Acórdão nº 08B983 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Abril de 2008
Magistrado Responsável | OLIVEIRA ROCHA |
Data da Resolução | 17 de Abril de 2008 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.
AA, Construções, Lda.", intentou, no Tribunal Judicial da Mealhada, acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra BB, pedindo que esta seja condenada a: - reconhecer a autora como proprietária de todo o Lote 15, incluindo o imóvel - casa de habitação - onde reside a ré; - restituir o imóvel - casa de habitação - à autora livre e devoluto; - reconhecer que causou prejuízos à autora com a falta de entrega do imóvel, quando notificada, em quantia que não é possível definir ainda e, consequentemente, a indemnizar a autora, reparando esse prejuízo em quantia a liquidar em execução de sentença.
Alega, em síntese, que é dona e possuidora do prédio aludido, sendo certo que CC havia sido empregado da anterior proprietária, "DD SARL" e, nessa qualidade, que foi habitar a dita casa, tendo, quando cessou o contrato, adquirido o direito de habitação até à sua morte, após o que ali se manteve a habitar a casa a ora ré, esposa daquele, sem qualquer título.
Apesar de notificada para entregar o imóvel, a ré não o fez, causando prejuízos à autora, ainda não determináveis.
Regularmente citada, a ré contestou, alegando que a autora não tem direito a reivindicar a casa, existindo, ante a não demonstração, pela autora, de que tal casa lhe pertence, contradição entre causa de pedir e pedido.
A casa servia de morada de família ao seu falecido marido CC e à ré, os quais ali passaram a habitar há mais de 50 anos.
O seu falecido marido, na qualidade de trabalhador da "DD, SARL", beneficiava de habitação, mas, por volta do ano de 1977, tal sociedade suspendeu a sua actividade e despediu-o, tendo este reivindicado os seus direitos, conforme resulta do teor da acta de conciliação exarada nas Comissões de Conciliação e Julgamento do Distrito de Aveiro, e, então, a dona da casa reivindicada, ou seja, a entidade patronal, proporcionou ao seu falecido marido o gozo temporário do mesmo bem, através da retribuição no montante de 38.834$14, transmitindo-se a posição de arrendatário à ré com a morte do marido.
Na réplica, a autora pronuncia-se pela inexistência da contradição entre pedido e causa de pedir e impugna a existência do alegado contrato de arrendamento.
Foi proferido despacho saneador, onde se julgou improcedente a excepção deduzida pela ré, seleccionando-se, de seguida, a factualidade relevante.
Ante reclamação apresentada por autora e ré, foi proferido, já em audiência de julgamento, o despacho que consta da acta de fls. 160 e segs., deferindo apenas, e parcialmente, a reclamação da autora e indeferindo a reclamação da ré.
Já após iniciada a audiência de julgamento, a ré veio, a fls. 192 e 201, interpor recurso dos despachos proferidos no sentido do indeferimento de pedido de realização de diligência probatória e do pedido de depoimento de parte exarados a fls. 170, 181 e 182.
Ambas as partes apresentaram alegação escrita sobre o aspecto jurídico da causa, após o que foi proferida sentença a julgar a acção parcialmente procedente e provada, sendo a ré condenada a reconhecer a autora como proprietária do Lote nº 15, integrado pela casa de habitação onde reside, restituir tal casa e reconhecer que causou prejuízos à autora, com a falta de entrega do imóvel a partir da data da sua citação para a acção, em quantia não concretamente determinada, devendo indemnizar aquela em quantia a liquidar em execução de sentença.
Não se conformou a ré com tal decisão, dela apelando, sem êxito, para o Tribunal da Relação de Coimbra.
Ainda irresignada, pede revista, tendo concluído a alegação de recurso pela seguinte forma: A ré alegou factos que, uma vez provados, não podiam deixar de demonstrar o seu direito "a morrer" na habitação que sempre teve e onde sempre viveu, acompanhado do seu marido enquanto este viveu; Alegou factos, que podiam demonstrar o seu direito, mas estes não foram levados ao questionário e, por isso, reclamou sobre tal omissão, mas esta foi ignorada, apenas se pretendeu "despejar" a ré, ou seja, parece que os "dados" estavam lançados desde o início, pelo que as decisões enfermam de nulidade, prevista nas als. b) e d) do n° 1 do art. 668º do Código Processo Civil; A Mma. Juiz a quo, por despacho de 15/07/2005, indeferiu a reclamação que não admitia recurso, mas podia e devia ser analisada a questão no recurso da decisão final, com pleno fundamento; E, de facto, a questão foi levantada no recurso, que devia ter sido apreciada, por força do nº 3 do art. 511º do Cód. Proc. Civil, no qual se devia ter dado provimento a tal indeferimento e anular o processado posterior; Ao não se ter analisado o fundo desta questão, fez-se errada interpretação, o Supremo Tribunal pode emendar, nos termos do art. 722º do Cód. Proc. Civil; Na verdade, a Mma. Jujz "a quo" não podia condenar a ré a entregar uma casa que é actualmente "clandestina" e, muito menos, a Relação podia passar "por cima" da questão, face às normas apontadas e este Supremo pode e deve censurar aquela atitude; Violaram, assim, as instâncias, além do mais, o art. 122° do CIRC; E o acórdão, ao omitir esta questão de fundo, não deixa de ser nulo, nos termos das als. d) e e) do nº1 do art. 668° do CPC, por força do art. 716° deste Código; Pois, além do mais, ignorou-se o caso julgado, arguido nas referidas alegações de apresentadas pela recorrente, ofendendo-se o artigo 675° do Código de Processo Civil; E, finalmente, fez-se, na decisão sub judice, errada interpretação das normas aplicadas ao arrendamento urbano, referidas pela ré; E mesmo que se tratasse de uma concessão, esta jamais podia ser gratuita, face aos factos dados por provados e, por isso, não corresponde à verdade tal assertiva; E se o falecido marido da recorrente tinha direito a habitar a casa até à sua morte, este direito estender-se-ia ao seu cônjuge, por aplicação do art. 1724° do Código Civil; Assim, foi proclamada uma errada interpretação dos arts. 1476°, 1484° e 1485°, todos do Código Civil; E estando a recorrente convencida que tinha direito, e estando a ocupar uma casa "clandestina", não podia ser condenada a pagar...
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