Acórdão nº 08A778 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Abril de 2008

Magistrado ResponsávelPAULO SÁ
Data da Resolução22 de Abril de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - A Companhia de Seguros AA Portugal, S.A.

interpôs, na 2.ª Vara Cível da Comarca do Porto, acção declarativa de condenação, com processo comum, sob a forma ordinária, contra BB - Sociedade de Medição Imobiliária, L.da, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de € 138.023,81, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Para tanto alega, em síntese: A Ré, no exercício da sua actividade de mediação imobiliária, agiu dolosamente e com inteira consciência de enganar FP e esposa, já que se encontrava na posse de elementos necessários e suficientes para saber que os negócios que lhes propunha eram impossíveis de concretizar.

A A. tem, nos termos do art. 17.º, n.º 2, das condições gerais do contrato de seguro que celebrou com a Ré, direito de regresso, afim de ser reembolsada pela quantia de € 138.023,81 que entregou àqueles, para ressarcir os danos por estes invocados e reconhecidos por sentença transitada em julgado.

Devidamente citada, a ré deduziu contestação, impugnando os factos articulados na petição inicial, invocando não se ter provado no acórdão proferido a existência de qualquer dolo na conduta da ré, nem mesmo a prática de qualquer contra-ordenação ou crime, considerando, pois, não se verificarem os pressupostos de aplicabilidade da cláusula em que fundamenta a A. o seu pedido.

A A. replicou.

Dispensou-se a audiência preliminar, foi proferido despacho saneador, declararam-se os factos assentes e fixou-se a base instrutória, com reclamação da A., atendida.

Realizada a audiência de julgamento, respondeu-se à matéria de facto, sem reclamações.

A final, foi proferida sentença, que julgou a acção parcialmente procedente, condenando, em consequência, a Ré, a pagar à A. a quantia de 69.011,90 Euros, acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Inconformada, apelou a A. para a Relação do Porto, recurso que foi admitido, pugnando pela total procedência da acção.

Não houve contra-alegação.

A Relação veio a julgar a apelação totalmente procedente, pelo que condenou a Ré a pagar à A. a quantia de € 138.023,81, acrescida de juros, à taxa legal, desde a citação e até integral pagamento.

De tal acórdão veio a R. interpor recurso de revista, recurso que foi admitido como tal.

A R. apresentou as suas alegações, formulando, em síntese, as seguintes conclusões:

  1. Deve negar-se provimento ao recurso da A./recorrida, quanto ao direito de regresso, bem como revogar-se na totalidade a sentença da 1.ª Instância e o douto acórdão da Relação do Porto também na totalidade, já que inexiste solidariedade e fundamento para o direito de regresso da A/recorrida.

  2. Deve dar-se provimento ao presente recurso, no sentido de revogar o douto acórdão recorrido, na parte em que qualifica a actuação da aqui recorrente como uma contra-ordenação, já que, ainda que possa ter ficado demonstrado que a recorrente foi negligente, não houve prova, nem tal ocorreu, da condenação ou punição da recorrente por contra-ordenação ou a aplicação de qualquer coima ou sanção por tais factos, não havendo por isso fundamento para o direito de regresso.

  3. Deve dar-se provimento ao presente recurso quanto ao facto de a responsabilidade da aqui recorrente não ser de carácter solidário, tudo nos termos das disposições legais supra mencionadas e, nessa parte também ser revogada a douta sentença da 1.ª Instância e o douto acórdão recorrido.

  4. A entender-se, o que não se concede, que a recorrente praticou uma contra-ordenação, deve aplicar-se ao caso retroactivamente a Portaria n.º 66/2005 de 25 de Janeiro, no seu art.º 9.º, alínea a), no sentido em que esta estipula um regime mais favorável para a recorrente e por aplicação do art.º 2.º do Código Penal.

Pede que, no provimento do recurso seja a R. absolvida do pedido, na totalidade.

Não houve contralegação.

Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

II - Fundamentação II.A.

De Facto É a seguinte de facto fixada pela 1.ª instância: 1 - A R. aderiu ao contrato de seguro de grupo celebrado entre a A. e a APEMI - Associação Portuguesa das Empresas de Mediação Imobiliária, o qual é titulado pela apólice nº. 68.305 - doc. de fls. 9, aqui dado por reproduzido -, através do qual a A. assumiu para si transferido o risco de responsabilidade civil da ora R. pelas "indemnizações que legalmente sejam exigíveis ao segurado pelos danos patrimoniais que sejam causados aos clientes, decorrentes exclusivamente de acções, omissões ou incumprimento das obrigações do segurado no exercício profissional da actividade de mediação imobiliária, conforme definido na legislação em vigor - cfr. o artº. 3º. das Condições Gerais (doc. de fls. 10) - Alínea A) da matéria assente; 2 - Tal contrato vigorava durante o ano de 1998 com um capital seguro de Esc. 50.000.000$00 - cfr. doc. de fls. 9 - Alínea B) da matéria assente; 3 - Através de tal contrato ficou estabelecido que «a seguradora, uma vez paga a indemnização, tem direito de regresso contra o segurado (...) quando a responsabilidade do segurado ou de pessoa por quem ele seja responsável decorra de actuação dolosa ou de acto qualificável como crime ou contra-ordenação» - cfr. o artº 17º, nº 2, das Condições Gerais do contrato de seguro, juntas a fls. 10 - Alínea C) da matéria assente 4 - Correu termos sob o nº 58/2000 e pela 2ª Secção da 1ª Vara Cível do Porto acção ordinária em que foram AA. FP e mulher, PS, R. a ora R. e intervenientes principais como associados da R. a ora A., BB Vinte - Sociedade de Mediação Imobiliária, Lda., e Axa Portugal - Companhia de Seguros, SA - certidão de fls. 13 - Alínea D) da matéria assente; 5 - Discutida tal causa, veio a ser proferida sentença em 1ª instância que julgou parcialmente procedente a acção e condenou a ora A. a pagar aos então AA. a quantia de € 68.145,77 e juros de mora à taxa legal desde a citação e até integral pagamento - cf. a certidão junta a fls.13 - Alínea E) da matéria assente; 6 - Tal sentença veio a ser alterada por Acórdão da Relação do Porto que, mantendo os valores da condenação, estendeu tal condenação em termos de responsabilidade solidária à aqui R. - cf.doc. de fls. 13 - Alínea F) da matéria assente; 7 - Interposto recurso desse Acórdão da Relação, veio a ser proferido Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça que ampliou a condenação, de molde a ficarem as ora A. e R. condenadas solidariamente no pagamento aos aí AA. também da indemnização de Esc. 10.120.000$00, a título de lucros cessantes - cfr. doc. de fls. 13 - Alínea G) da matéria assente; 8 - Acórdão esse que transitou em julgado - cfr. doc. de fls. 13 - Alínea H) da matéria assente; 9 - A ora R. é uma sociedade comercial, cujo objecto se traduz no exercício da actividade de mediação imobiliária, consistente na obrigação de conseguir interessados para a compra e venda de bens imobiliários, ou para constituição de quaisquer direitos reais sobre os mesmos, para o seu arrendamento, bem como na prestação de serviços conexos - Alínea I) da matéria assente; 10 - Conforme contratos-promessa em causa na acção referida em D), de compra e venda, outorgados em 2 e 6 de Outubro de 1998, os FP e mulher, PS, prometeram adquirir no empreendimento composto de dois edifícios, com a designação de blocos A e B, a constituir em regime de propriedade horizontal e destinado a habitação e comércio, que a construtora "UU" teria em construção na Rua ...., nas freguesias e concelho da Maia, as seguintes fracções: - pelo preço de 14.220.000$00 uma fracção do tipo T1+1, sita no 4º andar, bloco B do supra referido edifício em construção, dispondo de garagem e arrumos localizados na cave designados pela letra e número "B-01", tendo pago a título de sinal e princípio de pagamento a quantia de 2.133.000$00; - pelo preço de 17.730.000$00 uma fracção do...

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