/01/1953, de nacionalidade portuguesa, divorciado, com a profissão actual de técnico de acostagem, com anterior residência na Rua ..nº 0, 1º andar, letra B, Lisboa, e, antes de detido, residente na Rua ..., Lote 000, 3º esq. Alcochete.

Veio a ser encontrado e detido, a 14/02/08, no Fogueteiro, em Setúbal.

Foi oportunamente inserida, no Sistema de Informação Schengen (S.I.S.), a indicação da necessidade de detenção de AA, nos termos do artº 95º da Convenção do Acordo de Schengen de 16/06/1985 (inserção F0133469495074 0000 1).

O pedido é feito com base nos seguintes elementos: "(...) 6. [apelido] AA 7. [nome próprio] AA 9. [data de nascimento] 1953.01,20 10. [naturalidade] Portugal - Lisboa 12. [sexo] Masculino 13. [nacionalidade] PT # Portugal 30. [autoridade de origem do mandado de detenção ou da sentença (identidade ou qualidade do magistrado ou identificação da jurisdição)] A presente difusão intervém a título de um Mandado de Detenção, Europeu, solicitamos aos países que não possam reconhecer o Mandado de Detenção Europeu, que tratem este Mandado como um Mandado de Detenção provisória, com vista à extradição. Este Mandado foi emitido por uma autoridade Judiciária competente; 31. [referência do mandado de detenção] 02/19060; 32. [data do mandado de detenção] 01 de Outubro de 2004; 33. [qualificação da autoridade que solicita a busca] Solicita-se que a pessoa acima mencionada seja detida e entregue às autoridades Judiciárias, para fins do exercício de procedimentos penais ou da execução de uma pena ou de uma medida de segurança privativa de liberdade. Designação oficial da autoridade judicial: Tribunal_de Grande Instância; Nome do seu representante: Joel Parard; Função: assistente, encarregue do dossier: 02/19060; Morada: TGI, Place Jean Jaures, F-37032 Tpurs Cedex Frange. Tcl: 00.33.2,47.60.26.60, Fax: 00.33.2.47.60,27.78; Coordenadas da pessoa a contactar a fim de serem tomadas as disposições práticas necessárias à entrega da pessoa: Permanente, do Ministério Público; Tel: 00.33.2.47.60.27.77.

034. [pena máxima] 7 anos de prisão; 35. [magistrado ou jurisdição de origem da sentença] Tribunal Correccional de Tours, France; 36. [data da sentença] 9 de Março de 2006; 37. [referência da sentença] 663/D; 38. [pena aplicada] 5 anos de prisão; 039 [pena ainda por cumprir] 4 anos de prisão; 40. [textos legais aplicáveis] Artigos 311-1, 311-4, 311-14, 321-1, 321-3, 321-9, 321-10, 441-1, 441-2,441-10,441-11 do Código Penal; 41. [qualificação legal dos factos] Furto agravado por duas circunstâncias; receptação de documentos administrativos falsos; uso de documento falso, comprovativo de um direito, uma identidade ou uma qualidade; 42. [data/período do cometimento da infracção] No decurso de 2002 e 2003; 43. [local/locais do cometimento da infracção] Em França; 44. [descrição dos factos (incluindo as suas consequências)] AA, na companhia do seu filho ...., efectuou no decurso de 2002 e 2003, em zonas de estacionamento de locais turísticos muito frequentados, situados na Normandia (França) ou em Touraine (França), uns cinquenta furtos, com danos sobre veículos pertencentes a turistas franceses ou estrangeiros, cujas trancas das portas forçava para furtar os objectos de valor que lá se encontravam, assim como as bagagens que lá se encontrassem e que a seguir revendia clandestinamente, para com isso usufruir lucros substanciais avaliados entre 2.500 e 4.000 euros mensais.

Detinha e circulava, sob a cobertura de um falso Bilhete de Identidade e uma falsa Carta de Condução que admitiu ter comprado na Bélgica.

  1. [grau de participação (autor, co-autor, cúmplice, outros)] co-autor; 61. [última morada conhecid

  1. Portugal: Rua ..., lote 8 1 -18000, Lisboa, Portugal; 83. [garantias jurídicas] Julgamento definitivo - Não é passível de recurso; o presente mandado reporta-se a um total de 3 infracções." Detido, como se viu, a 14/02/08, foi apresentado no Tribunal da Relação de Lisboa no dia seguinte. Ouvido, não renunciou ao princípio da especialidade e opôs-se à execução do mandado. Foi-lhe aplicada a medida de coacção de apresentações semanais no posto policial da área da respectiva residência, concedendo-se-lhe, a seu requerimento, o prazo de dez dias para apresentação de oposição (nº 4 do artº 21º da lei 65/2003 de 23 de Agosto).

    É o seguinte o teor dessa oposição: "AA, visado nos presentes autos de extradição, vem deduzir oposição à execução do MDE nos seguintes termos: 1.° - O requerido vem desde já solicitar novo prazo de oposição, uma vez que ainda se não encontra junto aos autos o Mandado de Detenção Europeu 2.° - Sendo certo que o arguido ainda não foi inteiramente elucidado sobre a existência e o conteúdo do Mandado de Detenção Europeu (ao que parece proveniente da Justiça Francesa.) o qual, a existir de facto, ainda não consta dos autos).

    1. - Nessa conformidade, se tem de entender que ainda se não mostra cumprido, na sua integralidade, o disposto no art.° 18.° n.° 5 da Lei 65/2003 de 23 de Agosto.

    2. - Pelo que se requer, pelos motivos infra expostos, a notificação do mandatário do arguido (ou do seu representado) da junção aos autos do referido MDE e a concessão de novo prazo de dez dias para o requerido se pronunciar sobre o conteúdo desse MDE (nomeadamente quanto aos seus aspectos formais).

      Mas, sem conceder, 5.° - Diz a Justiça Francesa que o requerido foi submetido a julgamento acusado de vários furtos (dado que a tradução não se encontra correcta) alguns deles praticados no ano de 2002.

    3. - Ora o furto é punido no nosso Código Penal com pena de prisão ou multa (art.° 203.° do CP) sendo o seu prazo de prescrição de cinco anos (art.° 118.° n.° 1 alínea c) do CP - não sendo punível (ao invés do que estipula o Code Penal Francês e consta do "Histórico") com a pena de SETE ANOS.

    4. - Nessa conformidade, existiria uma causa de recusa facultativa de execução do MDE em referência - por força do disposto no art.° 12.° n.°l alínea e) da Lei 65/2003 de 23 de Agosto 8 - Por outro lado, o cidadão em causa (AA) encontra-se em território nacional, tem nacionalidade portuguesa, sendo a expulsão de cidadãos portugueses proibida pela Constituição da República "apud" art.º33.°n.°l daCRP 9 - Proibindo também o mesmo art.° 33.° n.° 3 da CRP a extradição de cidadãos portugueses, à excepção dos casos de terrorismo e de criminalidade internacional organizada, pelo que os art.° l.°e 2.°da Lei 65/2003 de 23 de Agosto se mostram materialmente inconstitucionais por violação quer do art.° 33.° da CRP quer dos princípios nele consignados.

      10. - Não sendo invocados no processo nem imputados ao arguido, quer o crime de terrorismo, quer o de criminalidade internacional organizada.

      11. - Do mesmo modo, o disposto na Lei 65/2003 de 23 de Agosto no que aos presentes autos respeita, encontra-se fora do âmbito excepcional a que alude "a norma de cooperação judiciária" a que faz jus n.°5 (regime excepcional) do art.° 33.° da mesma CRP.

    5. - Pelo que o art.° 2.° da referida Lei 65/2003 de 23 de Agosto se mostra ferido de verdadeira e própria inconstitucionalidade material, por violação do apontado art.° 33.° n.° 3 da Lei Fundamental.

    6. - De notar ainda, que mesmo se não considerasse a apontada inconstitucionalidade, o n.° 3 do referido art.° 2.° da mencionada Lei, vem expressamente dizer que afinal a Lei se aplica a todas as infracções que "constituam infracção punível pela lei portuguesa" o que, para além de se revelar um contrasenso (retirando todo o sentido ao rol de crimes elencados anteriormente no n.° 2), constitui, também, nítida inconstitucionalidade material, por violação da norma imperativa do art.° 33.° n.°3 da Lei FUNDAMENTAL.

    7. - Ainda sem conceder, 15.° - O requerido é português, não fugiu de França /tendo sido restituído à liberdade no âmbito de um processo que lhe foi movido, por excesso de prisão preventiva, reside em Portugal na morada que indicou no T.I.R., havendo o MDE referido nos autos sido emitido para cumprimento de uma pena, podendo o Estado Português executar aquela mesma pena.

    8. - Existindo, por tal facto, uma causa de recusa facultativa de execução do apontado Mandado de Detenção Europeu.

    9. - Finalmente, sempre se dirá que sendo o crime de furto (art.° 203.° do CP) punido em Portugal também com pena de multa, tal possibilidade (de aplicação, em concreto, por um Tribunal Português de aplicação ao requerido, de pena de multa, sempre cairia na previsão da causa de recusa facultativa da execução do Mandado de Detenção Europeu, contemplada no n.°l do art.° 12.° da referida Lei 65/2003 de 232 de Agosto, para além de constituir uma das excepções previstas no art.° 7.° n.° 2 alínea b) da Lei 65/2003 de 23 de Agosto.

      Termos em que se reafirma a oposição clara do requerido à solicitada extradição (benefício da regra da especialidade), mantendo-se todo o alegado no requerimento ditado para a acta no dia da audição do requerido (15.02,2008) e requerendo-se outrossim ao Venerando Tribunal:

  2. Que notifique o mandatário do requerido da oportuna junção do MDE aos presentes autos.

  3. (sic) c) Que conceda ao requerido, novo prazo de dez dias de oposição, a contar da data dessa notificação.

  4. Que não execute o Mandado de Detenção Europeu dadas as razões expostas." B - A DECISÃO RECORRIDA Por acórdão de 17/3/2008, do Tribunal da Relação de Lisboa, foi deferida a execução do M. D. E., tecendo-se, em relação à aludida oposição, as seguintes considerações: "O mandado de detenção em causa é admissível por ter por finalidade o cumprimento de pena de prisão...

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